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Processo n°: | REC - 03/07360806 |
Origem: | Prefeitura Municipal de Marema |
RESPONSÁVEL: | Augustinho Piaseski |
Assunto: | Recurso (Recurso de Reconsideração - art. 77 da LC 202/2000) -TCE-01/01873670 |
Parecer n° | COG-275/07 |
Recurso de Reconsideração. Tomada de Contas Especial. Apreciação condicionada ao saneamento de regularidade formal.
Diante de recurso sem assinatura, é possível aplicar subsidiariamente o art. 284 do Código de Processo Civil, consoante autoriza o art. 308 do Regimento Interno, a fim de conceder prazo ao recorrente para sanar a deficiência. Se depois disso a situação permanecer irregular, o recurso não deverá ser conhecido.
Administrativo. Liquidação de despesa. Ausência de comprovação efetiva. Contas julgadas irregulares. Imputação de débito. Conhecer e negar provimento.
A ausência de comprovação do pagamento de recursos aos destinatários próprios evidencia deficiência na liquidação da despesa, o que implica julgamento irregular das contas e imputação de débito aos responsáveis, ante a inobservância aos artigos 62, 63, §§ 1º e 2º e 64, parágrafo único, da Lei nº 4.320/64.
Senhor Consultor,
Tratam os autos de recurso de reconsideração interposto por Augustinho Piaseski, ex-Prefeito Municipal de Marema, nos termos do art. 77 da Lei Complementar nº 202/00, em face do acórdão nº 1349/2003, proferido nos autos da Tomada de Contas Especial nº 01/01873670, que julgou irregulares as contas com imputação de débito, nos termos do art. 18, III, "c", daquela Lei Complementar, condenando o recorrente e o responsável Antônio Piaseski solidariamente ao pagamento de R$ 2.600,00, referente a despesas efetuadas sem comprovação da sua efetiva liquidação, em descumprimento aos artigos 62, 63, §§ 1º e 2º, e 64, parágrafo único, da Lei nº 4.320/64.
O processo originário resulta de denúncia formulada contra o recorrente por Odair Luiz Tonetti, ex-funcionário da Prefeitura, que relatou supostas irregularidades cometidas no executivo municipal consistentes na ausência de desconto do imposto de renda e no pagamento em duplicidade aos professores do ensino fundamental (fls. 02/12).
A Diretoria de Auditorias Especiais (DAE) deste Tribunal reputou satisfeitos os requisitos da denúncia, nos termos do art. 65, caput, § 1º, da Lei Complementar nº 202/00, recomendando o conhecimento da mesma e a adoção de providências como auditoria, inspeção e diligência junto à Prefeitura daquele município, objetivando a apuração das irregularidades (conforme parecer de admissibilidade nº 061/01 às fls. 13/15).
O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas acompanhou a manifestação técnica (parecer MPTC nº 1282/2001, fl. 17) e a Auditora Relatora também (fls. 18/19), tendo o Pleno, em seguida, proferido a decisão nº 2128/2001, por meio da qual conheceu da denúncia e determinou as providências (fl. 20).
Realizada a inspeção, a DAE emitiu o relatório nº 045/02. Verificou-se que no tocante à ausência de retenção do imposto de renda, a situação foi regularizada em 23/10/2000, antes mesmo de formulada a denúncia, cujo protocolo data de 04/07/2001. No mais, recomendou-se a conversão do processo em tomada de contas especial; a definição da responsabilidade, com a citação dos responsáveis; e, por fim, a audiência do recorrente, para que apresentasse justificativa pelo não recolhimento, à época devida, da retenção do imposto de renda (fls. 22/26).
A Relatora do feito acolheu a proposição da auditoria, no despacho de fls. 28/29.
O recorrente apresentou alegações de defesa às fls. 33/41, enquanto o outro responsável, Antônio Piaseski, apesar de citado (fl. 43), permaneceu silente.
Em seguida, os autos retornaram ao órgão técnico, que no parecer conclusivo nº 050/03 (fls. 45/50), recomendou julgar irregular as contas tomadas, com imputação de débito (item 1), e comunicar os fatos ao Ministério Público Estadual, em face das fortes evidências de desvio de recursos públicos (item 2).
