Processo:

CON-06/00019250

Unidade Gestora:

Prefeitura Municipal de Governador Celso Ramos

Interessado:

Anísio Anatólio Soares

Assunto:

Consulta - Utilização da dotação Reserva de Contingência diante do que dispõe o art. 5º, III, da LRF

Relatório e Voto:

GAC/HJN - 777/2010

 

                                                                                                                               

Consulta. Reserva de Contingência. Utilização. Prejulgados. Reforma. Revogação.

1. Reserva de Contingência. Utilização. Passivos Contingentes e Outros Riscos e Eventos Fiscais Imprevistos. Abertura de créditos adicionais. Outras Finalidades. Limitação.

1.1. A dotação Reserva de Contingência estabelecida na Lei Orçamentária Anual (LOA), segundo as condições previstas pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO),  deverá ser destinada ao atendimento dos passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos (art. 5º, III, b, da LRF), como forma de garantir a responsabilidade da gestão fiscal.

1.2. É admitida a utilização da Reserva de Contingência para outra finalidade no final do respectivo exercício, justificadamente, e de acordo com as condições estabelecidas na legislação local (LDO e LOA), desde que atendidos os passivos contingentes e não houver resíduos a pagar a título de riscos ou eventos fiscais imprevistos.

 

2. Prejulgado. Nova Interpretação. Reforma. Revogação.

Sempre que o Tribunal de Contas manifestar-se sobre matéria de Prejulgado, firmando nova interpretação, deverá ser mencionada a sua revogação ou reforma na deliberação  (art. 156, do Regimento Interno).

 

 

1. INTRODUÇÃO

 

Os presentes autos derivam de Consulta protocolada em 08/02/2006 (sob o n. 002196) pelo então Prefeito Municipal de Governador Celso Ramos e Presidente da Federação Catarinense de Municípios (FECAM), Sr. Anísio Anatólio Soares, que peticiona manifestação desta Corte de Contas acerca da viabilidade de utilização da dotação Reserva de Contingência para suplementações de dotações do orçamento (fls. 04/05).

 

Desde logo, faz-se oportuno esclarecer que naquela mesma oportunidade o Consulente protocolizou (fls. 02/03, protocolo n. 002195) questionamentos relacionados aos Fundos Especiais, mais precisamente a respeito dos efeitos da Decisão n. 2501/2003 deste Tribunal. Os documentos atrelados a esse assunto foram desentranhados em atendimento ao Despacho do então Conselheiro Relator Moacir Bertoli (fls. 70), originando as providências da Secretaria Geral (fls. 71), que promoveu a constituição do processo n. CON-07/00397558, cuja instrução e apreciação resultou na Decisão Plenária n. 2406/2007.

 

Portanto, estes autos passaram a examinar especificamente a matéria relacionada ao uso de recursos orçamentários da dotação Reserva de Contingência, frente ao art. 5º, inciso III, da Lei Complementar Federal n. 101, de 2000 (LRF), que dispõe:

Art. 5o O projeto de lei orçamentária anual, elaborado de forma compatível com o plano plurianual, com a lei de diretrizes orçamentárias e com as normas desta Lei Complementar:

        I - ......

        II - ........

        III - conterá reserva de contingência, cuja forma de utilização e montante, definido com base na receita corrente líquida, serão estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias, destinada ao:

a)      (vetado)

        b) atendimento de passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos. (Nosso Grifo)

 

O processo, segundo informa o histórico do seu trâmite, foi pautado para fins de deliberação do Tribunal Pleno em diversas oportunidades, sendo reiteradamente adiado e/ou retirado de pauta, anotando-se as seguintes principais ocorrências nesse período:

 

a) pedido de vista do Senhor Conselheiro César Filomeno Fontes na Sessão de 06/08/2007 (fls. 88-verso), que apresentou o Voto Divergente de fls. 89/101;

b) avocado pela Presidência desta Casa na Sessão Plenária de 05/09/2007 (fls. 138-verso);

c) manifestação do eminente Conselheiro Salomão Ribas Junior em 20/05/2008 (fls. 139/140);

d) encaminhamento do processo à Diretoria de Controle dos Municípios (DMU), conforme Despacho n. 0196/2008 firmado pelo então Conselheiro Relator (fls. 141), visando pronunciamento adicional da Diretoria Técnica, com ênfase para as reuniões do PROMOEX, quando ventiladas questões pertinentes à Lei de Responsabilidade Fiscal (V FORUM – maio/2008, em Florianópolis-SC).

 

A DMU restituiu o processo ao Gabinete do Relator com a Informação n. 480/2008, junto com cópia da Portaria Conjunta STN-MF/SOF-MP n. 3, de 15/10/2008, que aprova os Manuais da Receita Nacional e de Despesa Nacional (fls. 142/151).

 

 

·         Instrução resumida dos autos

 

Consultoria Geral

 

Em sua primeira manifestação, mediante a Informação n. 024/2006, a Consultoria Geral sugeriu a remessa do processo ao exame da Diretoria de Controle dos Municípios (DMU), com referência “à utilização dos recursos da reserva de contingência para suplementar dotações insuficientes do orçamento”, “por se tratar de assunto precipuamente contábil”, assentando como indispensável tal manifestação (fls. 07/11).

 

Reporta-se, ainda, à “Nota Técnica n. 152/2006-GENOC/CCONT-STN”, datada de 01/02/2006, da Secretaria do Tesouro Nacional/Ministério da Fazenda, que verbaliza consulta oriunda da Federação Catarinense de Municípios (FECAM), sobre o tema “Reserva de Contingência” (cópia de fls. 15/19).

 

Seguiu-se o Relatório n. 1291/2006 (fls. 22/25), da DMU, que se subsidia nos documentos de fls. 26/40; cita Prejulgado deste Tribunal acerca do tema (processo CON-01/01621515); e fortalece o entendimento de que a dotação “Reserva de Contingência” somente pode ser destinada ao atendimento “de passivos contingentes, eventos ou riscos fiscais imprevistos”, nos termos da previsão do art. 5º, III, letra b, da LRF.

 

Nesse tempo, a Consultoria Geral elaborou o Parecer n. 343/2006 (fls. 42/59), cujo estudo a partir das fls. 47 é voltado à “Reserva de Contingência”.

