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Processo n°: | REC - 04/06398941 |
Origem: | Prefeitura Municipal de Brusque |
Interessado: | Ciro Marcial Roza |
Assunto: | Recurso (Recurso de Reconsideração - art. 77 da LC 202/2000) -TCE-01/04499818 |
Parecer n° | COG-999/08 |
LIMPEZA. ATIVIDADE-MEIO. TERCEIRIZAÇÃO.
É possível a terceirização da atividade-meio de limpeza.
Tratam os autos de Reconsideração n. REC-04/06398941, interposto pelo Sr. Ciro Marcial Roza e Maurílio Joaquim de Souza, em face do acórdão n. 1980/2004 (fls. 2927/2929), exarado no processo TCE-01/04499818.
O citado processo TCE-01/04499818 é relativo a supostas irregularidades praticadas nos exercícios de 2001 e 2002, apuradas nos autos REP 01/04499818.
O processo teve tramitação regular, com citação, defesa e julgamento.
Na sessão ordinária de 3/11/04, o processo n. TCE-01/04499818 foi levado à apreciação do Tribunal Pleno, sendo prolatado o acórdão n. 1980/2004 (fls. 2927/2929), que acolheu o voto do Relator, nos seguintes termos:
Visando à modificação do acórdão supracitado, os Responsáveis interpõem a presente Reconsideração, analisado pela Consultoria Geral - COG (fls. 14/24) e pelo Ministério Público de Contas (fl. 25).
Por meio do despacho de fl. 26, o Relator devolve os autos à esta Consultoria Geral - COG para análise da defesa quanto ao aspecto da terceirização, relativamente aos itens 6.2.1.2. e 6.2.2.2. do Acórdão 1980/2004 (fls. 2927/2929-TCE).
É o relatório.
A admissibilidade foi satisfatoriamente realizada à fl. 16, no Parecer COG-318/08.
3. MÉRITO
Trata-se de despacho do E. Relator Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall, determinando o retorno dos autos a esta Consultoria Geral para análise das razões de recurso quanto aos itens 6.2.1.2. e 6.2.2.2.
As restrições têm como irregularidade a terceirização de atividade-fim com a contratação de cooperativa para execução de atividades de limpeza para manutenção e conservação de vias públicas.
Os recorrentes, quanto a este ponto, alegam o seguinte:
Alegam os recorrentes em resumo, que a contratação de cooperativa é legal e que a atividade de limpeza não é atividade-fim, cabendo, portanto, a terceirização.
Com razão os recorrentes.
O parecer COG-15/04 - CON 04/00084104 tratou das cooperativas:
O consulente solicita parecer indagando sobre a possibilidade de cooperativas participarem nas licitações realizadas pelo Poder Judiciário.
A) CONCEITO DE COOPERATIVA
As cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas à falência, constituídas para prestar serviços aos associados (art. 4º, Lei 5.764/71). Perceptível a diferença em relação a uma empresa comercial pela inversão de atribuições, enquanto que nesta os empregados prestam serviço à mesma, as cooperativas são constituídas para prestarem serviços aos associados.
O sistema cooperativo teve sua origem na França e Inglaterra do século XIX1, tendo sido admitido no ordenamento jurídico brasileiro pela Lei 5.764/71, de 16/12/1971, que define a Política Nacional de Cooperativismo e institui o regime jurídico das sociedades cooperativas. A legislação especial foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, conforme se observa dos artigos abaixo transcritos:
Art. 3º. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I construir uma sociedade livre, justa e solidária;
O princípio da solidariedade é um dos que regem as relações entre os cooperados.
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XVIII a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento.
Art. 174. (...).
(...)
§ 2º. A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo.
A valorização das cooperativas é notória no ordenamento jurídico brasileiro, merecendo menção expressa nos arts. 5º, XVIII, e 174, § 2º, da CF/88.
