ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: REC - 03/07477240
Origem: Prefeitura Municipal de Garopaba
Responsável: Ênio Andrade Branco
Assunto: Recurso (Recurso de Reconsideração - art. 77 da LC 202/2000) -TCE-02/03119908 + REC-03/07426688
Parecer n° COG-407/07

Recurso de Reconsideração. Tomada de Contas Especial. Representação. Imputação de débito. Conhecer e dar provimento.

Convênio entre o DETER e a Prefeitura Municipal de Garopaba. Obras. Construção de terminal rodoviário. Imóvel de propriedade de terceiros. Dano ao erário. Responsabilidade solidária. Inexistência.

O art. 113 do Regimento Interno desta Corte define como responsável aquele que tenha "dado causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário". A solidariedade, por sua vez, somente se configura quando há contribuição, ativa ou passiva, de mais de um agente para a ocorrência do prejuízo.

Senhor Consultor,

  1. RELATÓRIO

    Tratam os autos de Recurso, na modalidade de Reconsideração, interposto pelo Sr. Ênio Andrade Branco - ex-Diretor-Geral do Departamento de Transportes e Terminais - DETER, contra o Acórdão n. 1301/2003, proferido nos autos do Processo n. TCE-02/03119908.

    O citado Processo n. TCE-02/03119908 é relativo à conversão em tomada de contas especial do Processo nº REP-02/03119908 que, por sua vez, tratou de Auditoria Especial para averiguação de irregularidades na realização de despesas com a construção do terminal rodoviário de Garopaba, noticiada através do oferecimento de representação a esta Corte de Contas pelo Deputado Estadual Afrânio Boppré. A referida auditoria especial foi empreendida pela Diretoria de Denúncias e Representações - DDR, deste Tribunal.

    Levada a efeito a mencionada análise, a DDR procedeu à elaboração do Relatório nº 01/03 (fls. 472 a 481), no qual sugeriu a conversão dos autos de representação em tomada de contas especial e a conseqüente citação do ora Recorrente e do Sr. Quirino Juvêncio Lopes - ex-Prefeito de Garopaba, para apresentarem defesa em relação às irregularidades suscitadas. O Relator do feito, Conselheiro José Carlos Pacheco, acatou a sugestão da DDR (fls. 490 a 494).

    Devidamente citado, o Recorrente compareceu aos autos, representado por sua procuradora (fls. 509), apresentando suas razões (fls. 501 a 508) .

    Em seqüência os autos foram examinados pela DDR, que elaborou o Parecer nº 038/03 (fls. 591 a 603), sugerindo pelo julgamento irregular das despesas com imputação de débito ao Recorrente. O Representante do Ministério Público junto a esta Corte de Contas (fls. 605 a 607) e o Relator do feito (fls. 608 a 611) acompanharam, na íntegra, o entendimento exarado pelo Corpo Técnico.

    Na Sessão Ordinária de 28/07/2003, o Processo n. TCE-02/03119908 foi levado à apreciação do Tribunal Pleno, sendo prolatado o Acórdão n. 1301/2003 (fls. 612/613) , portador da seguinte dicção:

"(...) ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

6.1. Julgar irregulares, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, inc. III, alínea "c", da Lei Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, e condenar os Responsáveis Solidários – Srs. Quirino Juvêncio Lopes - Prefeito Municipal de Garopaba, CPF n. 001.873.309-30, e Ênio Andrade Branco - ex-Diretor-Geral do Departamento de Transportes e Terminais - DETER, CPF n. 179.138.029-87, ao pagamento da quantia de Cr$ 20.000.000,00 (vinte milhões de cruzeiros), referente a despesas cuja iniciativa resultou frustrada pela inviabilidade da construção do Terminal Rodoviário de Passageiros de Garopaba causada pela ausência de estudos e projeto físico-financeiro, de devida fiscalização e prestação de contas e de edificação em imóvel de terceiros, equivocadamente tido como de propriedade do Município, implicando no descumprimento aos Princípios da Legalidade, Moralidade e da Economicidade insculpidos nos arts. 37, caput, e 70 da Constituição Federal, bem como ao prescrito nos arts. 5º, VII, e 6º, caput, do Decreto-Lei n. 2.300/86, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovarem, perante este Tribunal, o recolhimento do valor do débito aos cofres do Tesouro do Estado, atualizado monetariamente e acrescido dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir de 11/08/1992, ou interporem recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, inc. II, da Lei Complementar n. 202/2000).

6.2. Determinar ao Departamento de Transportes e Terminais - DETER que implante e mantenha um sistema de controle interno, em moldes a manter sob devido arquivo e adequado atendimento às demandas do controle externo, atividade afeta a este Tribunal, documentos e procedimentos que atestem suficientemente todos os atos administrativos praticados na aprovação, destinação de recursos de convênios e procedimentos fiscalizatórios atinentes à construção de terminais rodoviários, consoante o disposto nos arts. 58 da Constituição Estadual e 60 e 61 da Lei Complementar n. 202/2000.

