TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

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Gabinete do Auditor Gerson dos Santos Sicca

 

  PROCESSO N.

 

PDI 07/00015531 

 

 

0

UG/CLIENTE

 

Prefeitura Municipal de Mafra

 

 

 

RESPONSÁVEL

 

Sr. João Alfredo Herbst

Prefeito Municipal (Gestão 2005 a 2004)

 

 

 

ASSUNTO

 

Restrições constantes do Relatório de Contas Anuais do exercício de 2005, apartadas em autos específicos por decisão do Tribunal Pleno - Reinstrução 

 

 

Imperfeição da prestação de contas.

 

A prestação de contas apresentada de forma imperfeita, com inconsistências entre demonstrativos contábeis e entre fontes diferentes de informações, caracteriza grave irregularidade, sujeita a cominação de multa. 

 

Divergências contábeis.  

 

Divergências contábeis quando possuírem baixa relevância percentual, não comprometem a confiabilidade das informações do Balanço Geral Anual.

 

 

I – RELATÓRIO

 

Tratam os autos de restrições constantes do Relatório de Contas Anuais do Município de Mafra, referente ao exercício de 2005, apartadas em autos específicos, por decisão do Tribunal Pleno em sessão de 18/12/2006, conforme Parecer Prévio n. 215/2006 (fls. 2/3 dos autos).

Apreciada a matéria extraída das Contas Anuais, foi realizada audiência ao responsável, Sr. João Alfredo Herbst, para que, no prazo de 30 (trinta) dias, apresentasse alegações de defesa relativas às impropriedades verificadas.

A Audiência foi atendida com a remessa das justificativas e documentos que as embasam (fls. 4 a 43). Estas foram devidamente apreciadas pela Diretoria de Controle dos Municípios – DMU, que elaborou o Relatório de Reinstrução n. 857/2008 (fs. 52/63), o qual conclui pelo saneamento de três restrições (itens 2, 5 e 6 do Relatório de Instrução) e a  permanência das restrições transcritas na seqüência, razão pela qual sugere o Órgão Técnico considerar irregulares, sem imputação de débito, mas com a cominação de multas ao Sr. João Alfredo Herbst, Prefeito Municipal de Mafra em 2005:

1.1.  (inciso II) Divergência de R$ 1.576.298,90 entre os valores consignados para as transferências financeiras recebidas (R$ 2.444.260,86) e as transferências financeiras concedidas (R$ 867.961,96) registradas no Balanço Consolidado do Município (exercício de 2005), em desacordo com os preceitos contidos na Lei n. 4.320/64, especialmente os artigos 89, 90, 101, 103 e 104 (item 1 deste Relatório);

1.2.  (inciso II) Divergência de R$ 1.579.420,90 entre a variação do saldo patrimonial financeiro, da ordem de R$ 3.203.751,45, com o resultado da execução orçamentária (superávit no valor de R$ 1.624.330,55), em desacordo com os preceitos contidos na Lei n. 4.320/64, especialmente os artigos 89, 90, 101, 103 e 104 (item 3);

1.3.  (inciso II) Divergência no montante de R$ 10.835,97, verificada entre a amortização da Dívida Fundada registrada no Anexo 15 (R$ 284.208,13) e a contabilizada no elemento de despesa 4.6.90.71 – Principal da Dívida Contratual Resgatado, bem como apresentada na movimentação da Dívida Fundada, Anexo 16 (R$ 295.044,10), em afronta aos preceitos contidos na Lei n. 4.320/64, especialmente o artigo 98 (item 4);

1.4.  (inciso II) Prestação de Contas Anuais do Prefeito Municipal de forma imperfeita, em virtude da remessa de inúmeros demonstrativos contábeis incompletos, descumprindo os preceitos estabelecidos na Lei Federal n. 4.320/64, especialmente o seu artigo 85, além da omissão de informações em atendimento ao Ofício Circular TC/DMU 5.393/2006, em descumprimento aos artigos 20 c/c 10 e 85 da Resolução TC – 16/94, caracterizando ainda controle interno deficiente nos termos do mesmo diploma legal (item 7).

Concluída a análise técnica, seguiram os autos ao Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, o qual, manifestando-se através do Parecer de n. 1964/2008 (fls. 65/68), apresenta seu entendimento divergente do Órgão Técnico.

Além de considerar as irregularidades evidenciadas como falhas de natureza formal sem repercussão de dano ao erário, insta o art. 5°, inciso XLVI da Constituição Federal para afastar a aplicação de multa ao responsável, em face da ausência de lei para normatizar a aplicação da pena e a sua individualização. Afirma que a sugestão do Órgão Técnico por si só fere o referido preceito constitucional que impõe a individualização da pena como uma garantia fundamental de todo o cidadão brasileiro.


II - FUNDAMENTAÇÃO

A Diretoria de Controle de Municípios - DMU e do Ministério Público Especial divergem quanto ao julgamento dos presentes autos e a possibilidade de cominação de multas.

