PARECER nº: |
MPTC/3704/2010 |
PROCESSO nº: |
REP-08/00106288 |
ORIGEM : |
Serviço
Autônomo Municipal de Água e Esgoto de Timbó |
INTERESSADO: |
Joanicio
Umberto Gretter |
ASSUNTO : |
Contratação de advogado por inexigibilidade
de licitação. |
1 – DO RELATÓRIO
Trata-se de Representação formulada pelo Sr. Joanício Umberto
Gretter, servidor público municipal,
comunicando a existência de supostas irregularidades no âmbito do Serviço
Autônomo Municipal de Água e Esgoto de Timbó - SAMAE.
Os auditores da Diretoria de
Controle de Licitações e Contratações, por meio do Relatório nº 685/2008, de
fls. 60/66, sugeriram a audiência
do responsável, Sr. José Nazareno da Silva, Diretor-Presidente do Serviço
Autônomo Municipal de Água e Esgoto de Timbó, em face da restrição apontada no
item 4.2.1 de sua conclusão.
O então Procurador deste Ministério Público, por meio do Ofício
nº 952/2008, de fl. 67, solicitou ao titular da Unidade Gestora informações
complementares necessárias à instrução do feito.
A diligência foi
atendida (fls. 67/69).
O então Procurador
deste Parquet apresentou o Parecer nº
6573, de fls. 71/74, opinando pelo conhecimento parcial da Representação, e a audiência
dos responsáveis, Sr. José Nazareno da Silva, Diretor-Presidente do Serviço
Autônomo Municipal de Água e Esgoto de Timbó, e Sr. Marcos Gadotti, Procurador-Geral
do Município, para apresentarem justificativas acerca de irregularidade
evidenciada.
O Exmo. Auditor
Relator determinou a providência, mediante despacho de fls. 77/78.
Foram juntadas as justificativas de fls. 84/254,
257/414 e 417.
Por fim, os auditores da Diretoria de
Controle de Licitações e Contratações
apresentaram o Relatório nº 227/2009, de fls. 420/431, contendo as seguintes
conclusões quanto aos atos analisados:
-
Regular quanto à seguinte alegação:
3.1.1.1
Instauração de Processo Administrativo Disciplinar em face do Sr. José Nazareno
da Silva;
-
Irregular quanto aos seguintes aspectos:
3.1.2.1
Inexigibilidade de Licitação nº 15/07, para a contratação de advogado, no valor
de R$ 30.000,00, contrariando o disposto no art. 2º da Lei 8666/93 e art. 37,
XXI, da Constituição.
2 – DO MÉRITO
Trata-se da contratação do Escritório Bornholdt Advogados, por meio
de Inexigibilidade de Licitação, sem os requisitos legais para tanto, em
desacordo com o art. 25, II, da Lei nº 8.666/93.
Conforme os auditores da Diretoria de
Controle de Licitações e Contratações, na fl. 424:
(...) é
válido salientar que a Ação Indenizatória nº 073.06.004667-0, trata-se que uma
ação judicial comum (sic), com pedidos recorrentes em pleitos indenizatórios, e
que não exige notório conhecimento para realizar a sua defesa em juízo (sic).
Assim a referida ação poderia ter sido contestada pelos advogados que compõem a
Procuradoria Jurídica do Município.
De fato, os serviços de assessoria jurídica
constituem atividades inerentes à Administração Pública, devendo ser
desempenhados por servidores públicos, no caso, procuradores do Município; e a
contestação em ação indenizatória, ainda que com valor da causa elevado, não
constitui um objeto singular.
Sobre a contratação direta de advogados,
transcrevo trechos do Parecer nº 3636/2010, exarado no Processo nº TCE 06/00152251, da lavra da Exma. Procuradora deste
Ministério Público, Dra. Cibelly Farias:
O inc. II do art. 25 da Lei n. 8.666/93 estabelece
três requisitos para a inexigibilidade de licitação. São eles: serviço técnico
previsto no art. 13 da Lei n. 8.666/93; natureza singular do serviço técnico; e
profissional ou empresa de notória especialização, nos termos do § 1º do art.
25 da Lei n. 8.666/93.
Entretanto, para que se
proceda à referida inexigibilidade, é necessário que sejam preenchidos todos
os requisitos do referido dispositivo legal concomitantemente.