 

Depois de abreviado histórico a respeito de sua instituição (Decreto-lei Federal n. 200, de 1967), o Órgão Consultivo conjuga a apreciação da Nota Técnica n. 152/2006–STN/SOF com a Portaria Interministerial n. 163, de 04/05/2001 (art. 8º), e o art. 91 do Decreto-lei n. 200.

 

Também comenta a Portaria STN n. 586, de 2005, que discorre sobre a 5ª edição do “Anexo de Riscos Fiscais e o Relatório de Gestão Fiscal”, além de contemplar o Manual de Elaboração do Anexo.

O Órgão de Instrução tece considerações sobre o assunto e conclui, em síntese, que:

 

- a “Reserva de Contingência”, a par de cumprir sua finalidade precípua – atendimento de passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos –, pode ser utilizada para a suplementação de outras dotações orçamentárias;

 

- a utilização de recursos da “Reserva de Contingência” para abertura de créditos especiais para outros fins deverá ser parcial e “precedida de autorização legislativa específica”, além de ser garantida dotação “suficiente de recursos” para atender o preconizado pela LRF;

 

- prescinde de autorização legislativa específica, quando comprovadamente os recursos são destinados às situações definidas no art. 5º, III, b, da LRF, sob pena de incorrer em infração legal.

 

 

Ministério Público junto ao Tribunal de Contas

 

O então Procurador Carlos Humberto Prola Júnior firma o Parecer n. 4564/2006 (fls. 60/69), examinando, por primeiro, os pressupostos de admissibilidade da consulta, os quais aponta como não atendidos.

 

Contudo, dispôs-se ao exame do mérito, trazendo reflexões sobre aspectos tais quais: (i) a qualidade de “norma federal” e não “norma nacional” do DL 200, de 1967; (ii) a vigência do princípio orçamentário da especialização que requer que os recursos orçamentários sejam detalhados, inadmitindo dotações globais (como se refere o art. 91 do DL 200); (iii) a ausência de limites para os valores destinados à dotação – “reserva de contingência”, em prejuízo do planejamento governamental; e (iv) o espírito da LRF – que promove a responsabilidade da gestão fiscal que tem por fundamento o planejamento das ações e sua transparência.

 

Sustenta o Dr. Procurador, depois de deixar clara a diferença entre os textos legais – Lei de Responsabilidade Fiscal e a Lei das Sociedades Anônimas -, que pode ser aplicável à situação concreta a hipótese de reversão da “reserva de contingência quando deixarem de existir as razões que justificaram sua constituição”, tal qual prevê o art. 195 da Lei Federal 6.404, de 1976 (Lei das SAs).

 

Defende, para efeitos da Lei Complementar n. 101, de 2002 (LRF), que o evento – cessação das razões de sua constituição – possa ser considerado como sendo “... o primeiro dia do exercício seguinte, pois até o último dia do atual exercício financeiro poderão ainda ocorrer os eventos que motivam a sua constituição: passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos”.    

 

Admite, ainda, o Sr. Procurador, que tais recursos poderão refletir em superávit financeiro, e, neste caso, poderão servir para a abertura de créditos adicionais “nos termos do art. 43, § 1º, I da Lei n. 4.320/64” (fls. 68).

 

Conclusivamente, o Dr. Prola Júnior manifesta que na hipótese de acolhimento da Consulta, no mérito seja respondido ao Consulente:

Não é possível a utilização da Reserva de Contingência como fonte de recursos para abertura de créditos adicionais, para outras finalidades, que não o atendimento de passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos” (fls. 69).  

 

 

Processo apensado n. TCGAP-06/90028784. Interessado: Conselheiro César Filomeno Fontes

 

Lembro que esse processo tem origem no Memorando n. 31/06 encaminhado em 24/10/2006 ao então Presidente deste Tribunal, mediante o qual o Sr. Conselheiro César Fontes relata divergência de entendimento entre a DMU (Memorando n. 109/2006) e seu Gabinete, respeitante à destinação da dotação Reserva de Contingência, perceptível na instrução e Voto relacionados aos processos PCP (Prestação de Contas Anuais de Prefeito).

 

Sobre os autos apensos, opto por transcrever o conteúdo do Relatório e Voto n. 0328/2007 firmado pelo então Relator, Conselheiro Moacir Bertoli, incluso às fls.     72 a 88 deste processo de Consulta:

 

As considerações do Conselheiro César Fontes foram examinadas pela Assessoria da Presidência, através do Dr. Neimar Paludo, consoante a Informação n. APRE-030/2006, de 30/10/2006, que, resumidamente, explicita:

 

"... A Diretoria de Controle dos Municípios tem seguido a posição deste Tribunal, declarada em prejulgados, no sentido de que a reserva de contingência só pode ser utilizada para abertura de créditos nos casos de despesas decorrentes de passivos contingentes e riscos fiscais imprevistos.

A posição deste Tribunal de Contas decorreu da análise inicial da Lei Complementar n. 101/00, (...), onde os Tribunais de Contas foram guindados ao patamar de fiscais do cumprimento da nova Lei.

O entendimento foi o de que a reserva de contingência, como sugere seu nome, só é admissível para eventos e situações imprevistas ou não previsíveis. Considerando que um dos pilares da responsabilidade fiscal é o planejamento de receitas e despesas (explicitadas na LDO e na LOA), a reserva de contingência não mais se destinaria a suplementar dotações em razão de descuido na elaboração do orçamento.

A reserva de contingência pode ser utilizada para suplementação de dotações ou para abertura de créditos especiais, mas desde que o reforço orçamentário nas respectivas rubricas tenham por finalidade cobrir despesas decorrentes de passivos contingentes e riscos fiscais imprevistos."

 

Na seqüência, o Dr. Neimar indica doutrina verificando-se, que, em alguns casos, é admitido o abrandamento no uso da Reserva de Contingência nos últimos meses do exercício, para, constatada a existência de saldo orçamentário, usar tais recursos em qualquer outro tipo de despesa.

