ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

Gabinete do Auditor Adircélio de Moraes Ferreira Junior

PROCESSO Nº

REC nº 04/05200307

UNIDADE

Companhia de Desenvolvimento e Urbanização de Joinville - CONURB

RESPONSÁVEL

Romualdo Theophanes de França Júnior, Ex-Diretor-Presidente

ASSUNTO

Recurso de Reconsideração no processo nº TCE- 03/02746137

 

 

Preliminar. Impropriedade na identificação do responsável.

Via de regra, o Responsável perante esta Corte de Contas é o ordenador da despesa, em consonância com o art. 133 da Resolução TC-06/01.

 

Preliminar. Grave infração.

No que se refere à expressão “grave infração” é o art. 70, II, da LC (estadual) nº 202/00, auto-aplicável, porquanto a interpretação coerente, dentro do campo de maleabilidade da norma destacada, configura-se legal.

 

Horas-extras acima do limite legal. Eficiência, eficácia e economicidade da gestão administrativa. Natureza operacional. Competência do Tribunal de Contas.

A realização de horas-extras com habitualidade e acima do limite definido em lei (arts. 59 e 61da CLT) vai de encontro à regular eficiência, eficácia e economicidade na gestão administrativa, sendo englobada pelo conceito de natureza operacional, assim, adstrita ao controle desta Corte de Contas.

 

Sociedade de economia mista. Abono mensal. Concessão. Diretor-Presidente. Decisão colegiada.

Tendo o Diretor-Presidente de Sociedade de Economia Mista cumprido decisão colegiada quando da concessão de abono mensal para os funcionários, na posição de mero executor, em consonância com os termos dispostos no Estatuto Social da Companhia, não pode a responsabilização recair sobre a sua pessoa.

 

 

 

 

 

1 RELATÓRIO

 

Tratam os autos do Recurso de Reconsideração, conforme prescrito no art. 77 da LC (estadual) nº 202/00, interposto pelo Sr. Romualdo Theophanes de França Júnior, Ex-Diretor-Presidente da Companhia de Desenvolvimento e Urbanização de Joinville - CONURB, em face do Acórdão de nº 1064, da sessão ordinária de 21/06/04, em que atuou como Relator o Exmo Sr. Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall, proferido nos autos do processo nº TCE 03/02746137, o qual decidiu por julgar irregulares as contas em análise, com imputação de débito, com fulcro no art. 18, III, alínea "c" da LC (estadual) nº 202/00, e aplicou ao Recorrente multa prevista no art. 70, inciso II, da LC (estadual) nº 202/00; cita-se:

 

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

 

6.1. Julgar irregulares, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, inciso III, alínea “c”, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, que trata de irregularidades constatadas quando da auditoria ordinária realizada na Companhia de Desenvolvimento e Urbanização de Joinville - CONURB, com abrangência sobre atos de pessoal referentes ao exercício de 2001, e condenar o Responsável – Sr. Romualdo Theophanes de França Júnior - ex-Diretor-Presidente daquela entidade, ao pagamento da quantia de R$ 62.400,00 (sessenta e dois mil e quatrocentos reais), referente a despesas com pagamento de abono mensal, caracterizando ato de liberalidade do Administrador da Companhia vedado no art. 154 da Lei Federal n. 6.404/76 e ofensa aos princípios da legalidade e da economicidade insculpidos nos art. 37, caput, e 70 da Constituição Federal, conforme apontado no item 3 do Relatório DCE, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar, perante este Tribunal, o recolhimento do valor do débito aos cofres da CONURB, atualizado monetariamente e acrescido dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir da data da ocorrência do fato gerador do débito, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II, da Lei Complementar n. 202/2000).

 

6.2. Aplicar ao Sr. Romualdo Theophanes de França Júnior - ex-Diretor-Presidente da CONURB, com fundamento nos arts. 70, II, da Lei Complementar n. 202/00 e 109, II, c/c o 307, V, do Regimento Interno instituído pela Resolução n. TC-06/2001, a multa no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), com base nos limites previstos no art. 239, III, do Regimento Interno (Resolução n. TC-11/1991) vigente à época da ocorrência da irregularidade, em face da execução, por empregados, de horas extraordinárias acima do permitido legalmente, com habitualidade, sem necessidade imperiosa, em desacordo com os arts. 59 e 61 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, conforme exposto no item 2 do Relatório DCE, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado da multa cominada, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000.