6.3. Determinar à Diretoria de Controle da Administração Estadual – DCE, deste Tribunal, que inclua na programação de Auditoria in loco no Departamento de Transportes e Terminais - DETER a averiguação dos procedimentos adotados decorrentes da determinação de que trata o item 6.2 deste Acórdão.

6.4. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Parecer DDR n. 038/2003, ao Representante no Processo n. REP 02/03119908, ao Departamento de Transportes e Terminais - DETER, e aos Srs. Ênio Andrade Branco - ex-Diretor-Geral daquela entidade, e Quirino Juvêncio Lopes - Prefeito Municipal de Garopaba."

Visando à modificação do Acórdão nº 1301/2003, o Sr. Ênio Andrade Branco interpôs o presente Recurso de Reconsideração.

É o breve relatório.

II. PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE

Considerando que o Processo n. TCE-02/03119908 consistiu em tomada de contas especial, culminando no julgamento irregular com imputação de débito ao ora Recorrente, tem-se que o Sr. Ênio Andrade Branco utilizou-se da espécie recursal adequada, em consonância com o art. 77 da Lei Complementar nº 202/2000.

Procedendo-se ao exame do recurso, verifica-se que o Recorrente possui plena legitimidade para a interposição do mesmo, tendo em vista a responsabilização a ele imposta no Acórdão nº 1301/2003.

Tendo-se em conta que o Acórdão recorrido teve sua publicação no Diário Oficial do Estado na data de 12 de setembro de 2003 e que a peça recursal em exame fora protocolizada neste Tribunal no dia 13 de outubro do mesmo ano, constata-se a observância da tempestividade necessária ao conhecimento da presente Reconsideração.

Destarte, restaram devidamente preenchidas as condições legais de admissibilidade do Recurso em análise.

III. DISCUSSÃO

O Recorrente alega, em sua defesa:

"(...)

Pelo princípio da veracidade presumida ou da presunção de legalidade, até prova em contrário entende-se que todos os atos da administração pública sejam verdadeiros e praticados com estrita observância dos comandos legais.

É comezinho que a conseqüência decorrente deste princípio - presunção - é que as decisões administrativas são de execução imediata e criam obrigações independentemente de qualquer condição.

Isto determinou o comportamento do DETER, o qual não estava e não está obrigado a suspeitar da conduta de um outro ente público. Ninguém pode presumir que qualquer documento exibido por ente público possa ser falso, ou de validade questionável.

Releva observar que o título de venda do bem onde deveria ser construído o TRP, datado de 27/01/1983, somente foi averbado no registro de imóveis em 08/01/1993, fls. 295. Ora, se o Município de Garopaba exibiu o título de propriedade, e este era legítimo, o Recorrente não tinha razão para duvidar da legitimidade do dito título.

Ademais, a certidão do registro de imóveis "Ricardo Wiethorn", da Comarca de Palhoça/SC, não constava qualquer alusão a venda para terceiros, nem a transferência do registro do imóvel para o cartório de registro de imóveis de Imbituba/SC, isto porque a transferência do registro aludido só ocorre de um cartório para o outro (no caso de desmembramento por criação de comarca, a teor do que preceitua a Lei 6.015/73), quando o registro da venda do imóvel é requerido ao cartório de imóveis competente, o que aconteceu somente em 1993, como comprova o documento das fls. 295.

(...)

A análise dos documentos que compõem o processo TCE 02/03119908 revela que o decurso do tempo entre a celebração do convênio 14/92 e o início da apuração da denúncia realizada pelo Dep. Afrânio Boppré, prejudicou o Recorrente, pois ficou impossibilitado de obter a integralidade do processo que desaguou na assinatura do convênio 14/92. Várias são as referências sobre as providências determinadas pela administração do DETER da época que antecederam e sucederam a celebração do convênio 14/92, veja-se:

- fls. 300: relatório de viagem assinado pelo arquiteto Silvio Hickel do Prado, no qual se verifica a realização de fiscalização da obra, constatando a construção e a fundição de 21 sapatas 70x70cm;

- fls. 301: há uma série de despachos sendo que, no último deles, a informação de que em anexo segue relatório de vistoria (no processo TCE não há a continuação do processo do DETER do qual foi extraída essa folha);

- fls. 308: nesta folha do processo TCE 02/03119908 constata-se despachos lançados em processo do DETER, no qual se constata que em 1991, nos meses de setembro e outubro, houve avaliação técnica do projeto de construção do TRP do Município de Garopaba/SC, precedendo a assinatura do convênio 14/92. Máxime o que determinou que a documentação relativa ao terreno, assim como a vistoria dele, fosse realizada pelo órgão competente daquela autarquia.