 

Cita a Portaria Interministerial nº 163/2001, da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), reportando, ainda, procedimentos definidos no Manual de Elaboração do Anexo de Metas Fiscais e Relatório Resumido da Execução Orçamentária, aprovado pela Portaria n. 633, de 30/08/2006, da STN, aplicada a partir do exercício de 2007, que, ao tratar do Demonstrativo da Execução das Despesas por Função/Subfunção- Anexo II (p. 119 do Manual), expõe que:

 

"A Reserva de Contingência é constituída sob a forma de dotação global, não especificamente destinada a determinado órgão, unidade orçamentária, programa ou categoria econômica, sendo destinada ao atendimento de passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos. Estes últimos incluem as alterações e adequações orçamentárias que se identificam com o disposto no inciso III do § 1º do art. 43 da Lei n. 4.320/64, que permite a abertura de créditos adicionais com o cancelamento de dotações orçamentárias, inclusive da reserva de contingência incluída na Lei Orçamentária Anual. A forma de utilização e o montante dessa reserva serão definidos na Lei de Diretrizes Orçamentárias (...) de acordo com sua receita corrente líquida".     

 

Salienta o Dr. Neimar que,

... A questão é se a lei orçamentária pode conter reserva de contingência para outras finalidades (ou mesmo utilizar a reserva de contingência específica para passivos contingentes e riscos fiscais imprevistos quando estes não ocorram).

Assim, por exemplo, poderia a lei orçamentária estabelecer uma reserva de contingência de 4% da receita corrente líquida, sendo previsto que 2% será utilizada para passivos contingentes e riscos fiscais imprevistos.

Esta solução encontra resistências, tendo em vista a possibilidade de desvirtuamento do orçamento, abandonando-se o planejamento, ademais, porque não existe um limite legal para essa reserva de contingência.

Nos encontros entre os Tribunais de Contas depois do advento da LRF, muitos promovidos pelo Ministério da Fazenda e com a participação deste, houve consenso de que a reserva de contingência deveria ser utilizada exclusivamente para a finalidade de atender o disposto no art. 5º daquela Lei.

 

Anota que o assunto comporta três diferentes posicionamentos, quais sejam:

a) restritiva, em que a Reserva de Contingência só pode ser utilizada para o atendimento de passivos contingentes e riscos fiscais e outros eventos imprevistos;

b) flexibilizada, permite a adoção da reserva de contingência para outras finalidades quando no final do exercício houver saldo na dotação, depois de atendidos os passivos contingentes e riscos fiscais relativos ao exercício;

c) extensiva, a utilização da reserva de contingência pode dar-se para atender os passivos contingentes e riscos fiscais, bem como para a abertura de créditos adicionais não vinculados à finalidade prevista no art. 5º da LRF.

 

Por fim, o Sr. Assessor faz referência ao presente processo de Consulta "em razão do qual o Tribunal Pleno terá oportunidade de novamente se manifestar sobre a matéria, e, se for o caso, até mesmo modificar o posicionamento atual do Tribunal de Contas", sugerindo, em conseqüência, o exame do processo n. TCGAP-06/90028784 (anexo) em conjunto com os presentes autos.

Por meio de despacho proferido em 01/11/2006 o então Conselheiro Presidente acolheu a manifestação de sua Assessoria, sendo dito processo reunido a estes autos.

 

 

Dando continuidade ao exame do conteúdo deste processo de Consulta, trago à consideração:

Relatório e Voto n. 0328/2007 (fls. 72/88)

 

Em apreciação conclusiva, o Conselheiro Moacir Bertoli, Relator à época, em conformidade com as razões que subscreve, adotou a linha de entendimento restritiva, ou seja, que limita a utilização da dotação “Reserva de Contingência” para os fins estabelecidos na LRF (art. 5º, inciso III, letra b, da Lei Complementar n. 101, de 2000), não admitindo seu aproveitamento “para suplementação ou abertura de créditos adicionais para cobrir dotações insuficientes ou por falha de previsão orçamentária ou para atender despesas comuns à atividade pública” (fls. 87).

 

Pautado para deliberação na Sessão Plenária de 06/08/2007, houve pedido de Vista, na forma Regimental, do Exmo. Sr. Conselheiro César Fontes.

 

 

Vista dos autos. Voto Divergente. Conselheiro César Filomeno Fontes

 

O ilustre Conselheiro abriu divergência em torno do entendimento sustentado pelo então Relator, apresentando a propósito da matéria em debate o “Voto n. 745/2007” (fls. 89/101).

 

Abreviadamente, cito a seguinte passagem da manifestação discrepante:

 

“... discordo do seu entendimento para manter o posicionamento que sempre defendi, pois estou absolutamente convencido que a LC 101/2000-LRF, ao contrário de revogar a função para o qual a conta Reserva de Contingência foi criada – reservar recursos para abertura de créditos adicionais e flexibilizar o planejamento – atribuiu uma função adicional, obrigando o gestor a reservar recursos para passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos”.

 

Cita como fundamento o art. 24, II, c/c o art. 30, II, da CF; os arts. 8º, 13 e 91, da Lei Federal n. 4.320, de 1964; e o art. 91 do Decreto-lei Federal n. 200, de 1967.

 

Sustenta o Digno Conselheiro que “não tem sentido lógicoimpedir os Municípios de:

 

1.  seguir os procedimentos definidos para a União, que se ampara no art. 91 do DL n. 200, de 1967;

 

2. utilizar os recursos reservados, cujos riscos não ocorreram, sendo obrigado a manter os recursos “em caixa”, quando existem demandas não satisfeitas;

 

3. valer-se, exemplificativamente, de recursos obtidos com dívida ativa, incluídos em riscos fiscais da LDO – conta reserva de contingência, quando se verificar que houve ingresso desses recursos em face de exitoso “trabalho de cobrança”;

 

4. utilizar os recursos a título de “Reserva de Contingência” quando não tiverem ocorrido riscos “até o último mês o exercício”.

 

Teme o Sr. Conselheiro, que sendo acolhida a limitação constante da proposta de Voto do então Relator, os Municípios:

 

a)passem a adotar estratégias menos recomendáveis para continuar se valendo do princípio da flexibilidade do planejamento”. Aduz, que tem sido bastante reduzido o percentual destinado pelos Municípios para fins de “Reserva de Contingência”, segundo demonstrado no quadro de fls. 97 dos autos - em amostragem referente ao exercício de 2007 de 14 Municípios, cujos percentuais correspondem: o menor a 0,01% - São Miguel do Oeste e o mais elevado a 1,50% - Salto Veloso);

 

b) superestimem a receita, em especial projetando para o “último bimestre do exercício a parte superestimada para fugir do mecanismo da limitação do empenho”; ou

 

c) subestimem a receita para que disponham de “excesso de arrecadação”,  visando a abertura de créditos adicionais por ato do Executivo (fls. 97/98).

