ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

 

PROCESSO:                        REC 05/04282336

UG/CLIENTE:           Prefeitura Municipal de Praia Grande

INTERESSADO:      Elizeu Lima (gestão 2001/2004)

ASSUNTO:               Recurso de Reconsideração no Processo TCE 03/0732601

 

 

 

 

 

RECURSO DE RECONSIDERAÇÃO. NULIDADE PROCESSUAL EX OFFICIO. CITAÇÃO POR EDITAL. DESNECESSIDADE DE NOMEAÇÃO DE CURADOR NO PROCESSO ADMINISTRATIVO.

A ausência de curador em razão de citação editalícia não macula o processo administrativo.

 

COBRANÇA DE DÍVIDA ATIVA. OMISSÃO DO GESTOR. ANÁLISES CONTÁBEIS INSUFICIENTES PARA A CONFIGURAÇÃO DE ILEGALIDADE. CANCELAMENTO DE MULTAS.

A configuração de conduta omissiva do gestor na cobrança de créditos tributários inscritos em dívida ativa suplanta a mera análise de peças contábeis e registros municipais, quando vislumbradas as potenciais variáveis relativas a cada crédito.

 

 

 

I - RELATÓRIO

Cuidam os autos de manifestações recursais interpostas por Elizeu Lima contra o Acórdão n° 1728/2005, prolatado no Processo TCE – 03/0732601 e proferido na sessão ordinária do dia 29/08/2005, em que o Tribunal Pleno decidiu:

6.1. Julgar irregulares, sem imputação de débito, na forma do art. 18, III, alínea "b", c/c o art. 21, parágrafo único, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, que trata de irregularidades constatadas quando da auditoria realizada na Prefeitura Municipal de Praia Grande, com abrangência sobre registros contábeis e execução orçamentária, referentes ao exercício 2003.

6.2. Aplicar ao Sr. Eliseu Lima - ex-Prefeito Municipal de Praia Grande, CPF n. 082.671.469-20, com fundamento no art. 69 da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 108, parágrafo único, do Regimento Interno, as multas abaixo relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:

6.2.1. R$ 1.000,00 (mil reais), em face da ausência de providências para cobrança, administrativa e judicial, de Dívida Ativa dos exercícios de 1998 a 2002, no valor de R$ 370.108,32, em desacordo ao art. 30, III, da Constituição Federal c/c os arts. 124, 129, 130, 133, 193 e 194 da Lei n. 642/93 (Código Tributário Municipal) e 11 da Lei Complementar Federal n. 101/2000 (item 1.1 do Relatório DMU);

6.2.2. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da ausência de providências para responsabilização das gestões anteriores que causaram a prescrição de Dívida Ativa - competência 1988 a 1997, no valor de R$ 108.044,39, caracterizando renúncia ilegal de receita, em desacordo com o art. 11 da Lei Complementar Federal n. 101/2000 c/c o art. 30, III, da Constituição Federal (item 1.2 do Relatório DMU);

6.2.3. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da ausência na Certidão de Dívida Ativa do dispositivo da lei que originou o crédito da Fazenda Pública Municipal e a data de sua inscrição, em desacordo com o art. 189, incisos III e IV, do Código Tributário Municipal (item 1.3 do Relatório DMU);

6.2.4. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da prestação de serviços a particulares com utilização de bens e mão-de-obra públicos, no valor de R$ 3.435,00, sem legislação que disponha sobre os critérios legais e regulamentares de forma clara e objetiva para a referida prestação, em afronta ao princípio da legalidade insculpido no art. 37, caput, da Constituição Federal (item 1.4 do Relatório DMU);

6.2.5. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da realização de despesa com contribuição à Associação dos Municípios do Extremo Sul Catarinense - AMESC, no valor de R$ 15.174,56, calculada em percentual da participação do Município na receita do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços - ICMS, em desrespeito ao estabelecido no inciso IV do art. 167 da Constituição Federal (item 2.1 do Relatório DMU).

6.3. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório DMU n. 1193/2005, à Prefeitura Municipal de Praia Grande e ao Sr. Eliseu Lima - ex-Prefeito daquele Município.

Os autos foram encaminhados à Consultoria Geral que através do Parecer COG-421/2008, manifestou-se no sentido de conhecer o recurso, argüindo, ex officio, nulidade processual por falta de oportunidade de defesa (fls. 258/265), entendimento acompanhado pelo Parquet, por meio do Parecer n. 4709/2008 (fls. 266/267).