 

6.3. Recomendar à Companhia de Desenvolvimento e Urbanização de Joinville - CONURB que:

 

6.3.1. o plano de cargos e salários da empresa receba a devida apreciação e aprovação pela Câmara Municipal de Joinville em forma de lei, como meio de dar sustentação jurídica para os cargos a serem ocupados pelos futuros e atuais empregados, e em atendimento ao princípio da publicidade e moralidade;

 

6.3.2. quando da realização de concurso público, atente para as disposições do art. 37, caput, da Constituição Federal (princípio da publicidade);

 

6.3.3. proceda à formalização da disposição de seus funcionários cedidos à Fundação Municipal de Joinville por meio de Portaria assinada pelo Diretor-Presidente da CONURB ou de ato de disposição assinado pelo Chefe do Poder Executivo, atendendo, desta forma, os ditames do art. 21 da Lei 3.923/99.

 

6.4. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório de Reinstrução DCE/Insp.4/Div.12 n. 66/2004, à Companhia de Desenvolvimento e Urbanização de Joinville - CONURB e ao Sr. Romualdo Theophanes de França Júnior - ex-Diretor-Presidente daquela entidade.

 

Em suas alegações recursais (fls. 03-21), o Recorrente manifesta-se, em preliminar, em relação à impropriedade na identificação do responsável e quanto à auto-aplicabilidade do inciso II do art. 70 da Lei Complementar nº 202/00. No mérito, pondera acerca da exigência de autorização legal para a concessão do discutido abono, tendo em vista tratar-se de Sociedade de Economia Mista. Também, que “o Município de Joinville atribuiu à Secretaria de Desenvolvimento e Integração Regional atribuição semelhante à do CPF, em relação à CONURB, como consta da Lei Municipal n. 3.496/97 (art. 4º, III)”. E, ainda, que os dispositivos dados como infringidos não estão englobados pelo inciso II do art. 70 da Lei Complementar nº 202/00, porquanto constantes da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT. Por fim, justifica que o pagamento de horas-extras acima do limite legal se deu por defasagem no quadro de pessoal.

Encaminhado os autos à Consultoria Geral, esta emitiu o Parecer nº COG-310/08 (fls. 68-105), ocasião em que concluiu pelo conhecimento do recurso e, no mérito, conceder-lhe provimento parcial.

Concluída a análise jurídica, seguiram os autos ao Ministério Público Especial, o qual se manifestou através do Parecer nº 4170/MPTC/08, de fls. 106-108, da lavra do Exmo. Sr. Procurador Márcio de Souza Rosa, que entendeu por conhecer do Recurso para no mérito dar-lhe provimento. Nesse sentido, posicionou-se por cancelar tanto o débito, quanto a multa imposta – esta em razão do dispositivo dado como infringido não estar caracterizado como norma de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional ou patrimonial.

Por meio de despacho, o Exmo. Sr. Conselheiro Relator César Filomeno Fontes deu-se por impedido, tendo em vista sua atuação anterior no presente processo como membro do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas (fls. 109-110).

Seguindo a sua tramitação regular, vieram os autos para manifestação deste Relator.

Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, passa-se à análise do mérito.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

2 FUNDAMENTAÇÃO

 

2.1 DAS QUESTÕES PRELIMINARES SUSCITADAS PELO RECORRENTE

 

2.1.1 IMPROPRIEDADE NA IDENTIFICAÇÃO DO RESPONSÁVEL

 

 No que se refere à responsabilidade, não há dúvidas de que o Sr. Romualdo Theophanes de França Júnior - Diretor Presidente da Companhia de Desenvolvimento e Urbanização de Joinville - CONURB na época dos fatos, é a parte apropriada para figurar na presente demanda, adequando-se perfeitamente ao conceituado na alínea “a” do §1º do art. 133 da Resolução TC-06/01:

 

Art. 133. Em todas as etapas do processo de julgamento de contas, de apreciação de atos sujeitos a registro e de fiscalização de atos e contratos será assegurada aos responsáveis ou interessados ampla defesa.

