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ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO |
Processo nº: |
REC-05/04110551 |
Unidade Gestora: |
Câmara Municipal de Ituporanga |
Responsável: |
Sr. Osni
Francisco de Fragas |
Assunto: |
Recurso de Reconsideração (art. 77 da LC 202/2000)
– PCA-04/01652130 |
Parecer nº: |
GC/WRW/2008/827/ES |
Balanço anual.
Inconsistência contábil.
A análise do Processo de Prestação
de Contas de Administrador-PCA é feita com base nos dados constantes do sistema
ACP e principalmente no exame do Balanço Anual da Unidade Gestora, o qual contém
o registro dos lançamentos contábeis, efetuados no decorrer do exercício
fiscalizado, nos moldes da Lei Federal n. 4.320/64.
Desta feita, ante a existência de
inconsistências nos citados lançamentos, há o comprometimento do próprio
Balanço, prejudicando diretamente a atividade fiscalizatória deste Tribunal,
além de evidenciar o descumprimento da legislação mencionada.
Câmara
Municipal. Serviços contábeis.
É cediço o entendimento desta Corte
de Contas acerca da impossibilidade de contratação de pessoa jurídica
(escritório de contabilidade) para prestar serviços contábeis à Câmara Municipal.
1. RELATÓRIO
Cuidam os autos de recurso interposto pelo Sr. Osni
Francisco Fragas, Presidente da Câmara Municipal de Ituporanga em 2003, em face
do Acórdão n. 1.454/2005, proferido nos autos n. PCA-04/01652130.
A Consultoria-Geral examinou a peça recursal e, através
do Parecer n. COG-658/08, entendeu que a mesma poderia ser conhecida. No que
tange à matéria de fundo, pronunciou-se pelo seu não-provimento.[1]
O Ministério Público, em parecer da lavra da
Procuradora Cibelly Farias, acompanhou o entendimento do órgão consultivo.[2]
Autos conclusos ao relator.
Este o necessário relatório.
2. DISCUSSÃO
Registro, inicialmente, que o acórdão recorrido foi
vazado nos seguintes moldes:
“6.1.
Julgar irregulares, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, III,
alínea "c", c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar n. 202/2000, as
contas anuais de 2003 referentes a atos de gestão da Câmara Municipal de
Ituporanga e condenar o Responsável – Sr. Osni Francisco de Fragas - Presidente
daquele Órgão em 2003, CPF n. 019.948.599-20, ao pagamento da quantia de R$ 498,00 (quatrocentos e noventa e oito
reais), referente despesas com jantar de confraternização alusivo ao Dia do
Vereador, constituindo-se em gastos sem caráter público e estranhos à
competência da Câmara, por conseguinte não abrangidos no conceito de dispêndios
próprios dos órgãos do Governo e da administração centralizada disposto no art.
4º c/c o art. 12 da Lei Federal n. 4.320/64 (item B.1.1 do Relatório DMU),
fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão
no Diário Oficial do Estado para comprovar, perante este Tribunal, o recolhimento
do valor do débito aos cofres do Município, atualizado monetariamente e
acrescido dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000),
calculados a partir da data da ocorrência do fato gerador do débito, sem o que,
fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial
(art. 43, II, do mesmo diploma legal).
6.2.
Aplicar ao Sr. Osni Francisco de Fragas - anteriormente qualificado, com
fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II,
do Regimento Interno, as multas abaixo relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30
(trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do
Estado, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das
multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da
dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da
Lei Complementar n. 202/2000:
6.2.1.
R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da conta suprimentos compor
indevidamente o Balanço Patrimonial (Realizável), com saldo de R$ 142.083,93,
em decorrência da incorreta contabilização da devolução de recursos ao Poder
Executivo, evidenciando inconsistência contábil, em desacordo ao disposto no
art. 85 da Lei Federal n. 4.320/64 (item A-1.1 do Relatório DMU);
6.2.2.
R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da conta "Depósitos de Diversas
Origens" no Passivo Financeiro, apresentando saldo no valor de R$
941.874,35, em razão da não-contabilização das prestações de contas efetuadas
junto ao Poder Executivo, evidenciar inconsistência contábil, em desacordo ao
disposto no art. 85 da Lei 4320/64 (item A-1.2 do Relatório DMU);
6.2.3.