Os autos retornaram à COG para manifestação acerca do mérito recursal (fls. 268).

Em novo parecer, de n. 87/09, o órgão consultivo opinou pelo cancelamento das multas dos itens 6.2.1, 6.2.2, 6.2.4 e 6.2.5 do acórdão recorrido (fls. 268/282), o que foi referendado pelo Ministério Público Especial no Parecer n. 3169/2009, a fls. 283.

Vieram os autos conclusos.

 

II – DISCUSSÃO

O assunto discutido nos autos diz respeito à aplicação de multas ao gestor em razão de irregularidades constatadas na promoção das cobranças administrativas e judiciais da dívida ativa municipal.

Ab initio, a movimentação da máquina administrativa de modo a possibilitar ao julgador do recurso o exame da questão de fundo pressupõe a análise de questões relacionadas ao próprio exercício do direito de recorrer, bem como à existência e regularidade da relação jurídica processual (pressupostos processuais).

Quanto à admissibilidade, o recurso merece ser conhecido, uma vez que o responsável possui legitimidade para recorrer, o reclamo é adequado e tempestivo.

Ao tecer os olhos sobre certidão acostada aos autos a fls. 286, verifica-se que o recurso foi protocolado em 10/11/2005, ao passo que a decisão combatida foi publicada no DOE n. 17748, de 21/10/2005, estando dentro do trintídio legal.

Preliminar:

Suscitou a Consultoria Geral, de ofício, nulidade processual, por entender não ter sido oferecida oportunidade de contraditório ao responsável. Sustentou que a citação realizada por edital, conforme assentado a fls. 714/716, sem a nomeação de curador ao responsável a fim de oferecer defesa, tal como determinam a lei processual penal e civil, eiva todo o processo administrativo.

Sobre esse ponto, entendo não ser necessário tecer maiores considerações, porquanto a tese oferecida pela Consultoria Geral não foi referendada por este Egrégio, sendo possível citar a seguinte ementa:

Citação. Edital.

A citação por edital é um dos meios legalmente previstos para a comunicação da oportunidade do contraditório (art. 37, IV da Lei Complementar n. 202/00).

A despeito de a citação editalícia ser considerada ficta, porquanto fundamentada em presunção, isso não pressupõe a necessária utilização de preceitos contidos no Código de Processo Civil.

O rito processual que ordena a condução dos feitos processados pela Corte não demanda, para caracterizar o devido processo legal, a observância integral do rito adotado nos processos judiciais.” (REC 06/042063611, Rel. Cons. Wilson Rogério Wan-Dall, j. em 10.04.2008)

No mesmo sentido, cite-se voto no REC 06/00448703, de Relatoria do Conselheiro Salomão Ribas Júnior, julgado em 10/10/2008.

No caso em comento, a citação foi devolvida pelos Correios em três oportunidades (fls. 708), sendo que na última foi informada a mudança de endereço, motivo pelo qual a citação foi realizada por edital, conforme fls. 714/716.

Superada a preliminar, passa-se à análise do mérito.

A Consultoria Geral sugeriu o cancelamento das multas elencadas no item 6.2.1, 6.2.2, 6.2.4 e 6.2.5, as quais serão estudadas a seguir.

Ausência de providências para a cobrança de dívida ativa

Sobre a questão é necessário tecer alguns comentários.

Não obstante a salutar iniciativa do Corpo Instrutivo, que em diversas hipóteses tem constatado a existência de irregularidades e sugerido a aplicação de multa (até a imputação de débito, em alguns casos), é inquestionável que análises deste tipo, embora bastante pertinentes, exigem um nível de investigação superior à mera análise de peças contábeis, pois é fato notório que em matéria de executivos fiscais podem existir inúmeros fatores que interferem na sua cobrança, não se tratando de tarefa das mais simples a completa apropriação de todo o valor contabilmente previsto, quando vislumbradas as potenciais variáveis relativas a cada crédito (pequeno valor para execução, erros de lançamento, não localização do devedor etc.).

