Processo: |
RLI-09/00063483 |
Unidade
Gestora: |
Prefeitura Municipal de Navegantes |
Responsável: |
Moacir Alfredo Bento |
Interessado: |
Roberto Carlos de Souza |
Assunto:
|
Despesas com Pessoal acima do Limite
Legal e não empenhadas. Utilização da Reserva de Contingência. |
Relatório
e Voto: |
GAC/CFF - 127/2011 |
Processo
apartado. Prestação de contas do prefeito. Exercício financeiro de 2007.
Município de Navegantes.
1.
Limite de pessoal. Descumprimento. LRF.
O limite das despesas com pessoal e
respectivos encargos do Poder Executivo, conforme definição estampada no art.
20, III, da Lei Complementar n. 101/2000, é de 54% da receita corrente
líquida. Tal limite, se ultrapassado e não corrigido no prazo da lei, pode
provocar o parecer de irregularidade das contas.
2.
Reserva de Contingência. Utilização. Indevida.
Os recursos da reserva de
contingência devem ser utlizados para abertura de créditos adicionais visando
atender passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevistos,
sendo vedada sua utilização para suplementar dotações inerentes a despesas
normais da atividade pública (art. 5º, III, "b" da Lei de
Responsabilidade Fiscal).
3.
Realização de despesas. Ausência de prévio empenho.
O art. 60 da Lei n. 4.320/64 veda a
realização de despesa sem prévio empenho. Desta forma deve a Unidade programar
suas despesas de acordo com as receitas e em atendimento aos princípios da
anualidade e da competência.
1. INTRODUÇÃO
Tratam os autos de
Constituído o processo apartado foi procedida
audiência ao responsável, Sr. Moacir Alfredo Bento – Prefeito Municipal (gestão
2005/2008), nos termos do ofício DMU/TC n. 17.085/2009 de 27/10/2009, fl. 109,
para que se manifestasse sobre as restrições presentes na conclusão do
Relatório técnico n. 1.323/2009, fls. 97 a 107.
Em data de 07/12/2009, o responsável
protocolou resposta e juntou documentação, às fls. 111 a 114, objetivando
apresentar justificativas de defesa para as irregularidades anotadas.
Encaminhado os autos à Diretoria de Controle
dos Municípios, foi realizada a análise das alegações de defesa apresentadas, o
que resultou no Relatório DMU n. 228 de 09/02/2010, no qual restaram mantidas
todas as restrições, conforme segue:
Despesas
com pessoal do PODER EXECUTIVO no valor de R$ 28.469.942,15, representando
54,65% da Receita Corrente Líquida (R$ 52.097.386,23), quando o percentual
legal máximo de 54% representaria gastos da ordem de R$ 28.132.588,56,
configurando, portanto, aplicação a MAIOR de R$ 337.353,59 ou 0,65%, em descumprimento
ao artigo 20, III, 'b' da Lei Complementar nº 101/2000, ressalvado o disposto
no artigo 23 da citada Lei (item 1, deste Relatório);
Utilização dos recursos da Reserva de
Contingência, no montante de R$ 411.900,00 sem evidenciar o atendimento de passivos
contingentes, riscos ou eventos fiscais imprevistos, em desacordo com a Lei
Complementar n.º 101/2000, artigo 5º, III, "b" (item 2);
Realização
de despesas, inclusive relativas a pessoal e encargos, no montante de R$
2.103.471,61 liquidadas e não empenhadas no exercício de 2007, em desacordo com
os artigos 60, 101 e 102 da Lei n° 4.320/64
(item 3).
O Ministério Público junto ao Tribunal
manifestou-se nos autos por meio do Parecer MPTC n. 1256/2010, conforme
registro de fls. 130 a 132, de forma a ratificar os termos do Relatório técnico
e decidir pela IRREGULARIDADE dos
atos analisados, com aplicação de multas
ao Sr. Moacir Alfredo Bento – Prefeito Municipal à época, em função das
irregularidades anotadas pelo Corpo técnico.
Em seguida vieram-me os autos, na forma
regimental, para voto e respectiva proposta de decisão.
