PROCESSO Nº

DEN 12/00410731

UNIDADE GESTORA

Prefeitura Municipal de Florianópolis

RESPONSÁVEL

Dário Elias Berger - Prefeito na gestão 2009-2012

INTERESSADO

Roberto Damiani Cardoso e outros - Denunciantes

César Souza Júnior - atual Prefeito de Florianópolis

ESPÉCIE

Denúncia (art. 113, §1º, da Lei nº 8.666/93)

ASSUNTO

Supostas irregularidades na desapropriação/imissão de posse de áreas para a construção da avenida Beira-Mar Continental.

 

 

 

DENÚNCIA. IRREGULARIDADES NA DESAPROPRIAÇÃO DE IMÓVEL. INDÍCIOS DE PROVA. AUSÊNCIA. LEGALIDADE DEMONSTRADA PELA UNIDADE GESTORA. IMPROCEDÊNCIA.

A regularidade na desapropriação de imóvel  foi comprovada por meio de documentos trazidos aos autos pela Unidade Gestora, motivo pelo qual a Denúncia é considerada improcedente.

 

 

 

I – RELATÓRIO

 

Tratam os autos de exame de Denúncia (fls. 02-17), nos termos do artigo 65 da Lei Complementar (Estadual) n° 202/2000 (Lei Orgânica deste Tribunal) e dos artigos 95, 96, 97, 98 e 99 da Resolução n° TC-06/2001 (Regimento Interno deste Tribunal).

A referida Denúncia foi apresentada pelos Srs. Roberto Damiani  Cardoso, Carmen Lúcia Giglio Cardoso, Dilma Damiani Cardoso, Ana Lúcia Damiani Cardoso, Maria de Lourdes Damiani, Lígia Oliveira Czesnat, Carlos Roberto Czesnat, Aloísio Damiani de Oliveira, Leoni Teresinha Beckhauser Oliveira, Luiz Carlos Matte, Maria Alice de Oliveira Matte, Dulce Damiani de Oliveira, Gisela Damiani de Oliveira Domingues, Paulo Damiani Kotzias, Ana Maria Dutra Kotzias, Espólio de João Damiani Kotzias, Mônica Monteiro Kotzias, Jorge Anastácio Kotzias Neto, Jorge Anastácio Kotzias Filho, Ana Neri da Silva, Osmar Antônio Modesto da Cruz, Rosalina Bueno da Luz, Maria Cecília Damiani Kotzias, Alexandre Anastácio Kotzias Schutz, Ana Maria Kotzias Schutz e Espólio de Elda Damiani Kotzias, apontando supostas irregularidades na desapropriação/imissão de posse de áreas para a construção da avenida Beira-Mar Continental, e veio acompanhada da documentação de fls. 18-195.

A Diretoria de Controle de Municípios (DMU), através do Relatório nº 3525/2012 (fl. 196), solicitou à Unidade Gestora a vinda de cópia de todos os documentos relacionados à desapropriação supostamente irregular (decretos, leis, acordos, etc), diligência que foi realizada por meio do ofício de fl. 197:

1 – Cópia de todos os decretos, leis e acordos referente a desapropriação do aforamento, inscrito no GRPU sob o RIP nº 81050002369-51, a ocupação inscrita sob o RIP nº 81050000607-30 em nome de Carmem de Souza Damiani e outros, registrado no Cartório de Registro de Imóveis do 1° Ofício da Capital sob matrícula n° 5.703, fl 01 do Livro n° 2, com as seguintes características: área total de 2.422 m², medindo 73,40m de frente para o mar por 33,00m da frente aos fundos, onde confronta com a Rua 14 de Julho, no lado leste confronta com propriedade do governo do Estado e no lado oeste confronta com propriedade de João Alcântara da Cunha, este relativo a obra da Beira-Mar Continental.

