PARECER nº:

MPTC/2542/2010

PROCESSO nº:

TCE-02/03065204    

ORIGEM:

Departamento de Estradas de Rodagem - DER

INTERESSADO:

Departamento de Estradas de Rodagem - DER

ASSUNTO:

Tomada de Contas Especial  SLC-0203065204

 

 

1. DO RELTÓRIO

 

Retornam a esta Procuradoria para exame e parecer o processo epigrafado que versa sobre Tomada de Contas Especial, promanada da Decisão nº 3432/2002, do Tribunal Pleno, proferido nos autos do processo SLC 0203065204, que tratou da análise do processo licitatório relativo a Tomada de Preços nº 027/97, e respectivo contrato nº PJ. 091/87, que teve por objeto a construção da ponte sobre o Rio Blinck, no km 39,5 da Rodovia SC-49 – trecho Presidente Nereu – Vidal Ramos, numa extensão de 42,99 metros.

 

 

2. DA INSTRUÇÃO

 

Em cumprimento à decisão do colendo Plenário, o Processo SLC 0203065204, foi convertido em Tomada de Contas Especial TCE0203065204, bem como, efetuou-se a citação dos responsáveis, para apresentação das alegações de defesa.

Os Responsáveis apresentaram as justificativas perante o Tribunal de Contas, bem como juntaram documentos, fls. 967-1041 e 1049-1055 e 1063-1069.

À vista dos esclarecimentos aduzidos pelos responsáveis, a Diretoria de Controle de Licitações e Contratações, exarou o relatório nº 174/07, (fls. 1072-1090), que após análise, concluiu por sugerir ao Tribunal Pleno decidir por julgar irregulares com imputação de débito, na forma do art. 18, inciso III, alínea “c”, c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar nº 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, e condenar o Sr. Oscar Alberto da Silva Gayer ao pagamento de débito de sua responsabilidade, descrito no item 4.1, do referido relatório.

Sugeriu ainda, aplicar multa ao Sr. Edgar Antônio Roman, em face da irregularidade descrita no item 4.2, bem como fez determinação no item 4.3, ambos do mesmo relatório.

 

3. DA PROCURADORIA

 

 

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, analisando a Presente Tomada de Contas Especial, e tudo mais que dos autos consta passa a se manifestar, sobre as restrições apontadas pela Instrução Técnica.

A Instrução Técnica sugere a imputação de débito ao Sr. Oscar Alberto da Silva Gayer, no item 4.1, do relatório de fl. 1087, no valor de R$ 95.004,97 (noventa e cinco mil, quatro reais, noventa e sete centavos), referente a serviços executados e perdidos na ponte sobre o Rio Blink, devido à falta de pagamento à empresa contratada, em descumprimento ao previsto nos art. 66 da Lei nº 8.666/93.

Acerca dessa irregularidade, o responsável às fls. 1078, em síntese informou que não deu qualquer causa a prejuízo ao Poder Público. Ao contrário, de forma diligente e em atenção aos objetivos eleitos pela Administração, sempre tomou o extremo cuidado em prosseguir com as ações governamentais eleitas, somente frustadas em razão de restrições orçamentárias e financeiras abruptamente comunicada pela Pasta fazendária.

Conforme se exurge dos autos, a Instrução Técnica quer enquadrar o suposto dano ao erário como ato ímprobo.

É cediço que apuração da prática de ato de improbidade administrativa está regulada pela Lei n.º 8.429/92 a qual prevê a responsabilização do agente público quando da prática de atos que importem: a) enriquecimento ilícito do gestor (art. 9º); b) prejuízo ao erário (art. 10) e c) lesão aos princípios da administração pública (art. 11).

Com efeito, as infrações de que tratam os arts. 9º e 10 da Lei n.º 8.429/92, além de dependerem da comprovação de dolo ou culpa por parte do agente supostamente improbo podem exigir, conforme as circunstâncias do caso, a prova de lesão ou prejuízo ao erário, haja vista que o que caracteriza a improbidade do ato é o dolo, a contrariedade à lei e à moral por parte do agente público, e não sua inércia, inexperiência ou ingenuidade, como tem entendido a jurisprudência.

Nesse diapasão, parece-me que a fundamentação tecida no elatório de fls. 072-1090, pretende ampliar, de forma indevida, e até mesmo perigosa, o alcance da Lei nº 8.429/1992, ao estendê-la a situações de simples omissão – falta de pagamento da empresa contratada- do administrador quanto a seus deveres.

Com efeito, para que seja analisada a eventual ocorrência de improbidade administrativa por atos que causem prejuízo ao erário, é indispensável a demonstração dos atos praticados pelos agentes, para configuração do nexo de causalidade entre a ação ou omissão, seja dolosa ou culposa, conforme dispõe o caput do art. 10 da Lei 8.429/1992.

