ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

GABINETE DO AUDITOR GERSON DOS SANTOS SICCA

Processo n°: CON-07/00337652
UNIDADE GESTORA: CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ
Interessado: Édio Osvaldo Vieira
Assunto: Revisão geral anual do subsídio dos vereadores. Competência para a fixação do subsídio. Aplicação da revisão por Decreto.

1. RELATÓRIO

O Sr. Presidente da Câmara Municipal de São José formulou Consulta a esta Corte de Contas na qual apresenta as indagações abaixo citadas:

A Consultoria Geral sugeriu o conhecimento da Consulta, para que seja respondida nos seguintes termos:

O Ministério Público, em parecer, acompanhou o posicionamento da Consultoria Geral.

Apresentado o processo ao Plenário, o ilustre Conselheiro César Filomeno Fontes pediu vista, tendo apresentado voto divergente.

É o breve relato.

2. PROPOSTA DE VOTO

Passo a analisar os itens da Consulta. Ressalto que relevo a ausência de parecer jurídico por considerar pertinente que o Tribunal aprecie com profundidade a questão contida no item 2.

A indagação já foi respondida em oportunidades anteriores pelo Tribunal de Contas, tendo sido objeto de vários Prejulgados(1163, 1775, 1691, 1686, 1565, 1544, 1531, 1462, 1428, 1334, 1264, 1263, 1203 e 1153), razão pela qual bastaria ao consulente ter feito uma simples busca no sistema de consultas no sítio oficial do Tribunal de Contas de Santa Catarina na internet para obter a resposta segura.

Dessa maneira, entendo que a remessa de cópia de Prejulgados do Tribunal relacionados à matéria são suficientes para responder ao questionamento.

O consulente apresenta como situação problemática hipotética lei de revisão geral de vencimentos dos servidores públicos que não tenha contemplado os vereadores. Diante disso, questiona sobre a possibilidade de estender-se o benefício mediante decreto.

De antemão, registro que a hipótese não deixa de ser curiosa, já que eventual lei de revisão geral anual dos servidores, obviamente, teria sido votada pela Câmara de Vereadores. Logo, ao constatar a incompatibilidade do projeto de revisão com a Constituição, diante da ausência de generalidade na concessão do direito a alternativa correta a ser adotada pelo Legislativo seria a simples rejeição, o que compeliria o Prefeito a encaminhar novo projeto de acordo com o art. 37, inciso X, da Carta Constitucional.

Contudo, não cabe a esta Corte de Contas avaliar a ação política dos vereadores e as razões que os levem a aprovar um projeto de revisão geral anual que exclua determinados beneficiários. Ao Tribunal compete apenas apreciar a situação hipotética à luz das leis e da Constituição de modo a verificar a solução jurídica correta.

Uma lei de revisão geral anual que exclua de sua incidência determinadas categorias que deveriam ter idêntico tratamento incorre no vício da omissão parcial, umas das situações reconhecidas como atentatórias ao princípio da isonomia. Caracteriza-se o vício, dessa forma, por uma insuficiência no texto da Lei, que não inclui como destinatários do direito todos aqueles que deveriam receber solução similar.

O tema é muito debatido sob o enfoque dos limites do controle jurisdicional de constitucionalidade, havendo uma posição dominante que rejeita a extensão, pelo magistrado, dos benefícios previstos em Lei para aqueles que foram deliberadamente excluídos pelo legislador, limitação que decorreria de uma determinada interpretação do princípio da separação dos poderes.

Na hipótese aventada pelo consulente o princípio da separação dos poderes serve como paradigma relevante sob outra ótica, já que o Poder Legislativo é órgão criador de leis e, em tese, dotado de posição privilegiada para a correção de omissões parciais, o que faria com a aprovação de leis que sepultassem a inconstitucionalidade. O Poder Judiciário, por não ter à primeira vista preponderante função criadora na esfera do Direito, encontra maiores dificuldades para afastar a violação à Constituição operada pelo legislador com a exclusão indevida de potenciais beneficiários.

Qual seria, então, a dificuldade posta pelo princípio da separação dos poderes ao Poder Legislativo para que este suprisse as omissões parciais, em especial na situação objeto de apreciação?