 

Após, outras considerações, conclui o Conselheiro César Fontes por sugerir que a resposta à consulta seja efetivada nos seguintes termos (fls. 101):

 

- que, por força das disposições dos arts. 4º, § 3º e 5º, inc. III, letra b, da LRF, “é obrigatória a alocação de recursos na conta Reserva de Contingência constante da Lei Orçamentária Anual (...), cujo objetivo é preservar o equilíbrio de caixa demonstrado em Balanço caso esses riscos venham ocorrer”;

 

- com base no art. 8º da Portaria Interministerial n. 163/2001, poderão ser alocados recursos na contra Reserva de Contingência - “Recomendável até 2% da Receita Prevista na Lei Orçamentária de forma a preservar o princípio constitucional do planejamento das ações governamentais”, utilizáveis para a suplementação de dotações orçamentárias (art. 165, § 8º, da CF).

 

 

Manifestação do então Relator acerca do Voto Divergente (Relatório n. 0397/2007)

 

Na seqüência, o Sr. Conselheiro Moacir Bertoli produziu “Adendo ao Relatório e Voto n. 0328/2007” (fls. 135/138), que examina os argumentos do Conselheiro César Fontes em defesa da “dupla função” dos recursos constantes da dotação “Reserva de Contingência”.

Contudo, o Relator, à época, ratifica o entendimento que defende a utilização restrita dos recursos, nos precisos termos do art. 5º, III, b da LRF (fls. 138).  

 

Pautado, o processo foi adiado sucessivamente, como demonstram as anotações de fls. 138-verso.

 

Nesse meio tempo, houve pedido de vista do Conselheiro Salomão Ribas Junior.

 

 

Manifestação do Conselheiro Salomão Ribas Junior. Relatório n. 145/2008 (fls. 139/140)

Emprestando sua colaboração com vistas a uma solução conciliatória da matéria sob estudo, o Exmo. Sr. Conselheiro Salomão Ribas Junior, depois de mencionar que são claramente opostas as posições encontradas nos autos, assinala que a adoção de uma ou outra afronta a ponderação que tem permeado o exame de casos concretos pelo Colegiado. 

 

Reconhece como procedente a defesa do então Relator ao escolher “interpretação restritiva dos conceitos da LRF quanto a reserva de contingência”, considerando que a falta de limites “gerou grandes distorções e desajustes na execução orçamentária”.

 

Mas também afirma que são dignas de crédito as razões do Conselheiro César Fontes expostas em Voto Divergente, que recorre à interpretação oferecida pela Secretaria do Tesouro Nacional (art. 8º, Portaria n. 163/STN), com vistas à ponderação do assunto.

 

Sobre o regramento do art. 5º, III, b, da LRF, o eminente Conselheiro acrescenta, à época (maio/2008), que “a harmonização dos conceitos da LRF” objeto de ampla discussão no seio do PROMOEx “ainda não pacificou o entendimento” a respeito do tema analisado.

A propósito, anota que “no âmbito dos casos concretos este TCE tem admitido mediante o uso da ponderação que se utilizem recursos originariamente consignados como reserva de contingência”.

 

Por fim, sugere que a resposta da consulta seja construída mediante a composição dos entendimentos que instruem o processo.

 

Sob essa ótica propôs que “no final do item 6.2.1 da proposta de decisão” do Conselheiro Relator Moacir Bertoli fosse acrescida expressão representativa de uma solução conciliatória, qual seja:

 

Admite-se, de outra parte, a utilização desses recursos para outra finalidade desde que atendidos os passivos contingentes e não havendo mais o que pagar como riscos ou eventos fiscais imprevistos” (fls. 140).

 

 

Informação n. 408/2008. DMU.

 

A última manifestação inserida nos autos decorre de encaminhamento efetivado pelo então Relator (Despacho n. 0196/2008, fls. 141), que solicitou à Diretoria de Controle dos Municípios reavaliação do assunto à luz das reuniões havidas com o Grupo do Promoex.

 

Seguiu-se, assim, a manifestação da Diretoria Técnica, que:

 

a) ratifica o seu entendimento anterior pela utilização restrita dos recursos da dotação, para efeitos do art. 5º, inciso III, letra b, da LRF;

 

b) entende que se tolerada a utilização de recursos da dotação para outras finalidades, poderá redundar em maior destinação de verbas a título de “Reserva de Contingência”, visando sua utilização como fonte de recursos para suplementar dotações insuficientes;

 

c) a Lei de Responsabilidade Fiscal enfatiza o relevante papel do planejamento como meio para uma gestão fiscal eficiente e eficaz.

 

 

2. DISCUSSÃO

Não inovo ao dizer que o tema versado nestes autos tem suscitado ampla discussão neste Tribunal de Contas nos últimos exercícios, tanto que a presente consulta ainda carece de deliberação. 

 

Não se pode ignorar que nesse meio tempo está mantida a orientação que emana dos Prejulgados 1079 (processo CON-01/01946147, da Câmara Municipal de São Francisco do Sul, Decisão n. 98/2002 proferida na Sessão de 06/02/2002) e 1147 (processo CON-01/01621515, da Prefeitura Municipal de Governador Celso Ramos, Decisão n. 711/2002 exarada na Sessão de 02/07/2002) - que restringem a utilização da dotação “Reserva de Contingência” aos fins estipulados pelo art. 5º, inciso III, letra b, da LRF, ou seja, para atender passivos contingentes e eventos ou riscos fiscais imprevistos.

 

Aliás, torno a transcrever o dispositivo da Lei Complementar Federal n. 101, de 2000, que motiva a Consulta, e assim dispõe:

 

Art. 5º O projeto de lei orçamentária anual, elaborado de forma compatível com o plano plurianual, com a lei de diretrizes orçamentárias e com as normas desta Lei Complementar:

I - ....................

II - ............

IIIconterá reserva de contingência, cuja forma de utilização e montante, definido com base na receita corrente líquida, serão estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias, destinado ao:

a)  (vetado)

b) atendimento de passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos. (Grifou-se).