2 – Documentos referentes à desapropriação acima que comprovem o pagamento referente à indenização, ou comprovem o depósito judicial, e ou demonstrem de forma individualizada os recursos vinculados a esta despesa conforme determina o art. 50, I da LRF:

I - a disponibilidade de caixa constará de registro próprio, de modo que os recursos vinculados a órgão, fundo ou despesa obrigatória fiquem identificados e escriturados de forma individualizada;

3 – Demonstrar em caso de não recolhimento do pagamento, o registro contábil referente à assunção do compromisso de indenizar conforme determina o art. 50, II da LRF:

II - a despesa e a assunção de compromisso serão registradas segundo o regime de competência, apurando-se, em caráter complementar, o resultado dos fluxos financeiros pelo regime de caixa; (grifos do original)

 

Em atenção à solicitação retro, a Prefeitura Municipal de Florianópolis manifestou-se às fls. 199-200, remetendo a documentação de fls. 201-209. Após a vinda de procuração constituindo advogado pelos denunciantes (fls. 211-228), a Prefeitura apresentou esclarecimentos complementares ao atendimento da diligência (fls. 229-230).

A DMU, por sua vez, tendo em vista a conclusão do Relatório nº 131/2013 (fl. 232), solicitou novos documentos por meio do ofício de fl. 233:

1 – Cópias das Procurações outorgando poderes a Carmen de Souza Damiani - representante dos DESAPROPRIADOS, visto assinatura no TERMO DE ACORDO PARA DESAPROPIAÇÃO AMIGÁVEL, referente a imóvel localizado na Beira-Mar Continental do Município de Florianópolis, complementando o Ofício n° 478/PGMF, de 07/11/2012.

 

A Prefeitura Municipal de Florianópolis encaminhou resposta ao ofício e documentos (fls. 235-249). Ato contínuo, a diretoria técnica elaborou o Relatório nº 680/2013, sugerindo o conhecimento da Denúncia para, no mérito, considerá-la improcedente (fls. 251-252). O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas (MPjTC), por meio do Parecer nº MPTC/16464/2013 (fl. 254), acompanhou o entendimento da DMU.

É o relatório.

II – FUNDAMENTAÇÃO

 

Em apreciação ao cumprimento dos requisitos de admissibilidade da Denúncia preconizados no artigo 65, caput e §1º, da Lei Complementar (Estadual) n° 202/2000 (Lei Orgânica deste Tribunal) e nos artigos 95 e 96 da Resolução n° TC-06/2001 (Regimento Interno deste Tribunal), entendo que resta cumprido o requisito da legitimidade pelos denunciantes. Por outro lado, o responsável apontado, Prefeito Municipal de Florianópolis no exercício de 2009-2012, é sujeito à jurisdição desta Corte de Contas e a matéria denunciada é de competência deste órgão de fiscalização.

A Denúncia versa sobre suposta ausência de indenização pela desapropriação de imóvel utilizado para a realização da obra da avenida Beira-Mar Continental. Após a solicitação de documentos pela DMU em duas oportunidades, a Unidade Gestora trouxe os documentos relacionados a referida desapropriação, inclusive documento intitulado Termo de Acordo para Desapropriação Amigável (fls. 206-209), no qual foi avençado o seguinte:

Para efeitos da justa e prévia indenização pela Desapropriação em referência, os DESAPROPRIADOS, considerando a urgência que o Município tem para exercer a posse sobre o bem e integrá-lo a obra da Via Marginal Principal Coletora I (PC-1) – Beira Mar Continental – aceitam receber como pagamento os índices do “ DIREITO DE CONSTRUIR” previsto na Lei Complementar n° 350, de 09.03.2009, que deu nova redação à Lei Complementar n° 160/2005, ou seja: 28.818,85 (Vinte e oito mil, oitocentos e dezoito metros quadrados e oitenta e cinco decímetros), transferindo, com isto, no ato de assinatura deste Termo, todos os direitos possessórios que exercem sobre o imóvel desapropriado, dando plena e geral quitação à expropriação em espécie, firmando o compromisso de nada mais reclamarem, no presente e no futuro, por si ou seus sucessores. (grifei)

 

A transferência de índices de direito de construir ao proprietário de imóvel necessários à implantação de equipamentos urbanos, no caso em questão, a via denominada Beira-Mar Continental, é instituto jurídico previsto no artigo 35, inciso I do Estatuto das Cidades (Lei Federal nº 10.257/2001):

Art. 35. Lei municipal, baseada no plano diretor, poderá autorizar o proprietário de imóvel urbano, privado ou público, a exercer em outro local, ou alienar, mediante escritura pública, o direito de construir previsto no plano diretor ou em legislação urbanística dele decorrente, quando o referido imóvel for considerado necessário para fins de:

I – implantação de equipamentos urbanos e comunitários;

 

Portanto, não há o que falar em falta de pagamento de indenização por desapropriação e cessão de imóvel para a construção da aludida via, haja vista que referido adimplemento foi realizado mediante a transferência do direito de construir equivalente a 28.818,85 (Vinte e oito mil, oitocentos e dezoito metros quadrados e oitenta e cinco decímetros) denunciantes.