Dentre as diversas classificações de cooperativas, temos aquela que as divide em cooperativas de contribuições pecuniárias, de trabalho ou de serviços. Na primeira categoria estão incluídas as cooperativas de crédito, de produção agropecuária e habitacionais. A segunda e a terceira categorias são formadas por trabalhadores autônomos que oferecem a terceiros, sem exclusividade, os serviços profissionais do grupo ou de seus membros individualmente, sem perderem sua liberdade de aceitação das tarefas.2
Esclarecedores são os comentários de Líris Silvia Zoega T. do Amaral, a respeito da conceituação das cooperativas de trabalho:
Cooperativas de trabalho são aquelas que, construídas entre operários de uma determinada profissão ou ofício, ou de ofícios variados de uma mesma classe, têm como finalidade primordial melhorar o salário e as condições de trabalho pessoal de seus associados e, dispensando a intervenção de um patrão ou empresário, se propõem a contratar obras, tarefas, trabalhos ou serviços públicos e particulares, coletivamente por todos ou por grupo de alguns. Esta definição foi dada pelo art. 24 do Decreto nº 22.239/32, ora revogado, porém, trazendo esse conceito para o âmbito do gênero cooperativa disciplinado na Lei Federal nº 5.764/71, temos que a cooperativa de trabalho também será uma organização de pessoas que visam ajudar-se mutuamente, pois, o traço diferenciador desta forma de sociedade dos demais é justamente a finalidade de prestação de serviços aos associados, para o exercício de uma atividade comum, econômica, sem finalidade lucrativa.3
B) CARACTERÍSTICAS DAS COOPERATIVAS
De acordo com o art. 4º, da Lei 5.764/71, as características das cooperativas e que as distinguem das demais sociedades, são as seguintes:
Art. 4º (...)
I - adesão voluntária, com número ilimitado de associados, salvo impossibilidade técnica de prestação de serviços;
II - variabilidade do capital social representado por cotas-partes;
III - limitação do número de cotas-partes do capital para cada associado, facultado, porém, o estabelecimento de critérios de proporcionalidade, se assim for mais adequado para o cumprimento dos objetivos sociais;
IV - inacessibilidade das cotas-partes do capital a terceiros, estranhos à sociedade;
V - singularidade de voto, podendo as cooperativas centrais, federações e confederações de cooperativas, com exceção das que exerçam atividade de crédito, optar pelo critério da proporcionalidade;
VI - quorum para o funcionamento e deliberação da assembléia geral baseado no número de associados e não no capital;
VII - retorno das sobras líquidas do exercício, proporcionalmente às operações realizadas pelo associado, salvo deliberação em contrário da assembléia geral;
VIII - indivisibilidade dos fundos de reserva e de assistência técnica educacional e social;
IX - neutralidade política e indiscriminação religiosa, racial e social;
X - prestação de assistência aos associados, e, quando previsto nos estatutos, aos empregados e cooperativados;
XI - área de admissão de associados limitas às possibilidades de reunião, controle, operações e prestação de serviços.
Com as recentes alterações ocorridas no Código Civil pela Lei 10.406/2002, com vigência a partir de 11/01/2003, as características da sociedade cooperativa passaram a ser as seguintes:
Art. 1094. São características da sociedade cooperativa:
I - variabilidade, ou dispensa do capital social;
II - concurso de sócios em número mínimo necessário a compor a administração da sociedade, sem limitação de número máximo;
III - limitação do valor da soma de quotas do capital social que cada sócio poderá tomar;
IV - intransferibilidade das quotas do capital a terceiros estranhos à sociedade, ainda que por herança;
V - quorum, para a assembléia geral funcionar e deliberar, fundado no número de sócios presentes à reunião, e não no capital social representado;
VI - direito de cada sócio a um só voto nas deliberações, tenha ou não capital a sociedade, e qualquer que seja o valor de sua participação;
VII - distribuição dos resultados, proporcionalmente ao valor das operações efetuadas pelo sócio com a sociedade, podendo ser atribuído juro fixo ao capital realizado;
VIII - indivisibilidade do fundo de reserva entre os sócios, ainda que em caso de dissolução da sociedade.
A configuração da cooperativa se dá pela celebração de contrato de sociedade cooperativa entre pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro (art. 3º, Lei 5.764/71).
