Parecer no:

 

MPTC/7.274/2011

                       

 

 

Processo nº:

 

REC 09/00513519

 

 

 

Origem:

 

Município de Ilhota – Administração Central do Poder Executivo

 

 

 

Assunto:

 

Recurso de Reexame (art. 80, da LCE/SC nº. 202/2000).

 

 

Trata-se de Recurso de Reexame formulado pelo Sr. Ademar Felisky, com fundamento no art. 80, da Lei Complementar nº. 202/2000, em face da Decisão Plenária prolatada na Sessão Ordinária de 29-06-2009 (Acórdão 0905/2009 – Processo RPA-06/00463842).

O Gestor insurgiu-se contra referida decisão nos termos da petição de fls. 02-10. Procedeu à juntada dos documentos de fls. 11-14. Aduz em sua defesa que:

“ADEMAR FELISKY, devidamente qualificado nos autos do processo em epígrafe, vem, através do seu procurador infra-assinado, com supedâneo nos princípios basilares do direito, pedir:

REEXAME

do Acórdão nº 0905/2009, proferido no Processo nº RPA-06/00463842 que trata de representação acerca de supostas irregularidades praticadas no Convite nº 011/05, atribuídas ao Sr. Ademar Felisky, Chefe do Poder Executivo, passíveis de aplicação de multa de que trata o art. 70, inciso II, da Lei Complementar nº 202/2000 c/c o art. 109, inciso II, do Regimento Interno da Corte de Contas de Santa Catarina.

DA ADMISSIBILIDADE

Preliminarmente, cumpre asserir ser tempestivo o presente recurso, em acordo com o artigo 80 da Lei Complementar nº 202/2000, uma vez que a decisão recorrida foi publicada no órgão oficial de divulgação em 13/07/2009.

Tem legitimidade o recorrente para interpor o presente recurso de reexame, nos termos dos artigos 75 e 79 da Lei Complementar Estadual nº 202/2000.

DOS FATOS

O Processo nº RPA 06/00463842, apontou a ocorrência de supostas irregularidades no Convite 011/2005, atribuídas ao Prefeito de Ilhota, Sr. Ademar Felisky.

Trata-se de suposta irregularidade verificada na licitação na modalidade Convite nº 011/2005, cujo objeto se refere à aquisição de caminhão basculante a diesel para ser utilizado na coleta de lixo domiciliar do Município, fixando-lhe multas no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), em face da descrição do objeto da referida licitação, uma vez que foram consignadas ao objeto características únicas e sem margem de variação, restringindo a competição e impossibilitando a seleção da proposta mais vantajosa à Administração, pois da forma que se encontra descrito o objeto só cabe uma proposta, descumprindo-se assim, ao previsto no inciso I, § 1º, art. 3º da Lei 8666/93.

E ainda, multa de R$ 1.000,00 (mil reais), por não ter convidado o número mínimo de três interessados do ramo pertinente ao objeto do convite nº 11/2005, ante o configurado direcionamento do objeto da licitação, em afronta ao disposto no § 3º, do art. 22, da Lei 8666/93.

1. PRELIMINARMENTE

Note-se que, quanto às irregularidades apontadas ao Chefe do Executivo, Sr. Ademar Felisky, em acórdão supra mencionado, por certo que não houve uma profunda análise dos documentos constantes daquele processo licitatório.

Tanto é que, apesar desta Corte de Contas, em outros julgados, afirmar que para conhecer da Representação bastam apenas indícios de prova, não é possível que alguém seja condenado somente com indícios de prova, caso contrário, estar-se-ia ferindo os princípios constitucionais do contraditório e ampla defesa.

Frise-se que, apesar das alegações feitas pelo Representante, não restaram comprovadas as acusações feitas ao Representado.

2. DO MÉRITO

A discussão centra-se no suposto fato de a Administração não ter convidado o número mínimo de três interessados no ramo, bem como pela descrição do objeto da licitação Convite nº 11/2005, ser supostamente direcionada.

Pois bem, vejamos.

2.1 – Da legalidade do número mínimo de convidados para participar do referido certame.

Note-se que a modalidade escolhida pela administração do município de Ilhota para realizar a referida Licitação foi CONVITE, considerando as regras do art. 22 e 23 da Lei 8666/93.

