ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

Gabinete da Auditora Substituta de Conselheiro Sabrina Nunes Iocken

 

 

PROCESSO N.º:

 

REP 12/00510280

 

UNIDADE GESTORA:

PREFEITURA MUNICIPAL CAPINZAL

 

RESPONSÁVEL:

SR. LEONIR BOARETTO

 

ASSUNTO:

REPRESENTAÇÃO ACERCA DE SUPOSTAS IRREGULARIDADES NO CONCURSO PÚBLICO Nº 13/2012

 

 

DESPACHO Nº GASNI 70/2012

 

O presente processo trata de Representação promovida pelo Sr. Pedro Isganzella, atual Presidente da Câmara de Vereadores de Capinzal, acerca de supostas irregularidades contidas no Concurso Público nº 13/2012, promovido pelo referido município.

De acordo com o Representante, em breve suma, em junho do corrente ano foi exarada liminar pelo Poder Judiciário suspendendo a execução do Contrato nº 124/2012 (por meio do qual foi contratada a empresa responsável pela realização do concurso), além do próprio concurso regido pelo edital de nº 13/2012 (Ação Civil Pública n. 016.12.001691-0), tendo em vista que a contratação se deu por meio de Pregão Presencial, modalidade esta que seria inadequada para contratos dessa natureza.

Posteriormente, segundo o Representante, a Prefeitura realizou licitação na modalidade de Convite, tendo contratado uma outra empresa. Ainda de acordo com o Representante, a segunda licitação estaria eivada de vícios, tais como a contratação a preços manifestamente superiores aos praticados no primeiro contrato[1], a ausência de publicação e o possível conluio entre os participantes[2] e a ausência da comprovação da efetiva capacidade técnica da empresa contratada para conduzir o concurso. A segunda contratação foi realizada com a empresa Instituto Barriga Verde, que está sob investigação do Ministério Público Estadual sob a suspeita de fraude em concursos públicos por ela realizados.

Segundo o Representante, toda esta movimentação estaria sendo realizada pelo atual Prefeito Municipal, Sr. Leonir Boaretto, para garantir a aprovação de seus correligionários no concurso e a sua conseqüente efetivação no quadro de pessoal do Município, já que estaria no fim de seu mandato e não fora reeleito.

O Representante asseverou ainda que o edital do concurso contém diversos vícios, tais como a ausência de exigência de prova prática para os cargos de professor e de técnico em informática e a existência de conteúdo programático deficiente e direcionado.

O Representante encaminhou ainda uma relação com os nomes dos possíveis aprovados, todos ligados ao atual Prefeito. Também segundo o Representante, o concurso está sendo realizado no final do mandato, contrariando o princípio da moralidade, e sem finalidade pública, tendo em vista que a maioria das atividades da Prefeitura fica suspensa no mês de janeiro em decorrência das férias concedidas aos servidores.

Por fim, o Representante requereu que fosse instaurada Tomada de Contas Especial com vistas a apurar eventual prejuízo ao erário, e  ainda que fosse editada medida com vistas à suspensão do concurso público.

Foram juntados pelo Representante os seguintes documentos: relação dos candidatos com inscrição homologada no Concurso Público nº 13/2012; cópia do edital do concurso e de seu termo aditivo; cópia do processo do Convite nº 120/2012 e do contrato dele decorrente; e publicação do extrato relativo à primeira contratação, que decorreu do pregão presencial.

Paralelamente, foi encaminhada a este Tribunal, também pelo Sr. Andevir Isganzella, uma segunda Representação, autuada sob o nº 12/00511090, que trata da possível nomeação, pelo atual Prefeito do Município de Capinzal, de servidores aprovados em concurso público realizado no final do seu mandato.

O Representante alerta para o possível descumprimento dos comandos estabelecidos pela Legislação Eleitoral, em especial os relativos ao artigo 73, V, “c”, da Resolução nº 23.341/2011, do TSE, que proíbe a nomeação dos aprovados em concursos públicos homologados até 07 de julho de 2012 no período compreendido entre três meses antes das eleições até a posse dos eleitos.

Além disso, o Representante alerta para a ausência de demonstração do atendimento dos requisitos estabelecidos pela Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), em especial a comprovação de que as nomeações não acarretarão aumento da despesa com pessoal nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato, conforme estabelece o parágrafo único do artigo 21 da LRF. O Representante assevera ainda que não existe qualquer manifestação dos Secretários Municipais no sentido da necessidade das contratações, o que seria obrigatório diante do conteúdo da Lei Municipal nº 088/2005.

Por fim, o Representante apresenta argumentação semelhante à descrita no presente processo e requer a instauração de Tomada de Contas Especial e a anulação/suspensão de eventuais nomeações.

Considerando a existência de pedido de medida cautelar, que impende a avaliação da possibilidade de suspensão do Concurso Público nº 13/2012, e a data iminente que foi designada para a realização das provas – 09/12/2012 – esta Relatora passa a analisar o preenchimento dos requisitos necessários para a concessão da medida requerida pelo Representante.