2. DISCUSSÃO
2.1. Despesas
com pessoal do PODER EXECUTIVO no valor de R$ 28.469.942,15, representando
54,65% da Receita Corrente Líquida (R$ 52.097.386,23), quando o percentual
legal máximo de 54% representaria gastos da ordem de R$ 28.132.588,56,
configurando, portanto, aplicação a MAIOR de R$ 337.353,59 ou 0,65%, em
descumprimento ao artigo 20, III, 'b' da Lei Complementar nº 101/2000,
ressalvado o disposto no artigo 23 da citada Lei (item 1.1.1 da Conclusão do Relatório
n. 228/2010)
Apurou a análise Técnica o descumprimento do art. 20, inciso III,
alínea ‘b’ da LC n. 101/2000, visto ter o Poder Executivo ter excedido o
limite máximo de pessoal permitido (54%). Na oportunidade, considerando o que
estabelece o art. 23 da mesma lei, deveria o gestor público ter efetuado a
redução do excesso (0,65%) no prazo legal, que é de dois quadrimestres
seguintes ao exercício de ocorrência, sendo pelo menos um terço no primeiro
quadrimestre.
Segundo
a Instrução, o ex-prefeito se manifestou com as mesmas razões expostas, quando
da análise das contas do ano de 2007, ou seja, solicitou que fossem
considerados os ajustes efetuados na Receita Corrente Líquida e no total das despesas, os quais interferiram
significativamente na apuração dos limites legais.
Em relação ao solicitado, registrou a parte
Técnica não ser possível promover ajustes no resultado da receita arrecadada,
uma vez encerrados os Balanços contábeis referentes ao exercício de 2007. No
tange às despesas, apenas foi considerado o valor de R$ 17.499,51, relativo a
empenhos classificados indevidamente no elemento de despesa “92- Despesas de
Exercícios Anteriores”, fl. 99 dos autos, o que não resultou em alteração dos
cálculos de pessoal.
Nesses termos, verifico que os argumentos
apresentados pelo responsável não lograram alterar a situação objeto de exame.
Inclusive, acrescentou a parte Técnica ter verificado aplicação a maior no
exercício subseqüente (2008), no percentual de 7,05%, o que demonstrou a
ausência de providências, pelo chefe do Poder Executivo, visando adequar as
despesas de pessoal aos limites impostos pela Lei Complementar n. 101/2000.
Oportuno observar que nos cálculos efetuados
pela área Técnica deste Tribunal são incluídas, como despesas de pessoal, as
terceirizações de mão de obra, mesmo que decorrentes de substituição de
servidores (art. 18, § 1º - LRF).
No caso sob exame, foi incluído nos cálculos
do limite estabelecido no art. 20, III, ‘b’, da Lei n. 101/2000, a importância
de R$ 3.412.660,45, relativa a serviços de terceiros, conforme anexo IV do
Relatório Técnico n. 4.365/2008. Em vista desse procedimento, deveria o gestor
público acautelar-se em relação às despesas dessa natureza, quando de sua contratação
e contabilização, para não ter surpresas, pois ao serem acrescentadas ao
cômputo do limite de pessoal, pela análise técnica, podem ensejar a rejeição
de contas e/ou aplicação de multa, por parte deste egrégio Tribunal.
Pelo que se apresenta, entendo como correto
o posicionamento da Diretoria Técnica e a manifestação do Ministério Público,
ambos pelo julgamento irregular, em face da despesa de pessoal ter excedido o
limite máximo permitido pela Lei de Responsabilidade Fiscal, e pela aplicação
de multa ao Sr. Moacir Alfredo Bento, Prefeito Municipal à época.
Ainda, no que concerne à irregularidade
relacionada, prevê o art. 5º, § 1º da Lei Federal n. 10.028/2000, a aplicação
de multa no percentual de 30% dos
vencimentos anuais do gestor. De igual forma, estabelece o caput do art. 111
do Regimento Interno (Resolução TC-06/2001).
Todavia, ressalto que o Tribunal Pleno deste
Tribunal, em atenção aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, tem
aprovado votos em que a multa aplicada deu-se em patamar menor ao consignado
na Lei Federal n. 10.028/2000 (Acórdãos n. 0435/2007 e 0054/2007). Na oportunidade, interpretou-se que o
percentual a ser aplicado poderia ser de até
30% e que tal medida não significaria maiores embaraços na aplicação da
sanção, haja vista que o importante era o valor da multa cominada ao agente
político.
Logo, tendo-se em conta que os vencimentos
do ex-prefeito, no exercício de 2007, corresponderam ao montante de R$
105.600,00 e que 30% deste valor, nos termos da redação da Lei Federal em
questão, representaria R$ 31.680,00, sugiro ponderar a situação e aplicar
outro percentual para multa.
