Processo nº

REC-06/00430162

do processo nº RPA-03/04875791 (2 volumes)

Unidade Gestora

Prefeitura Municipal de Anita Garibaldi

Recorrente

Roberto Marin, ex-Prefeito Municipal

Assunto

1. Processo RPA-03/04875791. Representação. Supostas irregularidades na efetivação do Convite n. 80/2002 para reforma de motoniveladora do Município. Acórdão nº 1123/2006. Considera irregulares os atos. Aplicação de multa.   

2. Recurso de Reexame. COG. Análise de admissibilidade e de mérito. Negar provimento. Endosso do MPTC.

3. Voto. Exame de mérito. Sentença judicial transitada em julgado. Improcedência da Ação Civil Pública relativa ao assunto. Dar provimento ao recurso.

Relatório n.

GCSSNI/2009/000224

 

 

 

RELATÓRIO

 

 

O Sr. Roberto Marin, ex-Prefeito Municipal de Anita Garibaldi, protocolou em 02/08/2006 neste Tribunal petição autuada como Recurso de Reexame do Acórdão nº 1123/2006 exarado na Sessão Plenária de 05/06/2006 (publicado no Diário Oficial do Estado n. 17929, de 21/07/2006), com relação aos autos de nº RPA-03/04875791, que examinaram Representação formulada por Vereadores Municipais, acerca de supostas irregularidades na execução do Convite n. 80/2002 e demais atos relacionados à efetivação de reforma de motoniveladora (patrola) do Município, resumido como segue:  

 

6.1. Conhecer do Relatório de Auditoria realizada na Prefeitura Municipal de Anita Garibaldi, com abrangência ao exercício de 2002, para considerar irregulares atos relativos à reforma geral de Motoniveladora HBW 140M, com fornecimento de peças.

 

6.2. Aplicar ao Sr. ROBERTO MARIN - ex-Prefeito Municipal de Anita Garibaldi, CPF n. 385.970.129-00, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, a multa no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), em face da realização de despesas com ausência de processo licitatório, em descumprimento ao prescrito art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal c/c os arts. 2º, caput, e 3º, caput, da Lei Federal n. 8.666/93, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000.

 

6.3. Representar, após o trânsito em julgado da decisão, com fulcro no art. 99 do Regimento Interno deste Tribunal, ao Ministério Público, à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Anita Garibaldi para conhecimento dos fatos apurados por este Tribunal, e tomada das providências que julgarem pertinentes.

 

Ao examinar a peça recursal, a Consultoria Geral (COG) elaborou o Parecer n. 85/2009 (fls. 06/14), que aponta o atendimento das preliminares de admissibilidade, e, no mérito, refuta as alegações recursais e propõe negar o provimento, ratificando o inteiro teor do Acórdão recorrido.

 

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas manifestou-se mediante o Parecer n. 2627/2009 subscrito pelo Sr. Procurador-Geral Adjunto Márcio de Sousa Rosa (fls. 15/16), que acompanha o entendimento da COG.

 

 

Ÿ  Manifestação da Relatora

 

Desde logo, destaco que o Recorrente “cumprindo as determinações contidas no OF. TCE/SEG n. 8.076/06”, segundo explicita, promoveu o recolhimento aos Cofres Estaduais da multa aplicada na forma do Acórdão n. 1123/2006, no valor de R$ 1.000,00, conforme “DARE-SC” de fls. 04, em 16/07/2006. Observo que a cópia do ofício a que se refere compõe as fls. 583/584 do processo RPA-03/04875791.

 

Apesar de efetivar o recolhimento da multa, o Recorrente, demonstra sua irresignação a respeito da decisão deste Tribunal, mediante as alegações resumidas como segue:

 

1.    não houve a devida valorização do procedimento licitatório realizado pela Administração e que os esclarecimentos apresentados não foram analisados apropriadamente por este Tribunal;

2.    deixou de ser considerado que o desmonte prévio da máquina se fazia necessário para definir as peças a serem licitadas (e orçadas) para a reforma geral do equipamento;

3.    o processamento da licitação e a participação de interessados não dependia da localização do equipamento (em empresa privada que fez o desmonte);

4.    a realização de eventual pintura de peças do equipamento desmontado deu-se à revelia da Administração;