Destaco primeiramente que a concessão de medida cautelar encontra guarida no Poder Geral de Cautela, que é inerente à atuação dos Tribunais de Contas, tendo sido referendado pelo STF já em 2003, quando decidiu acerca do MS 24.510-7, oportunidade na qual a Relatora, Ministra Ellen Gracie, em sua fundamentação, afirmou que “(...) se as Cortes de Contas têm legitimidade para determinar que os órgãos ou entidades da Administração interessada adotem as medidas necessárias ao exato cumprimento da lei, com maior propriedade, possuem legitimidade para a expedição de medidas cautelares, como a ora impugnada, a fim de prevenir a ocorrência de lesão ao erário ou a direito alheio, bem como garantir a efetividade de suas decisões”.

Além disso, este Tribunal já adotou posicionamento semelhante, concedendo medida cautelar para evitar a ocorrência de futuros danos ao erário, conforme se verifica da Decisão nº 1486/2007, relativa ao processo RPJ 07/00068570, cujo Relator foi o Conselheiro Luiz Roberto Herbst.

Por meio da citada decisão, determinou-se, de forma cautelar, que fosse realizado o afastamento temporário de um funcionário da função de gerente em virtude da sua participação direta e efetiva em todas as irregularidades que haviam sido verificadas, para que se evitasse a ocorrência de novos danos ao erário. Extrai-se da Decisão nº 1486/2007:

Decisão nº 1486/2007

[...] 6.15. Determinar, cautelarmente, ao Presidente da CIDASC, com fulcro no art. 73 da Lei Complementar n. 202/2000, sob pena de responsabilidade solidária, que, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, a contar da data da publicação desta deliberação no Diário Oficial do Estado, proceda ao afastamento temporário do funcionário da CIDASC, Sr. ALÍPIO EGÍDIO KULKAMP, da função de Gerente de Apoio Laboratorial, bem como de qualquer atribuição no gerenciamento dos Laboratórios de Análise da Qualidade do Leite, da Água e de Alimentos localizados na Universidade do Contestado – Campus Concórdia, devido a sua participação direta e efetiva em todas as irregularidades constatadas e, conseqüentemente, existir indícios suficientes de que, prosseguindo no exercício de suas funções, possa causar novos danos ao erário, considerando a existência de elementos que indicam que o servidor participará de projetos da mesma natureza no Município de São Miguel do Oeste, haja vista a assinatura em 14/12/2006 do Termo de Compromisso celebrado entre o Estado de Santa Catarina, por intermédio da Secretaria do Desenvolvimento Regional de São Miguel do Oeste e da CIDASC, com a UNOESC para implantação do Laboratório de Análise de Leite, estando, assim, presentes os requisitos processuais do fumus boni iuris e periculum in mora, conforme fundamento exposto no item V do Relatório DAE. Ressalta-se que o afastamento do servidor dar-se-á somente quanto ao exercício da função de confiança de "Gerente de Apoio Laboratorial", pois é nesta condição que poderá retardar ou dificultar as ações desta Corte de Contas, sem prejuízo do exercício do emprego público que integra o quadro funcional da CIDASC.

Superada a questão relativa à legalidade da concessão de medida cautelar por este Tribunal de Contas, passo ao exame dos argumentos apresentados pelo Sr. Pedro Isganzella, atual Presidente da Câmara de Vereadores de Capinzal e Prefeito eleito do Município, que deve assumir o mandato a partir de janeiro de 2013.

De fato, conforme apontado pelo Representante, há necessidade de comprovação do atendimento aos comandos estabelecidos pela Legislação Eleitoral, em especial os relativos ao artigo 73, V, “c”, da Resolução nº 23.341/2011, do TSE, e pela Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), o que não se verifica no presente processo, em especial em virtude do concurso estar sendo realizado no último mês do mandato do atual Prefeito. Além disso, deve ser demonstrada a necessidade das contratações e avaliado de forma técnica o conteúdo do edital, a fim de se verificar se está havendo direcionamento ou não.

Considero importante frisar que as conseqüências dos fatos apontados pelo Representante são graves e que há processos judiciais nos quais está sendo analisada a licitude de concursos públicos promovidos pelo Instituto Barriga Verde, empresa responsável pela realização do concurso público do Município de Capinzal.

Contudo, pondero que individualmente consideradas as irregularidades apontadas pelo Representante podem não macular de nulidade o edital do concurso, mas que o conjunto das mesmas reúne gravidade suficiente para ensejar a sustação do procedimento

Verifico, portanto, ser necessária a adoção de uma medida cautelar diferida com o objetivo de evitar o prosseguimento do concurso até que seja demonstrada a sua total legalidade perante os aspectos suscitados na Representação, evitando que sejam realizadas nomeações irregulares, que repercutem nos cofres municipais e cuja reversão normalmente demanda longos processos judiciais.

