Parecer no:

 

MPTC/7.289/2011

                       

 

 

Processo nº:

 

REC 09/00545470

 

 

 

Origem:

 

Companhia Hidromineral de Piratuba

 

 

 

Assunto:

 

Recurso de Reexame (art. 80, da LCE/SC nº. 202/2000).

 

Trata-se de Recurso de Reexame formulado pelo Sr. Cezar Leobet, com fundamento no art. 80, da Lei Complementar nº. 202/2000, em face da Decisão Plenária prolatada na Sessão Ordinária de 27-07-2009 (Acórdão 1035/2009 – Processo ALC-06/00316114).

O Gestor insurgiu-se contra referida decisão nos termos da petição de fls. 02-07. Aduz em sua defesa que:

“[...]

 

“Em que pese o total respeito à decisão tomada por essa distinta Corte de Contas, que tanto tem feito pelo controle efetivo das contas públicas, contribuindo, assim, para a concretização dos mandamentos constitucionais da moralidade, da eficiência, da isonomia e da impessoalidade, a multa que foi aplicada ao recorrente é completamente ilegal e inconstitucional, razão pela qual se busca a reforma da decisão, conforme as razões que serão explanadas a seguir.

2 – MÉRITO

2.1 – A EXIGÊNCIA QUANTO À REMESSA DO EDITAL DE CONCORRÊNCIA, SEM NENHUMA SOLICITAÇÃO, É FUNDADA EXCLUSIVAMENTE EM ATO NORMATIVO EMANADO DESSE EGRÉGIO TRIBUNAL DE CONTAS DE SANTA CATARINA – O CONTROLE PRÉVIO AUTOMÁTICO É COMPLETAMENTE ILEGAL E INCONSTITUCIONAL

Conforme ficou assentado na decisão ora recorrida, foi aplicada multa de R$ 400,00 (quatrocentos reais) ao recorrente, devido à ausência de envio a essa distinta Corte de Contas dos Editais de Concorrência nºs 01, 03 e 04/05. Considerou-se, assim, descumprida a Instrução Normativa n. TC-01/2002, o que motivou a aplicação da referida penalidade administrativa.

Do exame atento dos autos, retiram-se três premissas fáticas fundamentais: 1 – a imputação de responsabilidade é amparada exclusivamente em ato normativo expedido por essa Egrégia Corte; 2 – a inexistência de solicitação expressa e individual por parte da Corte para examinar previamente os referidos editais; e 3 – ausência de irregularidade ou ilegalidade nos editais examinados.

Há no plano normativo federal o disposto no § 2º do art. 113 da Lei n. 8.666/93, cuja redação é a seguinte: “Os Tribunais de Contas e os órgãos integrantes do sistema de controle interno poderão solicitar para exame, até o dia útil imediatamente anterior à data de recebimento das propostas, cópia de edital de licitação já publicado, obrigando-se os órgãos ou entidades da Administração interessada à adoção de medidas corretivas pertinentes que, em função desse exame, lhes forem determinadas”. Verifica-se, de plano, que o controle prévio, pelos Tribunais de Contas, é cabível. Porém, é imprescindível que seja feita solicitação expressa do edital à entidade interessada. A exigência automática, fundada exclusivamente em Instrução Normativa expedida pela Corte de Contas, é completamente ilegal e inconstitucional, pois representa manifesta invasão da competência legislativa conferida à União Federal. Em outras palavras, o nosso distinto e extremamente qualificado Tribunal de Contas de Santa Catarina invadiu a competência da União Federal, legislando acerca da obrigatoriedade da remessa automática de editais. Sobre essa temática, o Egrégio Supremo Tribunal Federal já decidiu, em caso idêntico ao ora analisado, que tal imposição emanada dos Tribunais de Contas é manifestamente ilegal e inconstitucional, conforme precedente relatado pelo eminente Min. Menezes Direito, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 547.063/RJ, assim ementado:

Tribunal de Contas estadual. Controle prévio das licitações. Competência privativa da União (art. 22, XXVII, da Constituição Federal). Legislação federal e estadual compatíveis. Exigência indevida fita por ato do Tribunal que impõe controle prévio sem que haja solicitação para a remessa do edital antes de realizada a licitação.

1. O art. 22, XXVII, da Constituição Federal dispõe ser da União, privativamente, a legislação sobre normas gerais de licitação e contratação.

2. A Lei federal n. 8.666/93 autoriza o controle prévio quando houver solicitação do Tribunal de Contas para a remessa de cópia do edital de licitação já publicado.

3. A exigência feita por atos normativos do Tribunal sobre a remessa prévia do edital, sem nenhuma solicitação, invade a competência legislativa distribuída pela Constituição Federal, já exercida pela Lei federal n. 8.666/93, que não contém essa exigência.

4. Recurso extraordinário provido para conceder a ordem de segurança.

No corpo do acórdão encontra-se excelente fundamentação, onde fica demonstrada a total improcedência da fundamentação apresentada para aplicação da multa ao recorrente:

A penalidade foi imposta pelo descumprimento de formalidade que o Tribunal de Contas considerou essencial, isto é, a remessa de cópias do edital de concorrência, embora não houvesse solicitação, não se apontando nenhuma irregularidade seja na licitação seja no contrato decorrente.

(...)