 

§1º Para efeito do disposto no caput, considera-se:

 

a) responsável aquele que figure no processo em razão da utilização, arrecadação, guarda, gerenciamento ou administração de dinheiro, bens e valores públicos, ou pelos quais o Estado ou o Município responda, ou que, em nome destes assuma obrigações de natureza pecuniária, ou por ter dado causa a perda, extravio, ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário. (grifo nosso)

 

Em conformidade com o observado pela Consultoria Geral, o Responsável perante esta Corte de Contas é o ordenador da despesa, ou seja, o Diretor-Presidente.

Como forma de comprovação, dever-se-ia elaborar (e juntar ao processo) um ato oficial de delegação. Acerca do tópico, contempla-se a doutrina de Hélio Saul Mileski - O controle da gestão pública. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. p.123:

 

Delegação de Poderes é a forma legal e regular de proceder à identificação da figura do ordenador de despesa derivado. Conforme o disposto nos arts. 11 e 12 do Dec.-lei 200/67, a delegação de competência deve ser utilizada como instrumento de descentralização administrativa, com o objetivo de assegurar maior rapidez e objetividade às decisões, situando-as na proximidade dos fatos, pessoas problemas a resolver, com o ato de delegação indicando com precisão a autoridade delegante, a autoridade delegada e as atribuições do objeto de delegação. (grifo nosso)

 

Considera-se detalhe de extrema importância, porquanto, a Súmula 510[1] do Pretório Excelso é clara ao atribuir à autoridade delegada a responsabilidade pelo ato praticado.

De qualquer forma, como se trata de Sociedade de Economia Mista, o próprio Estatuto poderia prever outrem como ordenador. Nesse sentido, o já citado Hélio Saul Mileski esclarece (Op. Cit., p. 122-123):

 

Partindo da conceituação legal de ordenador de despesa, consoante os aspectos referidos no item anterior, em que se inclui a especial circunstância do agente subordinado que exorbita das ordens recebidas, pode-se dizer que existem duas categorias de ordenador de despesa: o originário e o derivado.

 

Ordenador de despesa originário ou principal é a autoridade administrativa que possui poderes e competência, com origem na lei e regulamento, para ordenar as despesas orçamentárias alocadas para o Poder, órgão ou entidade que dirige. Como se trata da autoridade principal, cujas competências e atribuições se originam da lei, o seu poder ordenatório é originário, cujo exercício cabe tão somente a ele.

 

Ostentam a condição de Ordenadores de Despesa originários os Presidentes dos Poderes Legislativo e Judiciário; os Ministros e Secretários de Estado, assim como os dirigentes de autarquias, fundações, sociedades de economia mista e empresas públicas, por possuírem competências e atribuições fixadas em lei, regulamentos ou estatutos societários, para administrarem estas organizações estatais, aplicando os recursos financeiros postos a sua disposição. - (grifo nosso)

 

Consoante exposto alhures, o Responsável pelas penalidades aplicadas continua a ser o indicado originalmente no processo.

 

 

 

2.1.2 DA QUESTÃO RELATIVA AO ART. 70, II DA LC (ESTADUAL) N. 202/00: O DISPOSITIVO NÃO SERIA AUTO-APLICÁVEL

 

A preliminar em análise diz respeito ao teor do art. 70, inciso II, da LC (estadual) nº 202/00[2], e art. 109, inciso II, da Resolução TC-06/01[3].

Dessa feita, no que se refere à ausência de regulamentação do texto legal em destaque (art. 70, inciso II, da LC (estadual) nº 202/00), há que se mencionar entendimento elaborado pela Consultoria Geral, de autoria da Auditora Fiscal de Controle Externo Anne Christine Brasil Costa que esclarece o apontado - REC - 06/00464490, no Parecer COG-609/06:

 

EMENTA.  Recurso de Reexame. Verificação cumprimento Lei Responsabilidade Fiscal. Relatórios Resumidos de Execução Orçamentária e de Gestão Fiscal. Aplicação de Multa por descumprimento ao art. 71 da LRF. Argüição de Preliminar. Ausência de defesa quanto ao mérito. Conhecer e negar provimento.

