PARECER nº: |
MPTC/4976/2011 |
PROCESSO nº: |
RLA
09/00593440 |
ORIGEM : |
Prefeitura
de Governador Celso Ramos |
INTERESSADO: |
Anísio
Anatólio Soares |
ASSUNTO : |
Auditoria in loco relativa a atos de
pessoal - exercício de 2009 |
1. RELATÓRIO
Trata-se de auditoria ordinária in loco realizada na Prefeitura de
Governador Celso Ramos, para verificação de regularidade na contratação de servidores
em caráter temporário, no período de 2-1-2009 a 30-6-2009.
Os auditores da Diretoria de
Controle de Atos de Pessoal elaboraram o Relatório nº 2870/2009, sugerindo a
audiência do Sr. Anísio Anatólio Soares, prefeito; dos Srs. Edmar Souza e
Francisco de Oliveira Neto, secretários da administração; do Sr. Cristiano
Ildefonso Nazário, membro da Comissão de Processo Seletivo; e da Sra. Rosiani
Laura Oliveira Fernandes, Diretora de Recursos Humanos (fls. 293/310).
A audiência foi determinada (fl.
310).
Os responsáveis foram notificados
para apresentação de justificativas (fls. 311/317).
De forma conjunta, foi
apresentada a defesa de fls. 319/324.
Por meio do Relatório nº 1796/2010,
os auditores da DAP sugeriram decisão de irregularidade dos atos analisados,
com aplicação de multas aos responsáveis (fls. 326/340).
2. MÉRITO
2.1 –
Contratação de servidores temporários (ACT’s) para o cargo de Fiscal de
Tributos, em desacordo com o artigo, 37, II e XXII, da CF/88 e Anexo I da Lei
Municipal nº 240/89, bem como com os princípios constitucionais da isonomia,
impessoalidade, moralidade, legalidade e interesse público.
O cargo de Fiscal de Tributos
está previsto no Quadro de Pessoal da Prefeitura de Governador Celso Ramos (Lei
nº 240/89).[1]
Como é sabido, os cargos de
provimento efetivo devem ser preenchidos mediante concurso público (art. 37, II,
da Constituição).
O prefeito de Governador Celso
Ramos, Sr. Anísio Soares, determinou fossem efetuadas contratações para
preenchimento do cargo em questão, em caráter temporário (Portaria nº 452/2008
- fl. 22).
Foram contratados 3 fiscais de
tributos, conforme demonstram contratos temporários de trabalho e respectivos
termos de rescisão (fls. 9/21).
O responsável justificou as contratações
aduzindo incremento de serviços na temporada de verão; desfalques no quadro
efetivo; e anulação de concurso público realizado no ano de 2003. Além disso,
ressaltou que os contratados não exerceram a função de fiscal (fls. 319/321).
Inequívoco que as contratações se
deram para o cargo de Fiscal de Tributos. Prova disso são os contratos e
rescisões já citados (fls. 9/21); a Portaria nº 452/2008 que previu textualmente
a contratação de Fiscais de Tributos (fl. 22); o Edital de Processo Seletivo
Simplificado nº 1/2009 (fls. 23/26); e a Lista de Candidatos inscritos no
Processo Seletivo (fl. 27).
Pelo que se infere dos autos, o
concurso público realizado no ano de 2003 não previu vagas para o cargo de
Fiscal de Tributos.
A assertiva é corroborada pela
seguinte constatação feita pelos auditores da DAP (fl. 298):
Cumpre
registrar, (sic) que o Município de Governador Celso Ramos realizou concurso
público para admissão de servidores efetivos – Edital nº 001/2003 – e que se
encontra pendente de decisão judicial (Ação Popular nº 007.03.005121-1), em
fase de apelação no TJ/SC. O edital previa vagas para os cargos de Agente de
Saúde (2 vagas), Assistente Administrativo I (25 vagas), Assistente
Administrativo II (15 vagas), Auxiliar de Laboratório (1 vaga), Contador (2
vagas), Coveiro (3 vagas), Educador Infantil (10 vagas), Professor de 1ª a 4ª
séries (30 vagas) e Auxiliar de Serviços Gerais (6 vagas), dentre outros.