R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face de despesas no montante de R$ 6.360,00
com a contratação de serviços profissionais de contabilidade, para execução de
atividades inerentes às funções de ocupante de cargo público, provido mediante
prévia seleção por concurso público, caracterizando descumprimento ao disposto
no art. 37, II, da Constituição Federal (item B-1.2 do Relatório DMU).
6.3.
Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam,
bem como do Relatório DMU n. 718/2005, à Câmara Municipal de Ituporanga e ao
Sr. Osni Francisco de Fragas - Presidente daquele Órgão em 2003.”
No que concerne à imputação de débito, constante do
item 6.1, o Recorrente assim se pronunciou:
“Em
que pese o entendimento apontando como irregular o pagamento de jantar aos
Vereadores, na data comemorativa ao seu dia, entendemos que esta despesa não é
estranha aos serviços da Câmara Municipal.
Não
resta dúvida de que a realização de reiteradas confraternizações pagas com
dinheiro público é absolutamente reprovável, estranho aos serviços da Câmara
Municipal, entretanto, um único jantar, em data festiva, alusiva ao dia do Vereador
e pago apenas para os nobres edis revela-se uma prática aceitável e legítima.
A
contabilização dessa despesa revela idoneidade do agente responsável pela
ordenação da despesa, pois agiu com honestidade, não admitindo que a despesa
fosse faturada com outra descrição que não despertasse suspeita. Agiu com
idoneidade, realizando uma despesa muito pequena para marcar a passagem do dia
do vereador [...].”[3]
Anoto que este Tribunal editou o Prejulgado n. 491 que
admite o pagamento de jantares para autoridades:
“É
facultado à Câmara de Vereadores, observado o disposto na Lei Orgânica do
Município, cumpridas as normas prescritas na Lei Federal nº 8.666/93 e
atendidos os pressupostos da despesa pública:
a) proceder à divulgação dos seus trabalhos de Plenário ou de Comissões,
podendo para isso contratar agências de publicidade;
b) adquirir passagens de transporte coletivo urbano – blocos de passes para uso
de seus servidores, quando em deslocamento a serviço;
c) adquirir medicamentos para uso em serviço por servidores e vereadores;
d) realizar despesa com coroas de flores, para fins de prestar homenagem
póstuma a autoridade e pessoas ilustres;
e) efetuar despesas com recepções,
almoços e jantares, restritas à autoridades, comitiva da autoridade visitante e
ao grupo de autoridade visitante e ao grupo de autoridades que compõem o comitê
de recepção; [...]”
Considerando que o jantar, custeado pela Câmara, teve
por motivo a comemoração do Dia do Vereador; que foi destinado somente aos Edis
e ainda que o valor não é exorbitante, divirjo do órgão consultivo e do
Ministério Público para cancelar o débito em questão.
Todavia, acolhendo a sugestão do Conselheiro Salomão
Ribas Júnior, durante a discussão dos presentes autos, a despeito de me
posicionar pelo cancelamento do débito na situação em tela, formulo
recomendação à Câmara de Vereadores de Ituporanga, para que as despesas em
questão não sejam mais custeadas pelos cofres públicos.
Em relação às irregularidades referentes aos itens
6.2.1 e 6.2.2, o Recorrente aduziu, em síntese, o seguinte:
“[...] o TCE não levou em
consideração que, na atualidade, os lançamentos contábeis ora apontados como
restrições, são efetuados pelo sistema de contabilidade, onde os seus usuários
nem sabem de que maneira estavam sendo feitos, uma vez que os lançamentos são
efetuados através de parametrizações.
Atualmente as parametrizações do
sistema de informática já foram corrigidas pela Empresa IPM Informática, de
forma que os lançamentos foram todos corrigidos, conforme já encaminhado ao
TCE.
Vejamos que até os Sistemas de
Informática ACP e E-Sfinge apresentam erros e são solucionadas as suas
correções. A Câmara de Vereadores quando da ocorrência solicitou à empresa
responsável pelo sistema de contabilidade, mas não houve resposta imediata,
sendo que continuou a contabilizar para cumprir os prazos legais para entrega
de balanços anuais e publicações dos relatórios.
[...]
No caso dos autos ficou plenamente
demonstrado que os recursos foram corretamente devolvidos ao Poder Executivo,
havendo irregularidade apenas quanto à forma de lançamento dessa devolução, que
deveria ter sido lançada como débito à conta ‘suprimentos recebidos’. Portanto,
o erro do sistema de informática não comprometeu a regularidade contábil da
Câmara Municipal, de forma que a irregularidade, apesar de ter ocorrido, não
pode ser considerada grave, a ponto de justificar a imposição da penalidade de
multa.