C) PROBLEMAS COM AS COOPERATIVAS
As sociedades cooperativas possuem objetivos e proteção sociais, inclusive com garantia constitucional. Porém, a prática tem demonstrado a ausência de zelo por parte dos interessados em manter as cooperativas como alternativa viável ao desemprego e à burocracia.
As cooperativas estão entre as idéias hodiernas de flexibilização das relações de trabalho e como essas idéias nem sempre são aplicadas teleologicamente, os inúmeros problemas são inevitáveis.
C.1. Existência Jurídica
A existência de sociedade cooperativa acha-se acolhida pelo sistema jurídico vigente, conforme a Lei 5.764/71, no que seu art. 4º, a define como sociedade civil. Portanto, não há subterfúgios que validem a exclusão das mesmas em licitações por este argumento, ou seja, da sua existência jurídica.
C.2. Prestação de Serviços
Pela conceituação de cooperativa, dada pelo art. 4º, da Lei 5.764/71, a mesma é constituída para prestar serviços aos associados, o que por certo período levou ao entendimento de que a participação das mesmas em licitações estaria vedada pela própria conceituação de cooperativa, porém, pelo art. 86, da mesma Lei, as cooperativas poderão fornecer bens e serviços a não associados, dirimindo a dúvida.
C.3. Participação em Licitações
É do texto constitucional que a lei apoiará e estimulará o cooperativismo (art. 174, § 4º), por esta razão e dada a vantagem proporcionada às cooperativas, sustenta-se que as suas propostas deveriam sofrer equalização quando da participação em licitações públicas, em cumprimento ao princípio da isonomia, do art. 3º, da Lei 8.666/93. No entanto, tal entendimento não encontra guarida na legislação e costumes administrativos.
O edital de licitação não poderá retirar as garantias concedidas pela Constituição objetivando incentivar este tipo de associativismo. De outra parte, a contratação de cooperativa com preços inferiores aos praticados pelos concorrentes poderia demonstrar justamente o resultado do incentivo dado às mesmas pelo ordenamento jurídico. Em relação à Administração pública as despesas ficariam minimizadas com esta contratação, perdendo, no entanto, vantagens indiretas, como por exemplo, tributos que incidiriam neste tipo de sociedade, não fosse cooperativa.
Os editais de licitação, por outro lado, também não poderiam afastar as exigências contidas no art. 27, da Lei 8.666/93, relativamente à habilitação jurídica, qualificação técnica, qualificação econômica-financeira e regularidade fiscal, haja vista que qualquer outra participante está obrigada a comprovar a sua situação mediante apresentação dos documentos necessários para que a Administração pública obtenha segurança na contratação, afastando eventuais responsabilidades decorrentes de irregularidades com a contratada, especialmente em face de inadimplemento de verbas trabalhistas.
Jessé Torres Pereira Júnior comenta sobre as cooperativas de fachada, nos seguintes termos:
Impõe-se à Administração precatar-se de admitir a participação, e eventual contratação, de cooperativas que sejam meras intermediárias de mão-de-obra, falsando o regime jurídico e as finalidades sociais e econômicas do instituto. Tenha-se em mente a advertência de VERGÍLIO PERIUS, ilustrado Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul, quanto a desvios praticados por cooperativas de fachada, constituídas exclusivamente para o fim de elidirem a incidência dos encargos patronais e previdenciários, verbis: " ... se faltar uma destas características (refere-se aos incisos do art. 4º da Lei nº 5.764/71), a existência da sociedade cooperativa fica comprometida. Vejamos o caso da aplicação do inciso I, pelo qual se exige, como caracterização de cooperativa, a livre adesão. O pedido de ingresso e a matrícula na cooperativa se constituem atos de livre aceitação, não de imposição. Obrigar trabalhadores ao ingresso em cooperativas de mão-de-obra significa que tais cooperativas perdem uma das principais características que as definem. Logo, são cooperativas irregulares, falsas ..." (Revista do TCE/RS, nº 14/1996, págs. 185-238).