Cabe lembrar que os diversos valores que compõem a dívida ativa não prescrevem de um ano para outro, mas dia a dia. Por conseguinte, considerando-se que o ponto principal a ser apurado reside na avaliação da efetividade da atuação do Poder Público, não é possível aferir, com segurança necessária para comprovação de eventual desídia do gestor, se o momento em que ocorreu a extinção do crédito tributário coincidiu com o momento administrativo a partir do qual já era possível ao recém-empossado Prefeito Municipal implementar medidas para otimização da cobrança dos executivos fiscais.

Não se pretende com essa linha de entendimento transparecer a idéia de que o Tribunal de Contas deve relevar as condutas omissas dos Prefeitos na cobrança da dívida ativa. Constituindo requisito essencial da responsabilidade na gestão fiscal a efetiva arrecadação de todos os tributos, é inquestionável que à eventual descumprimento deste ditame deve contrapor-se a pronta atuação desta Corte, inclusive com imposição das penalidades cabíveis. E tal atuação deve ser ainda mais incisiva em se tratando de situações indicativas de franca lesividade ao erário, características de algumas unidades que, por razões pouco esclarecidas, arrecadam montante irrisório relativamente ao total da dívida ativa inscrita.

Mas, por outro lado, a análise sobre esta matéria não pode se divorciar da aferição de outros indicativos que demonstrem que o Administrador adotou, sim, mecanismos diversos para o efetivo ingresso da receita pública, comprovando-as a esta Corte de Contas. Tampouco pode sustentar-se numa premissa – de pouco sustentabilidade prática – que teoricamente pressupõe a possibilidade de efetiva arrecadação da totalidade dos valores inscritos em dívida ativa. Neste ponto, cumpre inclusive lembrar que o ajuizamento do executivo fiscal demanda custos que, em determinadas hipóteses, podem ser maiores que os próprios valores cobrados, sendo que o próprio Poder Judiciário catarinense tem sido adverso à propositura de ações de execução com valores inferiores ao custo do processo.

Havendo futura possibilidade de proceder-se a uma apreciação mais minuciosa da arrecadação da dívida ativa das unidades – por exemplo, através de uma análise por amostragem dos processos de lançamento e de inscrição dos créditos, bem como dos procedimentos para cobrança – certamente estará este Tribunal atuando de forma bastante efetiva, aferindo o cumprimento de uma das exigências acentuadas na Lei de Responsabilidade Fiscal. Até que isto ocorre, entretanto, por estar distanciada de todas peculiaridades relacionadas às centenas ou milhares de processos alusivos a créditos fiscais, a mera análise global de dados contábeis deve ser adotada com relativa cautela, muito embora possa subsidiar constatações relativamente graves, em que é visível a distorção entre o valor arrecadado e o inscrito em dívida ativa e na qual merece prevalecer a presunção de atuação desidiosa do Administrador Público – o que não ocorre no caso.

Assentadas as premissas iniciais, passa-se a análise do caso concreto.

Em virtude da matéria, o Pleno aplicou a seguinte sanção:

6.2.1. R$ 1.000,00 (mil reais), em face da ausência de providências para cobrança, administrativa e judicial, de Dívida Ativa dos exercícios de 1998 a 2002, no valor de R$ 370.108,32, em desacordo ao art. 30, III, da Constituição Federal c/c os arts. 124, 129, 130, 133, 193 e 194 da Lei n. 642/93 (Código Tributário Municipal) e 11 da Lei Complementar Federal n. 101/2000 (item 1.1 do Relatório DMU

 

O recorrente refutou a multa, sob o argumento que realizou o correto encaminhamento de cobrança judicial da dívida ativa desde o exercício de 1997, relacionando 912 processos.

Vislumbrou-se que o Prefeito Municipal, apontado como responsável, exerceu sua gestão nos anos de 2001/2004, no entanto, o voto combatido pretendeu responsabilizá-lo por não providenciar a cobrança das dívidas ativas inscritas nos exercícios de 1998/2002. Para tanto, o órgão técnico colacionou créditos tributários inscritos em dívida ativa a partir de 31/12/1998 e, segundo o relatório, não ajuizados até o ano de 2003.

O prazo prescricional para ajuizamento da ação de execução fiscal é de 5 anos, contados da data da constituição definitiva do crédito tributário, a teor do art. 174 do CTN.

A constituição definitiva do crédito tributário relaciona-se à efetiva notificação do sujeito passivo a respeito do lançamento e não se vincula à data de inscrição da dívida ativa.