Naturalmente, caso o concurso contivesse
previsão de vagas para Fiscal de Tributos, os auditores do Tribunal as teriam enunciado.
Em suas justificativas, o
responsável não disse que o concurso contestado na justiça previa vagas para
Fiscal de Tributos, limitando-se a afirmar que “(...) existe um recurso no
Tribunal de Justiça, tratando da anulação de um concurso público realizado no
ano de 2003” (fl. 320).
Finalmente, ressalto que os
candidatos aprovados no concurso público realizado no ano de 2003, à época das
contratações temporárias, estavam integrando o quadro de servidores do
Município, conforme informação colhida em Acórdão datado de 21-2-2011,
proferido nos autos da Apelação Cível nº 2009.001080-2:[2]
Todos
eles têm endereço certo – pelo menos é certo o endereço comercial. Aprovados no
concurso cuja anulação é postulada pelo autor, foram nomeados e empossados. Conforme
informação do Prefeito Anísio Anatólio Soares, ainda integram o quadro de
servidores do Município de Governador Celso Ramos (...). (Grifo meu)
Assim, caso tenha havido previsão
de vagas para Fiscal de Tributos no concurso de 2003, os candidatos foram
empossados e estão trabalhando.
Portanto, a pendência judicial
não serve de justificativa para as contratações temporárias aqui tratadas.
Assim como, inexistiam óbices à
realização de novo concurso público, para prover os cargos de Fiscal de
Tributos, de acordo com as necessidades da Administração.
Ausente tal medida, flagrante a
omissão do responsável em realizar concurso público para prover o cargo efetivo
de Fiscal de Tributos, em afronta ao art. 37, II, da Constituição.
Agrava a situação a contratação
ter-se dado em atividade essencial ao funcionamento do Estado, que deve ser
exercida por servidor de carreira específica, nos termos do art. 37, XXII, da
Constituição.
Acresça-se o fato que a conduta
em questão se opõe aos princípios que devem nortear a administração pública.
A irregularidade deve ser
atribuída exclusivamente ao Prefeito, Sr. Anísio Anatólio Soares, pois, como
dito alhures, por meio da Portaria nº 452/2008, ele determinou a formação de
Comissão de Processo Seletivo Simplificado para contratar servidores
temporários (fl. 22).
Ou seja, a decisão de contratar foi
tomada pelo prefeito, que consagrou a irregularidade assinando os contratos temporários
de trabalho (fls. 9/21).
Os membros da Comissão de
Processo Seletivo atuaram na condição de subalternos do Prefeito, em
cumprimento à decisão por ele tomada na condição de Chefe do Executivo.
Nessa direção, não deve prosperar
a intenção de penalizar os participantes da Comissão de Processo Seletivo
Simplificado, Sr. Edmar Souza, secretário de administração, e Sr. Cristiano
Ildefonso Nazário, Fiscal de Tributos, cargos sem poder de decisão para
determinar as contratações sob exame.
Igualmente, inexistem elementos nos
autos que indiquem a responsabilidade da Sra. Rosiani Laura O. Fernandes,
Diretora de Recursos Humanos.[3]
2.2 –
Renovação dos Contratos temporários dos servidores (ACT’s), em desacordo com a
Lei (municipal) nº 639/99, art. 2º, §§ 1º e 2º, e art. 37, IX, da CF/88, bem
como com os Princípios Constitucionais da Isonomia, Impessoalidade, Moralidade,
Legalidade e Interesse Público.
No âmbito do Município, as
contratações temporárias de excepcional interesse público foram reguladas pela
Lei nº 639/99, com destaques para os seguintes excertos (fls. 220/221):
Art.
1º - Para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público,
poderão ser realizadas admissões de pessoal por tempo determinado mediante
processo seletivo simplificado nas condições e prazos previstos nesta lei.
Art.
2º - Consideram-se como de necessidade temporária de excepcional interesse
público, admissões que visem a:
I.
Combater
surtos epidêmicos;
II.
Atender situação de calamidade pública;
III.
Manutenção de atividades educacionais;
IV.
Manutenção das atividades de saúde pública;
V.
Operação veraneio;
VI.
Coleta de lixo e manutenção de limpeza pública;
VII.
