PARECER nº: |
MPTC/2039/2011 |
PROCESSO nº: |
REC
09/00518820 |
ORIGEM: |
Prefeitura
Municipal de Joinville |
INTERESSADO: |
Marco
Antonio Tebaldi |
ASSUNTO: |
Referente
ao Processo -DIL-06/00449505 |
RELATÓRIO
Versam os autos sobre Recurso de Reexame, previsto no art. 80 da Lei
Complementar n.º202/2000, proposto pelo Sr. Marco Antonio Tebaldi, ex-prefeito
do município de Joinville, visando à reforma do Acórdão n. 1002/2009, proferido
no Processo n. DIL – 06/00449505, para que sejam afastadas as sansões pecuniárias
aplicadas ou, subsidiariamente, minoradas.
O Acórdão, em síntese, dispôs:
6.1. Conhecer do
Relatório de Instrução que trata da análise da Inexigibilidade de Licitação n.
073/2006 e do Contrato n. 195/2006, formalizados pela Prefeitura
Municipal de Joinville, para considerar irregulares, com fundamento no
art. 36, § 2º, "a", da Lei Complementar n. 202/00, os atos
examinados.
6.2. Aplicar ao Sr.
Marco Antônio Tebaldi - ex-Prefeito Municipal de Joinville, CPF n.
256.712.350-49, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000
c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, as multas abaixo relacionadas,
fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão
no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovar ao Tribunal
o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde
logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o
disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:
6.2.1.R$ 500,00 (quinhentos reais),
em face da contratação da empresa Tekoha Engenharia e Consultoria Ltda. sem a
realização de devido processo licitatório, valendo-se do inciso II do art. 25 e
do art. 13 da Lei (federal) n. 8.666/93, sendo constatada ausência de
caracterização da inexigibilidade de licitação, em desacordo com os arts. 37,
XXI, da Constituição Federal e 2º e 3º da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 2.2.1
do Relatório DLC);
6.2.2.R$ 500,00 (quinhentos reais),
em função da outorga indevida de atribuições estatais à entidade privada, em
desacordo com os princípios constitucionais da legalidade, moralidade e
impessoalidade previstos no caput e no inciso XXII do art. 37 da
Constituição Federal (item 2.2.1 do Relatório DLC).
Os auditores da Consultoria Geral sugeriram, por meio do Relatório
23/2011 (fls. 11/24), conhecer do recurso e negar-lhe provimento, ratificando
na íntegra a decisão recorrida.
ADMISSIBILIDADE
Em primeiro plano, verifica-se que o presente Recurso de Reexame é
próprio, tempestivo e foi interposto uma só vez, por parte legítima para tanto,
conforme prescrevem os arts. 79 e 80 da Lei Complementar n. 202/2000.
Logo, o recurso merece ser conhecido.
MÉRITO
O responsável aduz que a contratação direta da empresa Tekoha
Engenharia e Consultoria Ltda. foi realizada com o devido respaldo legal,
observando-se todos os requisitos do art. 25, II, e art. 13 da Lei Federal n.
8.666/93, que ensejam a inexigibilidade de licitação.
Relata que a escolha
da empresa foi motivada pelos seguintes argumentos: a) capacidade técnica da empresa; b) seu conhecimento singular sobre o
município; c) necessidade de se dar continuidade aos serviços, que já vinham
sendo por ela prestados, de forma satisfatória; e d) elevado grau de confiança
existente entre as partes contratantes.
Por essa razão, sustenta que estaria caracterizada exceção à
obrigatoriedade de licitar, sem que houvesse afronta ao art. 37, XXI, da Constituição Federal e arts. 2º
e 3º da Lei n.º8.666/93.
As alegações do
responsável não merecem prosperar.
Inicialmente, cumpre
destacar que o Contrato n. 195/2006, oriundo da Inexigibilidade n. 073/2006,
visou à “assessoria especializada nas áreas de
gestão cadastral; tributária; modelagem, normalização e regulamentação de
dados; gerenciamento de serviços; desenvolvimento, implantação e manutenção de
sistemas de aplicativos, com foco no atendimento ao cidadão a estruturação do
cadastro técnico multifinalitário de Joinville – CTM; operacionalização de
carteira de cobrança; treinamento e reciclagem pessoal; planejamento e emissão
de tributos e atendimento a contribuintes.”
As atividades da
contratação encontram-se descritas no item 7.1 do Contrato (fls. 20/21 do
Processo DIL 06/00449505) e detalhadas no Termo de Referência (fls.228/249
daquele processo).
Com efeito, no que
concerne à contratação direta com suporte no art. 25, II, da Lei n. 8.666/93,
exige-se que se reúnam simultaneamente os seguintes requisitos: inviabilidade
de competição; que se trate de serviço técnico especializado, assim aqueles
relacionados no art. 13 da mesma norma; que o objeto seja de natureza singular;
e que o contrato seja firmado com profissional ou empresa de notória
especialização.
Vale trazer à
colação o seguinte excerto da Decisão n. 427/1999 do TCU:
"8.2. firma-se o entendimento de que a
inexigibilidade de licitação prevista no inciso II do artigo 25 da Lei n.º
8.666/93 sujeita-se à fundamentada demonstração de que a singularidade do
objeto - ante as características peculiares das necessidades da Administração,
aliadas ao caráter técnico profissional especializado dos serviços e à condição
de notória especialização do prestador, inviabiliza a competição, não sendo
possível a contratação direta por inexigibilidade de licitação sem a
observância do caput do art. 25 da Lei n.º 8.666/93” (Acórdão 1858/2004 –
Plenário – TCU).
Ocorre que o objeto do contrato em exame não possui característica
singular, o que por si só, torna a contratação irregular.
