![]() |
|
Processo n°: | REC - 04/00885530 |
Origem: | Câmara Municipal de Sombrio |
Interessado: | Jair de Souza Cândido |
Assunto: | Recurso (Recurso de Reconsideração - art. 77 da LC 202/2000) -DEN-00/03646068 + TCE-02/09545739 |
Parecer n° | COG-287/08 |
Prova da irregularidade. Elementos mínimos.
A ausência de elementos mínimos para a configuração da irregularidade conduz ao seu cancelamento.
Juros e multa. Despesa irregular.
A despesa com juros e multa pelo atraso no pagamento de obrigações obriga o seu causador a ressarcir o erário.
Despesa pública. Prova.
Provada a natureza pública da despesa, ainda que em grau de recurso, o débito deve ser cancelado.
Matéria recorrida. Julgamento. Limitação.
O julgamento em grau de recurso deve se restringir a matéria recorrida, em obediência ao princípio tantum devolutum quantum appellatum.
Senhor Consultor,
Tratam os autos de Reconsideração interposta por Jair de Souza Cândido contra o Acórdão 1926/2003, de 29/9/03, proferido nos autos TCE 02/09545739, que lhe imputou débito e multa.
Os autos TCE 02/09545739 tiveram tramitação regular, iniciando-se com o processo de Denúncia 00/03646068 para apurar supostas irregularidades praticadas nos exercícios de 2000 e 2001 na Câmara Municipal de Sombrio. No ato de conversão do processo de Denúncia para Tomada de Contas Especial, oportunizou-se aos processados a apresentação de defesa contra as irregularidades constantes do Voto do Exmo. Relator Conselheiro José Carlos Pacheco (fls. 70/74 - DEN).
As defesas foram apresentadas às fls. 10 a 98. As alegações de defesa foram analisadas pela Diretoria de Denúncias e Representações - DDR, por meio do Auditor Fiscal de Controle Externo, Sr. Sidnei Silva, que conclui pela manutenção das irregularidades, no que foi acompanhado pelo Procurador-Geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, Dr. César Filomeno Fontes (fls. 123/125).
O Relator Conselheiro José Carlos Pacheco exarou Voto (fls. 126/134), sendo acatado pelo Plenário, conforme Acórdão 1926/2003, nos seguintes termos:
Os débitos e multas dos Srs. Ademir da Silva, Pedro Tarciano Cardoso, Alessandro Colares Coelho e Jucimar Custódio foram pagas conforme documentos de fls. 186/291.
Inconformado com a decisão, interpôs Reconsideração o Sr. Jair de Souza Cândido.
É o relatório.
Considerando que se trata de processo de Tomada de Contas Especial, vê-se que o recorrente utilizou da espécie adequada, em consonância com o art. 77 da Lei Complementar n. 202/2000.
O recorrente se insurge contra as irregularidades que lhe são imputadas e que lhe ensejaram aplicação de débito e multa, que serão analisadas em seguida.
Alega o recorrente que o Decreto Legislativo 196/96 dispõe sobre a forma de remuneração dos Vereadores, fixando-a em 5% (cinco por cento) da receita orçamentária, e que este Decreto Legislativo não foi alterado na vigência da EC nº 19/98 que transformou a remuneração em subsídio a ser pago em parcela única. Afirma que o DL 196/96 não foi objeto de declaração de inconstitucionalidade. Indaga o recorrente a forma correta de alteração dos subsídios vereadores. Afirma, outrossim, que a Câmara de Vereadores é soberana. E por fim, sugere algumas decisões que poderiam ter sido tomadas por esta Corte de Contas.
O Poder Legislativo está sujeito a diversos limites constitucionais e legais para a despesa pública. É importante ressaltar que a obrigatoriedade de se fixar a remuneração dos Vereadores de uma legislatura para outra, remonta a Constituição da República na sua redação original de 19881. Sob a égide da Emenda Constitucional nº 25 permanece a mesma restrição acrescida de escalonamento em relação ao subsídio dos Deputados Estaduais, servindo tal parâmetro como limite, e não como indexador (art. 29, VI, CR).
