PARECER  nº:

MPTC/203/2011

PROCESSO nº:

LCC-10/00017696    

ORIGEM     :

Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN

ASSUNTO    :

Inexigibilidade de Licitação nº 18/2009 - Contratação de Advogados

1 – RELATÓRIO

Trata-se da Inexigibilidade de Licitação nº 18/2009, da Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN, que tem como objeto a contratação de serviços advocatícios, no valor de R$ 1.725.000,00 (um milhão setecentos e vinte e cinco mil reais) a título de pro labore.

Os auditores da Diretoria de Controle de Licitações e Contratações, por meio do Relatório nº 4/2010, sugeriram a audiência do Sr. Walmor Paulo De Luca, Diretor-Presidente, e Sr. Laudelino de Bastos e Silva, Diretor Financeiro e de Relações com o Mercado, para apresentação de defesa acerca de restrições evidenciadas (fls. 135/149).

A providência foi determinada pelo Exmo. Auditor Relator, por meio do despacho de fl. 149-verso.

Foram apresentadas justificativas pelos responsáveis (fls. 161/231); e juntados documentos por auditores do Tribunal (fls. 235/238).

Por meio do Relatório nº 808/2010, os auditores da Diretoria de Licitações e Contratações sugerem decisão de irregularidade do Contrato de Inexigibilidade de Licitação nº 18/2009, com aplicação de multas previstas no art. 70, II, da Lei Complementar nº 202/2000 aos responsáveis, considerando a permanência da irregularidade apontada no item 3.2.1 de sua conclusão, com recomendações aos gestores da CASAN (fls. 239/259).

 

2 – CONVERSÃO DO PROCESSO EM TOMADA DE CONTAS ESPECIAL

2.1 Inexigibilidade de Licitação nº 18/2009, para a contratação de serviços advocatícios, no valor de R$ 1.725.000,00 (um milhão setecentos e vinte e cinco mil reais), a título de pro labore, contrariando o disposto nos arts. 2º e 3º da Lei 8666/93 e art. 37, XXI, da Constituição.

O Escritório Prade & Prade Advogados Associados foi contratado por meio de Inexigibilidade de Licitação, para a prestação de serviços técnicos especializados de advocacia cível, com ênfase em questões de natureza processual, para a defesa, até a última instância, dos interesses da CASAN na Ação de Execução nº 023.05.002648-0 e na Ação de Embargos à Execução nº 023.05.031122-3.

Conforme os auditores da Diretoria de Controle de Licitações e Contratações (fl. 249):

 

(...) a prestação de serviços por parte da contratada, conforme se infere do objeto contratual já descrito acima, refere-se a atividades de defesa processual civil que fazem parte do dia a dia dos escritórios de advocacia.

Portanto, a defesa de ações de execução e de embargos à execução não são exclusivas do escritório contratado, podendo ser prestados pelo próprio quadro de advogados da CASAN.

 

De fato, os serviços de defesa processual civil podem ser desenvolvidos por inúmeros profissionais da área jurídica, devendo ser desempenhados por servidores públicos, no caso, pelos advogados da empresa; assim como a defesa em ações de execução, e a propositura de embargos à execução, ainda que com valor da causa elevado, não constituem objeto singular.

No caso, não foram demonstrados os requisitos necessários para a inexigibilidade de licitação, mormente a singularidade do objeto.

 

2.2 Ausência de justificativa do preço, contrariando o inciso II do § 2º do art. 7º, c/c inciso III do parágrafo único do art. 26 da Lei nº 8.666/93.

Os auditores do Tribunal salientaram não constar dos autos planilha de custos que demonstre a composição do preço ofertado. Além disso, enfatizaram a ausência de razoabilidade do preço contratado, consistente em R$ 1.725.000,00, pagos antecipadamente, acrescidos de parcela de êxito de 10% do valor da causa (fls. 144/145).

Os responsáveis sustentaram que o preço contratado é compatível com os preços de mercado (fls. 172/173):

 

De início, convém reafirmar que o escritório contratado renunciou a parcela de êxito dos honorários, tudo devidamente formalizado por meio de termo aditivo. (...)

De todo o modo, o valor dos honorários advocatícios é em todo condizente com os praticados no mercado. Frisa-se que a CASAN realizou pesquisa junto a três escritórios renomados em Florianópolis, sempre na pessoa de seus titulares – os escritórios Mossimann, Horn – Advogados Associados, Olsen da Veiga – Advogados Associados, e Prade e Prade - Advogados Associados.

(...)