O comando legal é para que o controle prévio seja realizado caso a caso, mediante expressa solicitação do Tribunal, daí a conseqüência da responsabilidade do agente de descumprir essa determinação. Há, portanto, uma dependência do pedido do Tribunal de Contas para que seja encaminhado o edital e da concorrência de atos viciados no procedimento de licitação.

Com isso, sendo da competência da União legislar privativamente sobre as regras gerais do procedimento de licitação e havendo Lei federal que estabelece que o controle prévio será efetuado mediante solicitação expressa do Tribunal em cada caso, padece de fundamento legal e constitucional resolução ou deliberação do Tribunal determinando o controle prévio automático.

Por outro lado, mostrou o voto vencido do Ministro Teori Zavascki, que não há conflito entre a Lei Complementar estadual e a Lei federal, mas, há, sim, invasão da competência privativa da União nos atos do Tribunal de Contas que inovam com a exigência da obrigação da Administração de remeter previamente os editais, sem que haja solicitação do Tribunal de Contas.

Por isso, a penalidade imposta está baldia de fundamento porquanto apoiada em ato do Tribunal de Contas que impõe exigência fora da competência prevista no art. 22, XXVII, da Constituição Federal.

Durante o julgamento, a eminente Min. Carmen Lúcia proferiu manifestação lapidar sobre o caso, assentando que “Não havendo obrigatoriedade, não há como estabelecer, por resolução, cominações no sentido de multar alguém por não ter cumprido o que ele não era obrigado”. Portanto, é inconstitucional e ilegal a imposição da multa aplicada ao recorrente, pois foi amparada juridicamente apenas em ato interno expedido por essa distinta Corte de Contas. Por esta razão, é impositivo o seu cancelamento, sob pena de restar afrontado o entendimento pacificado pela Corte Constitucional, que, conforme visto, no exercício da sua elevada função constitucional, assentou pela inconstitucionalidade e ilegalidade de exações impostas pelos motivos declinados.

2.2 – A AUSÊNCIA DE QUALQUER ILEGALIDADE DE DESPESA OU IRREGULARIDADE DE CONTAS

Conforme definido no tópico anterior, inexiste lei amparando a decisão ora atacada. Por isso, o ato decisório caracteriza ofensa ao inciso II do art. 5º da CF/88, pelo qual ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

Além disso, o Tribunal de Contas somente poderá aplicar multa aos responsáveis em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, conforme preconiza o disposto no art. 71, VII, da CF/88. Ausente, portanto, os pressupostos materiais para a aplicação da multa, esta deve ter reformada a decisão para cancelá-la.

3 – PEDIDO

Diante do exposto, requer seja recebido e processado o presente recurso, para ser dado integral provimento, e, consequentemente, cancelar a multa aplicada. Requer sejam intimados os advogados do recorrente para a apresentação de sustentação oral no dia do julgamento deste recurso, sob pena de nulidade da decisão, por ofensa ao contraditório e a ampla defesa.”

A Consultoria Geral elaborou o Parecer Técnico de fls. 10-18, concluindo:

“1) Conhecer do Recurso de Reexame proposto nos termos do art. 80 da Lei Complementar n. 202/2000, contra o Acórdão n. 1035/2009, na sessão ordinária do dia 27/07/09, no processo ALC 06/00316114, e, no mérito, negar-lhe provimento mantendo-se na íntegra os termos da decisão recorrida;

2) Dar ciência deste acórdão, do relatório e do voto do Relator que o fundamentam, bem como deste parecer COG ao recorrente Sr. César Leobet e à Companhia Hidromineral de Piratuba”.

É o relatório.

A sugestão da Consultoria Técnica, pelo conhecimento do Recurso de Reexame, merece ser acolhida, tendo em vista preencher os requisitos de admissibilidade.

Quanto à tempestividade, a Decisão recorrida foi publicada no DOTC nº. 310 de 10-08-2009 (segunda-feira), e o recurso protocolizado em 03-09-2009 (quinta-feira), portanto, dentro do prazo máximo de 30 dias estabelecido pelo art. 80 da Lei Complementar nº 202/2000.

Não merece reparos a conclusão a que chegou a Douta Consultoria da Corte. O recorrente não logrou demonstrar a injustiça da decisão que combate.

O precedente do Supremo Tribunal Federal sobre o qual o recorrente construiu sua argumentação não foi adequadamente compreendido por ele.

O que foi considerado ilícito pelo STF é a exigência de remessa de editais de licitação antes de sua publicação. A Instrução Normativa nº TC-01/2002, contudo, exige a remessa de editais de concorrência pública, somente após a sua publicação.

Não merece amparo também a alegação de que a multa aplicada carece de previsão legal. O art. 70, VII da LC 202/2000 oferece amplo respaldo à sanção aplicada pela Corte.

O Ministério Público entende que a decisão contra a qual se insurge o recurso bem resguardou o interesse público, razão pela qual deve permanecer intacta.

                          Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se:

1) pelo conhecimento do Recurso de Reexame interposto pelo Sr. César Leobet, por atender os requisitos da Lei Complementar nº. 202/2000 (art. 80);

2) no mérito, pela negativa de provimento, para manter-se na integra a decisão recorrida;

3) pela ciência da decisão ao recorrente.

 Florianópolis, 04 de abril de 2011.

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas