TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA

Gabinete do Conselheiro Otávio Gilson dos Santos

PROCESSO Nº. : PCP - 07/00110526
UG/CLIENTE : Município de Taió
RESPONSÁVEL : Sr. José Goetten de Lima - Prefeito Municipal
ASSUNTO : Prestação de Contas do Prefeito referente ao ano de 2006.
PARECER Nº. : GC-OGS/2007/648

PARECER PRÉVIO

1. RELATÓRIO

Trata o presente processo da Prestação de Contas de Prefeito, encaminhadas a este Tribunal de Contas em cumprimento ao disposto no art. 31, §§ 1.º e 2.º da Constituição Federal, art. 113, da Constituição Estadual, e arts. 50 a 59 da Lei Complementar n.º 202, de 15 de dezembro de 2000, pelo Município de Taió, contas estas relativas ao exercício de 2006, de responsabilidade de José Goetten de Lima - Prefeito Municipal.

1.1. Do Corpo Técnico

A Diretoria de Controle dos Municípios (DMU) desta Corte, procedeu ao exame da documentação apresentada, analisando sua consistência, bem como verificando os aspectos constitucionais e legais que norteiam a Administração Pública Municipal, anotando as irregularidades constatadas ensejando a elaboração do Relatório nº 2.009/2007, fls. 770 a 875, que em sua conclusão apontou as seguintes restrições, ad litteram:

Em vista das restrições evidenciadas, entende o Corpo Instrutivo que possa o Tribunal de Contas, além da emissão do parecer prévio, decidir sobre as providências que devam ser tomadas a respeito das restrições apontadas e, ainda:

I - RECOMENDAR à Câmara de Vereadores anotação e verificação de acatamento, pelo Poder Executivo, das observações constantes do presente Relatório;

II - SOLICITAR à Câmara de Vereadores seja o Tribunal de Contas comunicado do resultado do julgamento das Contas Anuais em questão, do Prefeito Municipal, conforme prescreve o art. 59 da Lei Complementar nº 202/2000, inclusive com a remessa do ato respectivo e da ata da sessão de julgamento da Câmara.

III - RESSALVAR que o processo PCA 07/00142720, relativo à Prestação de Contas do Presidente da Câmara de Vereadores (gestão 2006), encontra-se em tramitação neste Tribunal, pendente de decisão final.

IV - DETERMINAR ao Responsável pelo Poder Executivo a adoção de providências imediatas quanto as irregularidades levantadas pelo Órgão de Controle Interno (item A.7, subitem 2).

1.2. Do Ministério Público

O Ministério Público junto a este Tribunal emitiu Parecer MPTC nº 5.392/2007 (fls. 876 a 880), sugerindo a APROVAÇÃO das referidas contas, por entender que o Balanço Geral do Município de Taió representa de forma adequada a posição financeira, orçamentária e patrimonial, assim como as impropriedades apontadas não são consideradas irregularidades gravíssimas a ensejar a rejeição das contas apresentadas, e, sugerindo, ainda, que seja determinada a instauração de procedimento adequado a verificação referente à ocorrência de burla ao concurso público relativa à eventual afronta ao disposto no art. 37, II, da Constituição Federal e recomendações para adoção de providências para correção de deficiências de natureza contábil, financeira, orçamentária, patrimonial e operacional apontadas pelo Órgão Instrutivo.

2. DISCUSSÃO

Este Relator, após analisar os autos, entende relevante tecer algumas considerações acerca dos apontamentos efetuados pelo Corpo Instrutivo (Relatório de fls. 770 a 875) e da manifestação do Ministério Público junto a este Tribunal (Parecer de fls. 876 a 880) e sobre o mais que dos autos consta.

Trata o presente processo das contas anuais do município de Taió que foram encaminhadas através de meio magnético e o Balanço Anual por meio documental a esta Corte de Contas, autuado como Balanço Consolidado do Município.

O Corpo Instrutivo desta Corte de Contas, ao proceder o exame de consistência dos documentos e informações apresentadas, verificou e atentou - para concluir seu trabalho de análise dos dados - especialmente, para as seguintes informações: orçamento fiscal, execução orçamentária, análise financeira, análise patrimonial, verificação dos cumprimentos de limites constitucionais e legais, gestão fiscal do Poder Executivo. Dessa análise resultou o Relatório n.º 2.009/2007 (fls. 770 a 875).