O Ministério Público junto a esta Corte manifestou-se no sentido de acompanhar o entendimento consignado pelos técnicos, salvo no tocante ao item 2, sob o argumento de que não esgotaram todas os recursos previstos no Regimento Interno (parecer MPTC nº 1343/2003, às fls. 52/53).
A Relatora do feito lavrou voto acompanhando esse posicionamento (fls. 54/56), e, na sessão ordinária de 04/08/2003, o Tribunal Pleno exarou o Acórdão nº 1349/2003, nos termos que seguem (fls. 478/480):
ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:
6.1. Julgar irregulares, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, III, alínea "c", da Lei Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, e condenar os Responsáveis Srs. Augustinho Piaseski - ex-Prefeito Municipal de Marema, e Antônio Piaseski - ex-Tesoureiro da Prefeitura daquele Município, CPF n. 250.627.279-87, solidariamente, ao pagamento da quantia de R$ 2.600,00 (dois mil seiscentos reais), referente a despesas realizadas sem comprovação da sua efetiva liquidação, em descumprimento aos arts. 62, 63, § 1º e 2º, e 64, parágrafo único da Lei Federal n. 4.320/64, conforme apontado no Parecer DDR, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar, perante este Tribunal, o recolhimento do valor do débito aos cofres do Tesouro do Município, atualizado monetariamente e acrescido dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir da data da ocorrência do fato gerador do débito, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, inc. II, da Lei Complementar n. 202/2000).
6.2. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Parecer DDR n. 50/2003, aos Srs. Augustinho Piaseski - ex-Prefeito Municipal de Marema, e Antônio Piaseski - ex-Tesoureiro da Prefeitura daquele Município, e ao Denunciante no Processo n. DEN-01/01873670, Sr. Odair Luiz Tonetti.
Os responsáveis foram devidamente notificados da decisão por meio dos ofícios nº TCE/SEG nº 11.325/03 e 11.326/03 (fls. 59/60), cujo recebimento se atesta pelos avisos de fls. 62 e 63.
Inconformado, Augustinho Piaseski interpôs o presente recurso de reconsideração.
É o relatório.
Compulsando os autos, verifica-se que a petição do recurso não foi assinada pelo recorrente (fl. 05), tampouco o ofício que encaminhou a peça (fl. 02).
Observa-se que à fl. 06, consta procuração devidamente assinada por Augustinho Piaseski, outorgando poderes em nome de Edson Antônio Valgoi. Contudo, apesar de autorizado, o outorgado sequer subscreveu as razões do recurso.
Diante disso, e considerando que há permissão no Regimento Interno (art. 308) para aplicar subsidiariamente a legislação processual aos casos decididos por este Tribunal, mostra-se oportuno invocar o art. 284 do Código de Processo Civil:
Art. 284. Verificando o juiz que a petição inicial não preenche os requisitos exigidos nos arts. 282 e 283, ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor a emende, ou a complete, no prazo de dez (10) dias.
Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial.
Assim, recomenda-se que o Relator assinale o prazo de 10 dias para que o recorrente possa suprir a falha na petição do recurso, apondo a sua assinatura. Cumprida tal diligência, caberá, então, a apreciação do recurso.
No entanto, se depois de dar oportunidade ao recorrente para emendar a peça, ele ainda assim não o fizer, estará a Corte autorizada a não conhecer do reclamo.
É o que orienta a jurisprudência:
(...) 4. Em atenção ao princípio da instrumentalidade do processo que privilegia a finalidade em detrimento da forma, evita-se o sacrifício de eventual direito material da parte, valendo-se da correta prestação jurisdicional como meio de certeza e segurança para a sociedade. Destarte, a ausência da assinatura do advogado na petição do agravo de instrumento constitui mera irregularidade sanável, devendo ser oportunizada à parte prazo para a correção da omissão. Aplicação analógica do art. 284, do CPC. 5 - Precedentes (REsp nºs 183.220/RS, 193.993/SC e 442.055/RN). 6 - Recurso conhecido, nos termos acima expostos e, neste aspecto, provido para, anulando o v. aresto guerreado, determinar ao Tribunal de origem que assinale prazo para suprimento da falha na petição do agravo de instrumento e após, se cumprida tal diligência, aprecie o pedido. (STJ, REsp 437.594/RS, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJU 16/06/2003, p. 378)
Feita essa ressalva, parte-se para a análise propriamente dita dos pressupostos de admissibilidade.
