Processo n° |
REC 08/00521773 |
Unidade Gestora |
Prefeitura
Municipal de Seara |
Responsável |
Flávio Ragagnin – Prefeito
Municipal – 2000-2004 |
Assunto |
Recurso de Reconsideração – art.
77 da LC 202/00 |
Relatório n° |
663/2010 |
1. Relatório
Nos termos do Acórdão nº 1037/2008,
do egrégio Plenário desta Corte, prolatado em 07.07.08, o interessado e ora
recorrente foi condenado, na condição de Prefeito Municipal de Seara, período
2000-2004, ao pagamento de duas multas: a primeira, no valor de R$ 1.500,00,
pela não instauração do devido processo licitatório na compra de madeira para
distribuição a munícipes carentes, no montante de R$ 27.972,80; e, a segunda,
no valor de R$ 5.000,00, pela distribuição gratuita de material de construção
em período vedado pela legislação eleitoral (Lei nº 9.504/97, art. 73, IV), ato
que, além de sancionado por essa vedação, não estava incluído no rol daqueles
autorizados pelas Leis municipais nº 935/95/, 1.051/96 e 1.225/01, infringido,
assim, as disposições do art. 37, caput, da Constituição Federal.
Inconformado com aquela decisão,
interpôs Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 15, inciso I, da Lei
Complementar estadual nº 202/2000, cuja tríade de admissibilidade
(legitimidade, tempestividade e singularidade) demonstrou-se presente e
comprovada.
A ilustrada Consultoria Geral,
através do Parecer nº 201/2010 (fls. 25-40), pronunciou-se pelo conhecimento e
desprovimento do recurso, seguindo-se manifestação no mesmo sentido do
Ministério Público junto ao Tribunal de Contas (fls. 41-49).
2. Voto
O recurso, de fato, não merece
provimento.
Quanto à primeira irregularidade
(dispensa indevida de licitação), alega o recorrente que o montante de R$
27.972,80 (que suplanta em muito a tolerabilidade de R$ 8.000,00 prevista na
Lei nº 9.648/98), utilizado para compra de madeira, resultou do somatório
indevido de várias aquisições distintas, com objetos e destinações
diferenciadas.
Sucede que, conforme apurou a
instrução (fl. 33), a madeira adquirida naquele valor, integrava um estoque de
materiais de construção, incluindo desde areia a prego, comprado pela
municipalidade para distribuição a munícipes carentes, nos termos do Convite n.
024/2004. Logo, tinha uma única finalidade, nada justificando o fracionamento
que o Recorrente entende legítimo.
Sabidamente, o pagamento fracionado
de bens e serviços, circunscritos temporal e materialmente a uma mesma
finalidade, mediante a emissão de documentos de despesa distintos, tem sido
prática comum (embora condenável) na Administração Pública, importando uma
burla à Lei de Licitações, que merece ser coibida por esta Corte.
Logo, a multa aplicada em função
dessa irregularidade merece ser mantida.
Quando ao segundo sancionamento,
decorrente da distribuição de material de construção a munícipes carentes em
período vedado pela legislação eleitoral, melhor sorte não está reservada ao
Recorrente.
Na sua defesa, enfatiza que não
infringiu a legislação eleitoral, pois, quando da distribuição do material, não
teria feito uso promocional de nenhum candidato e, tampouco, tido contato
pessoal com os munícipes beneficiados.
O argumento é irrelevante, à luz das
normas que definem a competência desta Corte de Contas, que não está legitimada
a emitir julgamentos sobre crimes ou infrações eleitorais. O que examina é se a
conduta e os atos administrativos do agente público se afeiçoam ou não aos
princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência
previstos no caput do art. 37 da Constituição Federal.
Na hipótese, dois aspectos merecem
ser realçados: 1) a inexistência de lei municipal específica autorizando a
doação direta, nos moldes como foi feita, à munícipes carentes; 2) a
desproporção entre a despesa realizada à conta do Fundo Rotativo Habitacional
nos exercícios de 2002 e 2003 (R$ 20,80) e a realizada no exercício de 2004,
quando se realizou o pleito (R$ 84.953,80), ou seja, mais de 4.200 vezes maior
do que a dos dois anos anteriores.
Quanto à forma de distribuição do
material, são esclarecedoras as próprias palavras do Recorrente, utilizadas em
sua peça de defesa (fl. 36):
A entrega também
era feita sem nenhuma formalidade ou celebração – até à modicidade dos valores
– ausentes qualquer placa, bandeira, planfleto ou música. Ao contrário, como já
foi dito, seria até risível qualquer formalidade ou propaganda em ato tão
singelo como o de entregar pequenas porções de madeira ou outro material para a
reforma de um imóvel simples.
Portanto, parece claro: as doações,
certamente feitas à margem de uma disciplina legal, não obedeceram a nenhuma
formalidade e foram feitas de forma aleatória, sem observância de critérios
objetivos capazes de afastar o risco de favorecimentos pessoais e de
infringência ao princípio da impessoalidade. E tudo com a agravante de terem
sido superlativamente intensificadas em ano e período eleitoral, circunstância
que, por decorrência lógica, conspira contra o conceito de probidade, pelo qual
tem o dever de zelar a Administração Público, em respeito aos cidadãos,
consoante o mandamento do art. 37, caput, da Constituição Federal.
Isto posto, VOTO
no sentido de que o Egrégio Plenário acolha a seguinte proposta de decisão:
2.1 Conhecer do Recurso de
Reconsideração, nos termos do art. 77 da Lei Complementar nº 202/2000,
interposto em face do Acórdão nº 1037/2008, desta Corte de Contas, e, no
mérito, negar-lhe provimento, mantendo na íntegra a decisão recorrida, em todos
os seus termos.
2.2 Dar ciência desta decisão, bem como
do Parecer e do Voto que a fundamentaram, ao Recorrente, Flávio Ragagnin, e ao
seu procurador, Adair Paulo Bortolini.
Conselheiro Salomão Ribas Junior
Relator