Sob essa ótica, a CASAN considerou sensivelmente melhor a proposta ofertada pelo escritório Prade & Prade - Advogados Associados, até porque o valor do pro labore, ao ensejo da assinatura do contrato, representava 1,01% (...) do valor da execução, tendo como parâmetro a quantia de R$ 170.000.000,00 (...). E, atualmente, a execução atinge a importância superior a R$ 218.658.990,28 (...) conforme planilha preparada pelo setor competente. Ou seja, hoje [26-4-2010], o pro labore compreende 0,79% (...) sobre este valor.

 

De fato, houve termo modificativo do contrato original, ficando estipulado na cláusula segunda o valor do contrato como sendo R$ 1.725.000,00 (fls. 176/177).

Ou seja, a cláusula de êxito de 10% sobre o valor da causa foi excluída do contrato.

Não constam dos autos quaisquer documentos hábeis a demonstrar a justificativa de preços no âmbito do procedimento licitatório.

Para ser preciso, no Parecer nº 405/2009, lavrado pelo Diretor Jurídico e pelo Diretor-Adjunto de Contencioso da CASAN, foi mencionado unicamente o fato de o pro labore de R$ 1.725.000,00 corresponder a menos de 1% do valor atualizado do crédito pretendido pela FUCAS, da ordem de R$ 170.000.000,00 (fls. fls. 18/47, especificamente fl. 44)

Referida assertiva não serve como justificativa do preço contratado.

A respeito da necessidade de a justificativa de preços constar do processo de inexigibilidade, dispõe o art. 26, parágrafo único, III, da Lei nº 8.666/93:

 

Parágrafo único. O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos:

(...)

III - justificativa do preço.

 

Eis o magistério do Marçal Justen Filho[1] sobre o assunto:

 

(...) deverão ser adotadas as formalidades previstas no art. 26, que envolvem, basicamente, a documentação acerca do preenchimento dos requisitos legais para a contratação. Deve-se instaurar procedimento administrativo, ao qual serão juntados os documentos referentes ao cumprimento de todas as etapas e formalidades acima indicados, inclusive no tocante ao preço contratado.

 

Ainda que se pudesse aceitar a justificativa de preço em momento posterior ao processo licitatório, não constam dos autos documentos hábeis a demonstrar a pesquisa de preços pretensamente realizada pelos responsáveis.

Dessa forma, há contrariedade ao art. 7º, § 2º, II, c/c art. 26, parágrafo único, III, da Lei nº 8.666/93.

 

2.3 Previsão de pagamento antecipado de valor sem estipulação de garantia que assegure a execução do contrato, em contrariedade ao art. 55, VI, da Lei nº 8.666/93.

         Trata-se do pagamento antecipado do valor de R$ 1.725.000,00, a título de pro labore, estipulado nas cláusulas 3.1, a, e 3.2 do Contrato (fl. 127).

         Conforme os auditores da DLC, no âmbito dos contratos administrativos, é defeso realizar pagamentos anteriores à prestação dos serviços sem que tal procedimento esteja previsto no edital e sem a exigência de garantias (fl. 256).

         Não obstante tal conclusão, sugerem os auditores determinação aos gestores da CASAN, que se abstenham de realizar o pagamento antecipado de despesas ainda não executadas.

         Nesse passo, tenho que a análise conjunta do ato em análise neste tópico com as demais irregularidades do procedimento licitatório, possibilita a conclusão que houve um dano ao Erário Público, como se verá a seguir.

 

2.4 Dano ao erário, identificação dos responsáveis, e conversão do processo em Tomada de Contas Especial.

         Por meio do Processo de Inexigibilidade sob análise foi contratado escritório de advocacia para defesa em processo em que a CASAN figurava como executada.

         A contratação deu-se na data de 9-12-2009 (fls. 122/129).

         Ocorre que o processo em questão já tramitava desde 25-1-2005,[2] sendo que os atos processuais determinantes dos resultados a serem obtidos foram praticados por advogados da Companhia.

         Entre os quais destaco:

- nomeação de bens à penhora pela CASAN, em 16-3-2005;

- despacho do Juiz, declarando a ineficácia da nomeação de bens à penhora, porquanto não obedeceu a graduação legal do CPC, com deferimento de penhora de saldo de conta corrente da CASAN, expedindo-se mandado de penhora e intimação, em 12-5-2005;

- despacho do Juiz, determinando expedição de mandado de reforço de penhora, em 19-8-2005;

- despacho do Juiz, determinando que a exequente carreasse aos autos cálculo atualizado e discriminado de seu crédito, indicando com precisão o valor já penhorado, e após, a expedição de mandado de penhora, em 9-8-2007;

- decisão interlocutória, determinando a transferência dos valores bloqueados para conta judicial, declarando convertido o bloqueio em penhora, e determinando a intimação do devedor (CASAN), em 13-3-2008;

- despacho do Juiz, determinando o bloqueio de valores referentes aos meses de abril e maio de 2008, em 2-6-2008;

- bloqueios de valores, em 25-8-2008 e 29-9-2008.