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:

Ainda, a Lei nº 8.429/92 consagrou a responsabilidade subjetiva do servidor público, exigindo o dolo nas três espécies de ato de improbidade administrativa (arts. 9º, 10 e 11) e permitindo, em uma única espécie – art. 10 – também a responsabilidade a título de culpa.

Nesse exato sentido, Maria Sylvia Zanella Di Pietro afirma que:

o enquadramento da lei de improbidade exige culpa ou dolo por parte do sujeito ativo. Mesmo quando algum ato ilegal seja praticado, é preciso verificar se houve culpa ou dolo, se houve um mínimo de má-fé que revele realmente a presença de um comportamento desonesto.

Afastou-se, portanto, a responsabilização objetiva do servidor público.

Registre-se que à falta de pagamento à empresa contratada não serve para responsabilizar alguém pelos serviços executados e perdidos e, conseqüentemente, condená-lo ao ressarcimento dos respectivos valores, uma vez que não há nexo direto entre à falta de pagamento à empresa contratada e serviços executados e perdidos.

Não se pode desconsiderar o alerta  emitido pelo Desenbargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, ao relatar a APEL.N: 398.962.5/7-00 - VOTO N°: 6351 - COMARCA: PALESTINA - VARA ÚNICA – Domingas, in verbis:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA - Improbidade administrativa – Município de Palestina - Certames na modalidade convite – Contratação de serviços de transporte, de construção de alambrado e para aquisição de geladeira - Alegação de fraudes nos diversos processos de licitação - Não ocorrência - Tratando-se de pretensão voltada à nulidade de atos da Administração sob o fundamento de improbidade administrativa e de prejuízo ao Erário, é necessária a demonstração do efetivo dano, que não se presume, e da má-fé dos envolvidos, não sendo suficientes condutas meramente irregulares - Inteligência dos artigos 10, "caput" e 11, "caput", da Lei n° 8.429/92 — Sentença de parcial procedência - Recurso do Ministério Público não provido, provido o do réu condenado PROCESSO - Ação civil pública por ato de improbidade administrativa - Propositura pelo Ministério Público - Condenação nas custas e honorários - Inadmissibilidade, salvo comprovada má-fé (art. 18 da Lei 8 078/90) - Recurso provido para esse fim

Conforme se extrai do julgado, tem-se que a improbidade administrativa, mais que um ato ilegal, deve traduzir, necessariamente, a falta de boa-fé, a desonestidade, o que não restou comprovado nos autos pelas informações disponíveis no relatório nº 174/07, fls. 1072-1090, ao contrário, consta dos autos que à falta de pagamento à empresa contratada somente foi frustadas em razão de restrições orçamentárias e financeiras abruptamente comunicada pela Pasta fazendária.

No mesmo sentedio é da Jurisprudencia do Tribunal de Justiça de Minas Gerais conforme acórdão assim ementado:

EMENTA: IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - PENAS - IRREGULARIDADE - CONTRATAÇÃO - VERBAL - AUSÊNCIA - DOLO - MÁ-FÉ - CULPA GRAVE - PREJUÍZO - INEXISTÊNCIA. IMPROCEDÊNCIA - AÇÃO - CIVIL - PÚBLICA. - Consoante já decidiu o eg. Superior Tribunal de Justiça, rel. Min. Garcia Vieira, a Lei 8.429/92 "alcança o administrador desonesto, não o inábil (REsp 213.994-MG, DJU 27.09.99). - Assim, a mera irregularidade na forma de contratação (verbal), não acarreta, por si só, a aplicação das penas da lei de improbidade administrativa, especialmente porque não comprovados o dolo, a má-fé e nem mesmo a culpa grave, ausente, também, qualquer tipo de prejuízo para a municipalidade.

Deveras, a Lei de improbidade, portanto, não pune a mera ilegalidade, mas sim a conduta ilegal ou imoral do agente público, e de todo aquele que o auxilie, voltada para a corrupção.

Conforme se extrai dos autos, depreende-se que a Instrução Técnica não comprovou, de forma inequívoca, o efetivo dano sofrido, ademais, a simples alegação de que os serviços executados na Ponte do Rio Blink foram perdidos não é motivo plausível para caracterização do dano, tão pouco pode ser admissível para caracterizar a ação dolosa do responsável - devido à falta de pagamento à empresa contratada.

Por outro lado, não se evidencia, pois, qualquer dano ao erário que justifique a sanção de ressarcimento, máxime porque não se apercebe conduta (omissa ou comissiva) que traduza, propriamente, qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida, importando enriquecimento ilícito do responsável.

 Nem se alegue que a aferição da existência de dolo somente poderia ocorrer após a instrução processual, eis que, no caso dos autos, a Instrução Técnica no seu Relatório nº 174/07, fls. 1072-1090, sequer narra a existência de má-fé e nem menciona o agir doloso por parte do responsável.

