Parecer
no:
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MPTC/7.407/2010
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Processo
nº:
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PCP 10/00068924
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Origem:
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Município
de São Ludgero – SC
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Assunto:
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Prestação de Contas
realizada pelo Prefeito,
referente ao exercício
financeiro de 2009.
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Trata-se de Prestação
de Contas efetuada pelo
Chefe do Poder Executivo do Município
em epígrafe,
consoante regra
da Constituição Estadual, art. 113, §
1º.
Foram juntados os documentos relativos
à prestação de contas
em comento nas fls. 02-483.
A Diretoria
de Controle dos Municípios
apresentou o Relatório Técnico de fls. 485-555, consignando remanescentes as seguintes
irregularidades:
A
– Restrições de ordem
legal:
A.1.
Utilização dos recursos do FUNDEB do exercício anterior, no montante de R$
274.541,01, após o primeiro trimestre de 2009, caracterizando afronta ao art.
21, § 2º, da Lei nº 11.494/2007;
A.2.
Registro indevido do grupo de destinação de recursos, sendo que despesas
custeadas com superávit financeiro do exercício anterior do FUNDEB, não foram
classificados no grupo que identificam recursos de exercícios anteriores,
caracterizando afronta aos artigos 3º e 4º, da Lei Complementar nº 202/2000 c/c
a Instrução Normativa nº TC 04/2004 e a Portaria Conjunta nº 3, de 14 de
outubro de 2008;
A.3.
Despesas com pessoal do PODER EXECUTIVO no valor de R$ 8.963.388,29,
representando 54,88% da Receita Corrente Líquida (R$ 16.333.494,20), quando o
percentual legal máximo de 54,00% representaria gastos da ordem de R$
8.820.086,87, configurando, portanto, excesso de gastos com pessoal no valor de
R$ 143.301,42 ou 0,88%, em descumprimento ao artigo 20, III, ‘b’ da Lei
Complementar nº 101/2000, ressalvado o disposto no artigo 23 da citada Lei;
A.4.
Divergência, no valor de R$ 106.251,97, entre os créditos autorizados
informados no Balanço Orçamentário – Anexo 12 (R$ 24.160.651,97) e o apurado
via Sistema e-Sfinge, conforme Decretos de alteração orçamentária (R$
24.054.400,00), caracterizando afronta aos artigos 75, 90 e 91 da Lei nº
4.320/64.
O Ministério
Público de Contas,
por meio
de seu parecer
de fls. 557-560 requereu a citação do
Gestor responsável em
razão de:
1.1)
gastos com pessoal do Poder Executivo no exercício em exame ficaram acima do
limite máximo de 54% da Receita Corrente Líquida – RCL, contrariando o comando
do art. 20, III, “b” da Lei Complementar 101/2000;
1.2)
inobservância da obrigação de utilizar no primeiro trimestre os recursos do
FUNDEB que deixaram de ser aplicados no exercício anterior (no máximo 5%)
mediante abertura de crédito adicional (artigo 21, § 2º, da Lei nº
11.494/2007).
O pedido
de citação foi indeferido pelo
Eminente relator
(fls.561).
Este o relatório.
A fiscalização contábil, financeira, orçamentária,
operacional e patrimonial
da entidade em
questão está inserida entre
as atribuições dessa Corte
de Contas, consoante
os dispositivos constitucionais,
legais e normativos vigentes (art. 31, §
1º e art. 71 c/c art. 75 da Constituição
Federal, art. 113 da Constituição Estadual, arts. 50 a 54 da Lei Complementar Estadual
nº. 202/2000; arts. 20 a
26 da Resolução TC nº. 16/1994 e arts. 82 a 94 da Resolução TC nº. 6/2001).
A análise destes autos revela que
o Relatório DMU não
atendeu aos requisitos da Lei Complementar nº
202/2000 ao deixar de conter
as informações previstas no art. 53, parágrafo único, inciso III, relacionadas ao reflexo
da administração financeira
e orçamentária municipal no desenvolvimento econômico
e social do Município.
Informação relevante ainda, inexplicavelmente suprimida da maior parte dos
relatórios produzidos pela DMU, é aquela relacionada às contratações
terceirizadas para atividades
públicas de natureza permanente.