 

O artigo 70, II, da LC-202/00 tem aplicação imediata.  A “grave infração” possui um conceito jurídico indeterminado de natureza discricionária que atribui ao seu intérprete e aplicador uma livre discrição, dentro dos parâmetros da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade, valendo a sua valoração subjetiva para o seu preenchimento.

 

Também, salienta-se o Parecer COG-73/06, da mesma autoria - Processo n. REC - 03/06208563, Acórdão n. 997/06:

 

EMENTA.  Recurso de Reconsideração. Tomada de Contas especial. Imputação de débito e multas. Conhecer e Dar Provimento Parcial.

“(...)

b) grave infração - conceito jurídico indeterminado de natureza discricionária que atribui ao seu intérprete e aplicador uma livre discrição, dentro dos parâmetros da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade, valendo a sua valoração subjetiva para o seu preenchimento. Neste sentido, grave infração decorrerá sempre da prática de comportamento típico (se a conduta do fiscalizado adequou-se àquele descrito na norma administrativa), antijurídico (se a conduta ocasionou afronta ao ordenamento) e voluntário (se ocorreu a prévia e consciente opção pela prática ou não do comportamento censurado), que cause um dano, patrimonial ou extra patrimonial, a um bem juridicamente tutelado, que frente aos princípios jurídicos, à probidade administrativa e ao interesse público impeçam que o aplicador da norma sancionadora apresente outra resposta ao fato que não seja a cominação de uma sanção ou a imputação de um débito (...)” (Informação COG n. 0172/05 - Processo n. REC-04/01498034)

 

Os excertos acima transcritos são claros ao abordar a tese em comento, e a atuação coerente, que busca obediência às disposições legais, configura-se legal e, com efeito, dentro do campo de maleabilidade da norma destacada.

Nesse norte, o argumento em análise não procede.

 

2.2 DAS QUESTÕES DE MÉRITO SUSCITADAS PELO RECORRENTE

 

2.2.1 DA IMPUTAÇÃO DE DÉBITO

 

A contenda em análise cinge-se à concessão (pagamento) de abono mensal para todos os funcionários da Companhia (R$ 100,00 - cem reais por funcionário) com a ausência de prévia autorização da Câmara Municipal, ou ato expedido pelo Prefeito, para legalizar o gasto. Foram dados como infringidos os seguintes dispositivos: caput do art. 37 da CF/88[4], caput do art. 70 da CF/88[5] e caput e alínea “a” do §2º do art. 154 da Lei nº 6.404/76[6].

Analisa-se.

Ab initio, reporta-se ao Parecer elaborado pela Consultoria Geral ao destacar a competência das Cortes de Contas para fiscalizar as Sociedades de Economia Mista (art. 70 da CF/88) - em que o acionista majoritário é a Administração Pública.  

O caráter híbrido das Sociedades de Economia Mista também foi salientado, que, por se sujeitarem ao regime da iniciativa privada (Lei n. 6.404/76 - Lei das Sociedades por Ações), no ponto que concerne ao regime trabalhista (art. 173, §1º, da CF/88)[7], podem instituir a vantagem laboral que acharem necessária, não se exigindo Lei específica para isso. No entanto, aponta-se a necessária observância da legislação vigente pelas sociedades de economia mista, mesmo no caso de exercício de atividade econômica[8].

Nesse sentido, observa-se o texto do art. 169 da CF/88, o qual pontua os requisitos necessários para a concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração; ipsis litteris:

 

Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

 

§ 1º A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas: (Renumerado do parágrafo único, pela Emenda Constitucional n 19, de 1998)

 

I - se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes; (Incluído pela Emenda Constitucional n 19, de 1998)

 

II - se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista. (Incluído pela Emenda Constitucional n 19, de 1998)

 

[...] - (grifo nosso)

 

 

Em conformidade com o raciocínio acima realizado, não é necessária autorização legislativa específica. Entretanto, denota-se indispensável a prévia dotação orçamentária. 