Além da verificação dos aspectos constitucionais e legais que norteiam a Administração Pública em relação a análise das contas anuais, este Tribunal de Contas utiliza-se dos parâmetros estabelecidos na Portaria nº 233/2003, a qual objetiva a uniformidade das decisões desta Corte, que tornou pública as irregularidades gravíssimas, que são ensejadoras da recomendação de rejeição das contas anuais.

Como irregularidades gravíssimas, o art. 3º da referida Portaria destaca: a não-aplicação de, no mínimo, 25% dos recursos na manutenção e desenvolvimento do ensino; a não aplicação de percentual mínimo de 60% dos 25% dos recursos na manutenção e desenvolvimento do ensino fundamental; a não aplicação de percentual mínimo de 15% dos recursos em gastos com ações e serviços públicos de saúde; o descumprimento da ordem cronológica nos pagamentos das obrigações municipais; a contratação de servidor por tempo determinado, sem lei municipal; a ocorrência de déficit de execução orçamentária e o descumprimento do artigo 42 da LRF, dentre outras.

Deste modo, conforme consta do Relatório n.º 2.009/2007 (fls. 770 a 875), da Diretoria de Controle dos Municípios, não se verificou nas contas em exame, a ocorrência de qualquer das irregularidades elencadas no art. 3º da Portaria nº 233/2003, bem como observa-se que as restrições apontadas não são ensejadoras da sugestão de rejeição das contas anuais.

Não obstante isso, foram identificadas pelo Corpo Instrutivo, outras irregularidades, acerca das quais passa-se a discorrer:

No item A.1 da Conclusão do Relatório Técnico (item B.2.1 - fls. 812 a 815), o Corpo Instrutivo afirma que o Município teria concedido reajuste indevido de subsídios de agentes políticos do Executivo Municipal - Prefeito e Vice-Prefeito, diante da concessão de 7% de aumento dos subsídios, por meio da Lei n. 3.080/2006 (fls. 736), de iniciativa do Poder Executivo.

Quanto à irregularidade acima descrita, inicialmente cabe a este Relator esclarecer os fatos que levaram o Corpo Técnico a identificar a majoração dos subsídios concedidos por meio da Lei n. 3.080/2006, no percentual de 7%, como reajuste e não como revisão geral anual (fl. 736).

O Corpo Técnico caracterizou referida majoração como reajuste e não revisão geral anual, uma vez que na referida Lei não foi indicado o índice de inflação que motivou o aumento, tampouco o período a que se refere. A partir disso, a Instrução considerou irregular o reajuste e identificou as importâncias pagas aos agentes políticos do Poder Executivo, durante o exercício de 2006.

Conforme estabelece o artigo 37, X, da CF, a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices.

Como dito anteriormente, a Lei n. 3.080/2006, não identificou qual o índice utilizado - tornando sem justificativa a fixação do percentual de 7% de aumento - bem como não apontou qual o período que levou em consideração para aplicar tal percentual. Diante das citadas omissões, verifica-se o descumprimento das exigências contidas no citado artigo 37, X, da CF, que prevê o instituto da revisão geral anual.

Ademais, é de se destacar que, no caso em tela, é possível inferir que o percentual de 7%, não se trata somente de revisão geral anual, uma vez que o referido percentual é superior aos índices comumente utilizados para tal fim, que busca a reposição das perdas salariais decorrentes da inflação do período.

Chego a este entendimento a partir da apuração da variação percentual ocorrida no período compreendido entre 04/2005 a 04/2006 (considerando que a referida lei tem seus efeitos contados a partir de 16/05/2006), com base nos indicadores a seguir elencados:

IPCA - IBGE = 4,63 %

INPC- IBGE = 3,34 %

IPC - FIPE = 2,55 %

Portanto, pode-se deduzir que a majoração dos subsídios, por meio da Lei n. 3.080/2006, em percentual de 7% no Município de Taió, é composto de uma parcela referente à revisão geral anual e de outra relativa à reajuste, propriamente dito, o que diverge do posicionamento do Corpo Instrutivo que considera como reajuste o aumento dos subsídios dos agentes políticos do Município de Taió, em decorrência da referida Lei.

