Parecer no: |
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MPTC/5.395/2011 |
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Processo nº: |
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REC 10/00421470 |
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Origem: |
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Prefeitura Municipal de Gaspar |
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Assunto: |
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Recurso de Reexame (art. 80, da LCE/SC nº. 202/2000). |
Trata-se de
O Gestor insurgiu-se
“Pedro Celso Zuchi –
Prefeito Municipal de Gaspar, inconformado com os termos do Acórdão nº
0302/2010, prolatado no Processo DEN-03/07452760 e baseando-se nos arts. 79 e
80 da Lei Complementar nº 202, de 15-12-2000, c/c o parágrafo único do art.
139, do Regimento Interno desse Tribunal, aprovado pela Resolução TC/SC nº
06/2001, vem respeitosamente a V.Exa. interpor o presente Recurso de Reexame
contra a citada decisão, pelo que submete ao elevado discernimento do Excelso
Plenário, dessa Egrégia Corte de Contas, os fatos e elementos a seguir
relatados:
I – Do Acórdão
1. Em Sessão
Ordinária de 17-5-2010, o Insigne Tribunal Pleno emitiu o Acórdão nº 0302/2010
sobre os presentes autos, em que deliberou:
Vistos, relatados e
discutidos estes autos, relativos à Representação acerca de Irregularidades na
Concorrência n. 47/2002, formalizada pela Prefeitura Municipal de Gaspar;
Considerando que foi efetuada a audiência do Responsável, conforme consta na f.
923 dos presentes autos; Considerando que as justificativas e documentos
apresentados são insuficientes para elidir irregularidades apontadas pelo Órgão
Instrutivo, constantes do Relatório de Reinstrução DLC/Insp.2/Div.6 n.834/2008;
Acordam os
Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em
Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no
art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1º da Lei
Complementar n. 202/2000, em:
6.1. Conhecer do
Relatório de Auditoria realizada na Prefeitura Municipal de Gaspar, que trata
da análise da Concorrência n. 47/2002, para considerar irregular, com
fundamento no art. 36, § 2º, “a”, da Lei Complementar (estadual) n. 202/00, o
ato examinado.
6.2. Aplicar ao Sr.
Pedro Celso Zuchi – Prefeito Municipal de Gaspar, CPF n. 181.649.359-72, com
fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II,
do Regimento Interno, a multa no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), por ter
incluído no edital da Concorrência n. 47/2002 as cláusulas restritivas
constantes dos itens 4.1 e 4.1.2.1, contemplando exigências consideradas
desnecessárias pela Administração antes do início da operação do sistema de
transportes coletivos, violando, com isso, as disposições dos arts. 37, XXI, da
Constituição Federal e 3º, § 1º, I, da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 2.1 do
Relatório DLC), fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação
deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para
comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que,
fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial,
observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000.
6.3. Determinar, com
fundamento no art. 29, caput, da Lei Complementar (estadual) n. 202/2000, que a
Unidade Gestora, representada pelo atual Prefeito Municipal de Gaspar, nos
termos do art. 49, caput e § 2º, da Lei (federal) n. 8.666/93, promova a
anulação do contrato oriundo da Concorrência n. 47/2002, comprovando tal
procedimento a esta Corte de Contas no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da
publicação deste acórdão no Diário Oficial Eletrônico deste Tribunal.
6.4. Comunicar de
imediato o fato ao Ministério Público Estadual, com fundamento nos arts. 1º,
XIV, r 65, § 5º, da Lei complementar (estadual) n. 202/2000, com remessa de
cópia dos presentes autos.
6.5. Dar ciência
deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do
Relatório de Reinstrução DLC/Insp.2/Div. 6 n. 834/2008 e do Parecer MP/TC n.
3985/2009; 6.5.1 ao Responsável nominado no item 3 desta deliberação; 6.5.2 aos
procuradores constituídos nos autos; 6.5.3 à Procuradoria do Município de
Gaspar; 6.5.4 ao responsável pelo Controle Interno daquele Município; 6.5.5 ao
Denunciante nos presentes autos; 6.5.6 ao Representante no Processo n.
RPA-07/00528083.