A legislação estadual reclama o acompanhamento do Conselho de Política Financeira (CPF) como forma de suprir a determinação de prévia dotação orçamentária. O Parecer COG nº 353/03, de autoria do Auditor Fiscal de Controle Externo Enio Luiz Alpini, esclarece a tese ao observar que "a única exigência constitucional refere-se à dotação orçamentária descrita no inciso I do § 1º do art. 169 da CF e tal é suprida através da autorização do CPF e da posterior homologação do Governador do Estado, chefe da despesa pública".

Na peça recursal, o Recorrente argumenta que "se fosse correto o raciocínio da Diretoria de Controle, quanto ao que disse sobre o CPF suprir o que determina a Constituição Federal, também deveria aplicar o mesmo à CONURB, haja vista a competência que a Lei 3496 delegou" (fls. 16). Do exame da legislação indicada, verifica-se que o raciocínio elaborado não prospera.

 

 

 

 

 

Inclui-se, neste momento, excerto do Parecer COG, de autoria da Auditora Fiscal de Controle Externo Karine de S. Zeferino Fonseca de Andrade, que menciona a inexistência de órgão similar ao CPF em Joinville – fls. 98 dos autos recursais:

Em verdade, ao se proceder à leitura da Lei (municipal) n. 3.496, percebe-se que inexiste no âmbito do município de Joinville um órgão similar ao Conselho de Política Financeira do Estado.

 

[...]

Obviamente, o dispositivo indicado não diz isso - somente aponta a necessidade da companhia observar tais limites em seu orçamento.

Tendo em vista o raciocínio realizado, a prévia dotação orçamentária, em consonância com o inciso I do §1º do art. 169 da CF/88, é medida necessária. Ainda assim, em relação ao exame do caso concreto, algumas observações não devem escapar da memória.

 

A Lei (municipal) nº 3.496, de 05/06/97, faz referência direta à CONURB e, ao realizar a previsão de que "a supervisão será exercida mediante as seguintes medidas: [...] III - fixação em níveis compatíveis com os critérios de ordem econômica, das despesas de pessoal e de administração", apenas salienta a necessidade da companhia observar tais limites em seu orçamento.

In casu, constata-se, primeiramente, que a concessão do abono se deu em benefício de todos os funcionários da Companhia (e não em proveito direto do Responsável).

Por sua vez, extrai-se do Relatório de n. 103/TCE/DCE/4ª Inspetoria4/Div.12/03 (fls. 24 dos autos originais), a seguinte afirmação: "através da Ata do Conselho de Administração (centésima vigésima primeira), de 06/04/2000, foi aprovado o pagamento de um abono salarial no valor de R$ 100,00 (cem reais) de forma linear, para todo quadro funcional, a partir de 1º de abril de 2000, por tempo indeterminado" (grifo nosso).

Trata-se, dessa feita, de situação em que a deliberação ocorreu de forma colegiada, em relação a qual o Diretor-Presidente estava diretamente vinculado (e, diga-se, obrigado a cumprir), nos termos dispostos pelo art. 34 do Estatuto Social da Companhia - fls. 18; senão vejamos:

 

Art. 34. Ao Diretor-Presidente, além das atribuições e responsabilidades próprias da qualidade de membro da Diretoria compete:

 

[...]

 

II - cumprir as normas de serviços oriundas da Assembléia Geral de Acionistas, do Conselho de Administração e da Diretoria; - (grifo nosso)

 

Por derradeiro, ainda que se considere a irregularidade da concessão do abono (de ordem orçamentária), não pode recair a responsabilidade sobre o Diretor-Presidente da Companhia.

           

Depreende-se, portanto, não ser o Recorrente (Diretor-Presidente da Companhia à época dos fatos) responsável por tal procedimento, porquanto foi o Conselho de Administração o Responsável pelo pagamento do indigitado abono, e o Diretor-Presidente, ora Recorrente, mero executor, em obediência ao Estatuto Social.

Determinante, portanto, para a fixação da responsabilidade, a questão do cumprimento da deliberação colegiada, fato que possui o condão de afastar o ônus total sobre o Recorrente.

Em suma, considerando as razões acima explanadas, insubsistente é a responsabilização contida no item 6.1 do acórdão recorrido.

 

2.2.2 DA APLICAÇÃO DE MULTA

 

A penalidade em comento trata da aplicação de multa em razão da violação dos arts. 59[9] e 61[10], da CLT, por conta do pagamento de horas-extras acima do limite definido em lei.