Segundo a Súmula 39 do TCU, a dispensa de licitação para a contratação
de serviços com profissionais ou firmas de notória especialização só tem lugar
quando se trate de serviço inédito ou
incomum, capaz de exigir, na seleção do executor de confiança, um grau de
subjetividade, insuscetível de ser medido pelos critérios objetivos de
qualificação inerentes ao processo de licitação.
Marçal Justen Filho aborda que o conceito de singularidade do objeto
está atrelada a uma “situação anômala, incomum, impossível de ser enfrentada
satisfatoriamente por todo e qualquer profissional ‘especializado’.
E continua:
“A fórmula ‘natureza
singular’ destina-se a evitar a generalização da contratação direta para todos
os casos enquadráveis no art. 13. É imperioso verificar se a atividade
necessária à satisfação do interesse público é complexa ou simples, se pode ser
reputada como atuação padrão comum, ou não.” (in Comentários á Lei de
Licitações e Contratos Administrativos, 10ª Edição, Ed. Dialética. P. 279).
Ausente objeto de natureza singular, não há de se falar em
inviabilidade de competição, que por ser requisito essencial do art. 25 da Lei
n. 8.666, torna o contrato irregular.
Assim
dispôs o Acórdão 5504/2010, da Primeira Câmara do TCU:
“a singularidade do
objeto a ser contratado constitui-se uma das condições essenciais para a
contratação por inexigibilidade de licitação, porquanto um dos requisitos
indispensáveis da inviabilidade de competição. Havendo, pois, viabilidade de
competição não poderá haver contratação por inexigibilidade de licitação, sob
pena de se incorrer em violação ao principio fundamental da licitação para a
contratação de obras e serviços ou aquisição de bem com recursos públicos.”
Ao que se observa, o
objeto do contrato em exame não se reveste de excepcionalidade que exija uma
especial distinção na área, e obste outras empresas de participem do certame.
É o que se conclui,
por exemplo, dos serviços de treinamento de pessoal e de elaboração de manuais
de procedimentos.
Quanto às alegações
do responsável de se dar continuidade aos serviços que já vinham sendo
prestados pela mesma empresa, e que essa possuía conhecimento singular sobre as
questões do município, não podem ser consideradas como fatores inviabilizadores
da competitividade do certame.
Ademais, o
impedimento da solução de continuidade na prestação dos serviços depende
exclusivamente de abertura planejada de processo licitatório e das devidas
prorrogações dos contratos, obedecidas às formalidades legais. Dessa forma,
estaria assegurada a escolha da proposta mais vantajosa e a permanência dos
serviços necessários.
O responsável justifica a contratação, ainda, em razão do grau de
confiança existente entre a contratante e a contratada.
Todavia, não é plausível que esse fator seja empregado como causa esparsa
para a escolha da empresa, sem que haja a presença do serviço singular, de
especial complexidade.
Da mesma forma a declaração de capacidade técnica da empresa não deve
ser considerada. Isso porque a sua aferição está diretamente ligada ao serviço
que se pretende contratar. Logo, a capacidade técnica só poderá ser cogitada
quando incontestável a singularidade do objeto.
Assim, os requisitos da exceção à regra de licitar não foram
respeitados, estando em desacordo com o art. 37, XXI e 2º e 3º da 8.666/93.
Não obstante isso, o contrato em destaque previu indevida outorga à
iniciativa privada de atividades essenciais, relativas ao poder de polícia e
inerentes à administração tributária do município, típicas da Administração
Pública.
O responsável alberga sua tese de defesa aduzindo que, efetivamente,
não houve a outorga de atribuições estatais à contratada, mas apenas uma
imprecisão vocabular na descrição dos termos do contrato, que permitem uma
falsa dedução de que teria ocorrido. E que a empresa “operava apenas no plano
operacional, nas atividades meio, instrumentais ou acessórias.”
Em que pese as justificativas apresentadas, o Corpo Técnico considerou
irregulares as seguintes atividades outorgadas:
a)
Atualização e base de cálculo com a implantação
do modelo de avaliação e cobrança do ITBI;
b) Planejar
e gerenciar a operação de lançamento de carnês referentes ao IPTU e ISS/TLL;
c)
Gestão da COSIP, mediante o lançamento mensal e
procedimentos para integração do cadastro imobiliário;
d) Manutenção
de sistemas de computadores afetos à Cobrança Ativa, execução da fiscalização,
ISS homologado etc.;
e)
Gerenciamento da Cobrança Ativa, mediante a
formatação e acompanhamento das carteiras, suporte ao atendimento receptivo ao
cidadão.
Deveras, como se depreende dos documentos relativos à contratação, em
especial, seu termo de referência, o objeto do contrato previu a delegação de
atividades essenciais do poder de polícia, relativas à administração tributária
de competência privativa de servidores de carreira, em flagrante desrespeito ao art. 37, XXII da
Constituição Federal.
Portanto correto o entendimento do Corpo Técnico ao concluir pela
manutenção da decisão recorrida que aplicou multa ao responsável.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com
amparo na competência conferida pelo art. 108 da Lei Complementar nº 202/2000,
após apreciar os argumentos em tela, consignados pelo Sr. Marco Antonio
Tebaldi, conclui que não possuem o condão de elidir as irregularidades
verificadas nos itens 6.2.1 e 6.2.2 do Acórdão n. 1002/2009, razão pela qual
opino pelo conhecimento do Recurso de Reexame, para no mérito negar-lhe provimento, mantendo-se na
íntegra a decisão recorrida.
Florianópolis,
01 de junho de 2011.
Procurador-Geral do Ministério Público
Junto ao Tribunal de Contas
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