II – Do Contraditório
6.2. Aplicar ao Sr.
Pedro Celso Zuchi – Prefeito Municipal de Gaspar, CPF n. 181.649.359-72, com
fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000c/c o art. 109, II,
do Regimento Interno, a multa no valor de R$ 1.000,00, por ter incluído no
edital da Concorrência n. 47/2002 as cláusulas restritivas constantes dos itens
4.1 e 4.1.2.1, contemplando exigências consideradas desnecessárias pela
Administração antes do início da operação do sistema de transportes coletivos,
violando, com isso, as disposições dos arts. 37, XXI, da Constituição Federal e
3º, § 1º, I, da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 2.1 do Relatório DLC),
fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão
no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovar ao Tribunal
o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que, fica desde logo
autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o
disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000.
Inconsistência da
Identificação do Responsável
1. Os autos são
omissos quanto a justificar fundamentadamente a razão de o Chefe do Poder
Executivo Municipal resultar apontado “responsável” pela suposta
irregularidade, enunciada no item 6.2 do Acórdão, com base em foi-lhe imputada
a multa; a decisão prolatada, pois, se ressente da observância do princípio da
motivação, que deve revestir as decisões de Tribunais, conforme previsto no Direito
Processual (ver CPP, art. 381; CPC, art. 165 c/c art. 458). Assim, restaram
sonegados elementos fundamentais ao Recorrente, para que pudesse exercer, em
sua plenitude o direito ao contraditório e ampla defesa, assegurado pelo art.
5º, LV, da C.F., inclusive quanto a eventual erro de pessoa.
Deixaram de ser
apontadas provas de que o ex-Prefeito cometeu ato ilícito, ou que ingeriu para
que fossem praticados. Se assinou o ato convocatório da licitação, isto se deu
baseado na presunção de legitimidade do ato administrativo, trazido ao seu
conhecimento, que atestou a legalidade do edital – neste caso, o parecer da
Assessoria Jurídica emitido nos termos do art. 38, par. Único, da Lei nº 8.666,
de 21-06-93, aprovando o ato convocatório do certame.
Hely Lopes Meirelles
é elucidativo, ao discernir sobre esta questão:
“Os atos
administrativos, como emanação do Poder Público, trazem em si certos atributos
que os distinguem dos atos jurídicos privados e lhes emprestam características
próprias e condições peculiares de atuação. Referimo-nos à presunção de
legitimidade, à imperatividade e à auto-executoriedade.
Presunção de
Legitimidade
Os atos
administrativos, qualquer que seja a sua categoria ou espécie, nascem com a
presunção de legitimidade, independentemente de norma legal que a estabeleça.
Essa presunção decorre do princípio da legalidade da Administração, que, nos
Estados de Direito, informa toda a atuação governamental. Além disso, a
presunção de legitimidade dos atos administrativos responde a exigências de celeridade
e segurança das atividades do Poder Público, que não poderiam ficar na
dependência de solução de impugnação dos administrados, quanto à legitimidade
de seus atos, para só após dar-lhe execução.
A presunção de
legitimidade autoriza a imediata execução ou operatividade dos atos
administrativos, mesmo que arguidos de vícios ou defeitos que os levem à
invalidade. Enquanto, porém, não sobrevier o pronunciamento de nulidade os atos administrativos são tidos
por válidos e operantes, quer para a Administração, quer para os particulares
sujeitos ou beneficiários de seus efeitos. Admite-se, todavia, a sustação dos
efeitos dos atos administrativos através de recursos internos ou de mandados de
segurança, ou de ação popular, em que se conceda a suspensão liminar, até o
pronunciamento final de validade ou invalidade do ato impugnado.
Outra consequência da
presunção de legitimidade é a transferência do ônus da prova de invalidade do
ato administrativo para quem a invoca. Cuide-se da arguição de nulidade do ato,
por vício formal ou ideológico, a prova do defeito apontado ficará sempre a
cargo do impugnante, e até a sua anulação o ato terá plena eficácia.”
2. A forma como houve
designação do ex-Prefeito, como responsável, guarda conflito inclusive com os
fins teleológicos da Lei Orgânica desse Tribunal de Contas, que seu art. 10,
retrata com perfeição, quando diz:
Art. 10 – A
autoridade administrativa competente, sob pena de responsabilidade solidária,
deverá imediatamente adotar providências com vistas à instauração de tomada de
contas especial para apuração de fatos, identificação dos responsáveis e
quantificação do dano, quando não forem prestadas as contas ou quando ocorrer
desfalque, desvio de dinheiro, bens ou valores públicos, ou ainda se
caracterizada a prática de qualquer ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico de
que resulte prejuízo ao erário.
