ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: REC - 03/03045710
Origem: Câmara Municipal de Içara
responsável: Cleber Antenor Viana
Assunto: Recurso (Reexame - art. 80 da LC 202/2000) -TCE-01/02119856
Parecer n° COG-361/07

EMENTA. Recurso de Reexame. Cerceamento de defesa. Nulidade do processo a partir da prolatação do decisum.

[...] Processo administrativo sem oportunidade de defesa ou com defesa cerceada é nulo, conforme têm decidido reiteradamente nossos tribunais judiciais, confirmando a aplicabilidade do princípio constitucional do devido processo legal, ou mais especificamente, da garantia de defesa.

Senhor Consultor,

RELATÓRIO

1.1.1 - Ausência de vinculação previdenciária definida dos Servidores estatutários e dos Agentes Políticos, em desacordo com os arts. 40 e 195 da Constituição Federal;

1.1.2 - Descontos de valores em folha de pagamento de Servidores e Agentes Políticos, referente a partido político, no montante de R$ 2.143,80 (até 06/2001), em desacordo com a Lei Federal nº 9.504/97, artigo 23, § 4º.

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

6.1. Em preliminar, converter o presente processo em "Tomada de Contas Especial", nos termos do art. 34, §1°, do Regimento Interno.

6.2. Julgar irregulares, com imputação de débito, na forma do art. 18, III, "c", da Lei Complementar n. 202/2000, as despesas pertinentes às Notas de Empenho ns. 007, 103, 141, 157 e 177; todas do exercício de 2000, e condenar o Responsável – Sr. Cléber Antenor Viana - Presidente da Câmara Municipal de Içara em 2001, ao pagamento da quantia de R$ 1.311,50 (um mil trezentos e onze reais e cinqüenta centavos), relativa a despesas com serviços de táxi, refeições e refrigerantes sem caráter público, não abrangidas no conceito de próprias dos órgãos do Governo e da administração centralizada, disposto no art. 4º c/c art. 12 da Lei Federal n. 4.320/64 (item 2.1 do Relatório DMU), fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado para comprovar, perante este Tribunal, o recolhimento do valor do débito aos cofres do Município, atualizado monetariamente e acrescido dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir da data da ocorrência do fato gerador do débito, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II, do mesmo diploma legal).

6.3. Aplicar ao Sr. Cléber Antenor Viana - Presidente da Câmara Municipal de Içara em 2001, com fundamento nos arts. 70, inc. II, da Lei Complementar n. 202/00 e 109, inc. II, c/c o 307, inc. V, do Regimento Interno instituído pela Resolução n. TC-06/2001, as multas abaixo discriminadas, com base nos limites previstos no art. 239, inc. III, do Regimento Interno (Resolução n. TC-11/1991) vigente à época da ocorrência das irregularidades, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:

6.3.1. R$ 500,00 (quinhentos reais), em decorrência da não-vinculação previdenciária dos servidores estatutários e agentes políticos da Câmara Municipal de Içara, em desacordo com os arts. 40 e 195 da Constituição Federal (item 1.1 do Relatório DMU);

6.3.2. R$ 200,00 (duzentos reais), em face da efetivação de descontos de contribuições a partidos políticos, no montante de R$ 2.143,80, em folha de pagamento de servidores e agentes políticos, em desrespeito ao art. 23, §4º, da Lei Federal n. 9.504/97 (item 1.2 do Relatório DMU).

6.4. Dar ciência deste Acórdão, bem como do Relatório e Voto que o fundamentam, ao Sr. Cléber Antenor Viana - Presidente da Câmara Municipal de Içara em 2001.

II. PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE

O Recorrente, na condição de Presidente de Câmara à época dos fatos, sancionado por esta Corte de Contas no Acórdão nº 1005/2002, possui plena legitimidade para pugnar pela reforma do referido pronunciamento.

Considerando que o Processo nº TCE - 01/02119856 consiste em Tomada de Contas Especial, tem-se que o Sr. Cleber Antenor Viana se utilizou da espécie recursal adequada, em consonância com o art. 80 da Lei Complementar nº 202/00.

Tendo-se em conta que o acórdão recorrido foi publicado no Diário Oficial do Estado em 10/04/03 e que o recurso em exame fora protocolizado neste Tribunal em 08/05/03, constata-se que restou devidamente observado o trintídio legal.

Desta feita, evidencia-se o cumprimento das exigências que autorizam o conhecimento da presente peça recursal.

III. DISCUSSÃO

O Recorrente busca pelo meio adequado, Recurso de Reexame, rever decisão proferida pelo Plenário desta Corte de Contas que além de aplicar multas totalizando o valor de R$ 700,00, julgou irregular, com imputação de débito, fundamentado no artigo 18, inciso III, alínea "c", c/c artigo 21, caput da Lei Complementar 202/2000, referentes a atos de gestão da Câmara Municipal de Videira, para condenar o mesmo, Presidente do Poder Legislativo Municipal, à época, a pagar a quantia de R$1.311,50, relativa a realização de despesas com serviços de táxi, refeições e refrigerantes sem caráter público, não abrangidas no conceito de próprias dos órgãos do Governo e da Administração Centralizada.