A modalidade de licitação convite exige o encaminhamento de no mínimo 03 (três) cartas-convites aos interessados do ramo pertinente ao seu objeto, evidente, então, que o número três constante no dispositivo legal é referente aos convidados, não aos habilitados.

Tal norma foi devidamente observada pela Administração Pública, que encaminhou a empresas do ramo automobilístico três convites para participarem da licitação, conforme comprovante de entrega em anexo.

Trata-se então, de processo licitatório em que foram convidadas 3 (três) empresas, apenas 1 (uma) foi habilitada, a Brusque Comércio de Caminhões e Transportes Ltda, tendo sido declarada vencedora da competição, em virtude da sua completa e regular habilitação e oferecimento de proposta.

Neste sentido, a modalidade de licitação convite deve ser dirigida a um número mínimo de 03 (três) interessados, conforme dispõe o art. 22, § 3º, da Lei 8.666/93:

Art. 22. (omissis).

§ 3º. Convite é a modalidade de licitação entre interessados do ramo pertinente ao seu objeto, cadastrados ou não, escolhidos e convidados em número mínimo de 3 (três) pela unidade administrativa, a qual afixará, em local apropriado, cópia do instrumento convocatório e o estenderá aos demais cadastrados na correspondente especialidade que manifestarem seu intresse com antecedência de até 24 (vinte e quatro) horas da apresentação das propostas.

Observe-se que, após convidadas as três empresas do ramo a participarem do certame na modalidade convite, duas empresas optaram por não apresentar propostas, quais sejam, Itadisa Itajaí Diesel S/A e Breitkopf Caminhões Ltda.

A alegação, contida nos Autos, de ser improvável que as empresas convidadas tenham o veículo que atenda as descrições do objeto do Convite nº 011/05, não é suficiente para caracterizar a inobservância por parte da Administração do dispositivo legal acima citado.

Até mesmo porque, depreende-se do próprio depoimento do Sr. Anderson Chiganças Marques, representante legal da empresa Breitkopf Caminhões Ltda. (fls.184/185) que disse: “... na época não tinham nenhum tipo de caminhão com aquelas especificações contidas no Processo Licitatório 11/2005 – CV...”, ou seja, não tinha nenhum caminhão com aquelas características no momento, mas não disse que não comercializava aquele tipo de veículo.

No depoimento do Sr. Silvio Lehmuhl, representante legal da Itadisa – Itajaí Diesel S/A (fls.188/189), também verifica-se que a empresa não possuía naquele momento veículo com as especificações contidas no edital.

Desta forma, uma vez encaminhadas no mínimo 03 (três) convites, o certame pode ter seguimento quando houver pelo menos a apresentação de uma proposta válida e formalmente aceitável.

A licitação sob exame apresenta caso típico de manifesto desinteresse do convidado, que não formulou proposta frente à carta-convite, agindo acertadamente a Administração Pública ao dar prosseguimento ao certame, tendo em vista a situação crítica que se encontrava o Município, no que tange a coleta de lixo, não podendo mais a população esperar por tal aquisição, fundamentada pela legislação, doutrina e jurisprudência, conforme segue:

Art. 22. (omissis).

§ 7º. Quando, por limitações do mercado ou manifesto desinteresse dos convidados, foi impossível a obtenção do número mínimo de licitantes exigidos no § 3º deste artigo, essas circunstâncias deverão ser devidamente justificadas no processo, sob pena de repetição do convite.

No mesmo sentido é a doutrina de Jessé Torres Pereira Júnior, segundo a qual:

“Nas duas últimas hipóteses, o desinteresse deve-se a motivos das próprias empresas, ainda que isolados ou passageiros. Comprovada a inapetência (falta de vontade ou de meios para participar) ou a incompetência (falta de qualificação para participar) das empresas do ramo, a Administração deve prosseguir no prédio seletivo com o número possível de licitantes, posto que o interesse do serviço público não poderá quedar-se inerte ou subjugado diante da inércia ou do capricho das empresas” (“in” “Comentários à Lei de Licitações e Contratações Públicas”, Ed. Del Rey, 2002, p.243).

E ainda, esclarece Marçal Justen Filho nos seguintes termos:

“A inexistência de, no mínimo, três potenciais interessados ou o não comparecimento desse número mínimo não se constitui em causa de invalidação do procedimento licitatório. Mas a Administração deverá justificar, por escrito, a ocorrência. A ausência de justificativa imporá a renovação da licitação”. (Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Aide, 4ª Ed. 1995, nº 6, p.132).