Sobre os grandes
números da administração,
cuja análise
conforma, por definição
constitucional, as chamadas
contas anuais
apresentadas pelo Sr. Prefeito
Municipal, objeto do parecer
prévio a ser exarado
pela Corte e
de futuro julgamento
pelo Poder Legislativo, foram apurados pela
Diretoria de Controle
da Administração Municipal - DMU:
Da gestão financeiro-orçamentária
1. O confronto
entre a receita
arrecada e a despesa realizada resultou no superávit
de execução orçamentária
da ordem de R$ 633.857,83,
correspondendo a 3,70% da receita
arrecadada;
2. O resultado
financeiro do exercício
apresentou-se superavitário, atendendo, portando, aos ditames
legais aplicáveis;
Das aplicações mínimas em educação
3. O disposto
no art. 212 da Constituição Federal, referente
à aplicação mínima
de 25% das receitas resultantes
de impostos em
manutenção e desenvolvimento
do ensino revelou-se cumprido;
4. Foram aplicados, pelo
menos, 95% dos recursos
oriundos do FUNDEB em
despesas com
manutenção e desenvolvimento
da educação básica,
conforme exige o art. 60 do ADCT c/c
art. 21 da Lei nº 11.494/2007;
5. A obrigação
de utilizar no primeiro trimestre os recursos
do FUNDEB que deixaram de ser
aplicados no exercício anterior (no máximo
5%) mediante abertura
de crédito adicional
(artigo 21, § 2º, da Lei nº 11.494/2007) não foi
observada.
6. Restou atendido o art. 60, inciso XII, do Ato
das Disposições Constitucionais
Transitórias, e o art. 22 da Lei nº
11.494/2007, que preconizam seja
aplicado pelo menos
60% dos recursos recebidos do FUNDEB na remuneração dos profissionais
do magistério do ensino
fundamental.
O ilícito evidenciado por estes autos relacionado às obrigações com a
educação explica, certamente, por que ainda, conforme pesquisa publicada
recentemente, o Brasil em matéria de educação encontra-se no mesmo nível de
países como o Zimbábue:
Brasil avança no IDH, mas tem a média do
Zimbábue na educação
O país precisa quase dobrar o tempo de
permanência da população dentro das salas de aula. Os brasileiros estudam, em
média, apenas 7 anos. O ideal, sugerido pela ONU, é elevar a escolaridade para
13 anos.
O
Brasil avançou, subiu quatro pontos no Índice de Desenvolvimento Humano, que
mede a qualidade de vida da ONU. Mas, na educação, o nosso número ainda é de
dar vergonha. O Brasil tem hoje a mesma média que o Zimbábue, o país com o pior
desempenho do mundo.
Das aplicações mínimas em saúde
7. No capítulo
das despesas com
saúde, constata-se que
foram aplicados em ações
e serviços públicos
de saúde valores
correspondentes ao percentual
mínimo do produto
de impostos, conforme
exige o art. 198 da Constituição Federal c/c o art. 77, inciso
III e § 1º, do ADCT.
Dos limites para gastos
com pessoal
8. Os gastos
com pessoal
do Município no exercício
ficaram abaixo do limite
de 60% da Receita Corrente
Líquida, conforme
o exigido pelo art. 169 da Constituição
Federal e pela
Lei Complementar
101/2000, em seu
art. 19;
9. Os gastos
com pessoal
do Poder Executivo
no exercício em
exame ficaram acima
do limite máximo
de 54% da Receita Corrente
Líquida - RCL, conforme
exigido pelo art. 20, III, “b” da Lei Complementar 101/2000.
A constatação é grave consoante dispõe a Decisão
Normativa nº 06/2008, e pode ensejar a emissão de Parecer Prévio com recomendação de rejeição das contas
prestadas pelo Prefeito:
Art. 9º As restrições que podem ensejar a emissão de Parecer Prévio com recomendação de rejeição das contas
prestadas pelo Prefeito,
dentre outras, compõem o Anexo I, integrante
desta Decisão Normativa, em especial as seguintes:
(...)
XIV – GESTÃO FISCAL (DESPESA TOTAL COM PESSOAL DO PODER EXECUTIVO) - Despesas
com pessoal
do Poder Executivo
acima do limite
fixado no art. 20, III, "b", da Lei
Complementar (federal)
n. 101/2000, sem a eliminação
do percentual excedente
nos dois quadrimestres seguintes,
em desacordo
com o art. 23 da Lei
Complementar (federal)
nº 101/2000.
O E. Relator indeferiu requerimento
deste Ministério Público no sentido de promover a citação do Gestor
responsável.
Em tempo,
a análise deste ponto
de controle por
parte da DMU, quando
constatada a afronta à norma
legal, deveria vir
acompanhada, sempre, de informações sobre
o comportamento das referidas despesas nos dois quadrimestres do
exercício seguinte
àquele que
constitui o objeto destes autos, ou seja,
o presente ano.