A multa aplicada com base no item
1.2 do relatório n. 718/2005 da DMU, igualmente não satisfaz o requisito de gravidade
da infração, requerida pelo inciso II do art. 70 do Regimento Interno do
Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, visto que o próprio relatório
admite que, os esclarecimentos apresentados foram suficientes para
descaracterizar a restrição apontada inicialmente. [...]”
A
Consultoria-Geral afastou a argumentação do Recorrente, valendo-se dos
seguintes fundamentos:
“Os itens 6.2.1 e 6.2.2 impuseram
multas ao Recorrente por ofensa ao art. 85 da Lei nº 4.320/64, diante da
incorreta contabilização da devolução de recursos ao Poder Executivo e da
não-contabilização das prestações de contas efetuadas junto ao Poder Executivo,
fatos que evidenciam inconsistência contábil.
Em sede recursal, é suscitada a tese
de que os lançamentos contábeis são feitos através de parametrizações, e que os
erros do sistema já foram corrigidos. Aduz ainda que os fatos que ensejaram a
aplicação das multas não configuram grave infração à norma legal.
O argumento de que os fatos
apontados não configuram grave infração à norma legal não devem prosperar.
A multa foi aplicada com fundamento
no art. 70, II, da LC 202/2000 c/c o art. 85 da Lei nº 4.320/65, que trata das
normas gerais de direito financeiro.
Art. 70. O Tribunal poderá aplicar
multa de até cinco mil reais aos responsáveis por:
II –
ato praticado com grave infração a norma legal ou regulamentar de
natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e
patrimonial;
Art. 85. Os serviços de
contabilidade serão organizados de forma a permitirem o acompanhamento da
execução orçamentária, o conhecimento da composição patrimonial, a determinação
dos custos dos serviços industriais, o levantamento dos balanços gerais, a
análise e a interpretação dos resultados econômicos e financeiros.
No caso, a questão relativa à definição
de "grave infração" já foi objeto de análise pelo Parecer COG-951/07,
autos do processo nº REC - 07/00531890, onde foi superada a preliminar de
inaplicabilidade do art. 70, II, da LC 202/2000, e reconhecido o exercício de
poder discricionário na aplicação das sanções com amparo nesse dispositivo.
ADMINISTRATIVO. ART. 70, II, LC Nº
202/2000. APLICABILIDADE IMEDIATA.
PRELIMINAR REJEITADA.
‘O artigo 70, II, da LC-202/00 tem
aplicação imediata. A “grave infração”
possui um conceito jurídico indeterminado de natureza discricionária que
atribui ao seu intérprete e aplicador uma livre discrição, dentro dos
parâmetros da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade, valendo a sua
valoração subjetiva para o seu preenchimento’. (Parecer COG-609/06)
Observa-se que o entendimento
consubstanciado neste Parecer foi acatado pelo Tribunal Pleno desta Corte de
Contas através do Acórdão nº 1313/2008, em sessão realizada em 18 de agosto de
2008.
Portanto, exercida a
discricionariedade do Pleno sobre a valoração da conduta do Recorrente, não
cabe a esta Consultoria Geral empreender o exame crítico desse aspecto do
Acórdão.
Sobre a alegação dos lançamentos
serem feitos por parametrizações, trata-se de matéria já enfrentada e rechaçada
pela Equipe de Auditoria e pelo Tribunal Pleno, sem que fosse apresentada
qualquer prova nova capaz de afastar a restrição.
Dessa forma, subsiste a higidez
jurídica da síntese consubstanciada no item sob exame.”[4]
Constato
que as multas aplicadas ao Recorrente surgiram de irregularidades constatadas
em Processo de Prestação de Contas de Administrador –PCA.
A
análise das informações constantes do mencionado processo é feita com base nos
dados do sistema ACP e principalmente no exame do Balanço Anual da Unidade
Gestora, que contém o registro dos lançamentos contábeis efetuados no decorrer
do exercício fiscalizado, que deve observar o preceituado na Lei Federal n.
4.320/64.
Desta
feita, ante a existência de inconsistências nos citados lançamentos há
comprometimento do próprio Balanço, além de prejudicar o exame e fiscalização efetuados
por este Tribunal.