Também atendeu a Administração Pública acerca do que regulamenta a parte final do § 7º do artigo 22 da Lei 8.666/93, que exige justificativa das circunstâncias em que ocorreu o procedimento licitatório, nos seguintes termos, fls.76:

“... visto o desinteresse do mercado, decidiu-se pela abertura dos envelopes de propostas dos interessados presentes de acordo com o Art. 22, § 7º da Lei 8.666/93, não sendo necessário a abertura de um novo processo licitatório.”

Ademais, a Administração Pública encontra amparo na jurisprudência para sua decisão, veja-se:

ADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA – LICITAÇÃO – MODALIDADE CONVITE – NÚMERO DE PARTICIPANTES – I. Afigura-se válido o procedimento licitatório, na modalidade convite, quando encaminhada a solicitação a pelo menos três convidados, ainda que somente dois tenham efetivamente participado do certame. II. Apelação e remessa oficial providas. (TRF 1ª R. – MAS 2002.31.00.000645-9 – AP – 6ª T. – Rel. Des. Fed. Souza Prudente – DJU 24.11.2003 – p.71).

Neste mesmo cerne, é o entendimento da Corte de Contas do Estado de Santa Catarina, conforme se verifica no prejulgado nº 1.850:

1. A modalidade de licitação convite exige o encaminhamento de no mínimo três cartas-convites a interessados do ramo pertinente ao seu objeto, podendo ter seguimento o certame quando houver pelo menos a apresentação de uma proposta válida e formalmente aceitável.

2. A mera passividade do convidado, não formulando proposta frente à carta-convite implica no manifesto desinteresse em participar da licitação, sendo desprezível sua declaração expressa, atestando a falta de interesse em fornecer bens ou prestar serviços à Administração.

3. Cabe à Administração justificar de forma circunstanciada os motivos impeditivos da obtenção de no mínimo três propostas válidas, sob pena de repetição do convite. (Decisão 103/2007, Origem: Prefeitura Municipal de Corupá. Rel. Conselheiro Salomão Ribas Júnior. Data da Sessão: 12/02/2007. DOE: 29/03/2007).

Portanto, o fato de se encontrar no processo licitatório nº 11/2005 apenas 1 (um) habilitado de 3 (três) convidados, não retrata irregularidade ou ilegalidade, eis que todas as formalidades e requisitos convalidadores foram atendidos.

Em virtude de restar comprovado de forma cabal e irrebatível a regularidade e legalidade do procedimento licitatório em questão, e por ter atendido aos princípios básicos da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório e do julgamento objetivo, requer desde já, o reexame e conseqüente substituição da decisão anteriormente proferida, para o fim de serem afastadas as penalidades impostas, por não retratarem a verdade dos fatos.

2.2. Do Objeto da Licitação.

Observa-se que as características lançadas no objeto do certame são as mínimas possíveis para adquirir um produto de qualidade, onde a população do Município de Ilhota, que é a principal beneficiada com a licitação em questão, não mais sofresse esse tipo de aborrecimento, ficando a mercê dos prejuízos que a falta de coleta de lixo pode causar tanto a saúde quanto ao meio ambiente, considerando que o antigo caminhão não conseguia perfazer todo o perímetro da cidade, ficando alguns pontos sem recolhimento, bem como pelo fato do mesmo estar constantemente em reparo, deixando a comunidade sem qualquer coleta.

Tais apontamentos se encastelam no inciso I do artigo 40 da Lei de Licitações.

Art. 40. O edital conterá no preâmbulo o número de ordem em série anual, o nome da repartição interessada e de seu setor, a modalidade, o regime de execução e o tipo da licitação, a menção de que será regada por esta Lei, o local, dia e hora para recebimento da documentação e proposta, bem como para início da abertura dos envelopes, e indicará, obrigatoriamente, o seguinte:

I – objeto da licitação, em descrição sucinta e clara;

Porquanto se observa que o objeto foi assim descrito, para que não se cometesse o mesmo erro que aconteceu ao se adquirir o caminhão anterior, portanto nesse tipo de aquisição deve sim ser considerado características específicas, as quais são as mínimas particularizações para que esta aquisição cumpra o fim pra qual foi feita, qual seja o bem social.