A fim de que a presente proposta de voto ofereça fundamentação adequada à manifestação plenária, passo a discorrer sobre as peculiaridades e circunstâncias relativas às irregularidades evidenciadas e as manifestações do Órgão Técnico e MP.

a) Quanto ao mérito – gravidade das divergências contábeis evidenciadas

As divergências contábeis não estão dentre aquelas consideradas gravíssimas pela Portaria n. 233/2003 deste Tribunal de Contas, e entendidas como fator de rejeição das contas do município. Entretanto, quando alcançam considerável grau de relevância podem comprometer a confiabilidade das informações contábeis e a adequação do Balanço Geral Anual, quanto à posição orçamentária, financeira e patrimonial do Ente, inclusive repercutindo insegurança quanto ao cumprimento dos limites, o alcance de metas de resultado, enfim, comprometer todo o resultado da análise técnica e, por conseqüência, o próprio Parecer Prévio. 

As divergências contábeis evidenciadas na análise das contas anuais de 2005 do Município de Mafra e apartadas em processo específico, objeto dos presentes autos, apesar de apresentarem certa expressão monetária não comprometeram a confiabilidade das contas anuais prestadas pelo município, razão pela qual o Relator à época decidiu recomendar a aprovação das contas e formar autos específicos para fins de exame minucioso da responsabilidade do gestor quanto às impropriedades contábeis evidenciadas.

As divergências contábeis anotadas nos itens 1.1 e 1.2 da conclusão do Relatório da DMU (1 e 3 do corpo do Relatório) possuem a mesa causa principal. Trata-se de erro no lançamento das transferências financeiras repassadas ao Instituto de Previdência de Mafra – IPMM pela Prefeitura Municipal.

Conforme alegou o responsável, a transferência foi contabilizada na Prefeitura Municipal como despesa orçamentária (empenhamento) e no IPMM – Instituto de Previdência de Mafra como transferência recebida (movimento extra-orçamentário). Na consolidação das contas, evidenciou-se a divergência nas demonstrações contábeis.

Tal procedimento evidencia o descumprimento de norma regulamentar (art. 2° da Portaria STN n. 339/2001) eis que restou evidenciada a divergência entre as transferências financeiras concedidas e recebidas entre os órgãos do mesmo Ente Municipal, pois, sendo consolidadas as contas, referidos registros deveriam ser idênticos.

Apesar de, em princípio, configurar-se restrição de ordem regulamentar, há repercussão nos anexos que compõem o Balanço Anual do Município, razão pela qual a Instrução optou por fundamentar a irregularidade em dispositivos da Lei n. 4.320/64 (arts. 89, 90, 101, 103 e 104).

Tenho me manifestado no sentido de que as divergências contábeis que produzirem baixa repercussão no conjunto das contas podem ser toleradas e recomendadas a providências, salvo nos casos em que a irregularidade for recorrente.

A análise do caso específico da divergência em tela (R$ 1.576.298,90) revela que o valor, apesar de apresentar expressão monetária não é relevante o suficiente para macular a integridade do conjunto de demonstrativos do Balanço Anual, isso porque restou demonstrado que o equívoco na contabilização não abalou a confiabilidade do balanço consolidado do Município.

Também não vislumbro repercussão que possa alterar o status de cumprimento ou não de mandamento legal ou constitucional objeto da análise das contas anuais. Percebam que a causa da irregularidade (empenhamento das transferências repassadas ao IPMM) revela, em verdade, que o resultado orçamentário consignado nas demonstrações da prestação de contas foi subavaliado, eis que foram contabilizadas despesas orçamentárias que, na verdade, deveriam apresentar-se como transferências financeiras no movimento extra-orçamentário.

Registre-se também que este tipo de divergência, apesar da consolidação das contas ser obrigatória desde o exercício de 2003, ainda é recorrente no âmbito municipal, face ao processo de adaptação e melhoria nos sistemas de contabilidade utilizados e, principalmente, o processo de escrituração dos órgãos descentralizados.   

Quanto à diferença de R$ 3.122,00 entre os valores das restrições 1.1 e 1.2 da conclusão do Relatório, informe-se que decorre do cancelamento de empenhos registrados no movimento extra-orçamentário. Este fato foi apontado no Relatório de Instrução (item 2) e saneado no de Reinstrução, razão pela qual não requer maiores comentários.

Interpretação semelhante faço para considerar também falha de natureza formal a irregularidade evidenciada no item 1.3 da conclusão do Relatório da DMU. A divergência no valor de R$ 10.835,97 entre os registros de baixa da dívida fundada em demonstrativos diferentes do Balanço Anual (Anexo 15 e 16), além de não se apresentar valor relevante não esconde qualquer intenção de alterar os resultados da execução orçamentária para fins de cumprimento de limite legal.

Pelo exposto, entendo que as referidas restrições (1.1, 1.2 e 1.3 da conclusão do Relatório da DMU) não se configuram como grave infração à norma legal, mas faltas de natureza formal.

Mesma conclusão não se pode tirar da análise do teor da restrição 1.4, porque além de fazer referência a inúmeras divergências contábeis existentes entre os demonstrativos do Balanço Consolidado Anual, afirma ter havido omissão de informações por parte da Unidade Gestora quando respondeu ao Ofício Circular TC/DMU 5.393/2006, em descumprimento aos artigos 20 c/c 10 e 85 da Resolução TC 16/94, fato que somado às divergências contábeis, evidencia deficiências no sistema de controle interno do município de Mafra.

