TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINACORPO DE AUDITORESGabinete do Auditor Gerson dos Santos SiccaPCA 05/00885567
PROCESSO |
PCA - 05/00885567 |
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UNIDADE |
Câmara Municipal de WITMARSUM |
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INTERESSADO |
Sr. MOACIR POSSAMAI - Presidente da Câmara no exercício de 2007
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RESPONSÁVEIS |
Sr. VALQUÍRIO ANTÔNIO BERKENBROCK - Presidente da Câmara no exercício de 2004 (período de 01/01/04 a 05/08/04 e de 06/10/04 a 31/12/04) Sr. ANTÔNIO SEVEGNANI - Presidente da Câmara no exercício de 2004 (período de 06/08/04 a 05/10/04) |
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ASSUNTO |
Prestação de Contas do Presidente da Câmara de Vereadores referente ao exercício financeiro de 2004 |
Prestação de Contas de Administrador. Irregularidade. Aplicação de Multa e Recomendação.
Contratação de Assessoria jurídica. Situação excepcional ou de emergência. Inexistência. Burla ao concurso público.
Contabilidade da Câmara de Vereadores. Servidor ocupante de cargo comissionado no Executivo Municipal. Contrato de trabalho voluntário. Burla ao concurso público.
Ainda que não remunerado, ofende o art. 37, inciso II da CF/88 a contratação de contador que já ocupa cargo comissionado no Município, especialmente mais quando as funções desempenhadas possam ser conflitantes.
Obrigações de despesas contraídas nos dois últimos quadrimestres. Disponibilidade financeira. Insuficiência. Ofensa ao art. 42 da LC 101/2000. Pequeno valor
I - RELATÓRIO
Trata o processo da prestação de contas do Presidente da Câmara Municipal de Vereadores de Witmarsum referente ao exercício financeiro do ano de 2004.
A Diretoria de Controle dos Municípios DMU, realizando o exame da consistência dos documentos e informações encaminhadas pela unidade, bem como a verificação dos aspectos constitucionais e legais que norteiam a Administração Pública Municipal, produziu o Relatório n° 959/2006 no qual foi constatada a existência de irregularidades nas contas apresentadas.
Devidamente citados, os responsáveis, apresentaram alegações de defesa, na forma do artigo 17, II, do Regimento Interno deste Tribunal (Resolução TC - 06/2001).
Em nova manifestação (Relatório nº 372/2007, fls. 50/69), a DMU sugeriu julgar irregulares as contas da Câmara Municipal de Vereadores do ano de 2004 com aplicação de multa aos senhores VALQUÍRIO A. BERKENBROCK e ANTÔNIO SEVEGNANI, ambos ex-presidentes da instituição em períodos distintos.
Concluída a análise técnica, seguiram os autos ao Ministério Público Especial, o qual, manifestando-se através do Parecer de nº 6.894/2007 (fls. 71/93), apresentou seu entendimento convergindo ao expresso pela Instrução, mantendo a sugestão de aplicação de multa. O Parquet propôs, ainda, a imediata representação ao Ministério Público Estadual para fins penais ante o descumprimento do art. 42 da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Vieram os autos conclusos.
II PROPOSTA DE VOTO
II.1. Sobre as despesas no montante de R$ 7.150,00 decorrente da contratação de assessoria jurídica em descumprimento ao inciso II do art. 37 da Constituição Federal.
De acordo com os autos, a Câmara Municipal de Witmarsum realizou a contratação temporária do senhor Gilberto Betti, para a prestação de serviços de assessoria jurídica, no valor de R$ 7.150,00.
A Instrução, embasada no Prejulgado nº 923/2000 que anota que os serviços de consultoria jurídica de escopo genérico devem ser executados por servidores ocupantes de cargos de provimento efetivo, mediante concurso público, considerou irregular a situação.
Os responsáveis argumentaram a inexistência de cargo ou função no quadro de servidores da Câmara de Vereadores de Witmarsum, além do fato de que a indigitada contratação ocorreu em função da elaboração de uma minuta de atualização da Lei Orgânica e da realização do controle da legalidade e constitucionalidade dos atos praticados pelos Edis em relação aos projetos de lei.