Note-se que todo o processo, desde o edital de licitação para contratação da empresa vencedora até a efetiva homologação do resultado final e a convocação dos aprovados deu-se dentro da mais absoluta lisura e com observância aos princípios norteadores do Direito Administrativo, notadamente da legalidade, moralidade, publicidade e impessoalidade.

2.3. Da Urgência da Aquisição do Objeto da Licitação

Cumpre destacar ainda a urgência da aquisição do objeto da referida licitação.

Note-se que o “antigo” caminhão de lixo que fazia o recolhimento deste material no Município já não tinha mais condições de fazê-lo, ora porque não conseguia cumprir todo o perímetro da cidade, ora por que estava sempre em manutenção.

Sendo assim, quem mais sofria com toda esta situação era a população Ilhotense que ficava a mercê dos danos que pode causar a falta de coleta de lixo tanto a saúde, quanto ao meio ambiente.

Observa-se, no presente caso, que a municipalidade por entender conveniente não repetiu o referido certame, ocorre que, não pode a administração postergar esta aquisição por tempo indeterminado.

Os munícipes que são os principais beneficiados com a aquisição do objeto, não podem ficar a mercê de um formalismo excessivo e suportar as conseqüências geradas. É notório que a aquisição de um novo caminhão basculante destinado ao recolhimento de lixo deste Município, é de suma necessidade.

Destarte, entendemos que a interpretação dos dispositivos acima mencionados encontra amparo para ser conjugada com o § 3º do artigo 48, que sistematicamente impõe o raciocínio de que a licitação deverá continuar normalmente quando existir pelo menos uma proposta válida e formalmente aceitável, desde que se apresente uma justificativa válida, escoimada, o que se verifica no presente caso em tela.

No entanto, no prosseguimento do certame licitatório ora em comento, observar-se à impossibilidade de atingir o número mínimo de licitantes dá-se em razão das limitações do mercado ou manifesto desinteresse dos convidados.

Sendo assim, fica claro porque houve urgência na aquisição do referido objeto, poupando a comuna desta cidade de maiores aborrecimentos.

Portanto, em que pese às alegações trazidas aos autos, estas não restaram comprovadas por falta de provas.

Desta forma, fundamenta-se nos motivos acima apresentados para requerer o reexame e conseqüente substituição da decisão anteriormente proferida, para o fim de serem afastadas as penalidades impostas.

3. DO PEDIDO

PRELIMINARMENTE:

1 – Seja acolhida a preliminar de cerceamento de defesa pela ausência de documentos indispensáveis, a fim de determinar o arquivamento da presente Representação sem julgamento do mérito.

Superada a Preliminar suscitada, REQUER:

Diante do exposto, requer o Representado, seja dado provimento ao presente recurso de REEXAME para que o Plenário, reveja a decisão proferida no Acórdão nº 0905/2009 – Processo nº RPA 06/00463842, e:

I – Sejam acolhidos os fatos e fundamentos apresentados, declarando improcedentes os argumentos da Representação, cancelando a aplicação das multas, bem como arquivamento definitivo do processo;

II – Seja dada a devida ciência aos demais atos processuais e da respectiva decisão ao procurador por qualquer meio de processo célere, seja via fac-símile ou através dos telefones (0**47) 3336-1040, 3222-2776 – 8411-7964, ou ainda, encaminhar cópia dos respectivos despachos no endereço: Rua Venezuela, 50 – Bairro Ponta Aguda – CEP 89.050-310 – Blumenau – SC;

Rol de documentos:

- Procuração;

- Cópia de recibos de entrega de convite licitatório..”

A Consultoria Geral elaborou o Parecer Técnico de fls. 15-26, concluindo:

“1) Conhecer do Recurso de Reexame, nos termos do art. 80 da Lei Complementar nº 202/2000, interposto contra o Acórdão 0905/2009, proferido na Sessão Ordinária do dia 29/06/2009, no Processo RPA-06/00463842, e, no mérito, dar-lhe provimento para:

1.1) Cancelar a multa do item 6.2.2, do acórdão recorrido;

1.2) Manter os demais termos da decisão recorrida;

2) Dar ciência desta Decisão, bem como do Parecer e Voto que a fundamentam ao Sr. Ademar Felisky, Prefeito Municipal de Ilhota, bem como ao seu procurador, Advogado, Elsimar Roberto Packer, OAB/SC 23.819.”.

É o relatório.