A despeito desta discussão, este Relator enfatiza que o cerne da questão não se altera diante dessas discordâncias, uma vez que é lícita a revisão da remuneração dos agentes políticos, ex vi art. 37, X, da CF, e, quanto a Prefeito e Vice-Prefeito, não há qualquer vedação legal/constitucional ao reajuste de seus subsídios, havendo, tão-só, disciplina relativa à obediência ao teto remuneratório (art. 29, V, c/c art. 37, XI, da CF) e à remuneração em parcela única (art. 29, V, c/c art. 39, § 4º, da CF), sendo que, no presente caso, foram observados os aspectos tratados nos citados dispositivos constitucionais.

Porém, o artigo 29, V, da CF, exige que os subsídios do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos Secretários Municipais, sejam fixados por lei de iniciativa da Câmara Municipal e, neste particular é que se verifica, no caso em exame, que a Lei n. 3.080/2006, que fixou o percentual de reajuste ao subsídio do Vice-Prefeito, possui vício de iniciativa, uma vez que foi proposta pelo Poder Executivo e não pelo Poder Legislativo, como prevê o referido artigo da Constituição Federal.

Diante do acima exposto, este Relator conclui que a irregularidade descrita no Relatório Técnico (item I.A.1 da sua Conclusão), no tocante ao reajuste de subsídios de Prefeito e Vice-Prefeito, deve se restringir ao fato de que houve vício de iniciativa na proposição da Lei n. 3.080/2006 pelo Poder Executivo, dentro da interpretação de que tal lei não trata somente de revisão geral anual (cuja iniciativa seria do Poder Executivo), mas também de reajuste de subsídio, cuja iniciativa caberia ao Poder Legislativo, nos termos do citado art. 29, inciso V, da CF.

Quanto ao tema "vício de iniciativa", nos moldes da situação tratada nos presentes autos, por oportuno cito o processo PCP 07/00034323, onde o Tribunal Pleno acolheu a Proposta de Decisão da Auditora Substituta de Conselheiro, Exma. Sra. Sabrina Nunes Iocken, onde o argumento apresentado para relevar tal restrição, está fundamentado no fato de que o "reajuste", mesmo quando encaminhada proposta de lei pelo Poder Executivo Municipal, permanecerá sob o controle do Legislativo quanto ao processo de formação da lei, não tendo sido identificados julgados do Supremo Tribunal Federal nos quais haja sido uma lei declarada inconstitucional por um vício de iniciativa do Poder Executivo.

Ademais, é importante ressaltar que esta Corte já manifestou-se em diversas ocasiões em processos de prestação de contas, e em processo apartado, afastando eventual vício de ilegalidade quanto ao aumento nos subsídios dos Prefeitos e Vice-Prefeitos (Processos PCP 06/00293823, PCP 06/00096246, PCP 07/00034323 e PDI 06/00507483).

Diante do exposto, este Relator posiciona-se por encerrar a discussão acerca do tema nos presentes autos, determinando ao Poder Executivo que atente às exigências do art. 37, X, da CF, quanto à indicação do índice e o período a que se refere, quando da elaboração de lei que prevê a revisão geral anual, bem como observe a competência da Câmara Municipal para a proposição de lei que prevê reajuste de subsídio dos agentes políticos do Poder Executivo, conforme dispõe o art. 29, V, da CF.

Quanto à restrição referente ao item A.2, da parte conclusiva do Relatório Técnico (fl. 817), observa-se que da análise da documentação encaminhada pela Unidade, em atendimento ao Ofício Circular TC/DMU n. 201/2007 (fl. 702), foi constatado o pagamento de décimo-terceiro ao Prefeito no valor de R$ 8.602,80, e ao Vice-Prefeito no valor de R$ 4.301,40, sem que houvesse previsão legal para o mesmo, tendo em vista que a Lei Municipal n. 2.988/2004, que fixou os subsídios dos Agentes Políticos municipais de Taió para a legislatura 2005/2008, não prevê o pagamento de décimo-terceiro ao Prefeito e Vice-Prefeito, conforme se extrai do Relatório Técnico (fl. 815).

Acerca do direito dos agentes políticos, ao décimo-terceiro, esta Corte manifestou-se por meio do Prejulgado n. 1.510 (CON 03/00726970) admitindo instituição do décimo-terceiro para Prefeito e Vice-Prefeito, concluindo que em razão do exercício contínuo das atividades do Prefeito Municipal, com dedicação exclusiva (vedado o exercício de outra atividade laboral pública - CF, art. 38), equiparando-se a qualquer trabalhador urbano, a concessão de décimo-terceiro subsídio, por lei local, é defensável do ponto de vista ético e moral.