Conforme o
mandamento, a autoridade administrativa competente será considerada responsável
solidária se não adotar providências, com vistas a apurar fatos, identificar
responsáveis e, no caso de tomada de contas especial, quantificar o dano.
Portanto, a Lei não designa a autoridade competente como “responsável
solidária”, só pelo fato de um subordinado cometer ato que possa ser
interpretado impróprio, a não ser em caso de comprovada prevaricação – o que
não é a situação.
3. A DLC agiu como
órgão de investigação; realizou inspeção in loco e apontou o que entendeu
impróprio; mas, não aprofundou sua ação para identificar as responsabilidades
inerentes, na extensão devida e nos termos preconizados pelo Direito
Processual; não efetuou investigação hábil para identificar responsáveis;
simples e laconicamente, designou o Prefeito como sendo o responsável.
Não se encontra em
lei, nem na doutrina ou na jurisprudência, suporte para presunção (sem prova)
de responsabilidade, nos termos propostos pelo Corpo Instrutivo. Ao contrário,
é ressaltada a importância de se buscar a verdade substancial, como tal
ensinada em lições sobre o “princípio da verdade material” – um dos sustentáculos
do “procedimento administrativo”, como leciona Celso Antônio Bandeira de Melo:
“36. (VIII) Princípio
da verdade material. Consiste em que a Administração, ao invés de ficar
restrita ao que as partes demonstrem no procedimento, deve buscar aquilo que é
realmente a verdade, com prescindência do que os interessados hajam alegado e
provado, como bem o diz Héctor Jorge Escola. Nada importa, pois que a parte
aceite como verdadeiro algo que não o é ou que negue a veracidade do que é,
pois no procedimento administrativo, independentemente do que haja sido
aportado aos autos pela parte ou pelas partes, a administração deve sempre
buscar a verdade substancial. O autor citado escola esta assertiva no dever
administrativo de realizar o interesse público.
(...)
47. O princípio da
verdade material estriba-se na própria natureza da atividade administrativa.
Assim, seu fundamento constitucional implícito radica-se na própria
qualificação dos Poderes tripartidos, consagrada formalmente no art. 2º da
Constituição, com suas inerências.
Deveras, se a
Administração tem por finalidade alcançar verdadeiramente o interesse público
fixado na lei, é obvio que só poderá fazê-lo buscando a verdade material, ao
invés de satisfazer-se com a verdade formal, já que esta, por definição, prescinde
do ajuste substancial com aquilo que efetivamente é, razão por que seria
insuficiente para proporcionar o encontro com o interesse público substantivo.
Demais disto, a
previsão do art. 37, caput, que submete a Administração ao princípio da
legalidade, também concorre para a fundamentação do princípio da verdade
material no procedimento, pois, se esta fosse postergada, seria impossível
atender à autêntica legalidade na criação do interesse público.”
Da mesma forma que,
legalmente, o Administrador não pode dispensar a instrução de procedimento
administrativo da competência de agente subordinado, antes de cometer
determinados atos finais (sob pena até de prejudicar a legalidade ou a
legitimidade deles), a responsabilidade desses agentes também não pode deixar
de ser apurada e identificada, na hipótese de originar-se, do exercício do seu
dever funcional, eventual vício transmitido ao ato final, que, pela própria
natureza, não possa ser detectado pela autoridade superior.
Frente ao acima
exposto, acentua-se o fato da ausência de motivação legal, capaz de justificar
a escolha do Recorrente como responsável, sujeitando-o à imputação de multa.
Ausência de base
legal para multar
4. A norma legal (de
caráter principiológico, e não procedimental) dita descumprida, em razão do que
houve a multa, foi o art. 3º, § 1º, inc. I, da Lei nº 8.666/93, de seguinte
teor:
Art. 3º - A licitação
destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a
selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e será processada e
julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da
impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade
administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento
objetivo e dos que lhe são correlatos.