C.4. Vínculo Empregatício
Os cooperados, de acordo com o art. 442, parágrafo único da Consolidação das Leis do Trabalho, não possuem vínculo de emprego com a Cooperativa, tampouco com os tomadores de serviços. Este dispositivo tem ajudado na criação de cooperativas, no entanto, algumas delas operam em relação aos seus associados por um sistema de serviços não eventuais, em caráter pessoal, oneroso e sob subordinação, características estas correspondente ao vínculo empregatício, conforme art. 3º, do Decreto-Lei nº 5.452, 1º/05/43 (Consolidação das Leis do Trabalho - CLT)
Em razão da criação de sociedades utilizando-se deste nome, porém, com o intuito de fraudar as normas de direito público, e, em especial, a legislação trabalhista, o parágrafo único, do art. 442, da CLT, tem sido interpretado à luz da situação fática, tornando-se mitigado em face da hermenêutica gramatical.
Este entendimento tem sido observado em decisões da Justiça especializada, conforme se observa do julgado abaixo transcrito:
RECURSO DE REVISTA VÍNCULO DE EMPREGO RECONHECIMENTO COOPERATIVA FRAUDE A decisão regional, com esteio na prova dos autos, reputou existente o vínculo de emprego, diante da constatação de que a cooperativa foi criada apenas com o escopo de fraudar a legislação trabalhista. Desvaliosa a alegação no sentido da inexistência de fraude, o que levaria à incidência do parágrafo único do artigo 442 da CLT, nesta fase recursal, visto que para se acatar conclusão diversa à do Tribunal de origem necessário seria que se adentrasse o quadro fático-probatório, o que é vedado a teor do Enunciado nº 126 do Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de Revista de que não se conhece. (TST RR 615066 1ª T. Rel. Min. Conv. Guilherme Bastos DJU 29.08.2003)
Rodolfo Pamplona4, juiz do Trabalho da 5ª Região, Salvador (BA), professor universitário, mestre e doutorando em Direito do Trabalho pela PUC/SP, em artigo de sua autoria, transcreve duas decisões relativas ao tema:
Cooperativa. Relação de emprego. Quando o fim almejado pela cooperativa é a locação de mão-de-obra de seu associado, a relação jurídica revela uma forma camuflada de um verdadeiro contrato de trabalho. (TRT-SP RO 02930463800 Rel. Juiz Floriano Corrêa Vaz da Silva, 31/05/95).
Trabalhadores organizados em cooperativa Prestação de serviços a terceiros Relação de emprego Inexistência. Trabalhador associado a cooperativa de trabalho regularmente constituída, que presta serviços a vários tomadores distintos, sem fixação, portanto, a nenhuma fonte de trabalho, não pode ser considerado empregado nem daquela nem de nenhum destes, a teor do que dispõe o parágrafo único do art. 442 da CLT, com a redação da Lei nº 8.949/94. (TRT-MG RO 12736/96 Rel. Juiz Márcio Ribeiro do Valle, 11/11/96).
Conforme se observa das decisões supratranscritas, as situações fáticas são diametralmente opostas. Enquanto na primeira a relação de emprego foi reconhecida, na segunda, em razão da ausência de características do vínculo, a relação de emprego foi declarada inexistente.
D) ENUNCIADO Nº 331 DO TST
O Tribunal Superior do Trabalho, publicou o Enunciado 331, com o seguinte teor:
Nº 331 Contrato de prestação de serviços. Legalidade - Inciso IV alterado pela Res. 96/2000, DJ 18.09.2000
I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).
II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).
III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (art. 71 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993).
Conforme se depreende do Enunciado acima transcrito, as regras sobre a contratação de cooperativas ora mencionam o tomador de serviços privado ora a Administração pública.
Os dois itens que se referem à Administração pública, são o II, que não reconhece vínculo de emprego mesmo que a contratação, mediante empresa interposta, seja irregular, e o item IV, que impõe responsabilidade subsidiária quanto as obrigações trabalhistas inadimplidas pelo empregador.