De igual modo concluiu acerca da instituição do décimo-terceiro ao Vice-Prefeito, que caso este não execute função administrativa permanente junto à administração municipal - como ocupante de cargo de Secretário, por exemplo - e não seja servidor público, a previsão de décimo-terceiro subsídio na lei que institui os subsídios atende ao princípio da legalidade.

O posicionamento desta Corte manifesto no Prejulgado n. 1.510, fundamenta-se no fato dos agentes políticos congregarem uma categoria com especial tratamento constitucional. De modo expresso, a Constituição Federal (art. 7°, VIII) prevê o pagamento de décimo-terceiro salário apenas aos trabalhadores, subentendendo-se aqueles que laboram sob as ordens de um empregador, e aos servidores públicos (art. 39, § 3°). Aos agentes políticos não foi prevista expressamente essa garantia. Para o Prefeito e Vice-Prefeito Municipal é justificável a concessão de décimo-terceiro, tendo em vista a contínua, diária e completa jornada de trabalho, de duração igual ou superior a dos servidores.

No entanto, o pagamento décimo-terceiro desses agentes políticos não são automáticas, porque não regidos pelo Estatuto dos Servidores, nem pela CLT, de maneira que inexiste uma legislação garantidora desse direito. Diante disso, cabe à legislação prever a concessão de décimo-terceiro subsídio ao Prefeito e Vice-Prefeito. Esta autorização não contraria a Constituição Federal, inserindo-se no espírito constitucional de garantia dos direitos sociais. De todo modo, não se estende automaticamente o direito ao adicional previsto no art. 7°, VIII, da Constituição da República, pois compete à comunidade, diante da situação financeira do Poder Público local e a situação sócio-econômica dos municípios, decidir se pode ser concedido décimo-terceiro subsídio ao cidadão que exerce o cargo de Prefeito e Vice-Prefeito.

Portanto, o pagamento do décimo-terceiro subsídio ao Prefeito e Vice-Prefeito deve estar expressamente previsto na lei que instituir a remuneração desses agentes políticos.

Dessa forma, em relação ao pagamento de décimo-terceiro subsídio ao Prefeito e Vice-Prefeito, entendo ser admissível para o Prefeito e Vice-Prefeito, desde que previsto na legislação municipal, em razão da atividade contínua e dedicação exclusiva (vedado o exercício de outra atividade laboral pública - CF, art. 38), por esta razão entendo que a presente restrição deva ser objeto de ressalva, para que a Unidade adote providências para sua correção.

No item A.3. da conclusão do Relatório do Técnico, consta a restrição relativa à realização de despesas com saúde realizadas através da Administração Centralizada - Prefeitura, no montante de R$ 1.264.040,92, contrariando o estabelecido na Constituição Federal, artigo 77, § 3º dos ADCT, alterado pela Emenda Constitucional nº 29 (item B.1.2 - fl. 811).

Com relação à restrição acima delineada, relativa à realização de despesas com Ações e Serviços Públicos de Saúde, através da Prefeitura Municipal, em desacordo com o artigo 77, § 3° dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias - ADCT - CF/88, alterado pela Emenda Constitucional 29/2000, que dispõe que os recursos destinados a estes gastos devem ser aplicados por meio de Fundo Municipal de Saúde, é cabível recomendação, por este Tribunal, à Prefeitura Municipal, para que adote medidas visando a correção da falha identificada.

Vale ressaltar que a referida restrição não comprometeu a apuração dos valores a serem aplicados em Ações e Serviços Públicos de Saúde, tendo sido constatado pelo Corpo Técnico que o montante aplicado em Ações e Serviços Públicos de Saúde para o exercício de 2006 foi da ordem de R$ 2.473.890,41 (fl. 797), correspondendo a um percentual de 20,84% da receita com impostos, inclusive transferências, ficando evidenciado que o município CUMPRIU o referido dispositivo constitucional, sendo o percentual mínimo de aplicação para o exercício de 2006 de 15% das receitas com impostos, inclusive transferências, conforme estabelecido no § 1º do artigo 77 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias - ADCT.