Execução de obras pavimentação urbana e comunitária;
VIII.
Participação em convênios;
IX.
Execução dos serviços rodoviários e de transporte municipal;
X.
Saneamento, manutenção e abastecimento de
água; e
XI.
Atender outras situações de urgência que vierem a
ser definidas em Lei.
Parágrafo
1º - As admissões de que trata este artigo terão dotação específica e
obedecerão aos seguintes prazos:
I.
Nas hipóteses dos incisos I e II, enquanto
perdurar o combate epidêmico ou situação de calamidade;
II.
Na hipótese do inciso III, no decorrer do período
letivo em cada exercício;
III.
Nas hipóteses dos incisos IV, VI, IX e X, pelo prazo
de até 12 (doze) meses;
IV.
Na hipótese do inciso V, pelo prazo de até 3 (três)
meses, em cada temporada; e
V.
Na hipótese do inciso VII, até a conclusão
do objeto.
Parágrafo
2º - os prazos de que trata o parágrafo anterior são improrrogáveis, exceto nos
casos dos incisos IV, VI, IX e X, que poderão ser prorrogáveis, por novo ato e
por uma única vez, por igual período. (Grifo meu)
A auditoria revelou que “a
Prefeitura Municipal de Governador Celso Ramos efetuou contratação em caráter
temporário de servidores (ACT’s) nos anos de 2006 a 2009, e renovou os
contratos no período de janeiro de 2008 a 30 de junho de 2009, fato que
descaracterizou a excepcionalidade e a necessidade temporária” (fl. 294).
Conforme narrado pelos auditores,
a constatação foi feita a partir da análise de vários documentos: relação de
servidores admitidos em caráter temporário nos anos de 2006 a 2009;
recontratações evidenciadas em CI’s (Comunicações Internas) subscritas por secretários
municipais; contratos temporários de trabalho assinados pelo prefeito; termos
aditivos a contratos de trabalho temporário assinados pelo prefeito; relação de
servidores contratados temporariamente entre janeiro de 2006 e 30 de junho de
2009; e lista de cargos vagos no quadro de servidores da Prefeitura (fl. 303).
Chama a atenção o número excessivo
de contratações temporárias promovidas pela Prefeitura. Em análise preliminar
dos fatos, os auditores narraram que, para um total de 426 servidores, 150 foram
contratados excepcionalmente em caráter temporário, representando 35% do
universo de servidores (fl. 298).
Os números atestam que os
gestores da Unidade vêm vilipendiando o instituto das contratações temporárias
em caráter excepcional.
O que deveria ser exceção
tornou-se regra, fazendo com que os contratados temporários desempenhem funções
permanentes da Administração, conforme relatado pelos auditores da DAP (fl. 298):[4]
Além
do elevado número de servidores temporários em relação aos efetivos, a
diversidade de funções elencadas como temporárias, tais como, Fiscal de
Tributos, Auxiliar de Serviços Gerais, Técnico de Enfermagem, Farmacêutico,
Coveiro, Educador Infantil e Motorista, também contribuiu para a escolha da
unidade a ser auditada.
A prática é reprovável e deve ser
coibida, conforme ressalta Adilson Abreu Dallari:[5]
Está
absolutamente claro que não mais se pode admitir pessoal por tempo
indeterminado, para exercer funções permanentes, pois o trabalho a ser
executado precisa ser, também, eventual ou temporário, além do que a
contratação somente se justifica para atender a um interesse público qualificado
como excepcional, ou seja, uma situação extremamente importante, que não possa
ser atendida de outra forma.
A jurisprudência do STF não
difere da posição aqui defendida:[6]
CONSTITUCIONAL. LEI ESTADUAL CAPIXABA QUE
DISCIPLINOU A CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA DE SERVIDORES PÚBLICOS DA ÁREA DE SAÚDE.
POSSÍVEL EXCEÇÃO PREVISTA NO INCISO IX DO ART. 37 DA LEI MAIOR.