Na verdade, a Instrução Técnica, atribui ao Sr. Oscar Alberto da Silva Gayer a prática de ato de improbidade administrativa pela falta de pagamento à empresa contratada, imputando verdadeira responsabilidade objetiva ao agente público.

Por outro lado, é salutar, ainda, a análise da legislação que disciplina a responsabilidade do ordenador de despesa por danos causados ao erário em face da ação ou omissão culposa ou dolosa de agente subordinado ou de terceiros.

Diz o art. 80 Decreto-Lei 200, de 25.02.67, que dispõe sobre a organização da Administração Federal, verbis:

Art. 80. Os órgãos de contabilidade inscreverão como responsável todo ordenador de despesa, o qual só poderá ser exonerado de sua responsabilidade após julgadas as contas pelo Tribunal de Contas.

§ 1° O ordenador de despesa é toda e qualquer autoridade de cujos atos resultarem emissão de empenho, autorização de pagamento, suprimento ou dispêndio de recursos da União ou pela qual esta responda.

§ 2° O ordenador de despesa, salvo conivência, não é responsável por prejuízos causados à Fazenda Nacional por agente subordinado que exorbitar das ordens recebidas.

De acordo com a norma federal, o responsável pela gestão de recursos públicos afetos a sua área de atuação é o ordenador de despesas. Contudo, poderá ser exonerado dessa responsabilidade por ocasião do julgamento de suas contas pelo Tribunal de Contas.

De outro norte,essa Corte de Contas também regulamentou a matéria na Resolução nº. 11, de 06 de novembro de 1991 (Regimento Interno) cujo art. 75 assim dispõe:

Art. 75 - A responsabilidade, originalmente atribuída ao ordenador da despesa, poderá ser transferida ao responsável pela aplicação dos recursos públicos se efetivamente comprovado, nos termos de orientação própria do Tribunal, que não cabia ao primeiro culpa pelo atraso, má aplicação ou não prestação de contas.

Observa-se que o regulamento do Tribunal de Contas ampliou o alcance da norma, afastando a responsabilidade do ordenador quando ficar comprovado que não cabia ao mesmo a culpa pelo prejuízo. Em outras palavras, agindo com culpa o ordenador, seja pela negligência ou imprudência, cabe a ele a responsabilidade pelos prejuízos causados ao erário; não tendo contribuído culposamente para o resultado danoso, pode o Tribunal de Contas, segundo o art. 75 da Resolução TC nº 11/91 (Regimento Interno), transferir a responsabilidade pela má aplicação dos recursos públicos a quem efetivamente concorreu para o seu resultado.

Exurge-se dos autos, que a falta de pagamento à empresa contratada ocorreu em razão de restrições orçamentárias e financeiras abruptamente comunicada pela Pasta fazendária, o que no meu entender exclui a responsabilidade do responsável pelo suposto dano.

Como salientado acima, a caracterização da improbidade definida no art. 10, X, da Lei nº 8.429/92 pressupõe a existência de ação negligente, com dolo ou culpa grave, situação que não se verifica nestes autos, com destaque para o fato de que sequer foi demonstrado prejuízo real ao Erário e seu respectivo valor mediante prova técnica, que não é suprida apenas pelo levantamento numérico constante dos autos às de fls. 1075.

Quanto a sugestão para aplicação de multa ao Sr. Edgar Antônio Roman, pela irregularidade descria no item 4.2, do relatório de fls. 1088, em face de gestão antieconômica que resultou dano ao erário, tenho que a mesma não pode prosperar, haja vista que não se evidenciou a prática de improbidade administrativa do tipo sustentado no relatório de fls. 1072-1090 e não se justificam o ressarcimento e as demais sanções requeridas contra os responsáveis.

Por todo o exposto, este Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência que lhe é conferida pelo art. 108, incisos I e II da Lei Complementar 202/2000, manifesta-se no sentido de que sejam JULGADAS REGULARES as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, na forma do artigo 18, inciso I da Lei Complementar nº 202/2000, dando quitação plena aos responsáveis, de acordo com o artigo 19 do mesmo diploma legal, haja vista que os fatos levantados como irregulares não configuram dano ao erário pois, no meu entendimento, não se condena o agente público, sob mera presunção de ter concorrido para a existência de supostos danos ao erário, se estes não restarem devidamente comprovados nos autos.

Não tendo vindo aos autos prova indubitável dos danos pretéritos alegados, mister a improcedência do pedido de condenação e imputação de débito ao responsável. 

Florianópolis, 28 abril de 2010.

 

 

MÁRCIO DE SOUSA ROSA

Procurador Geral Adjunto

 

 

 

 

zas