Para o legislador, a barreira visível e que encontra fundamento na separação dos poderes é o poder de iniciativa para a propositura de projetos de lei. Como já assentado pelo Supremo Tribunal Federal que a iniciativa para a revisão geral anual é do chefe do Poder Executivo, questiona-se a viabilidade do legislador "corrigir" as falhas da lei de revisão por meio de ato de sua competência, desconsiderando a iniciativa privativa do Executivo.

De pronto é de se afastar a alternativa apresentada pelo consulente, a saber, a extensão mediante Decreto, e isso porque a revisão geral anual somente pode ser efetivada por lei, nos exatos termos do art. 37, inciso X, da Constituição Federal. Por via de conseqüência, qualquer extensão, caso admitida, não pode ocorrer pela via suscitada pelo consulente.

Resta saber se o Legislativo pode estender aos vereadores a revisão geral anual concedida aos servidores públicos, questionamento para o qual a Consultoria Geral oferece resposta positiva, apoiada no Prejulgado nº 1163.

A Consultoria Geral, ao admitir a extensão por lei de iniciativa do Legislativo está minimizando a regra de iniciativa privativa para a revisão geral e priorizando a possibilidade de correção da omissão parcial. Em suma, considera que a inconstitucionalidade pode ser superada pela ação do legislador, conquanto não tenha poder de iniciativa para tanto.

O problema está em saber se o legislador pode desconsiderar as regras de iniciativa legislativa para superar omissões parciais, questão cuja resposta não deve valer apenas para a situação apresentada na Consulta, mas também para qualquer hipótese em que haja legislação cujo conteúdo excluiu de forma injustificada potenciais beneficiários.

Não parece que a liberdade de conformação do legislador chegue ao ponto de suplantar os limites impostos ao poder de iniciativa legislativa pela Constituição, sendo certo, inclusive, que as regras para desencadear o processo legislativo representam uma concreta projeção do principio da separação dos poderes.

Assim, não teria o legislador poder para avaliar o conteúdo da legislação e, convencido da inconstitucionalidade cristalizada em uma omissão parcial, decidir por corrigir a situação por meio de instrumento legislativo sem que tenha poder de iniciativa para tanto. Isso representaria uma ingerência indevida na prerrogativa conferida a outro agente e remeteria o debate sobre a legitimidade da ação normativa para um juízo material formulado em terreno movediço.

O Supremo Tribunal Federal, ao examinar leis dotadas de vantagens incluídas por parlamentar em matéria cuja iniciativa fosse privativa do proponente do projeto tem apontado o vício de inconstitucionalidade, como se observa em trecho do voto do Ministro Eros Grau(Relator) proferido em Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 266.294-7:

Em idêntico sentido é o julgamento referente à Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1124-3/RN, do qual extraio o seguinte trecho do voto prolatado pelo ilustre Ministro Eros Grau:

Por fim, digna de nota é a decisão do Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.079-0/SC, na qual foi declarada a inconstitucionalidade de disposição legal originária de emenda parlamentar que criou nova gratificação a ser paga aos integrantes do Grupo de Fiscalização e Arrecadação da Secretaria de Estado da Fazenda de Santa Catarina. A ementa do julgado foi redigida da seguinte maneira:

Afora os argumentos contidos nas decisões, não haveria como se efetuar uma ponderação de normas constitucionais tendo como pressuposto certa hierarquia entre elas. Como já assentado pelo Colendo Supremo Tribunal Federal, o principio da unidade da Constituição impede a delimitação de uma hierarquia entre normas constitucionais. Por via de conseqüência, não se poderia afastar totalmente a regra do vício de iniciativa em nome de uma suposta prevalência material do princípio da isonomia.

Ocorre, no entanto, que a vantagem que se pretende estender(revisão geral anual) tem como fundamento primário a própria Constituição Federal, hipótese sobre a qual já refletiu a mais alta Corte do Judiciário brasileiro.

