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TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA
Gabinete do Conselheiro Otávio Gilson dos Santos |
PROCESSO N.º |
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REC 05/04188313 |
UG/CLIENTE |
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Câmara Municipal de Calmon |
INTERESSADO |
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Luiz Alves |
ASSUNTO |
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(Recurso de Reconsideração - art. 77 da LC 202/2000) PCA - 04/01333388 |
DESPACHO N.º |
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GC-OGS/2008/021 |
Recurso de Reconsideração. Prestação de Contas de Administrador. Constitucional. Câmara de Vereadores. Contratação temporária de assessoria jurídica e contador. Atividade permanente e contínua. Excepcionalidade não configurada. Necessidade de concurso público. Julgamento irregular das contas. Conhecer e negar provimento.
1. Relatório
Tratam os autos do Pedido de Reconsideração, interposto por Luiz Alves - ex-Presidente da Câmara de Vereadores de Calmon, com fundamento no art. 77, da Lei Complementar nº 202/00, contra o Acórdão desta Corte de nº 1.644/2005, constante às fls. 72 e 73, dos autos do processo PCA 04/01333388 que está em apenso.
Ao julgar o processo de Prestação de Contas do Administrador (PCA 04/01333388), este Plenário, na Sessão Ordinária de 15 de agosto de 2005, decidiu julgar irregulares sem imputação de débito, com aplicação de multas no valor de R$ 500,00 (quinhnetos reais), em face da contratação de assessoria jurídica, acarretando dispêndios da ordem de R$ 10.000,00, para execução de atividades inerentes às funções de ocupante de cargo público, provido mediante prévia seleção por concurso público, caracterizando descumprimento ao disposto no art. 37, II, da Constituição Federal e em face da contratação de serviços contábeis, acarretando dispêndios da ordem de R$ 5.376,00, cujas atribuições são de caráter não eventual, inerentes às funções de cargo de provimento efetivo, evidenciando burla ao Concurso Público, em descumprimento ao art. 37, II, da Constituição Federal.
1.1. da Consultoria Geral
A Consultoria Geral deste Tribunal de Contas examinou o pedido, através do Parecer nº 749/07, de fls. 31 a 50, observando, em face do pedido sob exame, o seguinte:
- primeiro, que o Recorrente, na condição de Presidente da Câmara de Vereadores de Calmon à época dos fatos, figura nos autos como Responsável, consoante definição do art. 133, § 1º, "a" do Regimento Interno desta Corte, e como tal, possui legitimidade para pugnar pela reforma da decisão sob comento.
- segundo, no que concerne ao tempo de interposição, verifica-se que o Recorrente observou o prazo legal de interposição do Pedido de Reconsideração previsto no art. 77 da Lei Orgânica, tendo-se em conta que o Acórdão proferido nos autos foi publicado no Diário Oficial do Estado em 10/10/2005 (DOE n. 17.740) e que a peça recursal, ora examinada, foi protocolada em data de 24/10/2005, sendo, portanto, tempestivo; e
- terceiro, que o presente recurso cumpre o requisito da singularidade, visto que, interposto pela primeira vez.
Analisando as razões apresentadas pelo Recorrente, a COG concluiu em seu Parecer, quanto à contratação de assessoria jurídica, que restou configurada a irregularidade, considerando o caráter contínuo e permanente da função de assessoria jurídica - relacionada, portanto, à função de ocupante de cargo público - e não estando caracterizada a contratação temporária, uma vez que não presentes os requisitos da temporariedade e da excepcionalidade.
Assim sendo, verifica-se o descumprimento ao disposto no art. 37, II, da Constituição Federal, que exige a aprovação prévia em concurso público para a investidura em cargo ou emprego público, conforme consta do item 6.2.1. da Decisão recorrida, pelo que, segundo a COG, não cabe a sua reforma.
Do mesmo modo, ao analisar os argumentos apresentados pelo Recorrente quanto à contratação de serviços contábeis, concluiu a COG que o cargo de contador não é suscetível de terceirização, e, bem assim, não assiste razão ao recorrente, tendo em vista que a contratação perdurou durante todo o exercício de 2003, afastando a alegação de que a contratação teve caráter temporário e que não se pode afastar o comando constitucional que exige realização de concurso público para provimento do cargo de contador.