5.     enfatiza as justificativas apresentadas anteriormente, quanto à escolha de empresa sediada no Município de Chapecó para o desmonte e avaliação das peças, quais sejam: (i) o nível de especialização das empresas lá sediadas compensa a maior distância - 217 km entre Chapecó e Anita Garibaldi, dos quais 50 km não eram asfaltados, porém apresentavam bom estado de conservação (DER) -, comparada com a do Município de Lages  - 105 km, cuja ligação à época (2002) não se fazia por estrada asfaltada; (ii) desconhecimento de qualquer Município da Micro-região (integrada por Anita Garibaldi) que tivesse reformado equipamento pesado em empresa sediada em Lages;

6.   aduz que todas as medidas adotadas visaram minimizar custos para a Administração e que não houve descumprimento da legislação nem infringência aos princípios (deveres) de “honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições públicas” (fls. 02/03).

A COG ao apreciar as alegações do Recorrente expõe que:

 

- o fato de “a máquina ter sido desmontada na mesma empresa que prestou o serviço, caracteriza-se como irregular, (...), ferindo o princípio da impessoalidade”;

- que a multa foi aplicada em face de “a escolha de local pela Prefeitura Municipal para armazenar a máquina ter sido considerada (...) inadequada”, acrescentando que além do fornecimento de peças, ocorreu a prestação de serviços, e que diante disso é ratificada a irregularidade;

- que a falta de conferência da documentação antes de efetivar o pagamento das despesas, não elidem a irregularidade pertinente à efetivação de pintura de partes da máquina sem o consentimento da Administração;

- sobre a especialização das empresas de Chapecó em detrimento da realização dos serviços em Lages, diz a COG que tal hipótese nem foi cogitada pelo Recorrente. Afirma a COG que as empresas de Lages “eram mais próximas à cidade de Anita Garibaldi e possuíam empresas com a mesma especialização”;

- que a Administração deveria ter efetivado procedimento de dispensa de licitação com vistas à eficácia do ato e viabilizar o exame do preço e sua compatibilidade com o mercado;

- transcreve parte do parecer do MPjTC no processo REC-04/05474938, acerca do conceito de economicidade; e

- assinala que a falta de processo licitatório “é causa para aplicação de multa”.

 

 

Devo relembrar que o processo RPA-03/04875791 que originou o Acórdão n. 1123/2006, decorre de Representação protocolada neste Tribunal em 03/07/2003 por Vereadores da Câmara Municipal de Anita Garibaldi, a respeito de supostas irregularidades descritas, em síntese, como segue:

 

·         uma motoniveladora (HWB 140M) do Município de Anita Garibaldi estaria desmontando desde junho 2002 na empresa Formáquinas Comércio de Peças e Serviços Ltda. (de Chapecó), e que em 01/12/2002 teria ocorrido a abertura de licitação na modalidade de Convite sob o n. 80/2002, cujo objeto corresponde à contratação da reforma do citado equipamento.

 

·         alegam os Representantes que a licitação se constituiu de uma fraude (visando dar aparência de regularidade à contratação), considerando que os serviços já estavam em execução na oportunidade em que aberta.

 

 

Além do Tribunal de Contas, os então Vereadores recorreram ao Ministério Público Estadual – Comarca de Anita Garibaldi, que promoveu Inquérito Civil – Portaria n. 05/2002-12/09, cuja documentação acompanha a inicial (fls. 04/198). 

 

Examinada a admissibilidade da Representação foi exarada a Decisão Plenária n. 4337/2003 (fls. 208 dos autos apensos), que determina à DDR a apuração dos fatos.

 

Nota-se que a Diretoria Técnica para fins de instrução, encaminhou ofícios requerendo informações/documentos ao então Prefeito (Sr. Rui Cândido Duarte, fls. 225) e ao Sr. Promotor de Justiça da Comarca de Anita Garibaldi (fls. 226).

 

As informações vieram aos autos, destacando-se a notícia oriunda do Ministério Público Estadual de que fora promovida Ação Civil Pública, naquela oportunidade objeto do Agravo de Instrumento n. 2003.028485-0 dirigido ao Tribunal de Justiça do Estado, frente à discussão acerca da prerrogativa de foro (Lei Federal n. 10.628, de 2002).