A sugestão da Consultoria Técnica, pelo conhecimento do Recurso de Reexame, merece ser acolhida, tendo em vista preencher os requisitos de admissibilidade.

Especificamente quanto à tempestividade, a Decisão recorrida foi publicada no DOTC nº. 290 de 13-07-2009 (segunda-feira), e o recurso protocolizado em 12-08-2009 (quarta-feira), portanto, dentro do prazo máximo de 30 dias estabelecido pelo art. 80 da Lei Complementar nº 202/2000.

No que tange ao mérito, a conclusão sustentada pela Douta Consultoria da Corte não pode ser acolhida.

O recorrente não logrou demonstrar a injustiça da decisão que combate.

Equivoca-se a COG ao entender que as obrigações impostas pelo art. 22 § 3º da Lei 8.666/93 foram atendidas no Convite nº 011/2005, conduzido pelo Prefeito do Município de Ilhota, Sr. Ademar Felisky.

A COG afirma (fl. 24) que “se foi efetuado convite a três empresas do ramo, não há como aplicar multa ao recorrente sob alegação de que não foram feitos convites em número mínimo suficiente para atender os dispositivo legal (sic)”. MAS, o que a Lei impõe é não é apenas o encaminhamento do convite a empresas do ramo, como equivocadamente concluiu a COG, e sim a remessa a empresas interessadas do ramo pertinente ao objeto.

O interesse decorre da potencialidade para participar do certame. Assim, impossível acolher a alegação do recorrente (fl.04) de que teria procedido conforme a Lei quando “encaminhou [o convite] a empresas do ramo automobilístico”. Pelo raciocínio sustentado, levando-o a extremos, poderia a Administração Pública de Ilhota ter encaminhado referido convite até mesmo para empresas que comercializassem apenas veículos esportivos ou de passeio, afinal, todas integrantes do conjunto que se pode intitular “ramo automobilístico”!

Não bastava, no caso em exame, que se remesse o convite a uma empresa do ramo automobilístico, mesmo que ligada à comercialização de caminhões. Era necessário aferir se a empresa convidada comercializava caminhões usados (este o único objeto do certame). E impunha-se também verificar se esta empresa tinha por política empresarial participar de licitações públicas. O convidado que não atendesse no mínimo a estes critérios, cuja aferição na fase interna da licitação é uma obrigação lógica, necessária para assegurar o sucesso da futura licitação, não pode ser considerado interessado.

Efetivamente, o Município de Ilhota não convidou no mínimo três interessados do ramo pertinente ao objeto do certame. Foi o que corretamente identificou a Diretoria de Licitações e Contratações, no Relatório nº DLC/419/08 (fls. 176-185 dos autos recorridos), e acolheu o E. Conselheiro Otávio Gilson dos Santos, assim como, à unanimidade, o Egrégio Plenário da Corte.

Bem ao contrário do afirmou a COG, sugerindo (fl. 24) que a instrução técnica da Corte teria opinado pela aplicação da multa apenas por ter considerado “improvável que as demais empresas convidadas e qualquer outra que não a empresa habilitada pudesse atender a pretensão da administração quanto ao objeto licitado”, e que (fl. 25) a comprovação do ilícito não se fazia “a contento nos autos, ficando na esfera da possibilidade, não sendo suficiente para sustentar a aplicação de uma multa”; os autos do feito recorrido não deixam qualquer dúvida quanto ao ilícito, caracterizado pelo direcionamento dos convites a empresas não interessadas no certame, e mais, não deixam dúvidas também de que tal conduta foi adotada de maneira predeterminada, com o dolo de assegurar que a contratação pretendida no certame, já flagrantemente dirigido na descrição do objeto, não pudesse sofrer em hipótese alguma qualquer revés.