 

Ao enfrentar as situações concretas, o Tribunal Pleno tem decidido pela aplicação de multa e/ou recomendação aos Gestores Municipais, quando verificada a utilização dos recursos da dotação “Reserva de Contingência” para fins diversos, ou seja, em desacordo com a norma da LRF, bem como, quando inexistente ou inexpressivo o valor da dotação. Exemplificativamente, cita-se:

 

Nº Processo

 

Município

Decisão ou

Parecer Prévio/Data

Recomendação/Valor multa-

R$

Ausência previsão/Vlr. utilizado da Reserva de Contingência –R$ (1)  (2)

PDI-07/00012940

Presidente Nereu

 

0559/2008, de 16/04/2008

2.000,00

109.310,00

PDI-07/00012788

São Francisco do Sul

 

0986/2009, de

13/07/2009

1.000,00

924.000,00

PDI-07/00415041

Tangará

029/2009, de 11/03/2009

800,00

29.000,00

RLI-08/00711718

Rio Negrinho

476/2010, de 12/07/2010

1.000,00

917.300,00

PDI-07/00016260

Apiúna

2444/2007, de 12/12/2007

800,00

301.000,00

PDI-07/00011706

União do Oeste

1082/2009, de 05/08/2009

800,00

100.000,00

PDI-07/00537589

Águas Mornas

428/2009, de 01/04/2009

1.000,00

138.389,00

PDI-07/00483128

Flor do Sertão

1532/2009,de 27/04/2009

Recomendação

Uso indevido Res Contingência -

 Vlr de R$ 8.570,00

PCP-09/00188421

Ituporanga

243/2009, de 14/12/2009

Recomendação

Providências em face ausência previsão Res. Contingência

PCP-09/00321601

Planalto Alegre

83/2009, de 05/10/2009

Recomendação

Providências em face ausência previsão Res. Contingência

PCP-09/00223510

Serra Alta

121/2009, de 26/10/2009

Recomendação

Providências em face previsão Reserva Contingência em vlr inferior ao previsto art.8º LDO-Município.

PCP-09/00186216

Lages

268/2009, de 16/12/2009

Recomendação

Providências em face reincidência uso indevido Reserva Contingência (vlr. R$ 680.950,00,ex 2008).

PCP-09/00243899

Caibi

141/2009

Recomendação

Evitar reincidência uso indevido Res Contingência, sob pena autos apartados

Notas:

(1)   Não consta da decisão informação acerca do valor total da dotação destinada para fins de Reserva de Contingência, nem o percentual definido na LDO incidente sobre a RCL.

(2)   Os valores informados foram utilizados para finalidades diversas daquelas previstas no art. 5º, III, b, da LRF.

 

Apesar de se tratar de uma pequena amostra é possível extrair indicativo de que este Tribunal de Contas caminha em direção à exigência de cumprimento do art. 5º, III, b, da LRF, não só no que se refere ao uso restritivo da dotação “Reserva de Contingência” para atender passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos, como também há uma tendência no sentido de se estimular as Unidades Gestoras a fazerem constar nas leis orçamentárias do Município - Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e Lei Orçamentária Anual (LOA) - a previsão de dotação orçamentária a título de Reserva de Contingência.

A “suplementação de dotações insuficientes por falha de previsão ou por gastos normais da atividade pública” tem sido repelida, em acordo com o item 1 do Prejulgado 1147 desta Corte de Contas.

 

Deliberação recente sobre o assunto. Decisão n. 524/2010

Ainda, recentemente, na Sessão Ordinária realizada no dia 02/08/2010 o assunto voltou à pauta. O processo n. PDI-07/00011382, decorrente da formação de autos apartados prevista no Parecer Prévio n. 0165/2006, autos PCP-06/00047547, relativo às contas anuais do exercício de 2005 da Prefeitura Municipal de São Martinho, foi objeto de apurada instrução sob a direção do seu ilustrado Relator, Conselheiro Salomão Ribas Junior.

 

Peço vênia a Sua Excelência para reportar passagens do seu Relatório e Voto de n. 330/2010, que fundamentam a Decisão n. 524/2010, através da qual este Tribunal cominou multa ao Responsável, no valor de R$ 1.000,00, pelo uso indevido da dotação “Reserva de Contingência”.

 

Com sua habitual acuidade o Exmo. Senhor Conselheiro Relator historiou, embasado em manifestação da Diretoria Técnica, que o Gestor do Município de São Martinho no exercício de 2005, de forma reincidente, utilizou recursos vinculados à Reserva de Contingência sem atender o preconizado pelo art. 5º, III, b, da Lei Complementar Federal n. 101, de 2000.

 

O Sr. Conselheiro Salomão Ribas cuidou de buscar a manifestação da Municipalidade para prestar esclarecimentos adicionais, tais como: se ocorreu o atendimento de passivos contingentes durante o exercício; qual a época em que os recursos da Reserva de Contingência foram utilizados para suplementar dotações insuficientes; e se no final do exercício restaram despesas a pagar a título de passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos.

Entretanto, o Responsável não se pronunciou.

 

A instrução dos autos foi então encerrada, alimentada com a informação de uso de recursos da dotação “Reserva de Contingência” no montante de R$ 145.176,00, à margem da previsão do art. 5º, III, da LRF.

 

Tais despesas, segundo as justificativas apresentadas pela Unidade Gestora na fase de instrução, foram realizadas nos termos da “Portaria Interministerial n. 163 da Secretaria do Tesouro Nacional – STN; na Nota Técnica n. 152/2006, proveniente da consulta formulada pela FECAM- Federação Catarinense dos Municípios – ao Ministério da Fazenda, a respeito da utilização da reserva de contingência; e Notas Técnicas expedidas pela STN.

 

A esse respeito, o eminente Conselheiro Relator registra argumentos da DMU no sentido de “que a Portaria Interministerial indigitada é frontalmente contrária ao disposto na LRF, Lei Complementar n. 101/2000, assim como a Nota Técnica da FECAM é incompatível com o entendimento desta Corte de Contas, consubstanciado no Prejulgado n. 1235/2002”, transcrevendo depois disso, parte do Relatório DMU n. 2.560/2007 (ratificado pela Informação n. 238/2009), que contém os fundamentos para o entendimento do Órgão de Instrução.