Em conclusão a COG manifesta-se propondo:
4.1 O conhecimento do presente Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 77 da Lei Complementar Estadual nº 202/00, interposto em face do Acórdão nº 1.644/2005 (fls. 72-73), proferido nos autos da Prestação de Contas de Administrador nº 04/01333388;
4.2 No mérito, a negativa de provimento, mantendo-se a decisão objurgada;
4.3 A ciência do decisum, parecer e voto ao Sr. Luiz Alves, Presidente da Câmara Municipal de Vereadores de Calmon em 2003, e à Prefeitura Municipal de Calmon.
1.2. da Procuradoria Geral
A Procuradoria Geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, emitiu o Parecer n. 7159/2007, no qual se posiciona no sentido de acompanhar a sugestão da Consultoria Geral (fls. 51 e 52).
2. Análise e Voto
Inicialmente, em relação aos pressupostos de admissibilidade, verifico que, tanto a legitimidade recursal, quanto a singularidade e a tempestividade foram preenchidos, portanto, o presente recurso está apto a ser conhecido.
Quanto ao mérito, alega o Recorrente em síntese, relativamente às multas imputadas, conforme se extrai dos autos e do parecer COG (fls. 31 a 50), que o art. 37, II, da Constituição da República, "apenas estabelece que a investidura em cargo ou emprego público deverá ser feita somente através de concurso público", mas que o referido comando "não impede que a Administração contrate serviços de que necessite" (fl. 3). Acrescenta que a contratação de serviços é autorizada pelo "inciso XXI do referido artigo" (fl. 3). Argüi a possibilidade de terceirização de serviços determinados e por prazo certo, desde que observada a necessidade de licitação. Acrescenta que a contratação de assessoria jurídica e contábil constitui um dos possíveis objetos da licitação. Invoca o cumprimento de todos os requisitos procedimentais do certame. Ressalta não ter havido prejuízo ao erário, diante da necessidade da contratação dos serviços. Destaca a inconveniência da realização de concurso público. Requer o cancelamento das multas.
Neste aspecto, este Relator entende que a matéria relacionada à contratação de Assessoria Jurídica e Contador pela Administração Pública encontra-se pacificada neste Tribunal de Contas, que já se pronunciou reiteradamente sobre a necessidade de desempenho das funções típicas da Administração Pública por servidores titulares de cargos públicos e que a eventual contratação temporária deverá atender aos requisitos da temporariedade e da excepcionalidade.
Visando dar celeridade processual, cito os Prejulgados nº 873, nº 996, nº 1.501, nº 1.121 e n. 1.277:
1. Quanto à contratação de advogado ou serviços jurídicos, deve ser considerado o seguinte:
a) Tendo os serviços jurídicos, incluída a defesa judicial ou extrajudicial dos interesses do Município, natureza de atividade administrativa permanente e contínua, é recomendável que haja o correspondente cargo efetivo no quadro de servidores do Município para atender tal função, com provimento mediante concurso público (art. 37 da Constituição Federal).
b) É cabível a contratação de profissional do ramo do direito, desde que devidamente justificada para atender específicos serviços (administrativo ou judicial) que não possam ser realizados pela assessoria jurídica dada a sua complexidade e especificidade, configurando necessidade dos serviços de profissional (jurista) de notória especialização, hipótese em que a contratação, por inexigibilidade de licitação, se dará nos termos dos artigos 25, II, parágrafo 1o, combinado com o artigo 13, V e § 3º, e 26 da Lei Federal 8.666/93, observados os princípios constitucionais que regem a Administração Pública e observando-se, também, os arts. 54 e 55, da Lei Federal nº 8.666 de 21.06.93; ou por dispensa de licitação quando atendidos os requisitos do artigo 24, II, e 26 da Lei de Licitação.