A propósito, no que tange à assertiva do recorrente de que a Instrução técnica sustentou sua condenação pelo descumprimento do art. 22, § 3º, baseada apenas em indícios de provas (fl. 04 e 05), a DLC, quando afirmou, corretamente, (fl. 182) “que mesmo que Responsável tivesse convidado outras empresas cujo ramo de atuação fosse pertinente ao objeto do certame, ainda assim estas não seriam interessadas, porquanto improvável o atendimento das descrições do objeto do Convite nº 011/2005, mormente por ser o caminhão um bem usado (1994)”, assim o fez analisando a questão do direcionamento do certame e não a obrigação (descumprida) de convidar no mínimo três interessados do ramo pertinente ao objeto do certame. Quando analisou esta obrigação descumprida afirmou (fl. 182), peremptoriamente, e com fulcro em robustas provas documentais constantes dos autos recorridos:

“Nada obstante o Responsável alegar que cumpriu com o inteiro teor do art. 22, §§ 3º e 7º da Lei 8.666/93, ou seja, que efetivamente convidou três empresas pertinentes ao ramo do objeto do certame, o fato é que os convites foram enviados para empresas desinteressadas, quais sejam, Itadisa – Itajaí Diesel S/A e Breitkoppf Caminhões Ltda., haja vista a impossibilidade fática dessas empresas fornecerem o bem pretendido pela Administração Pública Municipal.”

 

De fato, o recorrente convidou as empresas Itadisa Itajaí Diesel S/A, Breitkopf Caminhões Ltda. e Brusque Comércio de Caminhões e Transportes Ltda. Destas apenas a última cotou preço para o objeto da licitação, sagrando-se vencedora do certame.

O recorrente alega que o representante da empresa Itadisa – Itajaí Diesel S/A, Sr. Sílvio Lehmuhl, afirmou “que a empresa não possuía naquele momento veículo com as especificações do edital”(fl. 05).

No afã de defender-se, o recorrente pinçou apenas o que lhe interessava do depoimento prestado pelo referido representante da empresa Itadisa S/A perante a CPI instaurada pelo Poder Legislativo de Ilhota. A leitura daquele depoimento, contudo, não deixa dúvidas de que referida empresa nunca poderia ter atendido ao Convite nº 011/2005, pois não comercializava veículos usados, e por que a política da empresa era de não participar de licitações públicas (fl. 74):

“(...) perguntado se a empresa sempre participa de licitações disse que há oito anos não participam mais de licitações (...) falou que a prioridade da empresa é sempre veículos novos da marca Mercedes Benz, e que os veículos usados que recebem na troca são repassados a garagistas da região e que a empresa não possui departamento de vendagem de veículos usados (...) disse que a empresa não se sentiu prejudicado face a empresa não possuir este tipo de veículo e que somente trabalham com veículos novos, sendo assim a empresa não se sentiu prejudicada até porque como se refere não se sentiu prejudicada até porque como se refere nos autos já anteriormente citados a empresa não possui condições legais de participar de qualquer tipo de processo licitatório (...)”(sic).

Uma simples consulta ao site da empresa teria revelado que mesma não comercializava veículos usados. Um simples telefonema ou consulta por e-mail teria confirmado tal fato. Esta é uma das providências mais elementares da fase interna da licitação, e não reconhecê-la como tal significa aceitar que certames como o ora analisado possam ser maliciosamente fraudados.

Mas, mesmo que ainda fosse possível conceder o benefício da dúvida, e se pudesse, ainda, vislumbrar a conduta como situada no campo daquelas tidas apenas como negligentes ou imprudentes (o Município remeteu convite para empresa que não comercializava o objeto pretendido, e tinha por política não participar de certames licitatórios), tal conclusão não se sustentará diante do exame do depoimento prestado pelo representante da empresa Breitkopf Caminhões Ltda., Sr. Anderson Chiganças Marques. Houve sim a intenção deliberada de convidar para o certame empresas que não pudessem atender ao certame.

Segundo o Sr. Anderson Chiganças Marques,

“(...) antes de ser emitido o convite houve duas pessoas que foram na empresa para ver o preço de caminhão usado e caminhão novo, e que nenhum mecânico foi até a empresa para ver as condições de qualquer caminhão, disse que em momento algum falou para a pessoa responsável pelo processo licitatório que iriam participar do processo licitatório, (...) em seguida falou que as pessoas que foram até a empresa para ver os veículos, foram antes do dia da emissão da carta convite, e que o tempo entre a emissão da carta convite e o cumprimento ou seja a entrega do veículo foi um tempo muito curto. (sic)” (...).

Antes, porém, afirmou o representante da empresa Breitkopf Caminhões Ltda.:

“(...) disse que na época não tinham nenhum tipo de caminhão com as especificações contidas no Processo Licitatório 11/2005-CV, disse que não apresentaram a proposta porque não tinham caminhão com as especificações contidas no edital, e disse que a Carta Convite contia muito detalhe do caminhão a ser adquirido (sic) (...)”.