A transferência do direito de construir e a sua sistemática no plano urbanístico pode ser assim definida:

A TDC [transferência de direito de construir] pretendeu, desde a sua gênese, trazer o mercado ou a iniciativa privada na pessoa dos proprietários individualmente atingidos por uma desapropriação ou afetação de seus imóveis por alguma obra ou utilidade pública, com a designação como valor histórico etc. para uma parceria.

Quando o assunto fosse a construção da qualidade de vida urbana, a TDC [transferência de direito de construir] seria uma alternativa ao uso simplório da desapropriação, para salvaguarda de diversos interesses da cidade e de seus habitantes, inserindo-se nesse contexto a necessidade de realização de obras viárias, a proteção ao patrimônio cultural, a proteção e a preservação ambiental, entre inúmeras hipóteses. A transferência sempre foi uma busca de mitigação dos custos urbanísticos, após o reconhecimento da incapacidade dos cofres públicos de absorverem esses custos; ou da impropriedade desses custos serem redistribuídos na arrecadação geral de impostos.[1]

 

Portanto, verificando o Município a possibilidade da mitigação do custo urbanístico da construção da Beira-Mar Continental em face da concordância dos denunciantes e proprietários do imóvel desapropriado em receber índices de direito de construir, anuência que foi celebrada no Termo de Acordo para Desapropriação Amigável, não há o que falar em necessidade de pagamento de indenização. O referido instrumento é prova contundente da inexistência de qualquer irregularidade no ato administrativo aqui analisado por este Tribunal, concernente na desapropriação por transferência do direito de construir.

Por outro lado, eventual pagamento de indenização além da transferência de direito de construir realizada poderia consubstanciar, aí sim, ato de gestão ilegal, ilegítimo e antieconômico merecedor de análise detida desta Corte de Contas, e que ensejaria em dano ao erário. Ademais, o instrumento denominado "direito de construir" pode ser negociado pelos expropriados no mercado imobiliário[2].

Logo, a vinda de documentação comprobatória da regularidade da imissão na posse da Prefeitura Municipal de Florianópolis leva à improcedência da presente Denúncia.

 

III – PROPOSTA DE VOTO

 

Estando os autos instruídos na forma regimental, submeto a presente matéria ao Egrégio Plenário, propugnando, com fundamento no parágrafo 3º do art. 96 da Resolução n. TC-06/2001, alterado pelo art. 4º da Resolução nº TC-05/2005 e Instrução Normativa n. TC-01/2002, a seguinte proposta de voto:

1 Conhecer da presente Denúncia e considerá-la improcedente, tendo em vista a regularidade na imissão na posse de áreas para a construção da avenida Beira-Mar Continental realizada pela Unidade Gestora.

2 Dar ciência da Decisão, do relatório e da proposta de voto que a fundamentam, aos Interessados, na pessoa do seu Procurador.

3 Determinar o arquivamento do presente processo.

Gabinete, em 06 de junho de 2013

 

Auditor Gerson dos Santos Sicca

Relator



[1] ALOCHIO, Luiz Henrique Antunes. O direito do urbanismo e a transferência do direito de construir: requisitos de limitação nas leis locais. Revista de Direito Administrativo. set/dez 2008; n. 249: Biblioteca Digital Fórum de Direito Público Cópia da versão digital.

[2] O Estado, ao invés de proibir, usa um instrumento econômico para valorizar um potencial de construir, que passa a ser transferível para ser aproveitado pelo próprio dono do imóvel afetado, ou por terceiros em outro local do PDU [Plano Diretor Urbanístico], previamente autorizado. (In ALOCHIO, Luiz Henrique Antunes. O direito do urbanismo e a transferência do direito de construir: requisitos de limitação nas leis locais. Revista de Direito Administrativo. set/dez 2008; n. 249: Biblioteca Digital Fórum de Direito Público Cópia da versão digital)