Quanto à restrição identificada no item B.1. da conclusão do Relatório do Técnico (fl. 817), verifica-se que o Déficit de Execução Orçamentária do Município de R$ 137.242,24 é composto pelo resultado do Orçamento Centralizado - Prefeitura Municipal, Déficit de R$ 204.269,82 e do conjunto do Orçamento das demais Unidades Municipais Superávit de R$ 251.569,79, excluído o resultado superavitário do Instituto de Previdência, que foi de R$ 184.542,21.

Entretanto, embora representando 0,86% da receita arrecadada, observa-se que o mesmo foi totalmente absorvido pelo superávit financeiro do exercício anterior (R$ 158.573,68), não implicando no comprometimento da execução orçamentária do exercício subseqüente e a conseqüente rejeição das presentes contas, em conformidade com os critérios estabelecidos na Portaria nº 233/2003, art. 3º, VI, que norteiam a análise das contas anuais de Municípios, estando, portanto, descaracterizada a restrição.

Relativamente à restrição delineada no item B.2, onde foi identificada a ocorrência de déficit de execução orçamentária da Unidade Prefeitura (orçamento centralizado) da ordem de R$ 204.269,82, representando 1,57% da sua receita arrecadada no exercício em exame, o que equivale a 0,19 arrecadação mensal - média mensal do exercício, em desacordo ao artigo 48, "b" da Lei nº 4.320/64 e artigo 1º, § 1º, da Lei Complementar nº 101/2000 (LRF), parcialmente absorvido pelo superávit financeiro do exercício anterior - R$ 129.829,49 (item A.2.b - fl. 774), entende este Relator ser cabível recomendação à Unidade, para que adote medidas visando a eliminação gradual do déficit de execução orçamentária da Unidade Prefeitura, com vistas ao cumprimento dos preceitos do art. 1º da Lei Complementar nº 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal) e do art. 48, "b", da Lei Federal nº 4.320/64.

Outrossim, o Corpo Instrutivo apontou no item B.6 da conclusão do Relatório do Técnico (item B.1.1. - fl. 810), irregularidade relacionada ao fato de que o Município, durante o exercício de 2006, utilizou-se dos recursos da reserva de contingência para suplementar dotações sem evidenciar o atendimento de passivos contingentes ou eventos fiscais imprevistos, conforme abaixo:

Observa-se no tocante a essa restrição, que o disposto no § 4º do art. 5º da Lei Complementar nº 101/2000 estabelece que, é vedado consignar na lei orçamentária programação das despesas e das receitas com finalidade imprecisa ou com valores que não guardem relação com os limites de receitas estimados.

Já, em relação à reserva de contingência, assim estabelece a alínea "b", III, do art. 5º da Lei Complementar nº 101/2000:

Artigo 5º. O projeto de lei orçamentária anual, elaborado de forma compatível com o plano plurianual, com a lei de diretrizes orçamentárias e com as normas desta lei de complementar:

[...]

III - conterá reserva de contingência, cuja forma de utilização e montante, definido com base na receita corrente líquida, serão estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias, destinado ao:

a) (vetada);

b) atendimento de passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos.

[...]

Como se verifica acima, a reserva de contingência prevista com base na receita líquida será fixada e destinada ao pagamento de passivos contingentes e outros riscos fiscais de imprevistos.

O entendimento desta Corte de Contas, por meio do Prejulgado 1147, estabelecido no Processo CON-01/01621515 (Parecer COG nº 095/02), em relação ao que seja "passivo contingente" e "evento fiscal imprevisto", é o seguinte:

Os passivos contingentes decorrem de uma previsão já realizada, porém, que tenha extrapolado as previsões iniciais. Por isso mesmo, a lei fala em passivos. Sendo passivo, tem-se a noção clara de uma dívida já conhecida, ou pelo menos a viva expectativa de que um débito irá se formar a partir de certo momento, embora ainda não se conheça com precisão o seu montante. É o caso da decisão judicial acima citada, onde embora o ente já tenha uma certa expectativa e tenha feita uma reserva orçamentária, o montante foi superior ao previsto. Enfim, é quando não se tem certeza quanto ao exato momento da ocorrência e/ou o montante final do passivo.