A conduta dolosa na condução do certame evidencia-se claramente quando se conclui que antes da emissão do Convite nº -11/2005 a empresa Breitkopf Caminhões Ltda. foi procurada por representantes do Município que puderam certificar-se dos caminhões usados que aquela empresa possuía.

A descrição do objeto e o convite direcionado às empresas Breitkopf Caminhões Ltda. e Itadisa S/A foi conduzida de maneira a não permitir que aquelas empresas pudessem participar do certame e, assim, atrapalhar a única verdadeira pretensão do Administrador Público de Ilhota, que era a de adquirir o veículo da empresa Brusque Comércio de Caminhões e Transportes Ltda.

De fato, a única razão para que as empresas Breitkopf Caminhões Ltda. e Itadisa S/A fossem convidadas para o certame, era o fato de que as mesmas não poderiam apresentar-se como interessadas na licitação. A empresa Itadisa S/A, porque não era do ramo pertinente ao objeto, afinal não comercializava veículos usados. A empresa Breitkopf Caminhões Ltda. porque não possuía veículo que atendesse ao restritíssimo objeto delimitado no Convite, desenhado sob medida para uma terceira empresa...

Efetivamente, o processo decisório de aquisição do veículo usado junto à empresa Brusque Comércio de Caminhões e Transportes Ltda. já havia sido concluído quando o certame veio a público. O procedimento licitatório surgiu apenas para chancelar aquela decisão.

Isso se evidencia de maneira muito clara no Relatório da CPI (RPA 06/00463842, fls. 85 e 118), ao se comparar o depoimento da Secretária de Administração, que era também a Presidente da Comissão de Licitação, com o procedimento do Convite 011/2005. A Secretária afirmou que os prazos de elaboração de toda a documentação para iniciar um processo licitatório (fase interna) eram “em média de uma semana a vinte dias, para então haver se providenciado o envio da carta convite”. “No entanto, verificam-se nos documentos que compõem o processo de licitação de compra do caminhão, que todos os procedimentos praticados no processo licitatório em exame, possuem a mesma data, qual seja 08/03/2005. Todos os atos processuais foram praticados no mesmo dia de envio da carta-convite, com extrema rapidez, em contradição com o período hábil mencionado pela Secretária de Administração... (sic)”.

O caráter fantasioso do Convite 011/2005 evidencia-se ainda, a esta altura sem qualquer surpresa, porém, quando se constata (autos recorridos, fl. 119, Relatório da CPI) que a empresa vencedora da licitação, mesmo sem ter conhecimento dos valores liberados para o certame, conforme afirmação da representante legal da empresa (RPA, fl. 91), apresentou proposta absolutamente coincidente com o valor do Parecer Contábil que instrui os autos recorridos (fl. 33), no valor de R$ 53.000,00...

A alegada fixação do convite no local de costume, afirmada pela COG (fl. 25), não está provada nos autos, e sequer foi alegada pelo recorrente. O documento de fl. 11 dos autos da Representação não permite concluir o que afirmou a COG. Aquele documento deve ser tratado com as devidas ressalvas, a propósito, considerando-se a situação fática de integrar um procedimento cuja fase interna concluiu-se no prazo recorde de 1 (um) dia [!], muito fora dos padrões da Administração Pública de Ilhota, o que se conclui das afirmações da Secretária de Administração do Município, Sra. Ana Lúcia Wilvert (fl. 85 do RPA).

Porém, mesmo que tal afixação pública do Convite tivesse ocorrido, em nada se modificaria a obrigação imposta pelo art. 22 § 3º da Lei 8.666/93 de convidar no mínimo três interessados do ramo pertinente ao objeto do certame. Tal obrigação foi dolosamente descumprida e isso se evidencia robustamente no exame dos autos.

O Ministério Público entende que a decisão contra a qual se insurge o recurso bem resguardou o interesse público, razão pela qual deve permanecer intacta.

                          Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se:

1) pelo conhecimento do Recurso de Reexame interposto pelo Sr. Ademar Felisky, por atender os requisitos da Lei Complementar nº. 202/2000 (art. 80).

2) no mérito, por negar provimento ao recurso para manter-se integralmente a decisão combatida.

3) pela comunicação da decisão ao recorrente.

 

Florianópolis, 11 de agosto de 2011.

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas