PARECER
nº: |
MPTC/2941/2011 |
PROCESSO
nº: |
SPE 07/00405089 |
ORIGEM: |
Departamento Estadual de Infraestrutura - DEINFRA |
INTERESSADO: |
Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina -
IPREV |
ASSUNTO: |
- Aposentadoria de ANTEVIR BRESSAN |
1. RELATÓRIO
Cuida-se de
requerimento de registro de ato de concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição, com proventos integrais, de Antevir Bressan, ocupante do cargo de
Analista Técnico em Gestão de Infraestrutura, lotado no Departamento Estadual
de Infraestrutura - DEINFRA, fundamentada nos termos do art. 6º da Emenda
Constitucional n.º 41/2003.
A Diretoria de
Controle de Atos de Pessoal, através do Relatório n.º5817/2010, observou que o
requerente cumpriu os requisitos constitucionais garantidores do benefício da
aposentadoria.
No entanto, constatou
haver irregularidades no enquadramento do servidor no cargo em que se deu o ato
aposentatório, tendentes a obstar o registro da concessão do ato por esse e.
Tribunal.
Assim, entendeu não
ser legal o enquadramento, feito no ano de 2006, por intermédio da Lei Estadual
Complementar n.º 330, que estabeleceu estrutura de carreira no Departamento
Estadual de Infraestrutura – DEINFRA, haja vista que essa lei instituiu,
através do art. 4º, cargo único para todos os seus servidores, confundindo as
competências específicas a eles inerentes.
Ainda, anotou o Corpo Técnico que com o
advento da citada lei o servidor migrou para o cargo de Analista Técnico em
Gestão de Infraestrutura, restando configurado provimento derivado de cargo.
Ante essas
observações, asseverou a inconstitucionalidade da Lei Complementar n.º 330/2006
e concluiu, em sede preliminar, pela irregularidade no enquadramento do
servidor no cargo único em razão de “agrupar funções que indicam graus
extremamente desiguais de responsabilidade e complexidade de atuação, já que
essa situação agride o disposto no §1º, incisos I, II e III, do art. 39, da
Constituição Federal”.
Instado a se manifestar, o IPREV alberga sua tese
de defesa expondo que a alteração promovida pela LC 330/06 é verificada tão
somente do ponto de vista formal, uma vez que foi criada uma nomenclatura única
para o cargo em sentido amplo, entretanto sendo possível diferenciar as
diversas competências existentes, que, por sua vez respeitam as linhas de
correlação e mantêm a identidade dos antigos cargos.
Em que pese as
justificativas apresentadas, o Corpo Técnico, em sede de reinstrução, entendeu
que as incorreções levantadas não foram sanadas.
E ainda, afirmou que a
Lei Complementar n. 330/2006 possibilitou a irregular transposição de cargos,
especificamente através dos arts. 15 e 16, que tratam da progressão por nível
de formação. Reforça a premissa citando a ADI 3966/2007, em andamento no
Supremo Tribunal Federal, proposta pelo Procurador-Geral da República, cujo
objeto é o questionamento desses preceitos.
Ressaltou que se
referida ADI for julgada procedente poderá a Corte Suprema entender que os
dispositivos ali declarados inconstitucionais têm relação de dependência com a
unicidade de cargo, prevista no art. 4º da mesma lei. E sob a égide da teoria
do arrastamento, também declará-lo inconstitucional.
Assim, ao final,
opinou a DAP pela denegação do registro do ato de concessão de aposentadoria,
nos termos do art. 36, §2º, “b”, da Lei Complementar (Estadual) n.º202/2000, em
razão da irregularidade no enquadramento do servidor em cargo único,
ressalvando a prejudicialidade do art. 41, caput, do Regimento Interno, haja
vista que o servidor cumpriu os requisitos ensejadores do benefício, muito
embora a alteração na denominação do cargo levou à conclusão pela denegação do
registro.
2. DO MÉRITO
Após análise minuciosa
dos autos, este Órgão Ministerial, no propósito de auxiliar a Corte de Contas
no julgamento da matéria em debate, destaca-se o que segue abaixo:
2.1 DOS EFEITOS DECORRENTES DO POSSÍVEL PRONUNCIAMENTO DE
INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI N.º330/2006
Denota-se que o cerne da questão
versa sobre a inconstitucionalidade da Lei Complementar n.º330/2006, defendida
pelo Corpo Técnico, que estaria por impedir o registro do ato de concessão da
aposentadoria. Os preceitos atacados dizem respeito ao enquadramento do
servidor no cargo de Analista Técnico em Gestão de
Infraestrutura.