INCONSTITUCIONALIDADE. ADI JULGADA PROCEDENTE. I - A contratação temporária
de servidores sem concurso público é exceção, e não regra na Administração
Pública, e há de ser regulamentada por lei do ente federativo que assim
disponha. II - Para que se efetue a contratação temporária, é necessário que
não apenas seja estipulado o prazo de contratação em lei, mas, principalmente,
que o serviço a ser prestado revista-se do caráter da temporariedade. III -
O serviço público de saúde é essencial, jamais se pode caracterizar como
temporário, razão pela qual não assiste razão à Administração estadual capixaba
ao contratar temporariamente servidores para exercer tais funções. IV - Prazo
de contratação prorrogado por nova lei complementar: inconstitucionalidade. V -
É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de não permitir contratação
temporária de servidores para a execução de serviços meramente burocráticos.
Ausência de relevância e interesse social nesses casos. VI - Ação que se julga
procedente. (Grifos meus)
O fato de existirem tantas e
rotineiras recontratações e prorrogações de contratos temporários atesta que os
contratados estão exercendo atividades permanentes da Administração.
Assim sendo, as contratações
temporárias levadas a efeito pela Prefeitura de Governador Celso Ramos, no
período de 2 de janeiro de 2009 a 30 de junho de 2009, são irregulares.
A responsabilidade por tais atos deve
ser atribuída exclusivamente ao prefeito, Sr. Anísio Anatólio Soares, por ter
ele determinado a instauração de processos seletivos simplificados para
proceder às contratações temporárias, conforme demonstram as Portarias nºs
452/2008 e 10/2006 (fls. 22 e 89); além de ter sido ele o signatário dos
contratos de trabalho (fls. 11, 15, 20, 36, 40, 45, 50, 55, 60, 65, 75 e 79) e
dos termos aditivos aos contratos de trabalho (fls. 33, 42, 47, 52, 57, 62, 67
e 72).
Da mesma forma que na análise
procedida no tópico anterior, não deve prosperar a intenção de penalizar
ocupantes de cargos sem poder de decisão para determinar as contratações sob
exame.
3. CONCLUSÃO
Ante o exposto, o Ministério
Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo
art. 108 da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se por DECISÃO DE IRREGULARIDADE,
com supedâneo no artigo 36, § 2º, a,
da Lei Complementar nº 202/2000, dos seguintes atos:
. Contratação de servidores temporários (ACT’s)
para o cargo de Fiscal de Tributos, em desacordo com o art. 37, II e XXII, da Constituição,
Lei (municipal) nº 240/89, Anexo I, e com os princípios constitucionais da
isonomia, impessoalidade, moralidade, legalidade e interesse público;
. Contratação e recontratação de servidores
temporários, bem como prorrogação de contratos temporários de trabalho,
inclusive para atividades permanentes da Administração, de forma rotineira e em
quantidades que descaracterizam a condição de excepcionalidade, contrariando
disposição contida no art. 37, IX, da Constituição, e nos arts. 1º e 2º, §§ 1º
e 2º, da Lei (municipal) nº 639/99.
- APLICAÇÃO de MULTAS previstas no art. dos
art. 70, II, da Lei Complementar nº 202/2000, ao prefeito, Sr. Anísio Anatólio
Soares, em razão das referidas irregularidades.
Florianópolis,
26 de setembro de 2011.
Procurador
[1] Art. 2º da mencionada Lei (fl. 179) e Anexo
V (fl. 182-v).
[2] A título de informação, ressalto que a
Decisão em questão anulou o processo judicial, não o concurso público, por
vício de citação de alguns réus, conforme ementa e voto do Relator, disponível
no sítio do Tribunal de Justiça de Santa Catarina: <www.tj.sc.gov.br>.
Acesso em: 22-9-2011.
[3] A
participação da diretora de R.H limitou-se às imposições burocráticas do cargo,
adrede determinadas pelo prefeito por meio da Portaria nº 452/2008 (fl. 22).
[4] Os cargos citados existem no quadro de
pessoal da Administração, todos eles de provimento efetivo (fl. 105).
[5] DALLARI, Adilson Abreu. Regime
Constitucional dos Servidores Públicos. 2ª ed. São Paulo: RT, 1992. p. 124.
[6] ADI 3430/ES - Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI- Julgamento: 12-8-2009 -
Órgão Julgador: Tribunal Pleno – Publicação: DJe-200 - 23-10-2009.