Apesar do Enunciado não se referir às cooperativas, a elas se aplica, pois o conceito de prestação de serviços envolve tanto as desta espécie quanto as demais prestadoras de serviço terceirizado.
Há um conflito de normas entre o item IV do Enunciado 331, do TST e o art. 71, § 1º, da Lei 8.666/935. Porém, conforme ficou assentado no Acórdão do TST, processo TST-IUJ-RR-297.751/96, o conflito é apenas aparente:
Embora o artigo 71 da Lei nº 8.666/93 contemple a ausência de responsabilidade da Administração Pública pelo pagamento dos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato, é de se consignar que a aplicação do referido dispositivo somente se verifica na hipótese em que o contratado agiu dentro de regras e procedimentos normais de desenvolvimento de suas atividades, assim como de que o próprio órgão da administração que o contratou pautou-se nos estritos limites e padrões da normatividade pertinente. Com efeito, evidenciado, posteriormente, o descumprimento de obrigações, por parte do contratado, entre elas as relativas aos encargos trabalhistas, deve ser imposta à contratante a responsabilidade subsidiária. Realmente, nessa hipótese, não se pode deixar de lhe imputar, em decorrência desse seu comportamento omisso ou irregular, ao não fiscalizar o cumprimento das obrigações contratuais assumidas pelo contratado, em típica culpa in vigilando, a responsabilidade subsidiária e, conseqüentemente, seu dever de responder, igualmente, pelas conseqüências do inadimplemento do contrato.
E) TERMO DE CONCILIAÇÃO NA ESFERA FEDERAL
Com o objetivo de garantir que os objetivos das cooperativas não sejam desvirtuados e evitar graves prejuízos financeiros ao erário, o Ministério Público do Trabalho e a União, firmaram Termo de Conciliação Judicial nos autos do Processo 01082-2002-020-10-00-0, para que a União, conforme cláusula primeira, abstenha-se de contratar trabalhadores, por meio de cooperativas de mão-de-obra, para a prestação de serviços ligados às suas atividades-fim ou meio, quando o labor, por sua própria natureza, demandar execução em estado de subordinação, quer em relação ao tomador, ou em relação ao fornecedor dos serviços, constituindo elemento essencial ao desenvolvimento e à prestação dos serviços terceirizados.
F) ÂMBITO DE INCIDÊNCIA DO TERMO DE CONCILIAÇÃO
O Termo de Conciliação tem como partes o Ministério Público do Trabalho e a União, comprometendo a segunda a adotar atos omissivos de contratação. Conforme ressaltado pelo consulente, o Termo de Conciliação não é aplicado no Poder Judiciário de Santa Catarina, pois está adstrito ao âmbito federal.
Muito embora, o Termo de Conciliação tenha criado obrigações inter partes, as considerações elencados no próprio instrumento conciliatório deixam claro que as razões para a realização do mesmo ultrapassam a esfera federal, atingindo também, os demais entes da Federação.
Das considerações constantes do Termo de Conciliação, merecem destaque as quatro últimas, conforme transcrição abaixo:
CONSIDERANDO que a administração pública está inexoravelmente jungida ao princípio da legalidade, e que a prática do merchandage é vedada pelo art. 3º, da CLT e repelida pela jurisprudência sumulada do C. TST (En. 331);
CONSIDERANDO que os trabalhadores aliciados por cooperativas de mão-de-obra, que prestam serviços de natureza subordinada à UNIÃO embora laborem em situação fática idêntica a dos empregados das empresas prestadoras de serviços terceirizáveis, encontram-se à margem de qualquer proteção jurídico-laboral, sendo-lhes sonegada a incidência de normas protetivas do trabalho, especialmente àquelas destinadas a tutelar a segurança e higidez do trabalho subordinado, o que afronta o princípio da isonomia, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho (arts. 5º, caput e 1º, III e IV da Constituição Federal);
CONSIDERANDO que num processo de terceirização o tomador dos serviços (no caso a administração pública) tem responsabilidade sucessiva por eventuais débitos trabalhistas do fornecedor de mão-de-obra, nos termos do Enunciado 331, do TST, o que poderia gerar graves prejuízos financeiros ao erário, na hipótese de se apurar a presença dos requisitos do art. 3º, da CLT na atividade de intermediação de mão-de-obra patrocinada por falsas cooperativas;
CONSIDERANDO o teor da Recomendação para a Promoção das Cooperativas aprovada na 90ª sessão, da OIT - Organização Internacional do Trabalho, em junho de 2002, dispondo que os Estados devem implementar políticas no sentido de:
8.1.b Garantir que as cooperativas não sejam criadas para, ou direcionadas ao não cumprimento das leis do trabalho ou usadas para estabelecer relações de emprego disfarçados, e combater pseudocooperativas que violam os direitos dos trabalhadores velando para que a lei trabalhista seja aplicada em todas as empresas.