c) Para suprir a falta transitória de titular do cargo de advogado (ou outro equivalente), poderá o Município contratar profissional, temporariamente, até que haja o devido e regular provimento, segundo for regulado em lei municipal específica, inclusive quanto ao prazo, nos termos do inciso IX do art. 37 da Constituição Federal, ou, ainda, contratar serviços jurídicos através de processo licitatório.
d) Quando não houver cargo de advogado ou equivalente na estrutura administrativa do Município, para atender os serviços jurídicos gerais, é admissível, até a criação do cargo e respectivo provimento:
- a contratação de profissional em caráter temporário, mediante autorização por lei municipal específica, nos termos do inciso IX do art. 37 da Constituição Federal; ou
- a contratação de prestação de serviços jurídicos, através de processo licitatório, na forma da Lei Federal n° 8.666/93.
2. Quanto à contratação de contador ou escritório de contabilidade, o Município deve atentar para o seguinte:
a) Face o caráter de atividade administrativa permanente e contínua, o serviço de contabilidade deve ser cometido à responsabilidade de profissional habilitado e em situação de regularidade perante o Conselho Regional de Contabilidade, integrante do quadro de cargos efetivos do ente público, com provimento mediante concurso público (art. 37 da Constituição Federal), sendo vedada a contratação de pessoa jurídica (escritório de contabilidade) para realização da contabilidade de ente público.
b) Ocorrendo vacância ou afastamento temporário do titular do cargo efetivo de contador, é admissível, excepcionalmente, até novo provimento do cargo:
- a contratação de profissional, através de processo licitatório, observada a normatização da Lei n° 8.666/93; ou
- a contratação de profissional em caráter temporário, autorizada por lei municipal específica, que deverá estipular as condições da contratação, inclusive forma de seleção e prazo máximo de contratação, em atendimento ao disposto no inciso IX do art. 37 da Constituição Federal.
(Processo CON-TC9480611/98, Parecer COG-377/00, Decisão 2483/2000, Origem: Prefeitura Municipal de Bandeirante, Relator: Auditora Thereza Apparecida Costa Marques, Data da Sessão: 23/08/2000, Data do Diário Oficial: 10/11/2000).
Prejulgado 996. Face o caráter de atividade administrativa permanente e contínua, o serviço de contabilidade deve ser cometido à responsabilidade de profissional habilitado e em situação de regularidade perante o Conselho Regional de Contabilidade, integrante do quadro de cargos efetivos do ente público, com provimento mediante concurso público (art. 37 da Constituição Federal).
Na inexistência de cargo efetivo de contador, excepcionalmente, até a criação e o provimento do cargo, é admissível a contratação de profissional em caráter temporário, autorizada por lei municipal específica, que deverá estipular as condições da contratação, inclusive forma de seleção e prazo máximo de contratação, em atendimento ao disposto no inciso IX do art. 37 da Constituição Federal. (CON-01/01141149, Acórdão nº 974/2001, Parecer nº COG-186/01, Relator Auditor Clóvis Mattos Balsini, Câmara Municipal de Imaruí, 06/06/2001) (grifou-se).
Prejulgado 1501. Os cargos da Câmara de Vereadores, cujas atividades sejam típicas, permanentes e contínuas, tais como de contador, advogado, analista (nível superior) e técnico legislativo (nível médio), devem ser ocupados por servidores efetivos e providos mediante concurso público. (...)
(CON nº 03/07349837, Acórdão nº 4.355/2003, Parecer nº COG-583/03, Auditor Altair Debona Castelan, Câmara Municipal de Içara, 22 dez. 2003) (grifou-se).
Prejulgado nº 1121. Os serviços de assessoria jurídica (incluindo defesa em processos judiciais) podem ser considerados atividade de caráter permanente e, como tal, implica a existência de cargos específicos para referida atividade no quadro de cargos ou empregos da entidade. Contudo, o ingresso em cargos e empregos na administração pública direta e indireta, aí incluídas as sociedades de economia mista, depende de aprovação em concurso público de provas ou provas e títulos, consoante regra prescrita no artigo 37, II, da Carta Magna Federal.