Para este fim a Corte recebe uma exuberante quantidade de dados pelo sistema E-Sfinge, que
permitiria tal exame.
O Tribunal de Contas de Santa
Catarina, contudo, mesmo havendo tempo hábil para a apuração do ilícito, tem
preferido aferir o cumprimento da obrigação de reduzir apenas por ocasião do
exame das contas do exercício seguinte àquele em que se verifica o
descumprimento do limite de gastos com pessoal.
Trata-se de sistemática equivocada que merece ser revista, sob pena de
inviabilizar a apuração do ponto de controle estabelecido pelo art. 9º, XIV.
As despesas realizadas além do percentual autorizado pela Lei
de Responsabilidade Fiscal pertencem ao exercício de 2009. São despesas ilícitas, portanto,
que deveriam ter sido diminuídas até o mês de agosto do exercício de 2010. Caso
isto ocorresse perderiam o caráter ilícito, ante as providências adotadas.
Ao examinar essas providências no
sentido da redução das despesas com pessoal em 2010, o que ocorrerá, normalmente,
apenas no segundo semestre de 2011, além do risco de agravamento da situação
fática, a Corte incidirá no exame de condutas ocorridas fora do exercício de
2010 (ocorridas em 2009), o que tornará este exame ilícito naquela
oportunidade.
Ilícitos pertencentes ao exercício
anterior não podem macular as contas do ano seguinte.
Não se pode perder de vista que a
tipologia proposta pelo art. 9º, inciso XIV da Decisão Normativa atribui o
caráter ilícito da conduta em razão da realização
da despesa acima do percentual máximo. Ao assim tipificar o ilícito,
estabelece vínculo necessário com o exercício em que ocorreu o descumprimento
da regra imposta pelo art. 23 da Lei Complementar nº 101/2000. A eventual
omissão na adoção das providências para redução daquelas despesas apenas
confirma o caráter ilícito da despesa dentro do exercício em que foram
realizadas.
10. O limite
de gastos com
pessoal do Poder
Legislativo previsto
no art. 20, III, “a” da Lei de Responsabilidade Fiscal,
situado no percentual de 6% da RCL, foi
observado nas despesas próprias da Câmara Municipal do Município
em epígrafe;
11. A remuneração
máxima do Vereador
em relação
ao Deputado Estadual,
de que cuida o art. 29, VI da Constituição mostrou-se cumprida;
12. O limite
de 5% da receita do Município
aplicado ao total da remuneração dos Vereadores
revelou-se atendido;
13. A despesa
relacionada à folha de pagamento
da Câmara (incluindo o subsídio
dos Vereadores) situou-se dentro do limite máximo de 70% admitido pelo
art. 29-A, § 1º da Carta Federal;
14. O limite de gastos preconizado
nos incisos do art. 29-A da Carta Federal
foi respeitado.
15. Por
fim, o limite
máximo de transferências
de receitas tributárias, previsto
pela Constituição,
destinadas à manutenção do Poder Legislativo (exceto, dos seus
inativados), foi corretamente observado.
Do controle interno
Quanto à remessa bimestral
dos Relatórios de Controle
Interno, constata-se que foram observadas as disposições
regulamentares.
Analisando os dados
apresentados nestes autos, em confronto com o disposto
na Decisão Normativa nº. TC 06/2008, em
razão da negativa de citação patrocinada pelo E. Relator, tem-se que dentre as impropriedades apontadas não houve meios de confirmar
as ilegalidades consideradas gravíssimas que se anunciam, e que justificariam o
posicionamento opinativo
da Corte no sentido
da rejeição das contas apresentadas.
Deverá constar do Parecer
Prévio ainda
a determinação para
a oportuna apreciação em sede da competência para julgamento de atos, privativa da Corte (PROCESSO APARTADO):
1) das despesas
com pessoal
do poder executivo
acima do percentual
legal máximo
de 54%, em descumprimento ao artigo 20, III, ‘b’ da Lei
Complementar nº 101/2000;
2) das responsabilidades
pela omissão quanto à obrigação de utilizar no primeiro trimestre os recursos
do FUNDEB que deixaram de ser
aplicados no exercício anterior (no máximo
5%) mediante abertura
de crédito adicional
(artigo 21, § 2º, da Lei nº 11.494/2007) - (item
A.1 do Relatório nº. 2.298/2010).