Ainda que o Termo de Conciliação tenha se referido, em certos momentos, à União, no entanto, as situações descritas nas considerações são aplicáveis a todos os entes federados, porque demonstra situação fática cuja norma jurídica deva incidir. O Termo de Conciliação não cria Direito, mas determina a aplicação de normas. Portanto, os demais entes da Federação não estão ao Termo de Conciliação vinculados, porém, devem obediência às demais normas do ordenamento jurídico. Razão pela qual sustenta-se que a aplicação de normas jurídicas relacionadas às situações fáticas descritas nas considerações do Termo de Conciliação são aplicáveis aos Estados, Distrito Federal e Municípios.
Por outro lado, os termos da parte resolutiva do Termo de Conciliação servem como indicativo de conduta para todos os entes da Federação, visto que procuram mitigar problemas gerados com contratatações irregulares.
G) ENTENDIMENTO DO TRIBUNAL DE CONTAS/SC
Este Tribunal de Contas já se manifestou sobre a matéria em diversos processos de Consulta, cujos Prejulgados encontram-se abaixo transcritos:
Prejulgado 0594
A contratação de mão-de-obra pela administração municipal, através de cooperativa, somente é possível quando se tratar de serviços especializados ligados à atividade-meio e desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação, vedada a contratação para a realização de serviços que constituam atividade fim da administração pública ou cujas funções sejam próprias de cargos integrantes do seu quadro de pessoal, face o disposto no artigo 37, II da Constituição Federal. A administração municipal ao contratar serviços através de empresas ou cooperativas para atendimento de atribuições da atividade meio, devera fazê-lo mediante lei municipal reguladora e observando o procedimento licitatório, conforme artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal e artigos 2º e 6º da Lei Federal nº 8.666/93. Processo: CON-TC 0196600/81 Parecer: 527/98 Origem: Prefeitura Municipal de Ipumirim Relator: Thereza Apparecida Costa Marques Data da Sessão: 26/10/1998.
Prejulgado 1336
A contratação de mão-de-obra pela Administração Municipal, através de Cooperativa, deverá ser realizada com parcimônia, sendo possível quando se tratar de serviços especializados ligados à atividade-meio e desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação, vedada para a realização de serviços que constituam atividade-fim da administração pública ou cujas funções sejam próprias de cargos integrantes do seu quadro de pessoal, em face do disposto no art. 37, II, da Constituição Federal. Processo: CON-02/07990123 Parecer: COG-089/03 Decisão: 1028/2003 Origem: Câmara Municipal de São Lourenço d`Oeste Relator: Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall Data da Sessão: 16/04/2003 Data do Diário Oficial: 17/06/2003.