Já o "evento fiscal imprevisto" ocorre quando o fato gerador de despesas sequer havia sido previsto, porque ordinariamente imprevisível no momento da elaboração do orçamento. É caso de um evento da natureza (catástrofe, enchente, vendaval etc.) ou uma decisão judicial para o ente arcar com certa atividade de competência municipal (trânsito, educação, meio ambiente etc.).

Portanto, conforme verifica-se no exposto acima, a lei orçamentária anual deve prever a reserva de contingência, que representa uma proteção ao administrador municipal contra riscos e passivos contingentes, capazes de ameaçar o equilíbrio orçamentário e, como tal, destinar-se a gastos novos, imprevistos.

Conforme se extrai do Relatório Técnico à fl. 771, o Município de Taió, na Lei Orçamentária Anual n.º 3.064/2005, consignou dotação "Reserva de Contingência" no valor de R$ 300.000,00, que corresponde a 1,51% do orçamento, e a 1,95% da Receita Corrente Líquida apurada pela equipe técnica deste Tribunal (R$ 15.421.603,48 - fl. 799).

De acordo com o que consta da fl. 810, a Prefeitura Municipal de Taió, editou os Decretos n.º 3.458/2006; 3.471/2006; 3.514/2006; 3.570/2006; e 3.640/2006, através do qual constata-se que houve a anulação de R$ 231.410,00 da dotação "Reserva de Contingência".

Entretanto, não foi possível verificar neste caso a caracterização da situação prevista na legislação vigente, quanto à condição da utilização da reserva de contingência para fazer frente ao atendimento de passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos, contudo, considerando que o valor utilizado da dotação "Reserva de Contingência", no montante de R$ 231.410,00 corresponde a 1,50% da Receita Corrente Líquida apurada pela equipe técnica deste Tribunal (R$ 15.421.603,48 - fl. 799), sendo portanto, insignificante diante do volume de recursos administrados pela municipalidade neste exercício, entende este Relator que a irregularidade acima evidenciada deve ser motivo de recomendação, tendo em vista ter ocorrido no exercício a utilização da reserva de contingência, sem evidenciar o atendimento de passivos contingentes, riscos fiscais ou eventos fiscais imprevistos em desacordo com a Lei Complementar n. 101/2000, artigo 5º, III, b.

As demais restrições apontadas pela Instrução Técnica, constantes da conclusão do Relatório n. 2.009/2007, são todas de ordem legal e regulamentar, quais sejam: Ausência do Anexo de Metas Fiscais de Resultado Nominal na LDO (Lei nº 3.063/2005), em desrespeito à L.C. nº 101/2000, art. 4º, § 1º (item B.3); Meta Fiscal de Resultado Primário prevista na LDO (Lei nº 3.0632005), em conformidade com a Lei Complementar nº 101/2000, art. 4º, § 1º e 9º, não realizada até o 6º bimestre, caracterizando afronta ao art. 2º da LDO (item B.4); Ausência do Anexo de Metas Fiscais de Resultado Primário na LDO (Lei nº 3.063/2005), em desrespeito à L.C. nº 101/2000, art. 4º, § 1º (item B.5); Divergência entre o valor total dos créditos especiais registrado no Relatório Resumido de Execução Orçamentária e o constante do Balanço Orçamentário - Anexo 12, evidenciando descumprimento aos artigos 75, 90 e 91 da Lei nº 4.320/64 (item B.7); Inconsistência, referente ao total da despesa registrada no Anexo 9 - Demonstrativo da Despesa por Órgãos e Funções do Balanço Consolidado em relação ao total registrado no Anexo 2 - Natureza da Despesa segundo as Categorias Econômicas do Balanço da Câmara Municipal - PCA 07/00142720, em desacordo ao disposto no artigo 85 da Lei nº 4320/64 (item B.8); Ausência de registro no Anexo 15 - Demonstração das Variações Patrimoniais, de valores relativos à inscrição da Dívida Ativa, em desrespeito ao artigo 85 da Lei nº 4.320/64 (item B.9).

Quanto às restrições acima delineadas, este Relator entende que as mesmas não possuem relevância que possam comprometer a confiabilidade das informações contábeis ou caracterizar eventual descontrole das contas públicas em exame, cabendo, contudo, recomendação à Prefeitura para que adeque os procedimentos visando o atendimento às disposições legais relativas aos fatos.