Anoto,
por oportuno, que o Corpo Instrutivo registrou que as duas irregularidades já
foram objeto de apontamento no exercício anterior (2002)[5],
razão pela qual acompanho o entendimento da Consultoria, para manter as multas
aplicadas ao Recorrente.
No tocante à irregularidade do item 6.2.3,
relativa à contratação de escritório de contabilidade para prestação de
serviços à Câmara, o Recorrente argüiu, em suma, que:
“[...] a criação e definição dos
cargos desta Casa Legislativa deve se dar por Lei. Entretanto, até o momento
não foi editada nenhuma lei criando os cargos de provimento efetivo e os de
livre nomeação, para compor os quadros da Câmara Municipal de Ituporanga.
[...]
Considerando que os cargos criados
por Resolução, quando a Lei Orgânica exige que sejam criados por Lei, são de
validade duvidosa, optou-se por aguardar a conclusão dos estudos e criação dos
cargos por Lei Municipal, para, somente após, realizar o necessário concurso público
para provimento do cargo de contador.
Por esse motivo, e para fazer frente
a uma necessidade temporária, a Câmara Municipal optou pela contratação de um
escritório de contabilidade, para prestar referidos serviços, até mesmo porque,
a remuneração para o cargo criado pela Resolução n. 105/03 da Câmara Municipal
de Ituporanga não é compatível com qualificação profissional exigida para o
cargo.
[...]
Nas Câmaras de pequeno porte, como a
de Ituporanga, contudo, o atendimento das condições apontadas pelo Tribunal de
Contas de Santa Catarina torna-se economicamente inviável.
Com efeito, a contratação de
escritório de contabilidade, por ser pessoa jurídica, não representa burla ao
concurso público, bem como não houve prejuízo com a seqüência das políticas
públicas, visto que manteve-se a contratação do escritório que já prestava
serviços à Câmara Municipal por longa data. [...]”[6]
O
órgão consultivo rechaçou a argumentação do Recorrente, invocando prejulgados
deste Tribunal, que consolidam o entendimento acerca da matéria:
“O caso envolve a contratação da
empresa Contabilidade Starosky Ltda. Como bem esclareceu o relatório da Equipe
de Auditoria[7],
a matéria envolvendo a contratação de escritório de contabilidade (pessoa
jurídica) já foi decidida nesta Corte de Contas em diversos processos de
Consulta.
Pesquisando a jurisprudência da
Corte, verificam-se os seguintes Prejulgados:
Prejulgado 0873
1. ... 2. Quanto à contratação de
contador ou escritório de contabilidade, o Município deve atentar para o seguinte:
a) Face o caráter de atividade
administrativa permanente e contínua, o serviço de contabilidade deve ser
cometido à responsabilidade de profissional habilitado e em situação de
regularidade perante o Conselho Regional de Contabilidade, integrante do quadro
de cargos efetivos do ente público, com provimento mediante concurso público
(art. 37 da Constituição Federal), sendo vedada a contratação de pessoa
jurídica (escritório de contabilidade) para realização da contabilidade de ente
público.
b) Ocorrendo vacância ou afastamento temporário do titular do cargo efetivo de
contador, é admissível, excepcionalmente, até novo provimento do cargo: - a
contratação de profissional, através de processo licitatório, observada a
normatização da Lei n° 8.666/93; ou
- a contratação de profissional em caráter temporário, autorizada por lei
municipal específica, que deverá estipular as condições da contratação,
inclusive forma de seleção e prazo máximo de contratação, em atendimento ao
disposto no inciso IX do art. 37 da Constituição Federal. 3. ...
Prejulgado 0949
Face o caráter permanente da função
de contadoria, é recomendável que o cargo de contador esteja previsto no quadro
de servidores efetivos da Câmara, pois a atividade não se coaduna com cargos de
livre nomeação e exoneração.
Inexistindo cargo de contador no quadro de servidores efetivos,
excepcionalmente, a responsabilidade pelos serviços contábeis da Câmara poderá
ser atribuída a profissional habilitado (contador), servidor efetivo do
Poder Executivo ou do Legislativo, com remuneração pela Câmara de Vereadores,
podendo ser concedida gratificação atribuída por lei municipal.
Prejulgado 0988 (Reformado)
1. ... 2. ... 3. A prática de
registros contábeis e demais atos afetos à contabilidade são atribuições que devem
ser acometidas a contabilista efetivo habilitado e registrado no Conselho
Regional de Contabilidade, sob pena de infração à norma regulamentar do
exercício profissional.