Esta Corte de Contas, desde 1997, já vinha se posicionando de forma restritiva quanto a contratação de cooperativas de trabalho pela Administração pública. O entendimento foi gradativamente se aperfeiçoando até a Decisão nº 1028/93, de 16/04/2003 (Prejulgado 1336 - acima transcrito). A evolução jurisprudencial pode ser vislumbrada pelas decisões oriundas dos processos abaixo indicados:
a) Processo: CON-TC0142406/76 Parecer: COG-215/97 Origem: Prefeitura Municipal de Braço do Norte Relator: Conselheiro Luiz Suzin Marini Data da Sessão: 02/06/1997.
b) Processo: CON-TC0151307/78 Parecer: COG-279/97 Origem: Prefeitura Municipal de Lindóia do Sul Relator: Auditor José Carlos Pacheco Data da Sessão: 09/07/1997.
c) Processo: CON-TC0258602/79 Parecer: COG-650/97 Origem: Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina Relator: Conselheiro Salomão Ribas Junior Data da Sessão: 13/04/1998.
d) Processo: CON-TC0271701/72 Parecer: COG-248/98 Origem: Prefeitura Municipal de Gaspar Relator: Conselheiro Luiz Suzin Marini Data da Sessão: 24/06/1998.
H) LEI ESTADUAL Nº 8.815/92
No âmbito dos Poderes do Estado de Santa Catarina, a Lei Estadual nº 8.815/92, de 06/10/1992, elenca o rol de funções para as quais é permitida a locação de mão-de-obra: vigilante, telefonista, office-boy, marceneiro, recepcionista, servente, copeira, jardineiro, cozinheiro, garçon, merendeira, zelador, padeiro, ascensorista, agente de guarda de menores, digitador e mecânico.
O rol da Lei Estadual é taxativo e está todo abarcado nos serviços terceirizados vedados pelo Termo de Conciliação. Porém, em razão da conciliação não ser expressamente aplicável aos demais entes da Federação, cabe aos mesmos adaptar suas contratações visando não se enquadrarem nas situações descritas nas considerações do Termo de Conciliação, ainda que não haja menção quanto às funções terceirizadas.
Responde-se ao consulente, nos termos do Prejulgado 1336 com as adaptações necessárias que o caso requer:
1. A contratação de mão-de-obra pela administração pública, através de Cooperativa, deverá ser realizada com parcimônia, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação, vedada para a realização de serviços que constituam atividade-fim da administração pública ou cujas funções sejam próprias de cargos integrantes do seu quadro de pessoal, em face do disposto no art. 37, II, da Constituição Federal.
2. A administração pública ao contratar serviços através de empresas ou cooperativas para atendimento de atribuições da atividade-meio deverá fazê-lo mediante procedimento licitatório, conforme arts. 37, inciso XXI, da Constituição Federal e 2° e 6° da Lei Federal nº 8.666/93, adotando os procedimentos desta. 3. Se a cooperativa não pagar os seus trabalhadores, poderá o Poder Público ser responsabilizado, nos termos da legislação vigente, uma vez que está garantida a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços no caso de inadimplemento da empresa interposta.
Os Prejulgados colacionados na transcrição dão conta da possibilidade de se contratar cooperativa para atividades-meio.
Quanto ao serviço de limpeza ser considerado atividade-meio, o Parecer COG-750/08, nos autos REC - 05/00995745, ao tratar da aplicação do art. 18§ 1º, da LC 101/00, afirmou:
Porém, em se tratando de terceirização do serviço de limpeza - que é atividade-meio -, à luz de pronunciamentos doutrinários sobre o dispositivo legal, a despesa correspondente não precisa ser contabilizada no percentual de gastos com pessoal: (grifo nosso)
Em outro parecer (COG-341/07 - CON - 07/00090827), deixou-se consignado o seguinte:
São exemplos doutrinários clássicos da atividade-meio os serviços ou atividades administrativas internas tais como limpeza, vigilância e digitação, evitando, assim, que a administração crie cargos e/ou estruturas burocráticas para atendimento de objetivos que não estejam adstritos às finalidades institucionais do ente, permitindo-se, não raro, a intervenção de terceiros com base em técnicas mais eficientes e menos onerosas (prestadores de serviço e fornecedores de mão-de-obra). (grifo nosso)
Portanto, tanto a contratação de cooperativa é possível quanto a terceirização de atividade-meio (limpeza), fazendo com que, em análise recursal, recomende-se pelo cancelamento das multas aplicadas nos itens 6.2.1.2. e 6.2.2.2. do Acórdão 1980/2004 (fls. 2927/2929-TCE).