(...)
O Tribunal de Contas da
União,
‘Considerando o entendimento
manso e pacífico deste Tribunal de que é imprescindível a realização de prévio
certame licitatório para a contratação de profissionais ou empresas da área de
advocacia, exceto nas hipóteses de exigência de conhecimentos específicos;
ACORDAM os Ministros do Tribunal de
Contas da União, reunidos em Sessão Plenária, ante as razões expostas pelo
Relator, em:
[...]
8.4.2. providencie, de
imediato, as medidas necessárias para a regularização da contratação de
escritório ou profissional de advocacia, mediante prévio procedimento
licitatório, mantendo o atual contrato firmado com o escritório Prazeres
& Prazeres Advogados Associados até a assinatura do novo ajuste [grifei].’
E do relatório do Ministro
Relator, Sr. Benjamin Zymler, colho o seguinte trecho:
‘A questão da contratação de
serviços advocatícios por inexigibilidade de licitação é tema pacífico nesta
Corte de Contas, cujo entendimento é a necessidade de processo licitatório para
a contratação de serviços dessa natureza, exceto quando ficar comprovada a
notória especialização e a singularidade do objeto. Ocorre
que o termo notória especialização é comumente mal interpretado por alguns
administradores públicos, confundindo seu significado da Lei de Licitações com
seu significado popular. (...)
Como vemos não se trata apenas de o
profissional gozar de renomado conceito profissional, e sim, de seu trabalho
ser essencial e o mais adequado à administração pública. Entendemos que
serviços gerais de advocacia podem ser desenvolvidos por inúmeros profissionais
da área jurídica.’
O responsável aduz que a
contratação em análise nestes autos enquadra-se como inexigibilidade de
licitação, nos termos do art. 25, inciso II, da Lei n. 8.666/93. Entretanto,
como assinalou a instrução, é necessário que sejam preenchidos requisitos
cumulativos e indispensáveis à referida inexigibilidade, quais sejam, serviço
técnico previsto no art. 13 da Lei n. 8.666/93, natureza singular do serviço
técnico, e profissional ou empresa de notória especialização, nos termos do
art. 25, § 1º, da mesma Lei.
(...)
Já o segundo requisito, a natureza singular do
serviço técnico, refere-se à complexidade técnica da sua execução. Assim, pelo
ensinamento de Antônio Roque Citadini,
essa singularidade se consubstancia no fato do
objeto do contrato ser de natureza
pouco comum, com razoável dose de complexidade, de tal forma individualizadora,
que justifique a dispensa de todo o procedimento licitatório.
Pode-se dizer então que a caracterização do serviço
como de natureza singular se dá com o enquadramento da atividade como atuação
padrão e comum da Administração Pública. Se a atividade for rotineira, comum ou
padrão, não poderá ser caracterizada como singular e, por conseguinte, deverá
haver o procedimento licitatório.
No caso em tela, não
verifico a existência de singularidade do serviço, uma vez que o objeto do
contrato (...) refere-se a atividades típicas da Administração Municipal,
rotineiras e contínuas.
Imperioso destacar, ainda, que as atividades
analisadas não poderiam ter sido delegadas, conforme se depreende do Prejulgado
1579 dessa Corte de Contas, que estabelece que a execução das funções típicas e
permanentes da Administração deve ser atribuída a servidores de seu quadro de
pessoal, ocupantes de cargos efetivos ou por ocupantes de cargo comissionado.
(...)
Desta forma, resta desrespeitado o requisito da
classificação do serviço como singular. Uma vez que os três requisitos devem
ser verificados cumulativamente, já está caracterizada a irregularidade.
No presente caso, o responsável não foi capaz
de justificar a contratação direta, tendo em vista não ter demonstrado os requisitos
necessários para a inexigibilidade de licitação, mormente a singularidade do objeto.
Assim, a contratação é ilegítima.
No que diz respeito à responsabilidade
solidária da assessoria jurídica quanto a editais de licitação, cito Marçal
Justen Filho:[1]
(...)
poderá (deverá) punir-se o servidor público que adota interpretação contrária
ao Direito, aberrante, ou se o prolator do parecer desvirtuar os fatos
ocorridos, adotando versão não fundamentada em documentos ou outras provas.
