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ESTADO DE SANTA CATARINA
TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
GABINETE CONSELHEIRO LUIZ ROBERTO HERBST |
PROCESSO Nº |
REC-06/00315908 |
UNIDADE GESTORA |
Prefeitura Municipal de São Pedro de Alcântara |
RESPONSÁVEL |
Márcia Helena Neves |
ASSUNTO |
Recurso de Reconsideração - art. 77 da LC 202/2000 - TCE-03/03013869 |
RELATÓRIO Nº |
GC - LRH/2008/562 |
Recurso de Reconsideração. Constitucional.
A prova produzida sem a observância do contraditório é insuficiente para fundamentar uma condenação.
Conhecer e dar Provimento. Anular Acórdão.
Versam os autos sobre Recurso de Reconsideração, interposto pela Sra. Márcia Helena Neves, Servidora Pública Municipal de São Pedro de Alcântara, contra o Acórdão nº 529/2006, proferido nos autos do Processo nº TCE - 03/03013869, na sessão do dia 20/03/2006, nos seguintes termos:
6.1. Julgar irregulares, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, inciso III, alínea "c", c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, que trata de irregularidades constatadas quando da auditoria realizada na Prefeitura Municipal de São Pedro de Alcântara, com abrangência sobre processos licitatórios e a realização de despesas com o Programa "Parques e Jardins", referentes ao exercício de 1998, em decorrência de Denúncia formulada a este Tribunal de Contas, e condenar os RESPONSÁVEIS SOLIDÁRIOS Sr. SALÉZIO ZIMMERMANN - ex-Prefeito Municipal de São Pedro de Alcântara, CPF n. 378.343.639-72, e Sras. MÁRCIA HELENA NEVES, CPF n. 850.742.689-15, e ANA CLÁUDIA PAULI DE AMORIM, CPF n. 910.495.479-34 - Servidoras Públicas Municipais de São Pedro de Alcântara em 1998, ao pagamento da quantia de R$ 4.083,46 (quatro mil, oitenta e três reais e quarenta e seis centavos), pertinente a despesas inidôneas, decorrentes de processos licitatórios fraudulentos, em afronta aos arts. 62, 63, caput e §2º, III, da Lei Federal n. 4.320/64 e 3º da Lei Federal n. 8.666/93, conforme apontado nos itens 2.1 e 2.2 do Parecer DDR, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovarem, perante este Tribunal, o recolhimento do valor do débito aos cofres do Município, atualizado monetariamente e acrescido dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir da data da ocorrência do fato gerador do débito, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II, da Lei Complementar n. 202/2000).
6.2. Determinar à Administração Municipal de São Pedro de Alcântara que, doravante, classifique as despesas de acordo com os objetivos dos Projetos/Atividades previstos no orçamento a que pertencem, sob pena de multa no caso de reincidência, com base no inciso VI do art. 70 da Lei Complementar n. 202/2000.
A Consultoria Geral emitiu o Parecer n. 151/2008 de fls. 37/44, oportunidade em que verificou o atendimento dos pressupostos de admissibilidade.
Em preliminar, tratou-se da nulidade absoluta e impedimento do Relator. Para isso manifestou-se a COG nos seguintes termos:
Compulsando os autos, verifica-se que o Exmo. Sr. Conselheiro Relator funcionou como órgão do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina às fls. 59, 62 e 313.
A manifestação de membro do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas é causa de impedimento em processos em que figure como relator, quando esse membro é alçado a membro do próprio Tribunal de Contas do qual faz parte, por expressa previsão do art. 73, § 2º, I, da CF/88 c/c art. 61, § 2º, I, da CE/89.
Portanto, com fundamento nos arts. 73, § 3º e 75, da CR/88; 61, §§ 3º e 4º, da CE/89, c/c o art. 134, II, da Lei nº 5.869/73 - Código de Processo Civil, é a presente situação para revelar o impedimento, a qual deve ser corrigida, inclusive ex officio, sob pena de decretação de nulidade a partir da manifestação com esse vício.
Ao tratar do mérito cabe trazer os esclarecimentos do Parecer COG, relativos à nulidade absoluta do processo a partir da prova utilizada insuficientemente como fundamento da condenação, ainda que não foi oportunizado o exercício do contraditório e da ampla defesa ao Recorrente.