 

A Consulta

Dei destaque ao processo acima pela sua atualidade e porque os mesmos instrumentos – Portaria Interministerial n. 163 da STN e a Nota Técnica n. 152/2006 resultante de consulta promovida pela FECAM à STN/MF, que foram apontados pela Unidade Gestora (Prefeitura Municipal de São Martinho) para justificar a utilização dos recursos da dotação “Reserva de Contingência” para fins diversos daqueles estabelecidos no art. 5º, III, b, da LRF, instigam a consulta sob apreciação.

Em outras palavras: a Entidade consulente defende expressamente junto a esta Corte de Contas que seja admitido o uso extensivo da “Reserva de Contingência” para fins de “suplementações de dotações orçamentárias” destinadas a outras finalidades (fls. 04/05).

 

Os debates suscitados em face da matéria giram em torno da extensão dos efeitos do art. 8º da Portaria Interministerial n. 163, qual seja: permitir a aplicação do art. 91 do Decreto-lei n. 200, de 1967, aos demais entes da Federação (na situação concreta, aos Municípios) por força da interpretação dada por intermédio da Nota Técnica n. 152/2006, da STN, que responde consulta provocada pela FECAM, a qual se constitui da real interessada na presente consulta.

 

O equacionamento dos autos passa pela composição entre os diferentes posicionamentos ou o acolhimento de um dos seguintes entendimentos. Na seqüência, referencio:

 

1 - A Diretoria de Controle dos Municípios (DMU) em sua intervenção nestes autos sempre se posicionou taxativamente pela aplicação restritiva do teor do art. 5º, inciso III, letra b, da Lei Complementar n. 101, de 2000, quando se trata da utilização dos recursos da “Reserva de Contingência” (Relatório n. 1291/2006, fls. 22/40, e Informação n. 480/2008, fls. 142/151).

Esse entendimento resta ratificado na instrução dos autos que originaram a Decisão n. 0534/2010, focada acima. 

 

2 – A Consultoria Geral, que tem a atribuição de examinar as consultas, em seu Parecer n. 343/2006 acerca deste processo (fls. 42/59), pende em favor de certa flexibilidade no uso da dotação.

Vejo com dificuldade a aplicação concreta da proposta do digno Órgão Consultivo desta Casa, pela ausência de critérios objetivos, que conduzem à falta de condições para aferição dos parâmetros entabulados. Reproduzo parcialmente a conclusão do Parecer 343/2006 (fls. 58/59):

........................................

A Reserva de Contingência, prevista no Decreto-lei n. 200/67 e na Lei Complementar n. 101/2000, pode ser utilizada para suplementação de dotação orçamentária ou para a abertura de créditos especiais, devendo obrigatoriamente cumprir sua função primordial que é o atendimento de passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos.

 

A utilização para a suplementação de dotação orçamentária ou para a abertura de créditos especiais, sem pretender acorrer ao atendimento de passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos, não poderá gerar o esgotamento da reserva de contingência, mantendo-se alocação suficiente de recursos para cumprir o fim previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal, devendo, ainda, ser precedida de autorização legislativa específica.

 

 O seu préstimo para os fins consignados na Lei de Responsabilidade Fiscal, atendimento de passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos, permite o seu manejo de forma direta pelo Poder Executivo, dispensando a prévia autorização legislativa.

 

Cabe ao Chefe do Poder Executivo agir com responsabilidade quando da utilização direta da reserva de contingência sem autorização legislativa específica, certificando-se de que o caso no qual empregará os recursos alocados na reserva de contingência visa atender passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos, pois se assim não for, estará infringindo a Constituição Federal, a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Lei n. 4.320/64, maculando, destarte, as suas contas perante este Tribunal.

 

3 – O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas emitiu o Parecer n. 4564/2006, subscrito pelo então Procurador Carlos Humberto Prola Júnior (fls. 60/69), segundo o qual contesta com veemência a vigência do art. 91 do Decreto-lei 200/67, sob os auspícios do art. 8º da Portaria Interministerial n. 163. Discorre acerca da “pirâmide normativa” de nosso ordenamento jurídico, em virtude da qual evidencia a revogação do dispositivo (art. 91) frente às disposições da Lei de Responsabilidade Fiscal.

 

Advoga a rigorosa destinação dos recursos da “Reserva de Contingência” para os fins previstos no art. 5º, III, da LRF, aduzindo ser “Impossível conciliar a existência de uma dotação que não se sabe onde será gasta com o planejamento das finanças públicas exigido pela Constituição” (fls. 66).

 

Adita que a hipótese cogitada de liberalidade na utilização da Reserva de Contingência ofende “o próprio espírito da Lei Complementar 101/2000, que estabelece no art. 1º, § 1º que ‘a responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente” (fls. 67). Grifado e sublinhado no original.

 

Recorre, ainda, o Dr. Procurador, em defesa de sua tese, ao teor da mensagem do veto da alínea “a”, do inc. III, do art. 5º, da LRF, cuja norma dispunha que a “Reserva de Contingência” poderia ser destinada ao “pagamento de restos a pagar que excederem as disponibilidades de caixa ao final do exercício”, destacando-se:

... O dispositivo não respeita o princípio que deve nortear a introdução de reserva de contingência na proposta orçamentária: a prudência. A reserva de contingência deve representar proteção contra riscos e passivos contingentes capazes de ameaçar o equilíbrio orçamentário e, como tal, destinar-se a gastos novos, imprevistos. (...). Grifos do original (fls. 67).

 

Sustenta, a final, entendimento no sentido de que,

“Não é possível a utilização da reserva de contingência como fonte de recursos para a abertura de créditos adicionais, para outras finalidades, que não o atendimento de passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos (fls. 69).

 

4 – O Relator, à época, Conselheiro Relator Moacir, assim se manifestou:

a)  Por primeiro, conforme Relatório n. 0328/2007 (fls. 72/88), cujo exame abarca o conteúdo do processo apensado – TCGAP-06/90028784, derivado de manifestação do Exmo. Sr. Conselheiro César Filomeno Fontes, bem assim, o parecer editado pela Assessoria da Presidência acerca do exposto por Sua Excelência.

Também é analisada a questão respeitante à Portaria Interministerial n. 163; a Nota Técnica n. 152/2006 que interpreta o art. 8º da referida Portaria; o alcance do art. 91 do Decreto-lei n. 200, de 1967; e, ainda, outras publicações e atos do Governo Federal – particularmente, aqueles exarados pela Secretaria do Tesouro Nacional.