Assim, considerando que no exercício em
análise (2007) o percentual de aplicação a maior em despesa com pessoal
representou 0,65% da Receita Corrente Líquida, e que em relação ao ano anterior
(2006) o verificado foi de 5,5%, restando demonstrado redução do excesso,
concluo por sugerir a aplicação de multa ao responsável, no valor de R$
2.000,00, o que corresponde a 1,9% dos seus vencimentos anuais.
2.2. Utilização
dos recursos da Reserva de Contingência, no montante de R$ 411.900,00 sem
evidenciar o atendimento de passivos contingentes, riscos ou eventos fiscais
imprevistos, em desacordo com a Lei Complementar n.º 101/2000, artigo 5º, III,
"b" (item 1.1.2 da Conclusão do Relatório n. 228/2010)
No que tange aos atos de alteração orçamentária
observou inicialmente a equipe técnica da Diretoria de Controle dos Municípios
a utilização indevida dos recursos da reserva de contingência, no valor de R$ 411.900,00,
para suplementar dotações que não se caracterizavam como passivos contingentes,
riscos ou eventos fiscais, em descumprimento à Lei Complementar n. 101, art.
5º, inciso III, alínea “b”.
Para reforça seu entendimento citou nos autos
decisão exarada por esta Corte de Contas (Prejulgado 1235), na qual se
identifica, entre outras situações, ser vedada a utilização da reserva de
contingência para suplementar dotações insuficientes decorrentes de falta de
previsão ou gastos normais da atividade pública.
Por sua vez, justificou-se o
responsável nos mesmos termos apresentados por ocasião da Reinstrução do
processo de Prestação de Contas de Prefeito, ou seja, alegou que as alterações
orçamentárias foram realizadas em face do disposto na Lei n. 2098/2007 e de
acordo com o art. 16, §§ 1º e 2º da Lei de Diretrizes Orçamentárias (Lei n.
2019/2006), in verbis:
Art. 16 - Os Orçamentos para o exercício de
2007 destinarão recursos para a Reserva de Contingência, não inferiores a 1%
(um por cento) da Receita Corrente Líquida prevista para o mesmo exercício (ART.
5°, III da LRF).
§ 1° - Os recursos da Reserva de Contingência
serão destinados ao atendimento de passivos contingentes e outros riscos e
eventos fiscais imprevistos, e também
para abertura de créditos adicionais suplementares ou especiais para despesas
não orçadas ou orçadas a menor, conforme disposto na Portaria MPO n° 42/99,
art. 5°, Portaria STN n° 163/2001, art. 8° e demonstrativo de riscos fiscais.
(Art. 5°, III, "b" da LRF);
§ 2° - Os recursos da Reserva de Contingência
destinados a riscos fiscais, caso estes não se concretizem até o dia 10 de
dezembro de 2007, poderão excepcionalmente, ser utilizados por ato do Chefe do
Poder Executivo Municipal para abertura de créditos adicionais suplementares
de dotações que se tornaram insuficientes.
Anota-se que a partir de pesquisa realizada
no Sistema e-Sfinge foi possível constatar que a Lei n. 2098/2007, que dispôs
sobre a anulação parcial de dotações orçamentárias para efeito de
suplementação, dentre elas a Reserva de Contingência, foi editada em 14/12/2007,
restando, pois, comprovado o cumprimento do previsto no § 2º da LDO do
Município.
No que se refere à utilização
da reserva de contingência para suplementar despesas orçadas a menor, nos
termos legais antes citados, observa-se que o gestor público deve ter cautela em
sua aplicação. Primeiro porque a reserva de contingência não deve ser
entendida como uma espécie de fundo para comportar erros e equívocos, na
previsão de receitas e despesas orçamentárias. Segundo, a falta de diligência
na utilização dos recursos faz com que o Município corra o risco de não
possuir dotação suficiente para atender passivos contingentes e outros riscos
e eventos fiscais imprevistos, possíveis de acontecerem a qualquer tempo
durante a execução orçamentária do exercício.
Oportuno destacar que em
outros processos de contas tenho me manifestado no sentido de não haver
ilegalidade no fato do Município abrir créditos adicionais suplementares ou
especiais por conta de recursos da
Reserva de Contingência, para socorrer as dotações não orçadas ou orçadas a
menor, desde que seja observado alguns critérios, entre eles que a anulação se
dê ao final do exercício e que não haja insuficiência de caixa. A utilização
da reserva de contingência nesses dois casos estaria atendendo ajustes de
planejamento (princípio da flexibilidade orçamentária).