Com relação à sugestão do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, conforme as razões expostas à fl. 879, quanto à verificação por este Tribunal, em processo apartado, das despesas constantes do anexo 3 ao Relatório Técnico (fls. 832 a 850), que possuem indicativos de burla ao concurso público em afronta ao afronta ao art. 37, II, da Constituição Federal, tendo em vista tratarem-se de despesas com terceirização para substituição de servidores, cuja natureza é contínua e permanente, despesas estas no montante de R$ 143.872,23, realizadas pela Prefeitura Municipal, Fundo Municipal de Saúde, o Instituto de Previdência dos Servidores Públicos e pela Câmara Municipal de Taió.

Este Relator, ao compulsar os autos, verificou que o valor apurado pelo Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, teve por base tabela elaborada pelo Corpo Técnico desta Casa constante do anexo 5 (fls. 855 a 870).

Dos valores constantes do anexo 5 é possível verificar que as despesas identificadas pelo Órgão Ministerial são compostos, em parte, por despesas destinadas ao atendimento médico e odontológico dos munícipes, conforme consta das fls. 856 a 863.

Este Relator, ao analisar o histórico dos empenhos constantes das fls. 856 a 863, observou que os procedimentos realizados podem ser caracterizados como complementares às ações e serviços públicos de saúde, implementadas pelo município de Taió, com exceção daquelas relacionadas ao pagamento de pessoal vinculado ao Programa de Saúde da Família - PSF, que possui regras próprias de contratação, conforme manifestação desta Corte de Contas no processo CON - 05/03975087.

A Lei n. 8.080/90, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências, disciplina a participação complementar a do Estado nos seguintes termos:

Art. 24. Quando as suas disponibilidades forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinada área, o Sistema Único de Saúde (SUS) poderá recorrer aos serviços ofertados pela iniciativa privada.

Está claro que não é vedada a participação pela iniciativa privada, diante da necessidade do Poder Público atender à demanda da população por serviços de saúde, sendo este um direito fundamental da população elencado nos arts. 6º e 196 da Constituição Federal:

Art. 6º - São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição."

Art. 196 - A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Conforme os artigos constitucionais citados, o Estado é responsável em prover a saúde, garantindo acesso universal e igualitário. Os artigos constitucionais são reforçados pela Lei 8.080/90, de 19/09/1990, em especial o art. 2º:

Art. 2º. A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.

§ 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.

A participação complementar deverá ser adotada pelo Ente Público, neste caso o município, quando sua capacidade de atendimento já não for mais suficiente para atender à demanda de seus munícipes.

Por esta razão, o constituinte originário contemplou no art. 197 da Carta Magna, a participação de terceiros, tanto por pessoa física como jurídica de direito privado, na consecução deste direito.

Contudo, não se pode esquecer que o administrador público, quando da contratação destes serviços, deverá levar em consideração aspectos envolvendo os princípios elencados no art. 37 da Constituição Federal (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência), bem como, os princípios do art. 70 (legitimidade e economicidade).

Neste sentido, entendo oportuno citar o teor da Decisão que materializa o entendimento desta Corte de Contas sobre o tema em tela, por meio do Prejulgado 1.242, estabelecido no Processo CON-02/02980723 (Parecer COG nº 329/02), em relação ao que seja responsabilidade do Estado enquanto promotor das ações e serviços públicos de saúde:

6.2.1. O Estado deve prover a saúde independente do serviço estar ou não elencado na tabela do Sistema Único de Saúde - SUS;

6.2.2. O Poder Público utilizar-se-á do princípio da razoabilidade para escolha da forma mais adequada entre as lícitas para a prestação dos serviços de saúde. Poderá, por exemplo, (a) prestar diretamente, por seus próprios recursos materiais e humanos; (b) adquirir os equipamentos necessários e contratar os profissionais da área; e (c) firmar contrato ou convênio com entidade privada para complementação da atividade estatal;

6.2.3. A autoridade pública deve adotar todas as medidas necessárias à verificação dos fatos quando houver indícios de cometimento de irregularidade ou crime por parte dos prestadores de serviço de saúde, mormente quando contratantes com o Estado, devendo, para tanto, representar junto às instituições competentes para a apuração das irregularidades.

Por estas razões entendo que não cabe a formação de autos apartados para apuração de possível irregularidade das despesas relativas ao atendimento médico e odontológico no município de Taió.