Em sua abordagem, o Recorrente em síntese manifesta o seu inconformismo alegando o que segue:

"Cleber Antenor Viana, Presidente da Câmara de Vereadores de Içara à época dos fatos, face ao Acórdão nº 1005/2002, na forma da Legislação em vigor, sem subtrair as informações da defesa já enviadas a este tribunal, em 17/01/2002, apresenta reforço das justificativas, esclarecimentos e documentos comprobatórios, conforme o caso, na forma de recurso ao Acórdão nº 1005/2002, para o saneamento das restrições evidenciadas, como segue:" (grifo nosso)

[...]."

Preliminarmente, o processo que deu origem à condenação, originou-se de realização de uma auditoria in loco na Câmara Municipal de Içara (AOR - 01/02119856), com abrangência ao exercício de 2001, onde ficou evidenciado a realização de despesas com serviços de táxi, refeições e refrigerantes sem caráter público, não abrangidas no conceito de próprias dos órgãos do Governo e da Administração Centralizada.

Assim sendo, no Ofício 14.572 de 20/12/2001 (fl. 79 dos autos de origem), houve a citação do Recorrente para que apresentasse suas alegações de defesa.

Contudo, analisando os autos principais, constata-se que não houve, em nenhum momento do processo cognitivo, a juntada dos documentos de defesa do Recorrente devidamente protocolados neste Tribunal de Contas, no dia 24/01/2002, conforme comprovado na página 26 dos documentos apresentados em grau de recurso (fls. 05 à 35 dos autos).

Desta feita, como em 26/07/2002, ou seja, após a data do protocolo dos referidos documentos de defesa, o Relatório DMU - 678/2002 (fl. 82 dos autos de origem) considerou o Sr. Cleber Antenor Viana revel, ou seja, não sendo respeitado o devido processo legal, em razão da inobservância do princípio do contraditório e da ampla defesa, que se fizeram ausentes em todo o transcurso do processo original, acarretando posteriormente na sua penalização.

Destarte, considerando o vício apontado neste parecer, sugere-se a declaração da nulidade da decisão proferida às fls. 96 e 97 dos Autos n° TCE - 01/02119856, e o retorno dos autos à Diretoria de Controle dos Municípios - DMU, para que seja efetuada a juntada dos documentos de defesa (fls. 26 à 35 dos autos) do Sr. Cleber Antenor Viana no processo original (TCE - 01/02119856).

Da ampla defesa e do contraditório.

Dentro das teorias das nulidades processuais verifica-se que a presente situação refere-se a uma nulidade absoluta, haja vista que o ato praticado ofendeu previsão constitucional, e por conseguinte, o devido processo legal. No dizer de MEIRELLES:

Nulidade, no magistério de Tourinho Filho, "é a sanção decretada pelo órgão Jurisdicional, em relação a ato praticado com a inobservância das prescrições legais. É a decretação da ineficácia do ato atípico, imperfeito, defeituoso (Processo Penal, Ed. saraiva, SP, 1990, vol. II, pág. 117). O conceito refere-se à decretação da nulidade pelo órgão Judiciário, porque o autor está voltado ao foco do processo penal. No processo disciplinar, a nulidade pode ser declarada, por provocação ou de ofício, pela autoridade administrativa. A inobservância de formalidade legal é o pressuposto. Logo, não se pode falar em nulidade de processo quando não existir violação a uma prescrição legal.

As nulidades absolutas, bem lembra Sebastião José Lessa, são aquelas consideradas insanáveis e que atingem os atos estruturais próprio processo (Do processo administrativo disciplinar e da sindicância, Ed. Brasília Jurídica, BsB, 1996, pág. 102). A ausência de atos estruturais gera nulidade absoluta e podem – e devem - ser atacados de ofício, em nome da obediência ao princípio da legalidade ao qual a Administração Pública está vinculada (art. 37, caput, da Constituição Federal).

Assim, visando inibir futuro litígio judicial, posicionamo-nos pela nulidade do processo em questão.

IV. CONCLUSÃO

Em conformidade com o acima exposto sugere-se ao Exmo. Relator que em seu voto propugne ao Plenário por:

1. Conhecer do Recurso de Reexame interposto nos termos do art. 80 da Lei Complementar n. 202/2000 contra o Acórdão n. 1005/2002, de 02/12/2002, exarado no Processo n. TCE - 01/02119856, e, no mérito, dar-lhe provimento para:

1.1. anular todos os atos processuais a partir da Decisão nº 1005/2002, de fls. 96 e 97 dos autos nº TCE - 01/02119856, por não atenderem aos princípios da ampla defesa e do contraditório previstos no artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal.

1.2. Determinar à Secretaria Geral - SEG, que efetue o desentranhamento dos documentos de defesa (fls. 26 à 35 dos autos) e proceda sua juntada ao processo original (TCE - 01/02119856).

2. Dar ciência deste Acórdão, bem como do Parecer e Voto que a Fundamentam, ao Sr. Cleber Antenor Viana, bem como, à Câmara Municipal de Içara.

  MARCELO BROGNOLI DA COSTA

Consultor Geral