Tal
posicionamento baseia-se
na Nota Técnica n. 152/2006 da Secretaria do Tesouro Nacional - STN, editada
em resposta à consulta formulada pela Federação Catarinense de Municípios -
FECAM, na qual se extrai a seguinte conclusão:
Diante do
exposto, conclui-se que, de fato, é permitido o uso, por parte dos entes da
federação, da Reserva de Contingência como fonte de recursos para a abertura
de créditos adicionais. Tal uso, vale dizer, é plenamente compatível com o
objetivo da Lei de Responsabilidade Fiscal - segundo a qual a citada Reserva
deve ser destinada ao atendimento de passivos contingentes e outros riscos e
eventos fiscais imprevistos, incluindo-se nesses as alterações e adequações
decorrentes de falha de previsão orçamentária.
Considerando que no caso em
exame, conforme registrou a Instrução, o Município de Navegantes, no exercício
de 2007, abriu créditos adicionais suplementares no valor de R$ 411.900,00,
destinados a reforçar dotações para despesas com pessoal e encargos, outras
despesas correntes e amortização da dívida, o que representou 099% da Reserva
de Contingência orçada (R$ 412.000,00).
Considerando que apesar de
ser comprovado que a anulação da dotação ocorreu ao final do exercício, ou
seja, nos termos do art. 16, § 2º da Lei de Diretrizes Orçamentárias (Lei n.
2019/2006), verificou-se que o Município encerrou o ano com insuficiência de
caixa (déficit financeiro injustificado combinado com déficit orçamentário), assim
sendo, acompanho o entendimento da Diretoria Técnica e do Ministério Público, pela
irregularidade do ato praticado e pela proposta de aplicação de multa prevista
no artigo 70, inciso II, da Lei Complementar 202/2000.
2.3. Realização de despesas, inclusive relativas a
pessoal e encargos, no montante de R$ 2.103.471,61 liquidadas e não empenhadas
no exercício de 2007, em desacordo com os artigos 60, 101 e 102 da Lei n°
4.320/64 (item
1.1.3 da Conclusão do Relatório n. 228/2010)
Anotou a Instrução técnica a realização de
despesas com pessoal e encargos, liquidadas e não empenhadas no exercício de
sua competência (2007), caracterizando descumprimento do disposto nos artigos
60, 101 e 102 da Lei n. 4.320/64.
O responsável, diante da restrição,
justificou que as despesas apontadas forma contabilizadas fora de sua
competência pelo fato de chegarem ao departamento de contabilidade em momento
posterior ao encerramento do balanço; que o pagamento de despesas referentes à
pessoal e encargos em janeiro do exercício subsequente é prática adotada por
muitos anos no Município; e que o Município, por intermédio do Setor de
Contabilidade e de Controle Interno, vem desenvolvendo trabalhos e estudos com
vistas às readequações das rotinas contábeis.
A análise Técnica, por sua vez, manteve a
restrição sob o fundamento de que o responsável repetira as justificativas já
apresentadas, quando da reinstrução do Processo de Prestação de Contas de
Prefeito, não existindo, pois, novos fatos que motivassem o saneamento do
apontado.
Acrescento ao parecer técnico que este
Tribunal, ao dispor sobre a contabilização da despesa orçamentária pública e,
por conseqüência, dos Restos a Pagar, aplica a interpretação da Lei n. 4.320/1964 do ponto de vista orçamentário,
tendo por base o disposto no artigo 35 da citada Lei, o qual, segundo a tradicional doutrina, confirma o regime
misto para gestão financeira da contabilidade pública:
Art. 35. Pertencem ao exercício financeiro:
I – as receitas nele arrecadadas; e
II – as despesas nele legalmente
empenhadas.
De acordo com este dispositivo, a despesa empenhada, no período de sua
competência, passa a ser considerada como tal e para tanto integra a base
de cálculo para fins de verificação da execução orçamentária.
O que fez a análise Técnica, no processo de
Prestação de Contas, foi incluir a despesa liquidada com pessoal, na
importância de R$ 2.120.971,12, não empenhada pela Contabilidade, no exercício
de sua competência. Em conseqüência, excluiu as despesas dessa mesma natureza,
relativas ao exercício anterior (2006), o que indica a inexistência de
duplicidade de lançamento em um mesmo período.
Desta feita, acompanho o posicionamento
técnico e do Ministério Público.
3. VOTO
Diante do exposto, proponho ao Egrégio Tribunal
Pleno a adoção da seguinte deliberação.