Conquanto o Supremo Tribunal Federal não admita a extensão de vantagens pelo Legislativo por meio de emenda a projeto de lei cuja iniciativa é privativa, há precedente na Corte que a entende legítima quando o benefício decorra diretamente da Constituição. Refiro-me à decisão que deferiu medida cautelar requerida nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.835-SC, cuja ementa dispôs que:

    Embora a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.835/SC ainda não tenha sido julgada em seu mérito, estando os autos conclusos ao Relator desde 30 de setembro de 2003, é certo que na apreciação da medida cautelar o Tribunal Pleno apontou para um entendimento que abranda a intensidade com que a Corte vinha atacando a questão do vício de iniciativa, passando a admitir a manutenção no ordenamento jurídico de norma originária de emenda parlamentar que concretize vantagem, ainda que haja aumento de despesa, contanto que se trate de benefício que de qualquer modo adviria da aplicação direta de norma da Constituição.

    No voto proferido pelo Ministro Sepúlveda Pertence, Relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade objeto de análise lê-se o que segue:

      "(...)o dispositivo impugnado, oriundo de proposta de emenda aditiva parlamentar a projeto de iniciativa do Poder Judiciário, alcança duas categorias diversas para estender-lhes o reajuste de 10,30% proposta para os integrantes dos quadros dos serviços auxiliares da Justiça: os inativos, aposentados em cargos desses mesmos quadros, e os servidores do foro extrajudiciais.
      Quanto ao primeiro grupo-o dos inativos do Poder Judiciário-estou em que a argüição, quando não se repute despida de densidade dogmática-o que me parece o caso-, de qualquer modo, não autorizaria a medida cautelar, uma vez que, no ponto, a emenda aprovada é financeiramente inócua.
      É que, com ela ou sem ela, cuida-se de simples reajuste monetário ou de aumento real de vencimentos do pessoal da ativa, a sua extensão aos inativos decorre diretamente ao art. 40, §4º, da Constituição, a teor do qual ´os proventos da aposentadoria serão revistos, na mesma proporção e na mesma data, sempre que se modificar a remuneração dos servidores em atividade...".
      Mais de uma vez o Tribunal se orientou no sentido da inoponibilidade das regras de iniciativa legislativa reservada e outras limitações ao Legislativo à validade de preceitos legais que se limitam à reprodução literal ou substancial de normas constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade imediata à hipótese cogitada.
      Na ADIn 680/GO - de 28.3.93, atinente à contagem do tempo de trabalho privado para a aposentadoria do servidor, e assegurada pelo art. 202, § 2º, CF - repeliu-se a inconstitucionalidade da parte do dispositivo da Constituição estadual que a reproduzia - pois, como assinalado no voto condutor do em. Ministro Marco Aurélio -, "no que inserido na Carta do Estado o que se contém na Federal, descabe cogitar do vício de forma".
      De sua vez, na ADIn 352-sc, de 30.10.97, de que fui relator, ficou assentada a improcedência da inovação do art. 195, § 5º, CF - em termos, assimilável à fundada no vício de iniciativa - porque "ao assegurar a correspondência da pensão à totalidade do salário de contribuição, de sua vez, equivalente aos vencimentos do servidor falecido, a lei catarinense, ao final das contas, nada mais fez que explicitar norma da Constituição Federal que - já reproduzida, aliás, na Constituição do Estado - de qualquer modo, seria de absorção compulsória na ordem jurídica local".
      Sigo convencido da correção do raciocínio: a final de contas, não haveria por que invalidar, por vício de iniciativa, a emenda parlamentar que viesse unicamente a explicitar a incidência, no campo normativo da disciplina legal proposta, de norma constitucional que, de qualquer modo, nele incidiria.
      Dado que, na hipótese, o vício de iniciativa só ocorreria em função do aumento de despesa, é patente que elide a circunstância de que o dispêndio, com ou sem a regra de explicação questionada, de qualquer modo seria devido.
      Por outro lado, a inexistência do acréscimo de gastos faz cair no vazio o segundo pressuposto - o periculum in mora - da cautelar requerida.
      Menos tranqüila é a situação dos servidores do foro extrajudicial, igualmente alcançados pelo preceito discutido.
      Aí, não se cuidando da revisão geral tratada na redação primitiva do art. 37, X, da Constituição, à primeira vista, em relação a eles, a extensão nao redundaria compulsória e diretamente da Constituição Federal."