A Instrução construiu sua convicção de ter havido omissão de informações a partir da verificação de diversas inconsistências entre as informações remetidas nos demonstrativos contábeis da Prestação de Contas, as informações remetidas em meio eletrônico e aquelas remetidas em resposta ao Ofício Circular TC/DMU 5.393/2006.

Observa também que a Prestação de Contas foi realizada de maneira bastante precária, eis que foram remetidas demonstrações contábeis incompletas e divergentes entre si, mesmo após sucessivas remessas em substituição aos anteriores. 

Em suas alegações de defesa, o responsável concentra-se em explicar a causa das divergências contábeis, relatando problemas no funcionamento dos sistemas de contabilidade pública utilizados pela Unidade. Entretanto, no tocante à omissão de informações apenas afirma ter se empenhado ao máximo para atender sempre a todas as solicitações deste Egrégio Tribunal.

Verifiquei que diversas divergências apuradas pela Instrução no processo de análise da Prestação de Contas de Mafra de 2006 poderiam ser evitadas não fosse o erro nas informações remetidas em resposta ao referido ofício circular e, em face destas constatações e também do prejuízo causado ao processo de análise técnica das contas anuais, entendo que a restrição 1.4 da conclusão do Relatório Técnico enseja aplicação de multa ao responsável.

Proponho também para o caso a determinação de providências no sentido de corrigir as fragilidades no serviço de escrituração contábil e consolidação das contas do Município de Mafra, com ênfase na melhoria do controle interno, a fim de que sejam minimizadas as possibilidades de ocorrência de restrições de divergências contábeis como as referenciadas acima


b) Quanto à individualização e dosimetria da pena

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas manifesta-se nos presentes autos pela impossibilidade de aplicação de multa ao responsável face a não observância, pelo Órgão Técnico, da garantia fundamental que impõe à individualização da pena e observância do princípio da dosimetria (art. 5°, XLVI da CF/88).

Refletindo sobre as observações do MP e analisando o Relatório da DMU, não encontro elementos suficientes para concordar com a suposta inobservância à garantia fundamental nos presentes autos.

Há caracterização de cada irregularidade evidenciada, com indicação do dispositivo legal e/ou regulamentar desrespeitado; há indicação, para cada restrição evidenciada no Relatório, da sanção a qual o ordenador de despesa (responsável) estaria sujeito – no caso todas as sanções foram embasadas no art. 70, II da Lei Complementar Estadual n. 202/2000 (Lei Orgânica deste Tribunal de Contas); e haveria o respeito ao princípio da dosimetria da pena na medida em que o Relator, ao elaborar a proposta de voto, deve considerar as circunstâncias e contexto em que as irregularidades ocorreram a fim de fundamentar a opção pela graduação da multa, que no caso poderia alcançar até o valor de cinco mil reais.

Tendo em vista todo exposto e estando os autos apreciados na forma regimental, instruídos por equipe técnica da DMU e acrescidos das considerações do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, submeto a matéria à apreciação do Egrégio Plenário, propugnando pela adoção da seguinte proposta de VOTO:

1. Conhecer do Relatório de Instrução que trata da análise de irregularidades constatadas quando do exame das contas anuais de 2005 da Prefeitura Municipal de Mafra, apartadas dos autos do Processo n. PCP-06/00239454. 

 

2. Aplicar ao Sr. João Alfredo Herbst – Prefeito Municipal de Mafra, CPF n. 295.778.109-34, com fundamento nos incisos II e VII do art. 70 da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II e VII do Regimento Interno, a multa no valor de R$ 1.000,00 (um mil reais), em face da Prestação de Contas Anuais do Prefeito Municipal ter sido realizada de forma imperfeita, em virtude da remessa de inúmeros demonstrativos contábeis incompletos, descumprindo os preceitos estabelecidos na Lei Federal n. 4.320/64, especialmente o seu artigo 85, além da omissão de informações em atendimento ao Ofício Circular TC/DMU 5.393/2006, em descumprimento aos artigos 20 c/c 10 e 85 da Resolução TC – 16/94, caracterizando ainda controle interno deficiente nos termos do mesmo ato regulamentar (item 1.4 da conclusão do Relatório da DMU), fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000.

3. Determinar à Prefeitura Municipal de Mafra, com o envolvimento e responsabilização do órgão de controle interno, a adoção de providências para prevenir a ocorrência de divergências contábeis, como as constatadas nos itens 1.1, 1.2, 1.3 e 1.4 da conclusão do Relatório da DMU n. 857/2008, sob pena de futura sanção administrativa, conforme prevê o art. 70 da Lei Complementar n. 202/2000.

4. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório DMU n. 857/2008, ao Sr. João Alfredo Herbst - Prefeito Municipal de Mafra, e aos Poderes Legislativo e Executivo daquele Município.

 

Gabinete, em 27 de junho de 2008.

 

 

 

 

Gerson dos Santos Sicca

Auditor Relator