Há um limite geral para a remuneração total dos Vereadores, que é de 5% da receita do Município (art. 29, VII, CR). Aqui, novamente, trata-se de limite e não indexador.
Há ainda outro limite para a despesa total do Poder Legislativo com base na receita tributária e de transferências, escalonando entre 5% a 8% (art. 29-A, CR). E ainda, a Câmara Municipal não poderá gastar mais de 70% de sua receita com folha de pagamento (art. 29-A, § 1º, CR).
Por fim, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/00) impõe limites gerais de pessoal para o Município (60% da receita corrente líquida - art. 19, III), bem como, por Poder (6% da RCL para o Legislativo - art. 20, III, a).
As regras de controle de gastos no Poder Legislativo são várias, principalmente as de pessoal. No entanto, a verificação da restrição deve ter como prova alguns elementos necessários, tais como, valor-parâmetro, valor pago a maior, diferença entre ambos, somatório de todos os meses irregulares, pessoas beneficiadas, indicação da responsabilidade de cada ordenador de despesa e o montante correspondente ao seu período. Tudo isso embasado em prova, preferencialmente documental, juntada aos autos.
A equipe técnica de instrução afirma que o valor correto do subsídio seria de R$ 1.346,68 (fl. 111 - TCE), no entanto, não indica a fonte desta informação, impossibilitando o cotejamento entre a informação e o documento. Igualmente não apresenta memória de cálculo para o débito de R$ 17.949,15. Vale ressaltar que o documento de fls. 52 e 53 dos autos da Denúncia não se presta a tal prova, a uma porque referido valor não consta desse documento, a duas porque ele foi unilateralmente produzido pela equipe técnica, e a três porque ele é contraditório com o afirmado pela própria equipe técnica.
Eis que foi por ela afirmado que o valor mensal correto para o subsídio seria de R$ 1.346,68, sendo justamente esse valor constante do documento de fl. 52 - DEN a partir do mês de agosto. Os valores supostamente irregulares teriam sido pagos somente entre abril e julho de 2000. No entanto, a equipe técnica informa que o período de pagamentos irregulares iniciou-se em abril de 2000 estendendo-se até fevereiro de 2001 (fls. 52/53 - DEN).
Outro fato que se mostra relevante, informado no documento produzido pela equipe técnica, é que no mês de setembro de 2000, responderam como Presidentes da Câmara de Vereadores os Srs. Ademir da Silva e Jucimar Custódio, e nos meses de outubro a dezembro deste mesmo ano, o Sr. Ademir da Silva. Em janeiro de 2001 o Presidente da Câmara de Vereadores foi o Sr. Pedro Taciano Cardoso Oliveira e em fevereiro, o Sr. Alessandro Colares Coelho. Apesar da equipe técnica saber que os ordenadores de despesa foram diversas pessoas, ainda assim lançaram a responsabilidade em apenas um, o Sr. Jair de Souza Cândido. Aliás, esse argumento consta da defesa por ele apresentada às fls. 23 e 24 - TCE, amparado pelos documentos de fls. 42 a 46 - TCE e que sequer foi mencionada no Parecer 54/03 de fls. 109 a 121.
Diante da fragilidade da prova produzida pela equipe técnica e da ausência de responsabilidade nos meses de setembro de 2000 a fevereiro de 2001, não há como imputar débito ao recorrente tampouco aplicar-lhe multa pelo pagamento de subsídios aos vereadores em valores superiores aos permitidos em lei ou alterados na mesma legislatura.
Por outro lado, insistindo a Relatoria na melhor instrução do feito, o processo deve ser anulado a partir das fls. 109 - TCE, para que a equipe técnica considere todos os argumentos de defesa, dando prosseguimento regular a Tomada de Contas Especial.