    Os argumentos apresentados pelo relator, entretanto, devem ser vistos com cautela, e isso por duas razões. A primeira é que se trata de análise de pedido de medida cautelar, sendo que a Corte, cuja composição foi profundamente alterada desde a data da decisão, ao apreciar o mérito pode vir a ter outra compreensão sobre o assunto. E a segunda é que a própria eficácia plena do art. 37, inciso X, da Constituição Federal, apresentado como exemplo pelo relator é refutada pela jurisprudência daquele Tribunal, como se pode verificar no julgamento dos Embargos de Declaração no Agravo de Instrumento nº 590.328-3, do qual menciono trecho do voto do relator:

      "(...);
      Conheço,preliminarmente, dos presentes embargos de declaração como recurso de agravo (RTJ 145/664 - RTJ 153/834 - AI 243.159-ED/DF, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA - AI 243.832-ED/MG, Rel. Min. MOREIRA ALVES – Rcl 4.395-ED/SP, Rel. Min. CEZAR PELUSO, v.g.).
      E, ao fazê-lo, reconheço que não assiste razão à parte recorrente, eis que a decisão questionada ajusta-se, com integral fidelidade, à diretriz jurisprudencial que o Supremo Tribunal Federal firmou na matéria ora em exame.
      Com efeito, a controvérsia jurídica objeto deste processo já foi dirimida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, que, ao julgar a ADI 2.061/DF, Rel. Min. ILMAR GALVÃO (RTJ 179/587), fixou entendimento consubstanciado em acórdão assim ementado:
      "AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO.ART. 37, X, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL (REDAÇÃO DA EC Nº 19, DE 4 DE JUNHO DE 1998).
      Norma constitucional que impõe ao Presidente da República o dever de desencadear o processo de elaboração da lei anual de revisão geral da remuneração dos servidores da União, prevista no dispositivo constitucional em destaque, na qualidade de titular exclusivo da competência para iniciativa da espécie, na forma prevista no art. 61, § 1º, II, '' da CF.
      Mora que, no caso, se tem por verificada, quanto à observância do preceito constitucional, desde junho/1999, quando transcorridos os primeiros doze meses da data da edição da referida EC nº 19/98.
      Não se compreende, a providência, nas atribuições de natureza administrativa do Chefe do Poder Executivo, não havendo cogitar, por isso, da aplicação, no caso, da norma do art. 103, § 2º, ' fine' que prevê a fixação de prazo para o mister.
      Procedência parcial da ação." (grifei)
        Cumpre ressaltar, por necessário, que essa orientação plenária vem sendo observada em sucessivas decisões, que, proferidas no âmbito desta Corte, versaram questão essencialmente idêntica à que ora se examina nesta sede recursal (RE 406.784/RO, Rel. Min. CEZAR PELUSO – RE 410.514/RO, Rel. Min. ELLEN GRACIE – RE 416.000/DF, Rel. Min. CARLOS BRITTO - RE 421.795/DF, Rel. Min. CEZAR PELUSO – RE 424.580/MG, Rel. Min. ELLEN GRACIE – RE 438.066/RS, Rel. Min. GILMAR MENDES – RE 468.490/AM, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.):
          "1. RECURSO. Extraordinário. Admissibilidade. Servidor público. Revisão geral e anual de vencimentos. Iniciativa da vontade política do Presidente da República e das conveniências subjetivas de sua avaliação. Indenização fundada na responsabilidade civil. Direito não reconhecido. Jurisprudência assentada. Ausência de razões novas. Decisão mantida.Agravo regimental improvido. (...)."
          (RE 479.199-AgR/RS, Rel. Min. CEZAR PELUSO – grifei)
          Sendo assim, tendo em consideração as razões expostas, nego provimento ao presente recurso de agravo, mantendo, em conseqüência, por seus próprios fundamentos, a decisão ora agravada.
          (...)."

          Portanto, não obstante ter o preclaro Ministro Sepúlveda Pertence apresentado em seu voto como exemplo de norma cuja aplicação decorre diretamente da Constituição o art. 37, inciso X, da Constituição Federal, não se pode deixar de reconhecer que tanto na Ação de Inconstitucionalidade por Omissão nº 2.061/DF, julgada procedente por falta de regulamentação do preceito em apreço, quanto em vários julgados proferidos em sede de controle concreto o Supremo Tribunal Federal tem reconhecido a eficácia limitada do preceito.