Embora sejam atos conexos e conseqüentes, a inscrição não integra o procedimento de lançamento. Trata-se de ato administrativo de registro nos “livros” do órgão administrativo competente dos créditos de natureza tributária, depois de esgotado o prazo fixado para pagamento do tributo, pela lei ou por decisão final proferida em processo regular, permitindo a cobrança pelo processo de execução fiscal, passando a gozar de presunção de certeza e liquidez.

Logo, não haveria motivos, em tese, para o não encaminhamento dos títulos para cobrança judicial após a sua inscrição em dívida ativa.

Não obstante, o recorrente trouxe aos autos o ajuizamento de diversos processos relacionados à matéria, correspondente ao exercício de 1997 em diante, acostados a fls. 09/257.

A própria instrução, ao demonstrar o comportamento da dívida ativa, apresentou apenas os anos de 2002 e 2003, assentando um aumento na sua inscrição e cobrança, de acordo com a tabela inserida a fls. 720/721, o que desconfigura a desídia atribuída ao administrador. Assente-se que o comportamento deva ser analisado ao longo de toda a gestão do edil, ou seja, desde 2001, não havendo razão para cingi-lo.

Por fim, afirmo que os valores apurados pela Diretoria como não cobrados, na sua maioria, são inferiores a um salário mínimo, o qual representava a quantia de R$ 240,00 (duzentos e quarenta reais) na época – Lei n. 10.699/2003.

Por todos os argumentos expostos, entendo deva ser afastada a multa aplicada ao gestor.

A segunda sanção foi fundamentada da seguinte forma:

6.2.2. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da ausência de providências para responsabilização das gestões anteriores que causaram a prescrição de Dívida Ativa - competência 1988 a 1997, no valor de R$ 108.044,39, caracterizando renúncia ilegal de receita, em desacordo com o art. 11 da Lei Complementar Federal n. 101/2000 c/c o art. 30, III, da Constituição Federal (item 1.2 do Relatório DMU);

Sobre esse ponto, comungo com o entendimento exarado pela Consultoria Geral. Entendo que não obstante deva a autoridade administrativa instaurar a tomada de contas especial, sob pena de sanção e responsabilidade solidária, conforme o art. 2°, parágrafo único, da Instrução Normativa n.01/2001, in casu, é temerário atribuir aos gestores anteriores responsabilidade pela prescrição da dívida ativa relacionada à competência de 1988 a 1997 sem analisar cada crédito tributário.

Repita-se os valores prescrevem dia a dia. Além disso, a prescrição pode ser conseqüência de outros fatores que refogem à omissão dos antigos gestores. Ademais, os dispositivos que fundamentam a sanção não impõe essa obrigatoriedade ao administrador. Portanto, afasta-se a multa aplicada também nesse item.

Descumprimento dos requisitos legais nas certidões de dívida ativa do Município

O Pleno aplicou a sanção de R$ 400,00 (quatrocentos reais) em razão da ausência, na Certidão de Dívida Ativa, do dispositivo da lei que originou o crédito da Fazenda Pública Municipal e a data de sua inscrição.

Compulsando os autos, verifica-se que de fato as certidões de dívida ativa apresentadas não traziam a informação referente ao dispositivo de lei nem mesmo a data de inscrição em dívida ativa.

Com efeito, a ausência dos requisitos pode ensejar a nulidade do título executivo em caso de encaminhamento para a cobrança judicial, consoante inúmeros precedentes do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, sendo possível citar a AC 2008.078104-9, de Joinville, Rel. Luiz César Medeiros, j. em 24/03/2009 e a AC 2008.058223-3, da Capital, Rel. Vanderlei Romer, j. em 22/04/2009.

Ocorre que a irregularidade é passível de correção pelo administrador consoante lições extraídas da obra de Leandro Pausen, senão veja-se:

A emenda, ou substituição e o cancelamento da certidão de dívida ativa atendem o interesse público, surgindo como poder-dever, no intuito de coadunar a obrigação com seu fato gerador. Ambos os institutos jurídicos obedecem ao lapso temporal preconizado pelo legislador, ou seja, devem ser priorizados antes da decisão de primeira instância. (...) Ao rever seus próprios atos, a Administração Pública estará dando transparência e mostrando a necessidade de adequar a obrigação exigida ao seu predicado revelado pelo fato gerador. (In: Direito tributário -constituição e código tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 9 ed. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2007. p. 1204)

O mesmo juízo tem sido empregado pelo Tribunal de Justiça, a saber: AC 2004.019638-5, de Araranguá, Rel. Luiz Cesar Medeiros, j. em 13/06/2006.