Citaram o prejulgado nº1066 que reza:
"Não existindo quadro de servidores na Câmara Municipal, é admissível a contratação temporária de Assessor Jurídico até a organização do quadro próprio de pessoal, podendo ser através de procedimento licitatório, permitida a dispensa de licitação nas hipóteses e condições estabelecidas no artigo 24 da Lei Federal n.° 8666/93....".
No entanto, como bem salientou o Corpo Instrutivo e o Ministério Público Especial, a contratação temporária de assessor jurídico até a criação do cargo e respectivo provimento é aceitável para as Câmaras Municipais que estão iniciando sua autonomia financeira e que necessitam de um período para tomar as providências necessárias ao provimento dos cargos dos quais necessitam.
No caso da Câmara Municipal de Witmarsum que já possui autonomia financeira há vários anos, não há justificativas à burla ao concurso público. A Unidade fiscalizada já teve tempo mais do que razoável para verificar a necessidade de servidores em atividades permanentes, dentre os quais um assessor jurídico.
Assim, considerando que os serviços de assessoria jurídica são de natureza permanente e contínua, devendo ser executados por servidor efetivo com provimento mediante concurso público (art. 37, II, da Constituição Federal de 1988) entendo que a contratação ora discutida foi indevida.
Por derradeiro, registre-se que em virtude de haver dois Gestores Públicos que realizaram despesas com a contratação de assessoria jurídica em desacordo com o artigo 37, inciso II, da CF/88 (VALQUÍRIO ANTÔNIO BERKENBROCK - período de 01/01/04 a 05/08/04 e de 06/10/04 a 31/12/04 e ANTÔNIO SEVEGNANI - período de 06/08/04 a 05/10/04), a responsabilidade será proporcionalmente dividida conforme se demonstrará ao final.
II.2. Sobre a Prestação de serviços contábeis para a Câmara Municipal através de servidor ocupante de cargo comissionado, em possível descumprimento ao artigo 37, inciso II, da Constituição Federal.
Constatou o corpo instrutivo que a Câmara Municipal de Witmarsum possui sua contabilidade sob a responsabilidade do senhor Acácio Moser, servidor ocupante de cargo comissionado na Prefeitura Municipal, o que contraria o artigo 37, inciso II da CF/88, bem como o princípio da separação dos poderes.
Em suas alegações os responsáveis afirmaram que a necessidade de manutenção dos serviços básicos da Câmara de Vereadores e a inexistência de servidor concursado habilitado para o exercício da função de contador obrigaram a utilização dos serviços profissionais do Controlador Interno da Prefeitura do Município de Witmarsum profissional habilitado com inscrição no respectivo conselho de classe. De outro lado, argumentaram que o trabalho desenvolvido por esse servidor não onerou os cofres públicos, uma vez que se deu via adesão a contrato de trabalho voluntário regido pela Lei Federal 9.608/98.
Em que pese não ter sido verificada a acumulação remunerada de cargos, já que não houve dispêndio para pagamento dos serviços de contabilidade objeto do presente debate, não se deve perder de vista a irregularidade da contratação realizada.
Os serviços de contabilidade, conforme assinalado pela instrução e Ministério Público devem ser realizados por servidores legalmente habilitados, ocupantes de cargos de provimento efetivo, através de concurso público, por se tratarem de atividades de caráter administrativo permanente e contínuo (neste sentido o Prejulgado n° 1277/2002).
A atividade exercida pelo contador público não se coaduna com cargos de livre nomeação e exoneração nem, tampouco, a relação jurídica estabelecida entre o particular e o Poder Público deve dar-se via contrato de adesão ao trabalho voluntário.
Ademais, carece ser registrado que o Sr. Acácio Moser prestava serviços de contabilidade à Câmara Municipal e era ocupante de cargo em comissão na Prefeitura Municipal de responsável pelo controle interno do Município no exercício de 2004, o que também é inoportuno, visto que o mesmo executava e poderia controlar os seus próprios serviços - na medida em que o Controle Interno do Município pode avaliar as contas do Legislativo -, não respeitando, assim, um dos princípios básicos do controle interno que é a segregação de funções, princípio este de fundamental importância para a efetividade do referido controle. Não pode ser possível a realização de um efetivo controle das ações do Poder Legislativo na hipótese das funções de contador da Câmara Municipal e de responsável pelo Controle Interno do Município ser desempenhadas pela mesma pessoa.