          Dessa maneira, por se tratar de norma de eficácia limitada e não de eficácia plena, o julgado atinente à medida cautelar requerida na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1835-9/SC não pode servir como precedente capaz de dar suporte a interpretação que considere suprido o vício de iniciativa no caso de projeto de lei que intente suprir falhas na revisão geral, diante da evidência de que o art. 37, inciso X, da Constituição Federal, jamais poderia ser aplicado diretamente.

          Por tais motivos, em razão dos obstáculos à ação do Legislativo destinada a superar as omissões parciais, especialmente a necessidade de preservação das regras de iniciativa privativa em relação a determinadas matérias e por não ser o art. 37, inciso X, que trata da revisão geral, norma de eficácia plena, o que justificaria a atribuição de um menor peso à regra de iniciativa no processo de ponderação entre normas potencialmente conflitantes, entendo que a resposta ao quesito 2 da Consulta não deve admitir a extensão da revisão geral anual por lei de iniciativa do Legislativo.

          O tema não é novo neste Tribunal, pois há vários Prejulgados que apontam para conclusão similar a que ora se apresenta:

            Prejulgado nº1775
            Prejulgado nº 1264
            (...).
            "(...).

          Há vários Prejulgados deste Tribunal de Contas que afirmam ser do chefe do Poder Executivo a competência para propor projeto de lei de revisão geral anual. Além disso, apontam a impossibilidade do Legislativo desencadear projeto de revisão geral em benefício dos servidores e vereadores. Logo, não haveria incompatibilidade entre os Prejulgados existentes e as conclusões apresentadas na presente proposta de voto.

          Entretanto, o Prejulgado nº 1163 deste Tribunal de Contas admitiu a extensão da revisão geral concedida aos servidores do Município aos vereadores por lei de iniciativa da Câmara, como se vê a seguir:

          Prejulgado nº 1163

          No parecer nº 229/02, da Consultoria Geral, que embasou o Prejulgado nº 1163, consta que:

          O Prejulgado nº 1696, por sua vez, estabelece que:

          No tocante ao Prejulgado 1163 e tendo em vista as razões expostas anteriormente, entendo que o seu quarto parágrafo deve ser reformado, a fim de que não se admita a extensão da revisão geral anual por iniciativa do Legislativo, acolhendo, neste ponto, a proposta do Conselheiro César Filomeno Fontes apresentada em seu voto divergente. Quanto ao Prejulgado 1696, citado acima, aponto outra impropriedade, decorrente do cotejo de seus termos com o art. 37, inciso XIII, da Constituição Federal, que veda "a vinculação ou a equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público".

          O primeiro aspecto que deve ser objeto de análise é se o indigitado art. 37, inciso XIII aplica-se também aos agentes políticos. Quanto a este ponto, registro que no julgamento do Recurso Extraordinário nº 181.715/SP o Supremo Tribunal Federal entendeu que o preceito não se aplicava aos mencionados agentes por não serem considerados servidores públicos strictu sensu, como asseverou o nobre relator, Ministro Marco Aurélio5. Consta na ementa:

          Há, todavia, julgado mais recente do Supremo Tribunal que indica a aplicabilidade do art. 37, inciso XIII, da Constituição Federal, aos agentes políticos, devendo-se ressaltar que se trata de decisão oriunda do Tribunal Pleno, ao passo que o decisum anterior era de órgão fracionário da Corte. Transcrevo a ementa:

          A orientação mais recente da Corte parece ser adequada. A previsão de remuneração exclusivamente por subsídio dos agentes políticos está prevista no art. 39, §4º, da Constituição Federal, inserido na seção II do capítulo VII do título II do texto, intitulado "Dos servidores públicos", sendo que o preceito remete expressamente ao inciso X do art. 37, que exige lei específica para a fixação dos subsídios e sua alteração. Logo, há íntima conexão entre o inciso X já citado e o inciso XIII, que proíbe a vinculação ou equiparação, e isso pela simples razão de que a exigência de lei específica pressupõe a impossibilidade de estabelecer-se uma vinculação remuneratória automática entre cargos, o que se poderia denominar de efeito cascata. Ademais, se para a alteração do subsídio exige-se lei específica, a vinculação resta, por decorrência lógica, descartada.