É sabido que se
diferenciam os dois sistemas de controle de constitucionalidade - concentrado e
difuso – pelo efeito de suas decisões, sendo que o controle difuso comporta o
efeito ex tunc, isto é, quando a
declaração da inconstitucionalidade da norma retroage desde o seu nascimento. O
controle concentrado, da mesma forma, aceita o efeito ex tunc, porém, além disso, pode o STF dar à decisão efeitos
prospectivos, ou seja, para o futuro – denominado ex nunc.
No que concerne ao efeito EX
TUNC tem-se, como visto, a retroatividade da norma à sua época de
origem. Ademais, partindo-se do princípio da nulidade da norma declarada
inconstitucional, verifica-se o fenômeno denominado efeito repristinatório,
através do qual a eficácia da legislação anterior ao caso existente é
restaurada, restabelecendo o status quo ante.
Noutro dizer, a norma declarada
inconstitucional não é capaz de tornar sem efeito eficazmente a lei que a
antecedeu, uma vez que nasceu nula.
Nas palavras do Ministro Celso de
Mello:
"A declaração de
inconstitucionalidade em tese encerra um juízo de exclusão, que, fundado numa
competência de rejeição deferida ao Supremo Tribunal Federal, consiste em
remover do ordenamento positivo a manifestação estatal inválida e desconforme
ao modelo plasmado na Carta Política, com todas as consequências daí
decorrentes, inclusive a plena restauração de eficácia das leis e das
normas afetadas pelo ato declarado inconstitucional" (STF -
Pleno, Ac. un. ADIn 652-5-MA - Questão
de Ordem - Rel. Min. Celso de Mello, DJU de 02.04.93, p. 5.615).
Aplicando-se essa teoria ao caso em exame, ou
seja, retroagindo-se o efeito à lei precedente e restabelecendo-se a eficácia
da norma afetada pelo ato declarado inconstitucional, torna-se incontroverso o
direito do Requerente, devendo contabilizar-se, para fins de registro, o tempo
laborado sob a égide da norma que venha a ser declarada inconstitucional.
De outro vértice,
partindo-se da proposição da declaração da inconstitucionalidade, com efeito EX
NUNC, ressalte-se que por razões de segurança jurídica ou de
excepcional interesse social poderá o Supremo Tribunal Federal em suas decisões
definitivas atribuí-las efeitos futuros.
Trata-se de
interpretação excepcional, cuja finalidade é evitar a ocorrência de maiores
danos sociais com a retroatividade da declaração de inconstitucionalidade.
Ensina o Ministro
Gilmar Mendes que:
“Razões de segurança jurídica podem obstar à revisão do ato praticado
com base na lei declarada inconstitucional. Nessas hipóteses, avalia-se,
igualmente, que, tendo em vista razões de segurança jurídica, a supressão da
norma poderá ser mais danosa para o sistema do que a sua preservação
temporária.” (STF, AC 189/SP – Rel. Min. Gilmar Mendes, Diário da Justiça,
Seção I, 15 abril 2004, p.14).
Portanto, pode-se
dizer que a Corte Suprema mostra cautela ao examinar o tema da
inconstitucionalidade em tese, eis que a decisão afetará a todos os
jurisdicionados que se encontrem em determinadas situações regidas pela norma
cuja inconstitucionalidade esteja sendo arguida, sem olvidar das relações
jurídicas já consolidadas, que não podem, sob pena de ofensa à regra da
segurança jurídica, ser desconstituídas.
Sob esse prisma, subjugando o caso concreto aos
efeitos supervenientes de uma possível declaração de inconstitucionalidade, com
efeito ex nunc, e lembrando, ainda não declarada, o direito do servidor
permanece inalterado.
Logo, independentemente do efeito que se adote
nessa suposta declaração de inconstitucionalidade - ex nunc ou ex tunc - o
direito do servidor resta inequívoco quanto à sua aposentadoria.
2.2 DA
POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO ART. 40 DO REGIMENTO INTERNO
Na análise procedida, o Órgão Instrutivo concluiu
pela prejudicialidade da aplicação do art. 41 do
Regimento Interno ao caso concreto. Considerou que o servidor cumpriu os
requisitos constitucionais necessários à concessão do benefício, por isso, o
dispositivo não se amoldaria à denegação do registro do ato.
Assim, como o próprio
Corpo Técnico afirmou, o requerente atendeu aos preceitos constitucionais que
garantem à aposentadoria, fazendo jus ao direito.
Contudo, o seu
enquadramento irregular levou à conclusão pela denegação do registro do ato,
com supedâneo no art. 36, §2º, b, da Lei
Complementar n. 202/2000.