Portanto, a prestação de serviços contábeis para a Câmara Municipal, ainda que não remunerado, através de servidor ocupante de cargo comissionado na Prefeitura Municipal, ofende o artigo 37, inciso II da CF/88.
No mais, conforme mencionado no Relatório n° 959/2006, a Câmara Municipal de Witmarsum já possui em seu quadro de pessoal o cargo efetivo de Técnico em Contabilidade que se encontra vago, restando à referida unidade somente providenciar as medidas necessárias para a realização do concurso público para o provimento do mesmo.
II.3. Sobre as obrigações de despesas liquidadas até 31 de dezembro de 2004, contraídas nos 2 (dois) últimos quadrimestres pelo Poder Legislativo sem disponibilidade financeira suficiente, no total de R$ 440,70, evidenciando descumprimento ao parágrafo único e caput do artigo 42 da Lei Complementar nº 101/2000 (LRF).
Foi verificado pela Instrução o valor de R$ 440,70 correspondente a obrigações de despesas liquidadas até 31 de dezembro de 2004, contraídas nos 2 (dois) últimos quadrimestres pelo Poder Legislativo sem disponibilidade financeira suficiente para pagamento.
O responsável em sua defesa alegou que a obrigação de despesa sem disponibilidade de caixa refere-se ao parcelamento de uma dívida junto ao INSS da qual são devedores a Câmara e a Prefeitura Municipal.
No entanto, conforme ponderou o corpo técnico deste Tribunal, a referida obrigação de despesa sem disponibilidade financeira refere-se à dívida flutuante e não à dívida fundada. Emerge dos autos (Anexo 17 Demonstrativo da Dívida Flutuante, fls. 21) que essa obrigação de despesa é referente ao INSS retido das folhas de pagamentos, e, deste modo, deveria ter sido paga integralmente dentro do exercício.
No último ano do período da gestão política não pode ser deixada obrigação de despesa para o próximo gestor sem disponibilidade financeira, conforme determina o artigo 42 da Lei Complementar 101/2000 (LRF):
"Art. 42. É vedado ao titular de Poder ou órgão referido no art. 20, nos últimos dois quadrimestres do seu mandato, contrair obrigação de despesa que não possa ser cumprida integralmente dentro dele, ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para este efeito.
Parágrafo único. Na determinação da disponibilidade de caixa serão considerados os encargos e despesas compromissadas a pagar até o final do exercício."
Diante do exposto e do conjunto probatório encontrado nos autos, verifica-se a ocorrência da irregularidade.
Com relação à representação ao Ministério Público Estadual sugerida pela nobre Procuradoria proponho o seu encaminhamento de acordo com art. 65, §5º da Lei Orgânica desta Corte.
Finalmente, a respeito da contabilização indevida de despesas com sessões extraordinárias - fato constatado pela instrução no relatório nº 956/2006 - o responsável justificou a ocorrência de um equívoco no momento da contabilização, alegando ainda que sobre os valores contabilizados em classificação imprópria não incidiram os encargos sociais. Assim, por ter existido um lapso de inversão de rúbrica, deve ser recomendado à Câmara Municipal de Witmarsun que passe a observar o disposto no Anexo III da Portaria Interministerial nº 163 de 04/05/2001.
Ante o exposto e estando os autos instruídos na forma Regimental, acolho totalmente o Relatório de Instrução pelos seus próprios e jurídicos termos e propondo a este egrégio Plenário a seguinte proposta de VOTO:
1 Julgar irregulares, sem imputação de débito, na forma do art. 18, III, alínea "b", c/c o art. 21, parágrafo único, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas anuais de 2004 referentes a atos de gestão da Câmara de Vereadores de Witmarsum, no que concerne ao Balanço Geral composto das Demonstrações de Resultados Gerais, na forma dos anexos e demonstrativos estabelecidos no art. 101 da Lei Federal n. 4.320/64, de acordo com os pareceres emitidos nos autos.