A obrigação de recolhimento decorre do art. 195, I, "a", e II, da Constituição da República, regulamentado pelo art. 30, I, "a" e "b", da Lei 8212/91, verbis:
O inciso I abrange a Câmara Municipal de Vereadores por força do art. 15, I, desta mesma Lei:
Art. 15. Considera-se:
I - empresa - a firma individual ou sociedade que assume o risco de atividade econômica urbana ou rural, com fins lucrativos ou não, bem como os órgãos e entidades da administração pública direta, indireta e fundacional; (grifo nosso)
O atraso no recolhimento gera a aplicação de juros e multa.
Alega o recorrente que o atraso no pagamento dos encargos previdenciários decorreu do atraso e do fracionamento no repasse de duodécimos pelo Poder Executivo. Informa, outrossim, que foi interposta ação judicial em junho de 2000 para garantir o repasse das diferenças.
Razão não assiste ao recorrente.
É obrigação de todo administrador, público ou privado, recolher os encargos previdenciários das pessoas que trabalham para a entidade que administram, sob pena, em caso de atraso, de incidir multa e juros sobre o valor devido. Tratando-se de entidade pública, no caso, Câmara Municipal de Vereadores, o recurso utilizado para o pagamento desses juros e multa não é do seu Presidente (ordenador de despesa), é recurso público. Desta forma, no primeiro momento, a Câmara de Vereadores paga o valor com os acréscimos legais para, em seguida, ser ressarcida pela pessoa física que deu causa a este prejuízo.
O encargo do Presidente da Câmara, na qualidade de administrador público, é gerir corretamente os recursos sob sua responsabilidade. Portanto, a alegação de que o atraso no pagamento de encargos previdenciários ocorreu pelo atraso ou fracionamento no repasse de duodécimos não pode prosperar, pois é risco inerente a atividade de administrador, devendo ser previdente o suficiente para que tal fato não ocorra. Em ocorrendo, assume a responsabilidade pelo ressarcimento. Ademais, não se tem notícia nos autos de que outras despesas também atrasaram, somente os encargos previdenciários.
O pagamento de juros e multa em decorrência do atraso no recolhimento de encargos previdenciários é despesa desprovida de caráter público, e por esta razão, sugere-se a manutenção do débito.
Alega o recorrente que o veículo foi utilizado a pedido da Comissária de Menores, Sr. Alzira Maria Scheffer, conforme comprova o documento de fl. 98 - TCE, para o transporte no dia 23 de fevereiro de criança com 3 anos de idade e de sua mãe, para a cidade de Quintão-RS, um serviço do setor social do Fórum.
Tais alegações são as mesmas apresentadas na defesa na fase instrutiva do processo, e foram acatadas pela equipe técnica, que ao final mudou o fato irregular:
Em relação a este tópico, o responsável apresenta justificativa, com correspondente documentação comprobatória apensada, indicando que no dia da ocorrência denunciada, na realidade o veículo da Câmara estava a serviço do Setor Social do Fórum da Comarca de Sombrio e não era utilizado pelo Presidente do Legislativo Municipal, tendo efetivamente existido a viagem denunciada, mas com objetivos distintos daqueles aludidos, sendo os mesmos, inclusive, relacionados ao atendimento do requisito do interesse público.
Além disso, a documentação apresentada é suficiente para comprovar o roteiro de viagem.
Ainda que sanada a dúvida sobre a ausência de roteiro de viagem e estar esclarecida a não utilização do veículo da Câmara por seu presidente, entende-se presentemente por manter-se a consideração de irregularidade pelos gastos realizados pelo Legislativo com a viagem realizada, haja vista não haver ficado suficientemente claro qual o interesse público e o amparo legal para a viagem efetivamente ocorrida. (fl. 117 - TCE) (grifo nosso)
Apesar da equipe técnica reconhecer que há roteiro de viagem e que o veículo não foi utilizado para fins particulares, manteve a mesma restrição por outras razões, quais sejam, "não haver ficado suficientemente claro qual o interesse público e o amparo legal para a viagem". No entanto, nessa nova configuração do fato, além de não estar embasada em qualquer norma jurídica, não foi dada oportunidade de defesa, o que macula de nulidade a restrição apontada.