Nessa oportunidade houve destaque para a orientação expedida por este Tribunal de Contas por meio do “Guia da Lei de Responsabilidade Fiscal” – 2ª edição, 2002, que no item 7.2.2 analisa a dotação “Reserva de Contingência”, a qual, além de definir o uso restritivo dos recursos, recomendava:

 

- que os valores correspondentes ao percentual destinado para a dotação constituíssem “reserva financeira específica”;

- que, no final do exercício, o saldo financeiro existente poderia constituir disponibilidade de caixa ou ser destinado a compor a reserva do próximo exercício.

 

Concluiu, então, por apresentar ao Tribunal Pleno proposta de decisão para responder a consulta no sentido de que a “Reserva de Contingência” somente pode ser utilizada para os fins do art. 5º, III, b, da LRF (fls. 87/88).

 

b)  Na seqüência, o Sr. Relator formulou “Adendo” ao seu Voto, nos termos do Relatório n. 0397/2007 (fls. 135/138), que traduz exame dos argumentos reiterados pelo ilustre Conselheiro César Filomeno Fontes em Voto Divergente que compõe as fls. 89/101 (reiteradas às fls. 119/134).

No final, o Conselheiro Moacir Bertoli reafirma sua Proposta de Decisão que sustenta a destinação dos recursos da Reserva de Contingência exclusivamente para os fins estabelecidos na Lei Complementar Federal n. 101, de 2000.

 

5     – O Sr. Conselheiro César Filomeno Fontes, a par do processo apensado, apresentou Voto Divergente de n. 745/2007 (fls. 89/101), que reitera seu posicionamento firmemente exposto em todas as suas intervenções no trato da matéria, no sentido de que:

5.1. em observância aos arts. 4º, § 3º e 5º, III, b, da LRF, é obrigatória a destinação de recursos para fins de Reserva de Contingência na Lei Orçamentária Anual, “suficiente ao atendimento de passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos”, inclusos no “Anexo de Riscos Fiscais”, segundo as definições contidas na Lei de Diretrizes Orçamentárias;

5.2. com base no art. 8º da Portaria Interministerial n. 163, de 2001, propõe que sejam destinados recursos “na conta Reserva de Contingência constante da Lei Orçamentária Anual, recomendável até 2% da Receita Prevista na Lei Orçamentária” para abertura de créditos adicionais genéricos.

Sugere, ainda, a revogação do Prejulgado 1147/2002.   

 

 

6     – O Exmo Sr. Conselheiro Salomão Ribas Junior, que marcou sua participação ativa no debate dos autos, propugna uma solução conciliatória, haja vista os entendimentos opostos, ambos com evidentes méritos segundo menciona, adotados pelo então Relator, Conselheiro Moacir Bertoli, e o ilustre Conselheiro César Fontes.

 

O Relatório n. 145/2008 (fls. 139/140) aponta oportuno desfecho para os autos sob exame, ao propor a adição de exceção à regra geral de restrição ao uso da dotação “Reserva de Contingência”, nos seguintes termos:

 

“Admite-se, de outra parte, a utilização desses recursos para outra finalidade desde que atendidos os passivos contingentes e não havendo mais o que pagar como riscos ou eventos fiscais imprevistos”.

 

7 – Este Relator inclina-se por trilhar o caminho da composição para a resposta à Consulta, propondo para tanto, o acolhimento do entendimento proporcionado pelo eminente Conselheiro Salomão Ribas Junior.

 

A defesa intransigente da responsabilidade do Gestor Público na elaboração das Leis Orçamentárias é inerente a este Tribunal de Contas. Para tanto, a Diretoria Técnica é instada a manter permanente acompanhamento acerca dos textos de lei (LDO e LOA, além do PPA) editados e sua execução, como também sua análise por ocasião da apreciação das contas anuais dos Municípios.

 

A falta de planejamento e de transparência nas ações administrativas, que afrontam a responsabilidade na gestão fiscal preconizada pela Lei Complementar Federal n. 101, de 2000, não podem servir de fundamento para lançar mão de dotação destinada ao atendimento de passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos.

 

Quando se trata do Anexo de Riscos Fiscais, previsto pelos arts. 4º e 5º da LRF, o Gestor Público deve atentar às disposições anualmente emitidas pela Secretaria do Tesouro Nacional, direcionadas à União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

 

A propósito, a normatização para o exercício de 2011, objeto da Portaria n. 249, de 30/04/2010, da Secretaria do Tesouro Nacional (STN/MF), introduz entre outros instrumentos o “Manual de Demonstrativos Fiscais”, o qual contempla o Anexo de Riscos Fiscais previsto pelo art. 4º, § 3º, da LC n. 101, de 2000.

 

Segundo o referido Manual:

 

É importante ressaltar que riscos repetitivos deixam de ser riscos, devendo ser tratados no âmbito do planejamento, ou seja, devem ser incluídos como ações na Lei de Diretrizes Orçamentárias e na Lei Orçamentária Anual do ente federativo. Por exemplo, se a ocorrência de catástrofes naturais – como secas ou inundações - ou de epidemias – como a dengue - tem sazonalidade conhecida, as ações para mitigar seus efeitos, assim como as despesas decorrentes, devem ser previstas na LDO e na LOA do ente federativo afetado, e não ser tratada como risco fiscal do Anexo de Riscos Fiscais.  Grifou-se.

 

Como se constata os procedimentos relacionados ao assunto têm evoluído e o Administrador Municipal não pode manter-se alheio, deixando de destinar recursos ordinários para fazer frente às situações calamitosas que afetam regularmente seu território e população.

 

No tocante aos Riscos Fiscais o tema é desenvolvido didática e minuciosamente no documento da STN, inclusive com a formulação de tabelas (modelos) que podem se adotadas pelo ente federativo, conforme especificações.

 

A par disso, o mesmo Manual contém um capítulo (item 6) destinado à descrição das infrações cometidas pelo Gestor que não atenta para o cumprimento da LRF, com elaboração do “Quadro 5” que discrimina a legislação, o que deve ser efetivado e quais as restrições e/ou penalidades a que se sujeita o Responsável.