Considerando que a ausência do dispositivo legal e da data de inscrição não representam nulidades insanáveis, havendo possibilidade de correção exitosa da ilegalidade até então realizada pelo gestor, conclui-se ser desproporcional a aplicação de multa, motivo pelo qual se entende como justo o seu afastamento.

Prestação de serviços a particular com utilização de bens e mão-de-obra públicos

A pena pecuniária impingida restou assim consignada:

6.2.4. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da prestação de serviços a particulares com utilização de bens e mão-de-obra públicos, no valor de R$ 3.435,00, sem legislação que disponha sobre os critérios legais e regulamentares de forma clara e objetiva para a referida prestação, em afronta ao princípio da legalidade insculpido no art. 37, caput, da Constituição Federal (item 1.4 do Relatório DMU);

O recorrente encaminhou o inteiro teor das normas que regulamentavam a cobrança pela utilização do trator agrícola de propriedade do Município, quais sejam, a Lei Municipal n. 185/73 e o Decreto n. 137/2001. A primeira autoriza a cobrança pela utilização de veículos e máquinas rodoviárias do Município e a segunda estipula o preço a ser cobrado por hora, estabelecendo isenção às pessoas que comprovarem renda de até 2 salários mínimos. Por conseguinte, não há razão para manter-se a pena aplicada por ausência de legislação clara e objetiva na cobrança dos serviços.

Contribuição à AMESC – vinculação de receita tributária

Por fim, aplicou o Pleno a seguinte sanção:

6.2.5. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da realização de despesa com contribuição à Associação dos Municípios do Extremo Sul Catarinense - AMESC, no valor de R$ 15.174,56, calculada em percentual da participação do Município na receita do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços - ICMS, em desrespeito ao estabelecido no inciso IV do art. 167 da Constituição Federal (item 2.1 do Relatório DMU).

O recorrente combateu a imputação, sob o argumento de que o gasto com as mensalidades à Associação dos Municípios do Extremo Sul Catarinense – AMESC consta nas previsões orçamentárias e foram autorizados pela Lei Municipal n. 758/95. Destacou que o percentual estipulado (não inferior a 1,3% sem ultrapassar 2%) sobre a receita arrecadada com o produto do ICM/ICMS do mês anterior seria apenas um critério de definição do valor a ser quitado.

Melhor sorte não possui o recorrente quanto a estes itens, uma vez que a vinculação de receita de impostos à despesa dos entes federativos é vedada desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, tendo sido mantida mesmo após as reformas realizadas no art. 167, IV, por meio das Emendas Constitucionais n. 03/93, 29/00 e 42/03. A redação original já determinava:

Art. 167. São vedados:

(...)

IV – a vinculação de receitas de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os arts. 158 e 159, a destinação de recursos para a manutenção e desenvolvimento do ensino, como determinado pelo art. 212 e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, previstas no art. 165, § 8°.

 

No caso em tela, o órgão técnico apurou o pagamento no ano de 2003 (fls. 419), quando já havia sido revogado o Prejulgado n. 292, que erroneamente possibilitava a instituição de percentual vinculado à receita do FPM para o pagamento de mensalidade às Associações de Municípios.

Por conseguinte, por ser manifestamente inconstitucional, entende-se correta a aplicação de multa neste caso.

 

III – VOTO

 

Ante o exposto, considerando as razões expendidas, acolho parcialmente os Pareceres exarados nos autos e propondo ao Egrégio Plenário a adoção da seguinte proposta de voto:

1) Conhecer do Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 77 da Lei Complementar nº 202/2000, interposto contra o Acórdão 1728/2005, proferido na Sessão Ordinária do dia 29/08/2005, no Processo TCE 03/07302601, e, no mérito, dar provimento parcial ao recurso, cancelando as multas aplicadas nos itens 6.2.1, 6.2.2, 6.2.3 e 6.2.4 do acórdão recorrido.

2) Dar ciência desta Decisão, bem como do Parecer e Voto que a fundamentam ao Sr. Eliseu Lima, ex-Prefeito Municipal de Praia Grande.

 

Gabinete, em 02 de setembro de 2009.

 

 

Cleber Muniz Gavi

Auditor Substituto de Conselheiro

Relator