Quanto a essas multas, não houve recurso por parte do recorrente, razão pela qual, em aplicação do princípio tantum devolutum quantum appellatum, mantêm-se as restrições.
Ante ao exposto, sugere-se ao Relator que em seu voto propugne ao Egrégio Plenário:
1) Conhecer do Recurso de Reconsideração proposto nos termos do art. 77 da Lei Complementar n. 202/2000, contra o acórdão n. 1926/2003, na sessão ordinária do dia 29/9/03, no processo TCE-02/09545739, e, no mérito, dar provimento parcial para cancelar os débitos dos itens 6.1.1.1. e 6.1.1.3., bem como, a multa do item 6.3., mantendo os demais itens da decisão recorrida.
2) Dar ciência deste acórdão, do relatório e do voto do Relator que o fundamentam, bem como deste parecer COG ao recorrente, ao denunciante, à Câmara e à Prefeitura Municipal de Sombrio.
6.1.1.2. R$ 423,05 (quatrocentos e vinte e três reais e cinco centavos), referente a despesas com pagamento de juros de mora pelo atraso no pagamento do INSS dos servidores do Legislativo Municipal e Vereadores, relativo aos meses de competência junho e julho de 2000, sem a devida previsão legal, contrariando o princípio da legalidade insculpido no art. 37, caput, da Constituição Federal e evidenciando realização de dispêndios sem caráter público, não abrangidos no conceito de gastos próprios da Administração centralizada previsto no art. 4º c/c 12 da Lei Federal n. 4.320/64 (item I.2.1 do Parecer DDR);
Art. 30. A arrecadação e o recolhimento das contribuições ou de outras importâncias devidas à Seguridade Social obedecem às seguintes normas:
I - a empresa é obrigada a:
a) arrecadar as contribuições dos segurados empregados e trabalhadores avulsos a seu serviço, descontando-as da respectiva remuneração;
b) recolher o produto arrecadado na forma da alínea a deste inciso, a contribuição a que se refere o inciso IV do caput do art. 22 desta Lei, assim como as contribuições a seu cargo incidentes sobre as remunerações pagas, devidas ou creditadas, a qualquer título, aos segurados empregados, trabalhadores avulsos e contribuintes individuais a seu serviço até o dia 10 (dez) do mês seguinte ao da competência; (grifo nosso)
6.1.1.3. R$ 180,00 (cento e oitenta reais), referente a despesas com combustíveis e lubrificantes em viagem com veículo de propriedade da Câmara, com indicações de uso particular e sem identificação do devido roteiro, evidenciando realização de dispêndios sem caráter público, não abrangidos no conceito de gastos próprios da Administração centralizada previsto no art. 4º c/c 12 da Lei Federal n. 4.320/64 (item I.3.2 do Parecer DDR);
6.2.2. Ao Sr. Jair de Souza Cândido - ex-Presidente da Câmara Municipal de Sombrio, as seguintes multas:
6.2.2.1. R$ 100,00 (cem reais), em face do não-recolhimento ao INSS, dentro do prazo legal, de valores de contribuição social, em infringência ao art. 30, I e II, da Lei Federal n. 8.212/91 (item I.2.1 do Parecer DDR);
6.2.2.2. R$ 100,00 (cem reais), em face da realização de despesas relacionadas ao veículo de propriedade da Câmara, sem observância das normas estatuídas por este Tribunal de Contas, em especial contrariando o inciso II do art. 60 da Resolução n. TC-16/94 (itens I.3.1 e I.3.4 do Parecer DDR).
IV. CONCLUSÃO
COG, em 13 de maio de 2008.
HAMILTON HOBUS HOEMKE
Coordenador de Recursos
DE ACORDO.
À consideração do Exmo. Sr. Relator CLEBER MUNIZ GAVI, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
COG, em de de 2008
MARCELO BROGNOLI DA COSTA Consultor Geral |