(...) Tanto mais por ser inadmissível uma espécie de ‘responsabilização
política’ ao sujeito que desempenha função de assessoramento, sancionando-o
apenas em virtude da consumação de um resultado reputado incompatível com
valores protegidos pelo Direito. Aquele que desempenha atividade de
assessoramento jurídico ou técnico sujeita-se ao regime jurídico genérico: a
responsabilização civil, penal ou administrativa dependendo da culpabilidade.
Enfim, é essencial preservar a autonomia da função de assessoramento jurídico.
O autor citado traz a baila decisão do STF
proferida pelo Ministro Carlos Velloso, no Mandado de Segurança nº 24.073-3/DF,
sobre o assunto:[2]
Advogado de
empresa estatal que, chamado a opinar, oferece parecer sugerindo contratação
direta, sem licitação, mediante interpretação da lei de licitações. Pretensão
do Tribunal de Contas da União de responsabilizar o advogado solidariamente com
o administrador que decidiu pela contratação direta: impossibilidade, dado que
o parecer não é ato administrativo, sendo, quando, muito, ato de administração
consultiva, que visa a informar, elucidar, sugerir providências administrativas
a serem estabelecidas nos atos de administração ativa. O advogado somente será
civilmente responsável pelos danos causados a seus clientes ou a terceiros, se
decorrentes de erro grave, inescusável, ou de ato ou omissão praticado com
culpa, em sentido largo (...).
Mediante Parecer Jurídico de fls. 12/16, o
Procurador do Município opinou pela possibilidade de contratação por meio de
inexigibilidade de licitação.
A posição defendida no Parecer, ainda que
contrária ao Direito, não é aberrante ou esdrúxula.
Há que se considerar que o parecer jurídico é
ato opinativo, e não ato administrativo decisório; e que a responsabilização do
advogado se dá nas esferas civil, penal e administrativa, conforme os ilícitos
previstos na legislação própria.
Ademais, o art. 38, parágrafo único, da Lei
nº 8.666/93 traz previsão de prévio exame e aprovação pelo assessor jurídico da
administração dos documentos relativos a licitações, e não de sanções no caso
de resultado incompatível com o Direito.
Por fim, ressalto a existência de
controvérsia jurídica acerca da possibilidade da imposição de sanção pelos
Tribunais de Contas aos pareceristas jurídicos, por atos decorrentes de suas opiniões.
Assim sendo, manifesto-me pela
responsabilização apenas do Diretor-Presidente do SAMAE, titular do poder de
decidir na Unidade Gestora.
Quanto à instauração de processo administrativo
disciplinar contra o Sr. José Nazareno da Silva, tendo em vista condenação
criminal pela prática de crime contra a administração ambiental no ano de 1998,
verifico que a matéria foi objeto de diligência por esse Tribunal, e não de
audiência do responsável.
Conforme informam os auditores desse
Tribunal, restou consumada a prescrição para a penalização administrativa do
Sr. José Nazareno da Silva, com base nos arts. 109 e 110 do Código Penal c/c
art. 133 da Lei Complementar Municipal nº 1/93.
Dessa forma, restaria analisar a questão da
inércia na instauração do processo administrativo.
Porém, como antes mencionado, a matéria não
foi objeto de audiência, o que inviabiliza aplicação de sanção, no tópico.
Dessarte,
ratifico em parte os termos do Relatório nº 227/2009 da Diretoria
de Controle de Licitações e Contratações, dissentindo para propor a sanção
apenas do Sr. José Nazareno da Silva, ex-Diretor
Presidente do SAMAE, pela irregularidade referente à Inexigibilidade de
Licitação.
3 – DA CONCLUSÃO
Ante o exposto, o Ministério Público junto ao
Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, II, da
Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se pela adoção das seguintes
providências:
- DECISÃO de IRREGULARIDADE do ato descrito no item 3.1.2.1 da conclusão do Relatório nº 227/2009 da Diretoria de Controle de Licitações e Contratações;
- APLICAÇÃO de MULTA prevista no
artigo 70, II, da Lei Complementar nº 202/2000 ao responsável, Sr. José
Nazareno da Silva, ex-Diretor
Presidente do SAMAE.
Florianópolis, 16 de agosto de 2010.
Procurador mb