Dos argumentos
apresentados, verifica-se que essa Corte de Contas criou para si um imbróglio
jurídico, em que anuncia estarem cumpridos os requisitos constitucionais,
atestando o direito do requerente, mas negando o registro em razão do vício na
forma de provimento do servidor no cargo em que se deu a aposentadoria.
No entanto, o ato será passível de registro se
não houver irregularidade quanto ao mérito. Premissa normativa capitulada no
art. 40 do Regimento Interno, in verbis:
Art. 40. O Tribunal decidirá pela ilegalidade e recusará o registro do
ato de concessão de aposentadoria, reforma, transferência para a reserva ou
pensão que apresentar irregularidade quanto ao mérito.
Hely Lopes Meirelles
conceitua mérito administrativo:
O conceito de
mérito administrativo é de difícil fixação, mas poderá ser assinalada sua
presença toda a vez que a Administração decidir ou atuar valorando internamente
as consequências ou vantagens do ato. O mérito administrativo consubstancia-se,
portanto, na valoração dos motivos e na escolha do objeto do ato, feitas pela
Administração incumbida de sua prática, quando autorizada a decidir sobre a
conveniência, oportunidade e justiça do ato a realizar. (MEIRELLES, H. L. Direito
Administrativo Brasileiro. 21. ed. São Paulo: Malheiros, 1990).
Ora, percebe-se no
caso concreto, que não há vício quanto ao mérito, mas sim, em questão puramente
formal. Nesse norte, não há que se discutir questão prejudicial. Resta patente, para tanto, a
possibilidade do registro do ato aposentatório.
2.3 DO JULGAMENTO DA ADI PELO STF X
INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA PELO TCE/SC E AS CONSEQUÊNCIAS DA DENEGAÇÃO DO
REGISTRO
Muito embora a discussão
acerca da inconstitucionalidade invocar apenas dois artigos da Lei Complementar
nº 330/2006 (arts. 15 e 16), a Instrução utiliza-se dessa inferência para
levantar a teoria da inconstitucionalidade por arrastamento, objetivando tornar
inconstitucional, também, o artigo 4º da mesma norma.
O Corpo Técnico
entende que tal dispositivo legal torna possível a transposição de cargo, se
preenchidos os requisitos estabelecidos nos artigos 15 e 16 da Lei Complementar
nº 330/2006, claramente vedada pela Carta Constitucional.
Este Órgão Ministerial
entende que tal ilação pode ser precipitada.
Supondo que o Supremo
Tribunal Federal julgue pela constitucionalidade da Lei n.º 330/2006 e o
Tribunal de Contas, por seu turno, precedente ao julgamento da ADIN, pugne pela
inconstitucionalidade e denegue o registro do ato de aposentação.
Ou mais, supondo que o
STF não acate a teoria levantada do arrastamento, que, registre-se, não se
encontra positivada no nosso ordenamento jurídico. Quais efeitos advirão da
denegação do registro?
E não se trata tão
somente de denegar ou não o registro. Afetará diretamente a credibilidade das
decisões impostas por essa Corte de Contas.
Como bem enumerado
pelo Corpo Instrutivo, o Estado editou várias leis com idêntico preceito
normativo. Impende frisar que serão objeto de análise dessa Corte de Contas
inúmeros processos como o mesmo fundamento fático e jurídico.
Ter-se-á como
consequência direta, a necessidade de nova análise de todos os processos, em
caso de julgamento pela constitucionalidade das indigitadas normas.
A denegação desses
registros com base em uma possibilidade jurídica remota, entre várias que o STF
poderá vir a adotar, enseja julgamento temerário.
Não se pode olvidar
que com a denegação do registro, a Administração Pública Estadual estará
impedida de efetuar a compensação financeira dessa aposentadoria, entre os
demais regimes da previdência social, importando em prejuízo ao erário.
3. CONCLUSÃO
Assim, considerando
que o Tribunal de Contas entende clarividente o direito do requerente;
Considerando os
efeitos decorrentes de uma possível declaração de inconstitucionalidade;
Considerando que o
art. 4º, criador da unicidade de cargo, não está em discussão na ADI 3966/2007,
e que a teoria do arrastamento pode não vir a ser aplicada quando do julgamento
da ação;
Considerando o
disposto no art. 40 do Regimento Interno dessa Casa;
Considerando a
impossibilidade de compensação financeira do Estado com outros Regimes de
Previdência Social;
Considerando
imprescindível a prevalência da segurança jurídica nos casos concretos;
Este Órgão Ministerial
pugna pelo registro do ato de aposentação do Requerente.
Florianópolis, 05 de
julho de 2011.
MAURO ANDRÉ FLORES
PEDROZO
Procurador-Geral do
Ministério Público
Junto ao Tribunal de
Contas
ar