Transcreve-se o teor da análise elaborada pelo Órgão Consultivo nos presentes autos; senão vejamos – fls. 82-84:

 

Da análise dos autos, observa-se que o Recorrente não traz argumentação inédita (é semelhante à apresentada nos autos originais - fls. 58-59) que possa elidir a aplicação da multa por pagamento de horas-extras acima do limite definido em lei.

 

Cumpre destacar que se trata de Sociedade de Economia Mista, com personalidade jurídica de direito privado e que está sujeita aos ditames do inciso II, §1º, art.173, da CF/88. Segundo este dispositivo legal, no que se refere aos direitos trabalhistas, deve-se aplicar a Consolidação da Legislação Trabalhista - CLT (Decreto-Lei n. 5.452, de 1º/05/43).

 

[...]

 

A CLT, em seu art. 58 determina que "a duração normal do trabalho, para os empregados em qualquer atividade privada, não excederá a 8 (oito) horas diárias, desde que não seja fixado expressamente outro limite" e, ainda, no caput do art. 59: "a duração normal do trabalho poderá ser acrescida de horas suplementares, em número não excedente de duas, mediante acordo escrito entre empregador e empregado, ou mediante contrato coletivo de trabalho".

 

Conforme se vislumbra, houve o pagamento excedente de horas-extras, além de duas horas diárias, violando o teor do caput do art. 59, da CLT.

 

No Recurso interposto, apenas se argumentou o fato da necessidade por falta de pessoal. No entanto, observa-se às fls. 21 dos autos originais que as horas-extras não foram concedidas de maneira extraordinária, e sim durante todo o decorrer do exercício de 2001, do que se denota habitualidade, inclusive, em contraponto ao estipulado pelo art. 61 da CLT:

 

[...] – (grifo nosso)

 

Destaca-se, ainda, o conteúdo do art. 61 da CLT:

 

Art. 61. Ocorrendo necessidade imperiosa, poderá a duração do trabalho exceder do limite legal ou convencionado, seja para fazer face a motivo de força maior, seja para atender à realização ou conclusão de serviços inadiáveis ou cuja inexecução possa acarretar prejuízo manifesto.

 

§ 1º O excesso, nos casos deste artigo, poderá ser exigido independentemente de acordo ou contrato coletivo e deverá ser comunicado, dentro de 10 (dez) dias, à autoridade competente em matéria de trabalho, ou, antes desse prazo, justificado no momento da fiscalização sem prejuízo dessa comunicação.

 

§ 2º Nos casos de excesso de horário por motivo de força maior, a remuneração da hora excedente não será inferior à da hora normal. Nos demais casos de excesso previstos neste artigo, a remuneração será, pelo menos, 25% (vinte e cinco por cento) superior à da hora normal, e o trabalho não poderá exceder de 12 (doze) horas, desde que a lei não fixe expressamente outro limite.

 

§ 3º Sempre que ocorrer interrupção do trabalho, resultante de causas acidentais, ou de força maior, que determinem a impossibilidade de sua realização, a duração do trabalho poderá ser prorrogada pelo tempo necessário até o máximo de 2 (duas) horas, durante o número de dias indispensáveis à recuperação do tempo perdido, desde que não exceda de 10 (dez) horas diárias, em período não superior a 45 (quarenta e cinco) dias por ano, sujeita essa recuperação à prévia autorização da autoridade competente. - (grifo nosso)

 

A respeito, salienta o Corpo Técnico às fls. 24:

 

Ou seja, os empregados da CONURB executam serviços além da hora normal, 180 horas/mês de trabalho, ou, a carga horária de cada cargo da Companhia, conforme o Plano de Cargos e Salários 2001 - 001/00, com habitualidade, em desacordo com o artigo 61 da CLT, ou seja, sem necessidade imperiosa.

 

Por outro lado, apontou o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, em seu Parecer nº 4170/MPTC/08 (fls. 106-108), que não há como considerar referidos dispositivos legais como normas de “natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial”, nos termos do inciso II do art. 70 da LC (estadual) nº 202/00.