Considerações gerais sobre a instauração de processos
apartados
Os chamados “processos
apartados” oportunizam a concretização do princípio
da indisponibilidade do interesse público. Por estes processos
a Corte investigará aquilo
que não
pode ser investigado no processo
de contas por
não representar
matéria passível
de exame em sede de contas,
ou por
não possuir conteúdo suficiente
para macular o conjunto das contas
anuais, não
obstante revele indícios
de práticas ilícitas.
Observado sob
a óptica interna
dos processos de contas,
o ditos “apartados” são
também a concretização, em alguma medida,
do princípio da proporcionalidade, pois não seria sustentável que
todo o conjunto
de atos que
conformam a gestão financeira,
orçamentária e patrimonial
de todo um
ano, e que
são apreciados nesses processos, fosse comprometida pela
prática de atos
isolados, mesmo que
ilegais. Estes
atos deverão ser
apreciados isoladamente em outro processo – o chamado
“processo apartado”.
Não é, contudo,
facultativa esta apreciação desses atos isolados. Se a matéria
está entre as atribuições
do Tribunal de Contas
ela deverá ser
apreciada em sede
da competência para
julgar conferida às cortes
de contas.
O manejo
de argumentos relacionados à falta de estrutura
para o exercício
do múnus constitucional, como comumente tem ocorrido, também
reclama maior cautela.
O Tribunal
de Contas de Santa
Catarina está, por certo,
entre os órgãos
melhor aparelhados do Estado e, porque
não dizer, da
Federação, para
o exercício de suas
obrigações. Nos
últimos anos
realizou diversos concursos
públicos que
culminaram com a nomeação de um invejável quadro de altíssima qualidade
técnica. Não
lhe faltam também
recursos de informática
ou de qualquer
sorte. Trata-se, pois,
de um dos mais
afortunados órgãos
de controle do Brasil e que possui os meios
para o exercício
pleno de todas as suas
atribuições. Poderiam ser
melhores e maiores
os recursos a serem disponibilizados para os tribunais de contas? Sempre
poderiam!
Também o manejo
do princípio da razoabilidade, como sustentam alguns
(normalmente sem
demonstrar a aplicação
do princípio...), para
afastar a atuação
da Corte, não
pode ocorrer sem
a demonstração clara
dos subprincípios da necessidade,
da adequação e da proporcionalidade
stricto sensu dessa não-atuação do Tribunal
de Contas.
Em razão
do exposto, o Ministério
Público junto
ao Tribunal de Contas
entende que as contas apresentadas pelo Município cuja prestação ora se examina apresentam indícios da inadequação da gestão contábil, financeira,
orçamentária e patrimonial
da entidade, que, contudo, em razão do indeferimento
do requerimento de citação deste Ministério Público, não puderam ser aferidos
conclusivamente, consoante as regras do devido processo legal, que impunham
fosse oportunizado o contraditório e da ampla defesa do Gestor responsável.
Assim, com amparo
na competência conferida pelo
art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar 202/2000,
manifesta-se:
1) pela
emissão de parecer
recomendando à Câmara Municipal a aprovação das contas
do Município de São Ludgero, relativas
ao exercício de 2009;
2) pela
determinação à Diretoria
de Controle dos Municípios
para que:
2.1) instaure o procedimento adequado
à verificação (PROCESSO
APARTADO):
2.1.1) das despesas
com pessoal
do poder executivo
acima do percentual
legal máximo
de 54%, em descumprimento ao artigo 20, III, ‘b’ da Lei
Complementar nº 101/2000;
2.1.2) das responsabilidades
pela omissão quanto à obrigação de utilizar no primeiro trimestre os recursos
do FUNDEB que deixaram de ser
aplicados no exercício anterior (no máximo
5%) mediante abertura
de crédito adicional
(artigo 21, § 2º, da Lei nº 11.494/2007) - (item
A.1 do Relatório nº. 2.298/2010);
2.2) acompanhe o cumprimento
da Decisão a ser
exarada pela Corte
e a eventual tipificação de
reincidências no exame que
processará do exercício seguinte;
3) pela
ciência ao Chefe do
Poder Executivo
nos termos
do propugnado pela Instrução
Técnica, estendendo-se o conhecimento da Decisão
da Corte ao Poder
Legislativo;
4) pela
solicitação de comunicação
do resultado do julgamento
e ressalvas propugnados pela Instrução.
Florianópolis, 02 de dezembro de
2010.
Diogo Roberto Ringenberg
Procurador do Ministério
Público de Contas