A possibilidade de contratação de advogados, para suprir deficiência temporária destes profissionais nos quadros da empresa de economia mista, seria aquela prevista no inciso IX do artigo 37 da Constituição Federal (contratação temporária), desde que existente norma estadual autorizativa definindo os casos de excepcional interesse público, a forma de seleção dos profissionais, a forma de pagamento e o prazo do contrato, aplicando-se tal regra, também, à Administração Indireta, pois não há exceção no citado dispositivo constitucional.
(Processo nº CON/0001453190, Parecer: COG-096/02, Decisão: 441/2002, Origem: Companhia Catarinense de Águas e Saneamento, Relator: Conselheiro Luiz Roberto Herbst, Data da Sessão: 25/03/2002, Data do Diário Oficial: 14/05/2002).
Prejulgado 1.277. Excepcionalmente, caso não exista o cargo de contador nos quadros de servidores efetivos da Prefeitura Municipal ou da Câmara de Vereadores, ou houver vacância ou afastamento temporário do contador ocupante de cargo efetivo, as seguintes medidas podem ser tomadas, desde que devidamente justificadas e em caráter temporário, até que se concluam, em ato contínuo, os procedimentos de criação e provimento do cargo de contador da unidade:
1 - edição de lei específica que autorize a contratação temporária de contador habilitado e inscrito no CRC e estipule prazo de validade do contrato, justificando a necessidade termporária de excepcional interesse público, conforme preceitua o art. 37, IX, da Constituição Federal.
2 - Realização de licitação para a contratação de pessoa física para prestar serviço de contabilidade, conforme as diretrizes estabelecidas na Lei Federal nº 8.666/93.
3 - Atribuir a responsabilidade pelos serviços contábeis a servidor efetivo do quadro de pessoal do Poder Executivo, Legislativo ou na administração indireta, com formação superior em Contabilidade, devidamente inscrito no Conselho Regional de Contabilidade e regular em suas obrigações - que não o Contador desses órgãos - sendo vedada a acumulação remunerada, permitido, no entanto, o pagamento de gratificação atribuída por lei municipal e de responsabilidade do órgão que utilizar os serviços do servidor.
Em qualquer das hipóteses citadas no itens 1, 2 e 3, acima, a contratação deverá ser por tempo determinado, com prazo de duração previamente fixado, para atender a uma necessidade premente; sendo que em ato contínuo deve ser criado e provido por via do concurso público o cargo efetivo de Contador da Prefeitura e da Câmara Municipal, ou ainda até que se regularize eventual vacância ou afastamento temporário de contador já efetivado.
(CON-02/07504121, Acórdão nº 3.464/2002, Parecer nº COG-699/02, Auditor Evângelo Spyros Diamantaras, Câmara Municipal de São Miguel do Oeste, 18/12/2002) (grifou-se).
Constata-se que no presente caso, não foi cumprido o disposto no art. 37, II, da Constituição Federal quando da contratação de assessoria jurídica, para execução de atividades inerentes às funções de ocupante de cargo público, e da contratação de serviços contábeis, cujas atribuições são de caráter não eventual, inerentes às funções de cargo de provimento efetivo, evidenciando burla ao Concurso Público.
Dito isto, este Relator acolhe na íntegra o posicionamento do Órgão Consultivo deste Tribunal, o qual foi acompanhado pelo Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, submetendo a matéria ao egrégio Plenário desta Casa com a seguinte proposta de decisão:
2.1 Conhecer do Recurso de Reconsideração interposto pelo Responsável, Sr. Luiz Alves - ex-Presidente da Câmara Municipal de Calmon, nos termos do art. 77 da Lei Complementar nº 202/2000, interposto contra o Acórdão nº 1644/05, de 15/08/2005, exarado no Processo nº PCA 04/01333388, para, no mérito, negar-lhe provimento, ratificando na íntegra a decisão recorrida.
2.2 Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Parecer COG nº 749/07, ao Sr. Luiz Alves -ex-Presidente da Câmara Municipal de Calmon.
Gabinete do Conselheiro, em 13 de fevereiro de 2007
Otávio Gilson dos Santos
Conselheiro Relator