 

Cópia dos autos da Ação Civil Pública n. 003.03.001094-5, ajuizada perante a Comarca de Anita Garibaldi,consta das fls. 232 a 532.

 

Com base na documentação oriunda do Ministério Público Estadual a DDR elaborou o Relatório de Inspeção n. 089/05 (fls. 541/547 dos autos principais), cuja conclusão submetida à audiência do então Prefeito Municipal, requer justificativas sobre o encaminhamento da motoniveladora para reforma antes da realização da licitação, vencida pela mesma empresa, frustrando as disposições do inc. XXI do art. 37 da CF c/c a Lei Federal n. 8.666/1993. O ex-Prefeito apresentou as justificativas de fls. 555/557, complementadas pelas fls. 559/561 (autos apensos).

 

Na ocasião, o ex-Gestor esclareceu que a máquina fora encaminhada previamente para desmonte por se tratar de providência necessária para levantamento das peças a serem objeto da licitação e respectivo orçamento, visando sua reforma, tratando-se de um procedimento comum nessas hipóteses, e que não reverteu em qualquer ônus para a Municipalidade.

 

Ao reinstruir os autos (Parecer n. 18/2006, fls. 565/571 do processo principal) a Diretoria Técnica não acolheu as justificativas, salientando que o ato de encaminhar a motoniveladora para desmonte junto à Empresa Formáquinas em Chapecó constitui-se “por si só, suspeito” em face da distância entre os Municípios (Anita Garibaldi x Chapecó em comparação com Anita Garibaldi x Lages).

 

Diz ainda a DDR que “a gratuidade na desmontagem prévia do veículo e seu posterior conserto pela própria prestadora de serviços, evidencia com solar clareza a pactuação dirigida do resultado do certame posteriormente deflagrado, que serviu tão somente para a aparente regularidade da despesa pública” (fls. 569).

 

Acrescenta que a Lei de Licitações (art. 9º, I e II) veda a “participação do autor do projeto básico ou executivo na licitação de mérito”, estendendo esse entendimento, por analogia, à hipótese examinada. Afirma, ainda, que o veículo já estava “sendo consertado antes mesmo do certame ser anunciado aos interessados” (fls. 570).

 

Esses argumentos, em síntese, fundamentam o Acórdão n. 1123/2006.

 

Ao formalizar o recurso, o ex-Prefeito Roberto Marin reafirma que todos os procedimentos administrativos foram regularmente conduzidos, descrevendo a seqüência de passos seguidos para  viabilizar a execução da reforma.

 

Diante do reexame dos autos, ao acessar o andamento da Ação Civil Pública n. 003.03.001094-5 no site do Tribunal de Justiça do Estado, processada perante a Comarca de Anita Garibaldi, verifica-se que foi julgada improcedente a petição inicial do Ministério Público Estadual – Comarca de Anita Garibaldi.

 

Segundo a sentença do MM Juízo, datada de 18/11/2008,

 

A prova coletada durante a instrução não autoriza a conclusão de que houve simulação na realização do procedimento licitatório.

Apurou-se que não houve prévia execução do serviço, como exposto na exordial, mas apenas desmontagem do equipamento para realização de orçamento e aplicação de ‘fundo’ para conservação das peças desmontadas, tudo sem custo para os cofres municipais.

O serviço efetivamente licitado realizou-se após procedimento licitatório.

 

A decisão transitou em julgado em 27/01/2009, sendo o processo arquivado definitivamente.

 

Necessariamente, deve ser considerado que a manifestação da Diretoria Técnica, a qual subsidiou a deliberação deste Tribunal, pautou-se em todas as oportunidades, exclusivamente, na documentação oriunda do Ministério Público Estadual.

 

Não houve a realização de inspeção e/ou auditoria in loco; nem há comprovação nos autos de que em Lages existiam empresas igualmente capacitadas para execução dos serviços de desmontagem e avaliação de equipamentos do tipo motoniveladora, e por fim, para realização da reforma geral – para corroborar as assertivas da Instrução.