         Referidos atos culminaram com despacho do Juiz, de deferimento de levantamento de valores pela exequente, em 2-12-2010.

         Já no âmbito dos Embargos à Execução, destaco os seguintes atos processuais praticados antes da contratação do escritório de advocacia:[3]

- publicação de decisão, julgando improcedentes os embargos à execução propugnados pela CASAN em face da FUCAS, condenando a embargante no pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, fixados em R$ 500.000,00, sem duplicidade com os arbitrados na ação de execução (5-10-2009);

- juntada de embargos de declaração/infringentes em 21-10-2009;

- juntada de apelação, em 2-12-2009.

         O fato é que, até dezembro de 2009, as medidas adotadas no processo, determinantes para a sua conclusão, foram executadas por advogados da CASAN.

         A contratação de advogado em momento em que os processos já se encontravam delineados, e desconsiderando as atribuições do quadro de advogados da Companhia, pode ser considerada periclitante, atentatória aos princípios da economicidade e da eficiência, além dos princípios da legalidade, legitimidade, impessoalidade e moralidade administrativa, e representa um dano ao erário no valor despedido no contrato, correspondente a R$ 1.725.000,00.

         O uso indevido do recurso público se agrava na medida em que a contratação deu-se sem licitação, sem justificativa de preço, e com pagamento antecipado dos valores contratados.

         Nessas condições, opino pela conversão dos autos em tomada de contas especial; pela definição da responsabilidade solidária do Sr. Walmor Paulo de Luca, Diretor-Presidente da CASAN, e do Sr. Laudelino de Bastos e Silva, Diretor Financeiro e de Relações de Mercado, quanto à contratação de escritório de advocacia para defesa da CASAN em ação de execução e em embargos à execução que se encontravam com decisões já proferidas, desconsiderando as atribuições do quadro de advogados da Companhia, de forma periclitante, e atentatória aos princípios da economicidade e da eficiência, além dos princípios da legalidade, legitimidade, impessoalidade e moralidade administrativa, previstos nos arts. 37 e 70 da Constituição, gerando um dano ao erário no valor de R$ 1.725.000,00; e pela citação dos responsáveis para apresentação de defesa quanto à irregularidade acima descrita e quanto aquelas antes evidenciadas, para as quais existe previsão legal de imputação de débito e/ou aplicação de multa.

         Dessarte, dissinto dos termos do Relatório nº 808/2010 da Diretoria de Controle de Licitações e Contratações, para propor a conversão do processo em tomada de contas especial, nos termos deste Parecer.

 

3 – CONCLUSÃO

Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, II, da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se pela adoção das seguintes providências:

. CONVERSÃO dos autos em TOMADA DE CONTAS ESPECIAL, nos termos do art. 32 da Lei Complementar nº 202/2000 e do art. 34, caput, da Resolução nº TC-6/2001;

. DEFINIÇÃO da RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA do Sr. Walmor Paulo de Luca, Diretor-Presidente da CASAN, e do Sr. Laudelino de Bastos e Silva, Diretor Financeiro e de Relações de Mercado, e correspondente CITAÇÃO, nos termos do art. 15, I e II, c/c art. 13 da Lei Complementar nº 202/2000, para que apresentem defesa acerca das seguintes restrições, para as quais existe previsão legal de imputação de débito e/ou aplicação de multa:

- contratação de escritório de advocacia, para defesa da CASAN em ação de execução e em embargos à execução que se encontravam com decisões já proferidas, desconsiderando as atribuições do quadro de advogados da Companhia, de forma periclitante, e atentatória aos princípios da economicidade e da eficiência, além dos princípios da legalidade, legitimidade, impessoalidade e moralidade administrativa, previstos nos arts. 37 e 70 da Constituição, gerando um dano ao erário no valor de R$ 1.725.000,00;

- inexigibilidade de Licitação nº 18/2009, para a contratação de serviços advocatícios, no valor de R$ 1.725.000,00 (um milhão setecentos e vinte e cinco mil reais), a título de pro labore, contrariando o disposto no art. 37, XXI, da Constituição, e nos arts. 2º e 3º da Lei 8.666/93;

- ausência de justificativa do preço, contrariando o art. 7º, §2º, II, c/c art. 26, parágrafo único, III, da Lei nº 8.666/93;

- previsão de pagamento antecipado de valor sem estipulação de garantia que assegure a execução do contrato, em contrariedade ao art. 55, VI, da Lei nº 8.666/93.

         Florianópolis, 5 de setembro de 2011.

 

Aderson Flores

                         Procurador                          mb

 



[1] Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 13ª Ed. São Paulo: Dialética, 2009. p. 378.

[2] Espelho de tramitação Processual – Anexo 1.

[3] Espelho de tramitação Processual – Anexo 2.