O recurso de reconsideração é, efetivamente, o instrumento adequado para atacar acórdão proferido em processo de Tomada de Contas, conforme o art. 77 da Lei Complementar nº 202/00, in verbis:
Art. 77. Cabe Recurso de Reconsideração contra decisão em processo de prestação e tomada de contas, com efeito suspensivo, interposto uma só vez por escrito, pelo responsável, interessado ou pelo Ministério Público junto ao Tribunal, dentro do prazo de trinta dias contados da publicação da decisão no Diário Oficial do Estado.
Portanto, devem ser observadas a legitimidade, a singularidade e a tempestividade.
No que se refere à legitimidade recursal, verifica-se que o recorrente a possui, já que foi responsabilizado e condenado a pagamento de débito, em razão das irregularidades verificadas. Enquadrou-se, logo, na definição de responsável prevista no art. 133, § 1º, "a", do Regimento Interno.
A singularidade também foi cumprida, pois interposto o recurso uma única vez.
A tempestividade restou atendida, porquanto o acórdão recorrido foi publicado no Diário Oficial do Estado nº 17.241, de 18/09/2003, e o recurso, protocolizado em 02/10/2003, respeitando-se, assim, o prazo regimental de trinta dias para a interposição.
As contas tomadas foram julgadas irregulares, com imputação de débito, porque verificou-se pela auditoria ser procedente a denúncia apresentada a este Tribunal.
Conforme o parecer conclusivo 50/03 (fls. 45/50), o Executivo, ao constatar saldo de R$ 2.600,00 na conta do FUNDEF, determinou a execução de outra folha de pagamento aos professores. Emitiu, para tanto, o empenho nº 1964/A/98, a ser pago por meio do cheque nº 000186, conta 2-9 do BESC.
Observou-se, no entanto, que referido cheque fora sacado diretamente no caixa da agência do BESC em Xaxim, com um endosso ao portador, cuja assinatura assemelha-se com a do recorrente.
Considerando esse fato, infere-se que os recursos do FUNDEF não teriam sido depositados em favor dos professores, afrontando, portanto, os artigos 62, 63, §§ 1º e 2º e 64, parágrafo único, da Lei nº 4.320/64.
Nas suas razões recursais, o insurgente alegou que à ocasião da auditoria in loco, não foram encontrados documentos suficientes à comprovação do destino dado ao dinheiro, mas, posteriormente, realizando nova verificação dos arquivos, encontrou parte deles.
Trouxe declarações firmadas por cinco professores da rede municipal de ensino que atuavam na época, dando conta que receberam, "no dia 12 de janeiro de 1998, o complemento referenciado no histórico da nota de empenho 01964-A-1998", referente ao abono FUNDEF (fl. 7).
Apresentou também declarações de Nelson Bottesini, Diretor do Departamento de Educação de 1995 a 2000, e de Antônio Piaseski, Tesoureiro de 1997 a 2000 (e responsável solidário), corroborando o pagamento em espécie do abono aos professores (fls. 08 e 09).
Com base nisso, requereu o acolhimento do recurso para que fosse anulado o acórdão nº 1349/2003, convertendo-o em advertência.
Entretanto, a pretensão não pode prosperar, pois o recorrente não logrou comprovar a regularidade da operação denunciada.
Isso porque lançou mão apenas de declarações que, além de extemporâneas, não inspiram fidedignidade, considerando que dentre elas consta declaração firmada pelo próprio co-responsável pelo débito, Antônio Piaseski, afirmando que os valores foram pagos aos professores (fl. 09).
Apenas cinco pessoas firmaram a declaração, e as outras três não. Além disso, das cinco assinaturas, nenhuma delas foi certificada como autêntica por cartório extrajudicial.