 

A par disso, observo que a licitação realizada pela Prefeitura de Anita Garibaldi em dezembro de 2002 contou com a apresentação de três propostas válidas, sendo selecionada a de menor preço referente aos 214 itens listados (peças) além de 3 itens relativos à mão-de-obra inerente à reforma (fls. 360/403 do processo principal). Empresas participantes:

 

De Chapecó:

- Formáquinas Com de Peças e Serviços Ltda. .................. R$ 52.798,16

- Pavimáquinas Comércio de Peças e Serviços Ltda. ......... R$ 55.055,98

De Xanxerê:

- Upemaq Comércio de Máquinas Peças e Serv Ltda.......... R$ 57.511,26

 

A Empresa Macromaq Equipamentos Ltda., de Chapecó (com estabelecimentos em São José e Curitiba), firmou expresso desinteresse (fls. 405).

 

Não revelam os autos questionamentos quanto à efetiva realização dos serviços e conseqüente despesa, nem há ressalvas quanto ao preço contratado.

 

Com ênfase para a sentença judicial, que se posicionou pela improcedência das alegações e pedidos deduzidos através da Ação Civil Pública – a qual foi utilizada como sustentação para o exame técnico deste Tribunal -, entendo que cabe, nesta oportunidade, dar provimento ao recurso, para reformar o Acórdão n. 1123/2006 e considerar regulares os atos e procedimentos administrativos a que se referem os autos principais, o que importa em cancelamento da multa cominada.

 

Nestes termos, divirjo dos posicionamentos da Consultoria Geral e do Ministério Público Especial.

 

Cito por último, à vista do recolhimento do valor da multa comprovado nestes autos recursais, que o Recorrente deverá requerer à Fazenda Estadual a restituição da importância.

 

 

 

PROPOSTA DE ACÓRDÃO

 

 

Em conformidade com o exposto, VOTO por submeter à deliberação Plenária a seguinte PROPOSTA DE ACÓRDÃO:

 

 

Vistos, relatados, ....., e

 

Considerando a sentença proferida pelo MM Juízo da Comarca de Anita Garibaldi que julgou improcedente a Ação Civil Pública n. 003.03.001094-5, transitada em julgado em 27/01/2009;

 

Considerando que a instrução técnica do processo n. RPA-03/04875791 fundamentou-se na documentação decorrente do Inquérito Civil – Portaria n. 05/2002-12-09 do Ministério Público Estadual – Comarca de Anita Garibaldi e posterior Ação Civil Pública ajuizada perante a mesma Comarca;

 

Considerando que o Acórdão n. 1123/2006, exarado na Sessão Plenária de 05/06/2006 deste Tribunal, amparou-se em conclusões julgadas improcedentes pelo Poder Judiciário; e

 

Considerando as razões expostas pelo Recorrente, que sustentam, mediante reiteração, a inexistência de irregularidade com referência aos atos praticados visando a reforma da máquina Motoniveladora HWB 140M, do Município, viabilizada através do Convite n. 80/2002,

 

 

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pela Relatora e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

 

6.1. Conhecer do Recurso de Reexame, amparado no art. 80, da Lei Complementar n. 202, de 2000, c/c o art. 139, do Regimento Interno (Resolução n. TC-06/2001), interposto contra o Acórdão n. 1123/2006, exarado na Sessão Ordinária de 05/06/2006, nos autos do Processo n. RPA-03/04875791 e, no mérito, dar-lhe provimento para:

 

6.1.1. Modificar o item 6.1 da decisão recorrida que passa a ter a seguinte redação:

 

6.1. Considerar regular o Convite n. 80/2002 e demais atos relativos à reforma geral realizada na Motoniveladora HBW 140M, do patrimônio do Município de Anita Garibaldi.

 

6.1.2.  Cancelar a multa aplicada conforme o item 6.2 da decisão recorrida;

 

6.1.3. Cancelar o item 6.3 da decisão recorrida.

 

 

6.2. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto da Relatora que o fundamentam, ao Sr. Roberto Marin, ex-Prefeito Municipal, aos Representantes, e à Prefeitura Municipal de Anita Garibaldi.

 

 

Florianópolis, em 30 de junho de 2009.

 

                                                                      

 

 

Sabrina Nunes Iocken

Conselheira Substituta

Relatora (art. 86, § 4º, LC n. 202, de 2000)