Conjugando-se este parecer com o COG-318/08 (fls. 14/24), propõe-se a seguinte conclusão:
Ante o exposto, sugere-se ao Relator a seguinte proposta de decisão:
6.1. Conhecer da Reconsideração interposta contra o Acórdão 1980/2004, de 3/11/04, proferido nos autos TCE 01/04499818, e, no mérito, dar provimento para cancelar o débito do item 6.1 e as multas do item 6.2.
6.2. Dar ciência desta decisão, do Voto do Relator e Parecer que a fundamenta ao representante, aos recorrentes e ao Município de Brusque.
Consultor Geral 2
MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. Contrato Administrativo e as Cooperativas. Artigo. ILC - Informativo de Licitações e Contratos. Ano X, nº 109, Março 2003, p. 224. 3
AMARAL, Líris Silvia Zoega T. do. Cooperativa de trabalho. Jus Navigandi, Teresina, a. 6, n. 58, ago. 2002. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3138>. Acesso em: 02 fev. 2004. 4
PAMPLONA FILHO, Rodolfo M. V.. Cooperativismo e Direito do Trabalho. Jus Navigandi, Teresina, a. 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=2082>. Acesso em: 02 fev. 2004. 5
Lei 8.666/93. Art. 71. (...).
§ 1º. A inadimplência do contratado com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 28.04.1995)
Os procedimentos legais a serem tomados pelo município para a contratação de terceiros, para a realização de obras, a prestação de serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações da administração pública, serão necessariamente, os previstos na Lei Federal nº 8.666/93, ou mediante concurso público, conforme o caso, nos termos do artigo 37, incisos II e XXI, da Constituição Federal.
Se a cooperativa não pagar os seus trabalhadores, poderá o município ser responsabilizado, nos termos da legislação vigente, uma vez que está garantida a responsabilidade subsidiaria do tomador de serviços no caso de inadimplemento de empresa interposta. A não observância das características que distinguem as cooperativas das demais sociedades, enseja fraude à lei, devendo esta ser considerada mera intermediadora de mão-de-obra, fazendo emergir, inclusive, a existência do vínculo empregatício com o município.
A administração municipal ao contratar serviços através de empresas ou cooperativas para atendimento de atribuições da atividade-meio deverá fazê-lo mediante procedimento licitatório, conforme arts. 37, inciso XXI, da Constituição Federal e 2° e 6° da Lei Federal nº 8.666/93, adotando os procedimentos desta.
Se a cooperativa não pagar os seus trabalhadores, poderá o Município ser responsabilizado, nos termos da legislação vigente, uma vez que está garantida a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços no caso de inadimplemento da empresa interposta.
Caso o contrato com a Cooperativa seja de fornecimento, ficará adstrito à vigência dos respectivos créditos orçamentários, nos termos do caput do art. 57 da Lei n. 8.666/93, devendo ser efetuado novo procedimento licitatório e firmado novo contrato para o exercício seguinte.
Se o contrato for de natureza continuada, poderá ter o prazo máximo de 60 (sessenta) meses (art. 57, II, da Lei Federal nº 8.666/93). Findo este prazo, deverá ser efetuado novo procedimento licitatório e firmado novo contrato.
Este tipo de contrato também deve estar adstrito ao exercício financeiro. Assim, se um contrato de serviços continuados for formalizado em agosto, este estará financeiramente válido até dezembro, quando deverá ser renovado para o próximo exercício financeiro.
IV. CONCLUSÃO
COG, em de de 2008
HAMILTON HOBUS HOEMKE
Coordenador de Recursos
DE ACORDO.
À consideração do Exmo. Sr. Conselheiro WILSON ROGÉRIO WAN-DALL, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
COG, em de de 2008
MARCELO BROGNOLI DA COSTA
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PAMPLONA FILHO, Rodolfo M. V. Cooperativismo e Direito do Trabalho. Jus Navigandi, Teresina, a. 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=2082>. Acesso em: 02 fev. 2004.