Quanto aos empenhos relacionados às fls. 864 a 867, onde é possível identificar a contratação de Walter Agostinho Goetten de Souza, para prestação de serviços de Assessoria Contábil, no valor de R$ 5.844,00 e Nardelli & Betti Advogados Associados, para prestação de serviços de Assessoramento Administrativo nos atos de Competência do Poder Executivo, no valor de R$ 33.000,00.

Face o exposto, este Relator acolhe a sugestão do Ministério Público quanto à formação de autos apartados, para apuração de irregularidade relacionada às despesas efetuadas pela Prefeitura Municipal de Taió com contratação de Assessoramento Administrativo nos atos de Competência do Poder Executivo e Assessoria Contábil, por entender que no caso em tela, a terceirização desta espécie de serviços - que têm natureza contínua e permanente e são inerentes às funções e cargos de provimento efetivo - caracteriza burla ao concurso público, em afronta ao artigo 37, II da Constituição Federal.

3. VOTO

CONSIDERANDO que:

I – é da competência do Tribunal de Contas do Estado, no exercício do controle externo que lhe é atribuído pela Constituição, a emissão de Parecer Prévio sobre as Contas Anuais prestadas anualmente pelo Prefeito Municipal;

II – ao emitir Parecer Prévio, o Tribunal formula opinião em relação às contas, atendo-se à análise técnica contábil-financeira-orçamentária-operacional-patrimonial procedida e à sua conformação às normas constitucionais, legais e regulamentares;

III – o Parecer é baseado em atos e fatos relacionados às contas apresentadas, à sua avaliação quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, não se vinculando a indícios, suspeitas ou suposições;

IV – é da competência exclusiva da Câmara Municipal, conforme determina a Constituição Estadual, em seu art. 113, o julgamento das contas prestadas anualmente pelo Prefeito;

V – o julgamento pela Câmara Municipal das contas prestadas pelo Prefeito não exime de responsabilidade os administradores e responsáveis pela arrecadação, guarda e aplicação dos bens, dinheiros e valores públicos, cujos atos de gestão sujeitam-se ao julgamento técnico-administrativo do Tribunal de Contas do Estado;

CONSIDERANDO a manifestação do Corpo Instrutivo e do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas e mais o que dos autos consta, proponho ao Tribunal Pleno para:

3.1. EMITIR parecer recomendando à Egrégia Câmara Municipal, a APROVAÇÃO das contas da Prefeitura Municipal de Taió, relativas ao exercício de 2006, sugerindo que quando do julgamento, atente para as restrições remanescentes apontadas no Relatório DMU n. 2.009/2007;

3.2. RECOMENDAR à Prefeitura Municipal de Taió a adoção de providências visando evitar a ocorrência das seguintes irregularidades:

3.3. RESSALVAR que a Prefeitura Municipal de Taió deverá adotar providências visando corrigir a seguinte irregularidade: 3.4. DETERMINAR que, o Chefe do Poder Executivo, quando da proposição de lei que dispõe sobre a revisão geral anual, indique o índice utilizado e o período a que se refere, em cumprimento ao artigo 37, X, da CF, bem como atente acerca da competência do Poder Legislativo para a iniciativa de lei relativa ao reajuste de Prefeito, Vice-Prefeito e Secretários Municipais, conforme dispõe o art. 29, V, da Constituição Federal e o art. 111, VI da Constituição Estadual (item A.1 da conclusão do Relatório DMU, nos termos do Voto do Relator).

3.5. DETERMINAR à Secretaria Geral - SEG a formação de autos apartados para fins de análise, pela Diretoria competente, da irregularidade verificada no exame das contas, referente a ocorrência de indícios de irregularidades na contratação de serviços de terceiros (Assessoria Jurídica e Contábil), com possível burla ao concurso público, em afronta ao art. 37, II, da Constituição Federal, conforme consta do anexo 5 ao Relatório Técnico (fls. 864 a 870 - Relatório MPjTC e Voto do Relator).

3.6. RESSALVAR que o processo PCA 07/00142720, relativo à Prestação de Contas do Presidente da Câmara de Vereadores (gestão 2006), encontra-se em tramitação neste Tribunal, pendente de decisão final.

Gabinete do Conselheiro, em 22 de outubro de 2007

Otávio Gilson dos Santos

Conselheiro Relator