Portanto, a medida a ser deferida por esta Relatora visa essencialmente evitar que os atos praticados não possam ser revertidos posteriormente, causando graves prejuízos ao erário municipal. Considero, entretanto, que tal medida não deva obstar a realização das provas, que está prevista para o dia 09/12/2012, já que se demonstrada a regularidade do concurso a fixação de uma nova data certamente trará novos custos ao Município, tais como a locação do espaço, a contratação de fiscais etc., o que deve ser evitado tanto quanto possível.

Destaco, por fim, que entendo que o exercício da atividade de fiscalização, na medida do possível, não deve comprometer o andamento das ações voltadas ao desenvolvimento do Município e que existem atos subseqüentes à prova e cuja suspensão também evita eventuais nomeações irregulares, sem, contudo, causar acréscimo nos custos da Administração, como é o caso da “Divulgação da Classificação Final do Concurso (após recursos)”, que também está prevista para o dia 26/12/2012 e se constitui em ato prévio à homologação do resultado final, sendo que a sua não execução impede a homologação e resguarda o erário.

Acrescento ainda que, no intuito de se obter elementos complementares para análise, depois de cumprida a ordem de sustação, deve ser encaminhada a este Tribunal toda a documentação relativa ao concurso, desde os seus atos prévios até a contratação derradeira da empresa executora (Convite nº 120/2012) e todos os atos executados até o presente dia.

   Assim sendo, demonstrada a presença do periculum in mora, ante a previsão da realização das provas relativas ao Concurso Público nº 13/2012 no próximo domingo, dia 09/12/2012 e da homologação do resultado final do concurso já em 26/12/2012, 05 dias antes do término do mandato do atual Prefeito, além do fumus boni iuris, ante a ausência de demonstração e a necessidade de avaliação do atendimento a diversos aspectos da legislação relativa à contratação de servidores em final de mandato, com fundamento no Poder Geral de Cautela, reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal, e com vistas a assegurar a eficácia da decisão de mérito deste Tribunal e a tornar célere a atuação desta Corte, decido:

 

1. Conhecer da Representação, por preencher os requisitos dos arts. 66 c/c 65, § 1º, da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, bem como do art. 100 e seguintes do Regimento Interno (Resolução nº TC 06, de 28 de dezembro de 2001), alterado pela Resolução nº TC-05, de 29 de agosto de 2005 e Determinar ao Sr. Leonir Boaretto, atual Prefeito de Capinzal, e ao Sr. Edson Antônio Cassiano, Secretário da Administração e Finanças do Município:

1.1. Com fundamento no Poder Geral de Cautela e nos termos do §3° do artigo 29 da Lei Complementar Estadual nº 202/2000, que adotem providências visando à sustação cautelar do concurso em caráter diferido, deixando de realizar a divulgação da classificação final do concurso público, prevista para o dia 26/12/2012, e, consequentemente, a sua homologação, até ulterior manifestação deste Tribunal de Contas a respeito da sua legalidade;

1.2. Com fulcro no art. 123 do Regimento Interno, que, no prazo de 15 (quinze) dias a contar da presente decisão, encaminhem a este Tribunal toda a documentação relativa ao concurso, desde os seus atos prévios até a contratação derradeira da empresa executora (Convite nº 120/2012) e todos os atos executados até o presente dia; e

1.3. Com fulcro no art. 123 do Regimento Interno, que, no prazo de 15 (quinze) dias após a execução da medida cautelar determinada por esta Relatora no item 1, encaminhem os devidos comprovantes do atendimento à referida decisão, bem como os atos posteriores ao primeiro encaminhamento (determinação constante do item 2) eventualmente ainda não remetidos.

2. Determinar, com fulcro no §1° do art. 22 da Resolução n. TC-09/2002, à Secretaria Geral que realize o apensamento do processo REP 12/00511090 ao presente processo, que está melhor instruído, tendo em vista a conexão de matérias evidenciada entre eles.

3. Determinar à DAP que prossiga a regular instrução processual, conferindo caráter de urgência ao presente processo.

4. Dar Ciência deste Despacho Singular ao Sr. Leonir Boaretto, atual Prefeito de Capinzal, ao Sr. Edson Antônio Cassiano, Secretário da Administração e Finanças do Município, ao Instituto Barriga Verde, bem como ao responsável pelo Controle Interno do Município.

 

 

Gabinete da Relatora, 06 de dezembro de 2012.

 

 

Sabrina Nunes Iocken

Auditora



[1] A primeira contratação foi realizada pelo valor de R$ 13.999,00 e a segunda pelo valor de R$ 29.500,00.

[2] Foram apresentadas as seguintes cotações, que, de acordo com o Representante, seriam demasiadamente aproximadas e demonstrariam uma suposta combinação do resultado: Georgio Almeida ME – R$ 31.000,00; Instituto Barriga Verde Ltda.: R$ 29.500,00 e Exata GG Ltda.: R$ 31.000,00.