Para suprir a deficiência no setor de contabilidade do Poder Legislativo, até que
seja provido Contador em cargo efetivo, pela via do concurso público,
excepcionalmente poderá ser concedida uma gratificação prevista em lei e paga
pela Câmara Municipal, a servidor habilitado e registrado no CRC, para a
execução dos serviços contábeis.
4. Para otimizar o controle interno
é recomendável a segregação das funções de contabilidade e tesouraria,
destinando tais atribuições a servidores distintos.
Prejulgado 0996
Face o caráter de atividade
administrativa permanente e contínua, o serviço de contabilidade deve ser
cometido à responsabilidade de profissional habilitado e em situação de
regularidade perante o Conselho Regional de Contabilidade, integrante do quadro
de cargos efetivos do ente público, com provimento mediante concurso público (art.
37 da Constituição Federal).
Na inexistência de cargo efetivo de contador, excepcionalmente, até a criação e
o provimento do cargo, é admissível a contratação de profissional em caráter
temporário, autorizada por lei municipal específica, que deverá estipular
as condições da contratação, inclusive forma de seleção e prazo máximo de
contratação, em atendimento ao disposto no inciso IX do art. 37 da Constituição
Federal.
Prejulgado 1277
Em face do caráter contínuo de sua
função, o cargo de contador deve estar previsto nos quadros de servidores
efetivos da Prefeitura Municipal e da Câmara de Vereadores, quando esta
administrar seus próprios recursos, pois a atividade não se coaduna com cargos
de livre nomeação e exoneração.
O provimento do cargo de contador requer obrigatoriamente prévia aprovação em
concurso público, conforme determina o art. 37, II, da Constituição Federal.
A prática de registros contábeis e
demais atos afetos à contabilidade são atribuições que devem ser acometidas a
contabilista habilitado e registrado no Conselho Regional de Contabilidade, sob
pena de infração à norma regulamentar do exercício profissional.
Excepcionalmente, caso não exista o
cargo de contador nos quadros de servidores efetivos da Prefeitura Municipal ou
da Câmara de Vereadores, ou houver vacância ou afastamento temporário do
contador ocupante de cargo efetivo, as seguintes medidas podem ser tomadas,
desde que devidamente justificadas e em caráter temporário, até que se
concluam, em ato contínuo, os procedimentos de criação e provimento do cargo de
contador da unidade:
1 - edição de lei específica que autorize a contratação temporária de contador
habilitado e inscrito no CRC e estipule prazo de validade do contrato,
justificando a necessidade temporária de excepcional interesse público,
conforme preceitua o art. 37, IX, da Constituição Federal.
2 - Realização de licitação para a contratação de pessoa física para
prestar serviço de contabilidade, conforme as diretrizes estabelecidas na Lei
Federal nº 8.666/93.
3 - Atribuir a responsabilidade
pelos serviços contábeis a servidor efetivo do quadro de pessoal do Poder
Executivo, Legislativo ou na administração indireta, com formação superior em
Contabilidade, devidamente inscrito no Conselho Regional de Contabilidade e
regular em suas obrigações - que não o Contador desses órgãos - sendo vedada a
acumulação remunerada, permitido, no entanto, o pagamento de gratificação
atribuída por lei municipal e de responsabilidade do órgão que utilizar os
serviços do servidor.
Em qualquer das hipóteses citadas no itens 1, 2 e 3, acima, a contratação
deverá ser por tempo determinado, com prazo de duração previamente fixado, para
atender a uma necessidade premente; sendo que em ato contínuo deve ser criado e
provido por via do concurso público o cargo efetivo de Contador da Prefeitura e
da Câmara Municipal, ou ainda até que se regularize eventual vacância ou
afastamento temporário de contador já efetivado.
O Contador da Prefeitura não pode responsabilizar-se pela contabilidade da
Câmara, em face da vedação de acumulação de cargos (art. 37, XVI e XVII, da
Constituição Federal) e independência de Poderes.
É vedada a contratação de
escritórios de contabilidade, pessoa jurídica, para a realização dos serviços
contábeis da Prefeitura ou da Câmara Municipal, ante o caráter personalíssimo
dos atos de contabilidade pública.
(grifos meus)
Diante das manifestações
consolidadas deste Tribunal, não devem ser providas as razões recursais.”