2 - Aplicar aos Responsáveis abaixo discriminados as multas a seguir especificadas, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovarem ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da Lei Complementar nº. 202/2000:
2.1 - Ao Sr. VALQUÍRIO ANTÔNIO BERKENBROCK - Presidente da Câmara no exercício de 2004 (período de 01/01/04 a 05/08/04 e de 06/10/04 a 31/12/04), CPF 382.493.409-49, residente à Rua Immo Zerna, n° 131, Centro, Witmarsum, CEP 89157-000, com fundamento no art. 70, inciso II da Lei Complementar nº 202/2000, as seguintes multas:
2.1.1 - R$ 600,00 (seiscentos reais), em razão de despesas no montante de R$ 5.850,00(cinco mil, oitocentos e cinqüenta reais) decorrentes da contratação de assessoria jurídica em descumprimento ao artigo 37, inciso II, da Constituição Federal de 1988;
2.1.2 - R$ 400,00 (quatrocentos reais), em razão da prestação de serviços contábeis para a Câmara Municipal, sem remuneração, por servidor ocupante de cargo comissionado na Prefeitura Municipal, em descumprimento ao artigo 37, inciso II, da Constituição Federal de 1988;
2.1.3 R$ 400,00 (quatrocentos reais) devido às obrigações de despesas liquidadas até 31 de dezembro de 2004, contraídas nos 2 (dois) últimos quadrimestres pelo Poder Legislativo sem disponibilidade financeira suficiente, no total de R$ 440,70(quatrocentos e quarenta reais e setenta centavos), evidenciando descumprimento ao parágrafo único e caput do artigo 42 da Lei Complementar nº 101/2000 (LRF).
2.2 - Ao Sr. ANTÔNIO SEVEGNANI - Presidente da Câmara no exercício de 2004 (período de 06/08/04 a 05/10/04), CPF 625.486.209-30, residente à Estrada Geral, s/n°, Bairro Gnadental, Witmarsum, CEP 89157-000, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar nº 202/2000, a multa no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais) em razão de despesas no montante de R$ 1.300,00(mil e trezentos reais), referentes a contratação de assessoria jurídica em descumprimento ao artigo 37, inciso II, da Constituição Federal de 1988.
3 - Recomendar à Câmara Municipal de WITMARSUM que:
3.1 - passe a observar o disposto no Anexo III da Portaria Interministerial n° 163 de 04/05/2001, quanto ao correto procedimento no que tange ao apurado no item 1.2 do Relatório de Reinstrução nº 372/2007 (fls. 50/69);
3.2 adote providências para criação e provimento de cargo efetivo de assessor jurídico mediante concurso público conforme o disposto no art. 37, inciso II da Constituição Federal.
4 Representar ao Ministério Público do Estado de Santa Catarina, após o trânsito em julgado, com vistas à adoção das medidas legais que entender necessárias em virtude das obrigações de despesas liquidadas até 31 de dezembro de 2004, contraídas nos 2 (dois) últimos quadrimestres pelo Poder Legislativo sem disponibilidade financeira suficiente, no total de R$ 440,70(quatrocentos e quarenta reais e setenta centavos), evidenciando descumprimento ao parágrafo único e caput do artigo 42 da Lei Complementar nº 101/2000 (LRF).
5 Dar ciência do Acórdão com remessa de cópia do Relatório de Reinstrução n.º 372/2007 e do Voto que o fundamentam aos responsáveis Srs. VALQUÍRIO ANTÔNIO BERKENBROCK - Presidente da Câmara no exercício de 2004 (período de 01/01/04 a 05/08/04 e de 06/10/04 a 31/12/04) e ANTÔNIO SEVEGNANI - Presidente da Câmara no exercício de 2004 (período de 06/08/04 a 05/10/04) e ao interessado Sr. MOACIR POSSAMAI atual Presidente da Câmara Municipal de Witmarsum.
Gabinete, em 11 de fevereiro de 2008.
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Gerson dos Santos Sicca
Auditor
Relator