No entanto, conforme se depreende, divergindo do Parquet, entendemos que a sistemática de realização de horas-extras e seu respectivo regramento encaixa-se no conceito de normas de natureza operacional, tendo em vista que tal postura traz reflexos diretos na operacionalização da Companhia, e, conseqüentemente, na eficiência, eficácia e economicidade da sua gestão administrativa.

Nesses termos, Saul Mileski comenta a função da fiscalização operacional – In: O controle da gestão pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 242:

 

A fiscalização operacional visa a avaliar o grau de cumprimento dos objetivos e metas previstos na lei orçamentária; determinar a eficiência (máximo de rendimento sem desperdício de gastos e tempo), a eficácia (realização de metas programadas) e a economicidade (operação ao menor custo possível) dos atos de gestão praticados; avaliar a eficácia do controle na administração dos recursos humanos, materiais e financeiros, identificando as áreas críticas na organização e funcionamento da Administração, com vistas a formular recomendações que possibilitem superar as observações mais significativas.

 

Assim, pela fiscalização operacional é possível ser alcançada uma avaliação sob o aspecto da produção, buscando uma melhora da relação custo-benefício, com direcionamento à identificação das causas que podem originar o baixo rendimento administrativo, no sentido de se evitar que ocorram ou permaneçam deficiências, mediante a formulação de recomendações apropriadas e tendentes à obtenção de melhorias no futuro funcionamento operativo da Administração.

 

A fiscalização operacional representa um estágio evolutivo no sistema de controle da atividade financeira do Estado, na medida em que, além de visar à preservação das finanças e do patrimônio público, passa também a ter o sentido do aperfeiçoamento das instituições administrativas, tendo em conta sua melhor produtividade, uma vez que busca avaliar a eficiência, a eficácia e a economicidade dos administradores [...]. – (grifo nosso)

 

Pode-se falar ainda no conceito de gestão antieconômica, porquanto se visualiza um claro desperdício do dinheiro público. A respeito cita-se, novamente, Saul Mileski – p. 250:

 

Todavia, a esses aspectos técnicos da economicidade devem-se juntar os de natureza jurídica. Na forma constitucional determinada – a fiscalização deve ser exercida com ênfase na legalidade, legitimidade e economicidade – há o estabelecimento de um sistema de controle que busca a eficiência da Administração. Significa dizer que a Administração tem o dever de ser eficiente na realização do interesse público, com o dinheiro arrecadado pelo povo sendo utilizado para o alcance do maior benefício pelo menor custo e para uma maior quantidade de cidadãos. – (grifo nosso)

 

Dito isso, posiciona-se pela manutenção da penalidade em destaque.

2.3 QUANTO ÀS RECOMENDAÇÕES REALIZADAS

 

Nos termos da análise efetuada pelo Órgão Consultivo, não cabe o exame de mérito das recomendações efetuadas, porquanto ausente o caráter impositivo das mesmas.

 

3 PROPOSTA DE VOTO

 

Considerando a manifestação da Consultoria Geral desta Corte, mediante Parecer nº COG-310/08, de fls. 68 a 105;

 

Considerando o que mais dos autos consta, VOTO no sentido de que o Egrégio Tribunal Pleno adote a decisão que ora submeto à sua apreciação:

 

3.1 Conhecer do Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 77, da LC (estadual) nº 202/2000, interposto pelo Sr. Romualdo Theophanes de França Júnior, contra o Acórdão nº 1064, exarado na Sessão Ordinária de 21/06/2004, nos autos do Processo nº TCE – 03/02746137 e, no mérito, dar-lhe provimento parcial para:

 

3.1.1 cancelar o débito constante do item 6.1 do acórdão recorrido, bem como alterar o item 6.2, os quais passam a ter a seguinte redação:

 

6.1 Julgar irregulares, sem imputação de débito, com fundamento no art. 18, III, alínea 'b', da Lei Complementar n. 202/00, as contas pertinentes a presente Tomada de Contas Especial, que trata de irregularidades constatadas quando da auditoria ordinária realizada na Companhia de Desenvolvimento e Urbanização de Joinville - CONURB, com abrangência sobre atos de pessoal referentes ao exercício de 2001.