Acrescento
ao rol de prejulgados mencionados pela Consultoria o de n. 1939, que leva em consideração a estrutura da Câmara, mas reforça o
entendimento da impossibilidade de contratação de pessoa jurídica:
1. É de competência da Câmara Municipal decidir
qual a estrutura necessária para execução dos seus serviços de contabilidade,
considerando entre outros aspectos, a demanda dos serviços se eventual ou
permanente; o quantitativo estimado de horas necessárias para sua execução; o
quantitativo e qualificação dos servidores necessários para realização dos
serviços; e a estimativa das despesas com pessoal.
2. De acordo com o ordenamento legal vigente, a execução das funções típicas e
permanentes da Administração Pública, das quais decorram atos administrativos,
deve ser efetivada, em regra, por servidores de seu quadro de pessoal,
ocupantes de cargos de provimento efetivo ou comissionado, estes destinados
exclusivamente ao desempenho de funções de direção, chefia ou assessoramento,
conforme as disposições do art. 37, II e V, da Constituição Federal.
3. Nas Câmaras de Vereadores cuja demanda de serviços contábeis é reduzida, os
serviços poderão ser executados:
3.1. por servidor com habilitação de
contabilista, nomeado para exercer cargo de provimento efetivo, cuja carga
horária, atribuições e outras especificações devem ser definidas pela Resolução
que criar o cargo, através de prévio concurso público (art. 37, II, da
Constituição Federal);
3.2. com atribuição da responsabilidade pelos serviços contábeis ao Contador da Prefeitura ou outro servidor
efetivo do quadro de pessoal dos Poderes Executivo, Legislativo, ou da
administração indireta com formação em contabilidade, devidamente inscrito
no Conselho Regional de Contabilidade e regular com suas obrigações, mediante a
concessão de gratificação criada por lei municipal, a ser paga pelo órgão que
utilizar os serviços do servidor.
4. Sempre que a demanda de serviços contábeis for permanente e exigir estrutura
de pessoal especializado com mais de um servidor, é recomendável a criação de
quadro de cargos efetivos para execução desses serviços, com provimento
mediante concurso público (art. 37, II, da Constituição Federal), podendo ser
criado cargo em comissão (art. 37, II e V, da Constituição Federal) para chefia
da correspondente unidade da estrutura organizacional (Contadoria, Departamento
de Contabilidade ou denominação equivalente).
5. Os cargos de provimento efetivo ou em comissão devem ser criados mediante
Resolução aprovada em Plenário, limitados à quantidade necessária ao
atendimento dos serviços e do interesse público, a qual deve estabelecer as
especificações e atribuições dos cargos e a carga horária a ser cumprida,
devendo a remuneração ser fixada mediante lei de iniciativa da Câmara (art. 37,
X, da Constituição Federal), proporcional à respectiva carga horária,
observados a disponibilidade orçamentária e financeira, bem como os limites de
gastos previstos pela Constituição Federal (art. 29-A) e pela Lei Complementar
(federal) nº 101, de 2000, e os princípios da economicidade, da eficiência, da
legalidade e da razoabilidade.
6. Compete à Câmara Municipal definir a carga horária necessária para execução
dos seus serviços contábeis, podendo ser estabelecida em 10, 20, 30 ou 40 horas
semanais, segundo o que melhor atender ao interesse público, devendo a
remuneração ser fixada proporcionalmente à carga horária efetivamente cumprida.
Vale
registrar, ainda, o posicionamento do Ministério Público, através do parecer da
Procuradora Cibelly Farias:
“A prestação de serviços
relacionados à Contabilidade é de natureza permanente e contínua, deles não
pode a Administração prescindir, sob pena de inviabilizar as atividades e
serviços prestados.
Desta forma, a realização de
concurso público para o provimento do cargo de Contador é medida que se impõe
como preceitua o art. 37, inciso II, da Constituição Federal.
Em reiteradas decisões esse Tribunal
tem firmado o entendimento nessa linha de orientação, consoante os Prejulgados
colacionados pela instrução, os quais salientam que, excepcionalmente, na hipótese de inexistência de cargo efetivo ou
de vacância, pode haver a contratação do profissional para esses fins, desde que em caráter temporário.
O recorrente afirma que a Câmara
contratou os serviços de Contador, porque o cargo existente nunca foi provido
por não ter sido criado por Lei Municipal e pela ausência de qualificação
profissional dos profissionais cedidos.
Todavia, durante todo o exercício em
análise – 2003 – constatou-se a contratação do citado profissional.