Os despachos em processo do DETER relativo ao convênio 14/92 descartam as acusações objeto dos relatórios DCO desse Tribunal, de que o Recorrente, se houve com falta de cuidado, para dizer o mínimo, na gestão do dinheiro público, visto que as ordens para que o corpo técnico avaliasse a possibilidade de celebração do convênio de cooperação técnica entre o DETER e o Município de Garopaba foram dadas em setembro e outubro de 1991, enquanto que a assinatura do convênio ocorreu em 07 de julho de 1992, e a liberação da primeira parcela em 05 de agosto de 1992, conforme revelam os despachos de fls. 308 do processo desse Tribunal.

(...)"

O Recorrente traça, ainda, outros pontos em sua defesa, entretanto os acima transcritos são suficientes para que se conclua que lhe assiste razão.

O DETER, mediante o Convênio nº 14/92, repassou a quantia de Cr$ 20.000.000,00, como primeira parcela do referido acordo, para que a Prefeitura de Garopaba iniciasse as obras de construção do Terminal Rodoviário do Município. Tal repasse ocorreu em 05 de agosto de 1992, respeitando o constante na cláusula quarta do convênio, a saber (fls. 312 dos autos principais):

"CLÁUSULA QUARTA - LIBERAÇÃO DOS RECURSOS

(...)

1ª PARCELA: Cr$ 20.000.000,00 (vinte milhões de cruzeiros) após a publicação do Extrato do Convênio no Diário Oficial do Estado;

2ª PARCELA: Cr$ 20.000.000,00 (vinte milhões de cruzeiros) após a prestação de contas da parcela anterior e o laudo de fiscalização, correndo a despesa à conta da item 4323.00 - Fonte 40 - Transferência a Municípios."

Denota-se que, nos termos da cláusula supra, o repasse da primeira parcela deveria ocorrer logo após a publicação do extrato do convênio do Diário Oficial do Estado e apenas a segunda parcela era condicionada à prestação de contas da primeira pela Prefeitura e laudo de fiscalização do DETER.

À época da formalização do referido instrumento (1991/1992), a documentação apresentada pela Prefeitura Municipal de Garopaba ao DETER comprovava a propriedade do imóvel aonde seria edificado o Terminal Rodoviário. Cumpre ressaltar, ainda, que o referido Convênio também foi assinado pelo Secretário de Estado dos Transportes e Obras e firmado com a concordância do Governador do Estado (docs. de fls. 211 e 216 dos autos principais).

A impossibilidade de continuação das obras objeto do Convênio se deu, basicamente, em virtude do imóvel pertencer a um terceiro particular que, por sua vez, comprou-o da própria Prefeitura em 1983. Tal fato não era e nem poderia ser de conhecimento do DETER, que recebera a comprovação de que o imóvel pertencia ao Município, e nada praticou de irregular, ao contrário, apenas deu cumprimento à obrigação de repassar a verba avençada.

Diante do acima exposto não se pode enquadrar o ora Recorrente como responsável, nos termos do art. 113, § 1º, "a", da Resolução nº TC-06/01, que define como responsável aquele que tenha "dado causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário".

Portanto, e salvo melhor juízo, não pode o ora Recorrente ser responsabilizado solidariamente pela impossibilidade de continuação das obras em análise, uma vez que não contribuiu nem ativa e nem passivamente para que a dita inviabilidade ocorresse.

Nesse sentido, o posicionamento desta Consultoria é pelo cancelamento do débito imputado ao Sr. Ênio Andrade Branco mantendo, entretanto, a responsabilidade individual do Sr. Quirino Juvêncio Lopes.

IV. CONCLUSÃO

Ante o exposto, sugere-se ao Exmo. Relator do processo que em seu Voto proponha ao Egrégio Plenário o que segue:

1. Conhecer do Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 77 da Lei Complementar n. 202/2000, interposto contra o Acórdão n. 1301/2003, exarado na Sessão Ordinária de 28/07/2003, nos autos do Processo n. TCE-02/03119908, e, no mérito, dar-lhe provimento, para cancelar a responsabilidade solidária imputada ao Sr. Ênio de Andrade Branco constante do item 6.1 da decisão recorrida.

2. Dar ciência ao DETER, ao Sr. Ênio de Andrade Branco - ex-Diretor-Geral daquela entidade e ao Sr. Quirino Juvêncio Lopes - ex-Prefeito Municipal de Garopaba.

COG, em 20 de junho de 2007.

ANNE CHRISTINE BRASIL COSTA

Auditora Fiscal de Controle Externo

De Acordo. Em ____/____/____

HAMILTON HOBUS HOEMKE

Coordenador de Recursos

DE ACORDO.

À consideração do Exmo. Sr. Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.

COG, em de de 2007.

  MARCELO BROGNOLI DA COSTA

Consultor Geral