Ademais, não foram trazidos os documentos mencionados no recurso - encontrados em momento posterior, segundo o recorrente -, tampouco outros indispensáveis ao afastamento da penalidade, tais como a folha demonstrativa dos salários dos servidores beneficiados com o abono e a respectiva ordem de pagamento, esses sim capazes de demonstrar inexistência de irregularidade.
Nesse contexto, é possível concluir que subsiste a afronta aos artigos 62, 63, § 1º e 2º e 64, parágrafo único, da Lei nº 4.320/64, os quais dispõem:
Art. 62. O pagamento da despesa só será efetuado quando ordenado após sua regular liquidação.
Art. 63. A liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito.
§ 1º Essa verificação tem por fim apurar:
I - a origem e o objeto do que se deve pagar;
II - a importância exata a pagar;
III - a quem se deve pagar a importância, para extinguir a obrigação.
§ 2º A liquidação da despesa por fornecimentos feitos ou serviços prestados terá por base :
I - o contrato, ajuste ou acordo respectivo;
II - a nota de empenho;
III - os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço.
Art. 64. (...)
Parágrafo único. A ordem de pagamento só poderá ser exarada em documentos processados pelos serviços de contabilidade.
Com efeito, não se cumpriu a finalidade precípua da fase de liquidação da despesa, qual seja, a de verificar o implemento da condição. No caso, não foi possível constatar o cumprimento da obrigação de utilizar os valores disponíveis no FUNDEF com pagamento destinado aos professores, pois, conforme evidenciado nos autos, o dinheiro correspondente foi desviado de sua finalidade, porquanto foi sacado diretamente no caixa pelo Prefeito, e este, por sua vez, não conseguiu demonstrar o contrário.
Saliente-se que o simples fato de existir autorização apropriada para o gasto não leva, necessariamente, à realização da despesa em obediência estrita aos objetivos estabelecidos. É o que aconteceu na hipótese, já que a nota de empenho constante nos autos (fl. 36), apesar de ser corretamente destinada a complementar a folha de pagamento, não foi liquidada corretamente, visto que deixou de atender, efetivamente, os seus destinatários legais.
Por todas essas razões, não há como reputar regulares as contas tomadas, muito menos afastar a imputação de débito.
Da mesma forma, não se mostra viável proceder à conversão em advertência. A Resolução TC-06/2001 (Regimento Interno do Tribunal de Contas) prevê o ressarcimento pelos responsáveis sempre que as contas forem julgadas irregulares com imposição de débito. In verbis:
No mesmo sentido, dispõe a Lei Complementar Estadual nº 202/2000, que diz:
Art. 21. Julgadas irregulares as contas e havendo débito, o Tribunal condenará o responsável ao pagamento da dívida atualizada monetariamente, acrescidos dos juros de mora devidos, podendo, ainda, aplicar-lhe a multa prevista no art. 68 desta Lei. (grifei)
Nesses termos, deve ser mantido o julgamento irregular das contas, bem como a imputação de débito, consoante o Acórdão nº 1349/2003 (fls. 57/58).
Ante o exposto, o parecer é no sentido de:
a) Conceder o prazo de 10 dias para que o recorrente possa emendar a petição do recurso, apondo a sua assinatura, com a ressalva de que a apreciação da insurgência estará condicionada ao cumprimento da diligência, pois, caso não seja observada, ensejará o não conhecimento;
b) Desde que efetivamente suprida a falha mencionada, conhecer do presente Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 77 da Lei Complementar Estadual nº 202/00, interposto contra o acórdão nº 1349/2003, proferido na sessão ordinária de 04/08/2003, nos autos da Tomada de Contas Especial nº 01/01873670;
c) No mérito, negar provimento ao reclamo, mantendo-se na íntegra a decisão recorrida;
d) Dar ciência do acórdão, relatório e voto do Relator, bem como deste parecer, a Augustinho Piaseski, ex-Prefeito Municipal de Marema, e ao procurador constituído, Dr. Edson Antônio Valgoi.
MARCELO BROGNOLI DA COSTA Consultor Geral |