Portanto, o que se depreende é que
não se tratou de uma situação de caráter temporário, descaracterizando a
situação excepcionalidade que permitiria tal contratação, segundo Prejulgados
exarados sobre o tema.
Além disso, invoca o recorrente o
princípio da economicidade para justificar o ato irregular praticado.
Em hipóteses semelhantes já se
manifestou esta Procuradoria, no sentido de que é possível compatibilizar a
contenção de gastos sem que, para tanto, sejam infringidas normas
constitucionais, que vigem há quase vinte anos, desde a promulgação da
Carta Magna de 1988.
Para tanto, bastaria que o edital do
concurso público fixasse carga horária (e respectiva remuneração) compatíveis
com o montante das atividades inerentes à estrutura da Unidade Gestora. [...]”[8]
Acompanho
o entendimento da Consultoria e do Ministério Público para manter a multa,
referente à irregularidade em comento.
3. PROPOSTA DE DECISÃO
CONSIDERANDO o que mais dos autos consta, submeto à
apreciação deste Tribunal a seguinte proposta de decisão:
6.1. Conhecer do Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 77
da Lei Complementar n. 202/2000, interposto contra o Acórdão n. 1.454/2005,
exarado na Sessão Ordinária de 25/07/2005, nos autos do Processo n. PCA-04/01652130
e, no mérito, dar-lhe provimento parcial para:
6.1.1. cancelar o débito constante do item 6.1 da decisão
recorrida;
6.1.2. conferir nova redação ao item 6.1 da decisão recorrida, no
seguinte sentido:
“6.1. Julgar
irregulares, sem imputação de débito, na forma do art. 18, III, alínea “b”, c/c
o art. 21, parágrafo único, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas anuais
de 2003 referentes a atos de gestão da Câmara de Vereadores de Ituporanga, no
que concerne ao Balanço Geral composto das Demonstrações de Resultados Gerais,
na forma dos anexos e demonstrativos estabelecidos no art. 101 da Lei Federal
n. 4.320/64.
6.2. Aplicar ao Sr. Osni Francisco de Fragas
– anteriormente qualificado, com fundamento no art. 69 da Lei Complementar n.
202/2000 c/c o art. 108, parágrafo único, do Regimento Interno, as multas
abaixo relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da
publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar ao
Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que,
fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial,
observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:”
6.1.3. ratificar os demais termos da decisão recorrida.
6.2. Recomendar à Câmara de Vereadores de Ituporanga que,
doravante, não utilize recursos públicos para custear homenagem aos Edis.
6.3. Determinar à Câmara de Vereadores de Ituporanga que se
abstenha de contratar pessoa jurídica (escritório de contabilidade) para a
prestação de serviços contábeis, devendo observar os prejulgados deste
Tribunal, especialmente o de n. 1939.
6.4. Alertar a Câmara de Vereadores de Ituporanga, na pessoa do
Presidente, da imprescindível tempestividade e diligência no cumprimento de
determinações exaradas por este Tribunal, como a constante do item 6.3 desta
deliberação, sob pena de aplicação das sanções previstas no art. 70, VI e § 1º,
da Lei Complementar (estadual) n. 202/00, conforme o caso, e julgamento
irregular das contas, na hipótese de reincidência no descumprimento de
determinação, nos termos do art. 18 § 1º, do mesmo diploma legal.
6.5. Determinar à
Secretaria Geral-SEG, deste Tribunal, que, após o trânsito em julgado,
comunique à Diretoria Geral de Controle Externo - DGCE, para fins de registro
no banco de dados.
6.6.
Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator, que o fundamentam à Câmara
de Vereadores de Ituporanga e ao Dr. Marcos Alencar Wiggers - Procurador
do Recorrente.
Gabinete do Conselheiro, em 16 de fevereiro de 2009.
Conselheiro Relator
[1] Fls. 12/21 dos autos n. REC-05/04110551.
[2] Fls. 22/27 dos autos n. REC-05/04110551.
[3] Fls. 04/05 dos autos n. REC-05/04110551.
[4] Fls. 16/18 dos autos n. REC-05/04110551.
[5] Conforme anotação às fls. 68 e 70 dos autos principais.
[6] Fls.07/09 dos autos n. REC-05/04110551.
[7]PCA., fls. 67/84, Relatório nº 718/2005.
[8] Fls. 24/25 dos autos n. REC-05/04110551.