 

A flexibilização para eventual utilização dos recursos para abertura de créditos adicionais, na forma que se está a propor, não autoriza nem o super dimensionamento da dotação para permitir a livre destinação dos recursos, nem o seu uso ao longo do exercício para suplementar recursos de toda sorte, por falta de planejamento.

 

Haverá de ser demonstrada e justificada a sua utilização, conforme previamente estabelecido na legislação local (LDO e LOA), em situações limitadas e valores razoáveis, sempre que a destinação não for precisamente aquela especificada no art. 5º, inciso III, letra “b”, da Lei de Responsabilidade Fiscal. 

 

8 – Revogação e Reforma de Prejulgados

A proposta de decisão que me propus apresentar ao ilustre Plenário desta Casa importa em revogação e/ou reforma de Prejulgados, em observância ao art. 156 do Regimento Interno (Resolução n. TC-06/2001), o qual prevê: “Considera-se revogado ou reformado o prejulgado sempre que o Tribunal, pronunciando-se sobre o mesmo, firmar nova interpretação, caso em que a decisão fará expressa remissão à reforma ou revogação”. Desta forma, cabe:

 

a)    Revogar o Prejulgado 1079, que estabelece:

Com o advento da Lei de Responsabilidade Fiscal, não mais cabe utilizar a Reserva de Contingência para suplementação de dotação por qualquer motivo, mas apenas para fazer frente a pagamentos de despesas inesperadas (passivos contingentes e eventos fiscais imprevistos)”.

 

b)    Reformar o Prejulgado 1147, item 1, que passa a dispor:

Com o advento da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n. 101/2000) a Reserva de Contingência somente poderá ser utilizada para suplementação de dotações orçamentárias visando a pagamentos de despesas inesperadas, decorrentes de situações imprevisíveis, como calamidades públicas, fatos que provoquem situações emergenciais etc, ou para cobrir passivos contingentes e eventos fiscais imprevistos, somente sendo admitida a utilização desses recursos para outra finalidade no final do respectivo exercício, justificadamente, e conforme dispuser a legislação local (LDO e LOA), desde que atendidos os passivos contingentes e não houver resíduos a pagar a título de riscos ou eventos fiscais imprevistos”.

 

c)    Reformar o Prejulgado 1235, item 5, que passa a dispor:

Com o advento da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n. 101/2000) a Reserva de Contingência somente poderá ser utilizada para suplementação de dotações orçamentárias visando a pagamentos de despesas inesperadas, decorrentes de situações imprevisíveis, como calamidades públicas, fatos que provoquem situações emergenciais etc, ou para cobrir passivos contingentes e eventos fiscais imprevistos, somente sendo admitida a utilização desses recursos para outra finalidade no final do respectivo exercício, justificadamente, e conforme dispuser a legislação local (LDO e LOA), desde que atendidos os passivos contingentes e não houver resíduos a pagar a título de riscos ou eventos fiscais imprevistos”.

 

 

3. VOTO

PROPOSTA DE DECISÃO

 

Em conformidade com o exposto, VOTO por submeter à deliberação do Plenário a seguinte proposta de DECISÃO:

 

3.1. Conhecer da presente Consulta formulada pela Federação Catarinense de Municípios-FECAM, através do então Presidente e Prefeito Municipal de Governador Celso Ramos, Sr. Anísio Anatólio Soares, por preencher os requisitos e formalidades preconizados nos arts. 103 e 104 do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 2001) do Tribunal de Contas.

3.2. Responder à Consulta nos seguintes termos:

3.2.1. A dotação prevista na Lei Orçamentária Anual (LOA), a título de Reserva de Contingência, é destinada ao atendimento de passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos, de acordo com o art. 5º, inciso III, letra “b”, da Lei Complementar Federal n. 101, de 2000 (LRF), observada a forma de utilização e o valor definido com base na receita corrente líquida (RCL), determinados na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), conforme estabelecido no art. 4º, § 3º, da LRF.

3.2.2. É admitida a utilização dos recursos da dotação Reserva de Contingência para outra finalidade, no final do respectivo exercício, justificadamente, e conforme dispuser a legislação local (LDO e LOA), desde que atendidos os passivos contingentes e não houver resíduos a pagar a título de riscos ou eventos fiscais imprevistos.

3.2.3. Com fundamento no art. 156 do Regimento Interno (Resolução n. TC-06/2001) do Tribunal de Contas, revogar o Prejulgado n. 1079.

3.2.4. Reformar o item 1 do Prejulgado n. 1147, com base no art. 156 do Regimento Interno, que passa a ter a seguinte redação:                                                              “Com o advento da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n. 101/2000) a Reserva de Contingência somente poderá ser utilizada para suplementação de dotações orçamentárias visando a pagamentos de despesas inesperadas, decorrentes de situações imprevisíveis e não sazonais, como calamidades públicas, fatos que provoquem situações emergenciais etc, ou para cobrir passivos contingentes e eventos fiscais imprevistos, somente sendo admitida a utilização desses recursos para outra finalidade no final do exercício, como dispuser a legislação local (LDO e LOA), desde que atendidos os passivos contingentes e não havendo mais o que pagar como riscos ou eventos fiscais imprevistos”.

3.2.5. Reformar o item 5 do Prejulgado n. 1235, com base no art. 156 do Regimento Interno, que passa a ter a seguinte redação:                                                              “Com o advento da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n. 101/2000) a Reserva de Contingência somente poderá ser utilizada para suplementação de dotações orçamentárias visando a pagamentos de despesas inesperadas, decorrentes de situações imprevisíveis e não sazonais, como calamidades públicas, fatos que provoquem situações emergenciais etc, ou para cobrir passivos contingentes e eventos fiscais imprevistos, somente sendo admitida a utilização desses recursos para outra finalidade no final do exercício, como dispuser a legislação local (LDO e LOA), desde que atendidos os passivos contingentes e não havendo mais o que pagar como riscos ou eventos fiscais imprevistos”.

3.3. Dar ciência da Decisão, do Relatório e Voto do Relator ao Sr. Anísio Anatólio Soares, Prefeito Municipal do Município de Governador Celso Ramos, Consulente, e ao Sr. Saulo Sperotto, Prefeito Municipal de Caçador e Presidente da FECAM.

 

Florianópolis, em 02 de setembro de 2010.

 

 

Herneus De Nadal

Relator