Esclarece a COG:
O Recorrente alega que a houve efetiva aquisição e entrega dos materiais licitados. Junta documentos.
Verifica-se nas fls. 84/86 que a prova utilizada como fundamento da condenação consiste em declarações perante o Ministério Público Estadual, as quais foram colacionadas nas fls. 43 e 44.
Nota-se que o Termo de Declaração de fls. 43 e 44 consubstacia o depoimento do gerente da empresa envolvida no processo licitatório apontado como irregular, narrando fatos que se revelam contrários ao Recorrente.
O depoente estava acompanhado de seu advogado e relatou o caso a dois membros do Parquet.
Não obstante o interesse jurídico do Recorrente nos fatos que lhe estavam sendo imputados diante do Ministério Público, não lhe fora oportunizado participar da produção da prova.
Nesse caso, há que se avaliar a matéria com alguma circunspecção.
A prova produzida perante o Ministério Público se reveste de natureza inquisitiva porque formada em investigação unilateral anterior ao processo penal.
Nesse aspecto, verifica-se ponderação da jurisprudência brasileira quanto ao valor da prova confeccionada em investigações criminais anteriores à fase processual. Normalmente, as questões controvertidas surgem no inquérito policial e estão relacionadas à inobservância do princípio do contraditório.1
Cita precedentes de fls. 42/43.
Cabe ressaltar as ponderações conclusivas apresentadas pela COG:
Constata-se nas decisões da Suprema Corte o posicionamento firme no sentido de não admitir a condenação baseada tão somente em provas produzidas em instrução unilateral, ou seja, sem a observância do contraditório.
No caso sob exame, a única prova contra o Recorrente consiste no testemunho de uma única pessoa, ouvida em ato não submetido à garantia do contraditório.
É nesse contexto que se observa a condenação: enquanto juízo de valor resultante de uma prova produzida à revelia do acusado.
Ausente a única prova que serve de base para a condenação, não se mantém o Acórdão.
Ante o exposto, deve ser provido o recurso.
Sendo assim, entendo que as razões expostas no Parecer da Consultoria Geral são suficientes para anular o Acórdão recorrido, tendo em vista nulidade insanável caracterizada pela ausência do contraditório e conseqüente cerceamento de defesa ao ora recorrente, nos termos do art. 5 inciso LV da Constituição Federal em relação a única prova constante nos autos, a qual serviu de base para a condenação.
O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas emitiu o Parecer MPTC n.4.841/2008, de fl. 45, ratificando o entendimento do Corpo Instrutivo.
É o relatório.
VOTO
CONSIDERANDO o estudo efetuado pela Consultoria Geral desta Corte, mediante Parecer n. COG 151/08;
CONSIDERANDO a manifestação da Procuradoria Geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, mediante Parecer MPTC N. 4.841/2008;
CONSIDERANDO o exposto, e com fulcro no artigo 59 da Constituição Estadual, no artigo 1º da Lei Complementar n° 202/2000 e no artigo 7° do Regimento Interno, proponho ao Egrégio Plenário o seguinte VOTO:
1. Conhecer do Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 77 da Lei Complementar n. 202/2000, contra o Acórdão n. 529/2006, proferido na Sessão Ordinária de 20/03/06, no Processo n. TCE - 03/03013869 e, no mérito, dar-lhe provimento para anular o Acórdão recorrido, tendo em vista nulidade insanável caracterizada pela ausência do contraditório e conseqüente cerceamento de defesa ao ora recorrente, nos termos do art. 5 inciso LV da Constituição Federal em relação a única prova constante nos autos, a qual serviu de base para a condenação.
2. Remeter os autos do Processo n. TCE - 03/03013869 à Diretoria de Controle dos Municípios - DMU para que seja proporcionado o exercício do contraditório em relação à produção de prova feita à revelia dos acusados.
3. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Parecer COG, à Sra. Márcia Helena Neves, Servidora Pública Municipal de São Pedro de Alcântara, e à Prefeitura Municipal de São Pedro de Alcântara.
Florianópolis, em 17 de outubro de 2008.