          Afora isso, a vinculação remuneratória acarretaria sérios problemas frente ao mandamento que prevê o direito à revisão geral anual. Imagine-se, por exemplo, que o subsídio dos vereadores estivesse vinculado ao dos deputados estaduais. Concedida a revisão geral para estes, aqueles seriam beneficiados independentemente de lei específica e sem considerar o índice aplicado no Município? É hipótese de difícil aceitação.

          Diante dos argumentos apresentados, considero que o art. 37, inciso XIII, da Constituição Federal, aplica-se aos agentes políticos. Registro, além disso, que o julgado no Recurso Extraordinário 181.715, que afastou a incidência do preceito em relação aos agentes políticos, é anterior à Emenda Constitucional nº 19/98.

          Feita essa constatação, conclui-se que o Prejulgado nº 1696 contém entendimento que não se coaduna com o texto constitucional, ao admitir possibilidade de vinculação remuneratória, no momento em que permite a concessão da revisão geral anual concedida aos servidores também aos agentes políticos desde que haja a previsão na lei que instituiu os subsídios.

          Para que a revisão geral anual seja concedida aos vereadores, não basta previsão na lei que fixou os subsídios. É impositiva a existência de lei específica prevista no art. 37, inciso X, sem que se possa compactuar com vinculação prevista em hipotética lei fixadora. Isso criaria vinculação entre os subsídios dos vereadores e a remuneração dos servidores do Município, o que é inaceitável.

          Portanto, o Prejulgado nº 1696 deve ser revogado, para que se mantenha apenas o entendimento de que a revisão geral anual, para contemplar os vereadores, deve ser disciplinada expressamente em lei específica.

          Observo, ainda, que a Consultoria Geral sugeriu a revogação do Prejulgado nº 1696, embora por outras razões.

          Por fim, entendo ser desnecessária a formação de novo Prejulgado em relação à matéria, bastando que se faça a devida uniformização, o que ocorrerá com a reforma do Prejulgado nº 1163 e a revogação do Prejulgado nº 1696. Em vista disso, poderá ser encaminhada ao consulente cópia de Prejulgados que abordam o tema.

          Ante o exposto, proponho ao Egrégio Plenário que acolha a seguinte proposta de voto:

            6.1. Conhecer da Consulta formulada pelo Sr. Édio Osvaldo Vieira, Presidente da Câmara Municipal de Vereadores de São José.
            6.2. Encaminhar ao Consulente cópia dos Prejulgados nºs 1263, 1428 e 1775.
            6.3. Conferir nova redação ao quarto parágrafo do Prejulgado nº 1163, que passa a ser a seguinte:
            "Não se admite a extensão aos vereadores por meio de lei de iniciativa do Legislativo de revisão geral anual concedida aos servidores. É dever do chefe do Poder Executivo Municipal incluir os agentes políticos(Prefeito, Vice-Prefeito, Secretários Municipais e Vereadores) como beneficiários da revisão geral anual, de acordo com o art.37, da Constituição Federal."
            6.4. Revogar o Prejulgado nº 1696.
            6.5. Dar ciência da decisão, do relatório e voto do relator que a fundamentam ao consulente.
            6.6. Arquivar o presente processo.

          Gabinete do Auditor, em 19 de dezembro de 2007.

          Auditor GERSON DOS SANTOS SICCA

          Relator


          1 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 266.694-7. 1ª Turma. Rel.Min. Eros Grau. J. em 06/09/1995. DJ de 04/11/2005.p.22.

          2 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1124-3/SC. Rel.Min. Eros Grau. Tribunal Pleno. J. em 02/03/2005. DJ de 08/04/2005.p.7.

          3 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.079-0/SC. Rel. Min. Maurício Corrêa. Tribunal Pleno. J. em 29/04/2004. DJ de 18/06/2004.p.44.

          4 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.835/SC. Medida Cautelar. Rel. Min. Sepúlveda Pertence. Tribunal Pleno. J. em 13/08/1998. DJ de 04/02/2000.p.54

          5 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Recurso Extraordinário. Rel.Mi. Marco Aurélio. 2ª Turma. J. em 08/05/2003. DJ de 12/12/2003.p.63.

          6 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2738/PB. Rel.Min. Maurício Corrêa. Tribunal Pleno. J. em 08/05/2003. DJ de 12/12/2003.p.63.