 

6.2 Aplicar ao Sr. Romualdo Theophanes de França Júnior - ex-Diretor-Presidente da CONURB, com fundamento nos arts. 69, da Lei Complementar n. 202/00 e 108, parágrafo único, c/c o 307, V, do Regimento Interno instituído pela Resolução n. TC-06/2001, a multa no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), com base nos limites previstos no art. 239, I, do Regimento Interno (Resolução n. TC-11/1991) vigente à época da ocorrência da irregularidade, em face da execução, por empregados, de horas extraordinárias acima do permitido legalmente, com habitualidade, sem necessidade imperiosa, em desacordo com os arts. 59 e 61 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, conforme exposto no item 2 do Relatório DCE, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado da multa cominada, ou interpor recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000.

 

3.1.2 ratificar seus demais termos.

 

3.2 Dar Ciência deste Acórdão, bem como do Parecer e Voto que a fundamentam à Companhia de Desenvolvimento e Urbanização de Joinville - CONURB, e ao Sr. Romualdo Theophanes de França Júnior - Ex-Diretor-Presidente da CONURB.

 

Gabinete, em 30 de outubro de 2008.

 

 

 

 

Adircélio de Moraes Ferreira Junior

Auditor Relator

 

 

 

 

 



[1]Súmula 510 STF - Praticado o ato por autoridade, no exercício de competência delegada, contra ela cabe o Mandado de Segurança ou a medida judicial.

[2] Art. 70. O Tribunal poderá aplicar multa de até cinco mil reais aos responsáveis por:

[...]

II - ato praticado com grave infração a norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial;

 

[3] Art. 109. O Tribunal poderá aplicar multa de até cinco mil reais, observada a gradação baixo, aos responsáveis por:

[...]

II - ato praticado com grave infração à norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, no valor compreendido entre oito por cento e oitenta por cento do montante referido no caput deste artigo;

 

[4] Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

[...]

 

[5] Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.

Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária.

 

[6]Art. 154. O administrador deve exercer as atribuições que a lei e o estatuto lhe conferem para lograr os fins e no interesse da companhia, satisfeitas as exigências do bem público e da função social da empresa.

[...]

§ 2° É vedado ao administrador:

a) praticar ato de liberalidade à custa da companhia;

 

[7] Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

[...]

§1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, [...].

 

[8] Disciplina o art. 173, da CF/88, em seu §3º salienta que "a lei regulamentará as relações da empresa pública com o Estado e a sociedade"

[9] Art. 59 - A duração normal do trabalho poderá ser acrescida de horas suplementares, em número não excedente de 2 (duas), mediante acordo escrito entre empregador e empregado, ou mediante contrato coletivo de trabalho.

[...]

[10] Art. 61 - Ocorrendo necessidade imperiosa, poderá a duração do trabalho exceder do limite legal ou convencionado, seja para fazer face a motivo de força maior, seja para atender à realização ou conclusão de serviços inadiáveis ou cuja inexecução possa acarretar prejuízo manifesto.

§ 1º - O excesso, nos casos deste artigo, poderá ser exigido independentemente de acordo ou contrato coletivo e deverá ser comunicado, dentro de 10 (dez) dias, à autoridade competente em matéria de trabalho, ou, antes desse prazo, justificado no momento da fiscalização sem prejuízo dessa comunicação.

§ 2º - Nos casos de excesso de horário por motivo de força maior, a remuneração da hora excedente não será inferior à da hora normal. Nos demais casos de excesso previstos neste artigo, a remuneração será, pelo menos, 25% (vinte e cinco por cento) superior à da hora normal, e o trabalho não poderá exceder de 12 (doze) horas, desde que a lei não fixe expressamente outro limite.

§ 3º - Sempre que ocorrer interrupção do trabalho, resultante de causas acidentais, ou de força maior, que determinem a impossibilidade de sua realização, a duração do trabalho poderá ser prorrogada pelo tempo necessário até o máximo de 2 (duas) horas, durante o número de dias indispensáveis à recuperação do tempo perdido, desde que não exceda de 10 (dez) horas diárias, em período não superior a 45 (quarenta e cinco) dias por ano, sujeita essa recuperação à prévia autorização da autoridade competente.