§ 1º - É vedado aos
agentes públicos:
I – admitir, prever,
incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que
comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo e estabeleçam
preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos
licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para
o específico objeto do contrato;
A aplicação da multa,
ora recorrida, baseou-se art. 70, inc. II, da Lei Complementar nº 202, de 2000,
que estabelece:
Art. 70. O Tribunal
poderá aplicar multa de até R$ 5.000,00 aos responsáveis por:
II – ato praticado
com grave infração à norma legal ou regulamentar de natureza contábil,
financeira, orçamentária, operacional e patrimonial;
A restrição
enunciada, no Acórdão, não configura hipótese referida no art. 70, II, da LC
202, com base em que o legislador conferiu poder ao Tribunal de Contas para
multar, pois:
. não diz respeito a
irregularidade de contas ou a ilegalidade de despesa, de que trata o art. 59,
VIII, da Constituição Estadual – de onde promana o poder do Tribunal de Contas
de multar; por conseguinte, também não é passível de ser enquadrada em situação
prevista no art. 70, II, da L.C. 202/2000, cuja eficácia deve guardar conformidade
com citada norma constitucional, de onde decorre;
. a matéria em exame
é inerente a Direito Administrativo propriamente dito (conforme nomenclatura
adotada pela doutrina, para diferençiá-lo das normas de Direito Administrativo,
de outra natureza), motivo pelo qual não é possível dela se originar infração a
norma legal ou regulamentar de Natureza contábil, financeira, orçamentária” (de
Direito Financeiro), e não configurarem regras de caráter “operacional ou
patrimonial”; além disto,
. a Lei Federal nº
8.666/93 não delega poder a Tribunal de Contas para aplicar multas, em razão de
eventual infração a alguma de suas normas; as sanções administrativas cabíveis
de serem aplicadas, em caso de eventualmente haver o seu descumprimento, são
unicamente as indicadas no Capítulo IV – “Das Sanções Administrativas e da
Tutela Judicial” (arts. 81 a 108).
Por conseguinte, o
eventual descumprimento da supracitada norma, da Lei nº 8.666/93, não tipifica
situação sobre que recaia a capacidade de Tribunal de Contas para imputar
multas. Em razão de constituir regra de Direito Administrativo propriamente
dito, pela sua Natureza, aquele dispositivo não se enquadra dentre as normas
referidas pelo art. 70, II, da LC 202/00, em relação às quais (e somente no
tocante a estas!) foi-lhe atribuída poder para multar. Portanto, a aplicação da
multa, ora recorrida, não se teve suporte legal hábil.
Outrossim, os autos
não contêm elementos que permitam identificar as razões jurídicas que
conduziram o Eg. Tribunal a entender que o disposto no art. 3º, § 1º, I, da Lei
866, configura matéria passível de ser enquadrada como de natureza como dentre
as discriminadas no art. 70, II, da LO/TC, ensejadoras da aplicação desse tipo
de penalidade.
A doutrina bem
clarifica a distinção, quanto à natureza, das normas de Direito Administrativo;
ensina De Plácido e Silva, em sua obra “Vocabulário Jurídico”:
Direito
Administrativo: Destarte, o Direito Administrativo encerra o conjunto de
normas, em virtude das quais se estabelecem os princípios e regras necessários
ao funcionamento da administração pública, não somente no concernente à sua
organização como às relações que se possam manifestar entre os poderes públicos
e os elementos componentes da sociedade.
Assim, dentro de seu
objetivo, traça os limites dos poderes delegados aos órgãos da administração
pública, conferindo as atribuições e vantagens a seus componentes e lhes
indicando a maneira por que devem realizar os atos administrativos e executar
todos os negócios pertinentes à administração, e aos interesses de ordem
coletiva, inclusos, em seu âmbito.
O Direito
Administrativo, no desempenho de sua precípua finalidade, triparte-se em
aspectos diferentes, dos quais surgem: o Direito Administrativo, propriamente
dito, o Direito Financeiro e o Direito Fiscal, que embora estreitamente
entrelaçados no cumprimento de seu objeto, apresentam-se definidos pela soma de
regras que se fazem fundamentais a cada uma dessas subdivisões.
O Direito
Administrativo, propriamente dito, cuida mais principalmente dos serviços de
ordem pública e de interesse coletivo, segundo os quais dá execução aos planos
de difusão e fomento, estabelecidos pelo poder público, para desenvolvimento e
grandeza do Estado, deixando aos Financeiro e Fiscal, que cuidem ou zelem por
esta parte privativa ao estabelecimento de normas financeiras oriundas do poder
financeiro do Estado, e ao estabelecimento de regras promotoras da realização
das rendas públicas.
O Direito Financeiro,
ou Direito Administrativo Financeiro constitui-se da soma de regras, ditadas em
interesse coletivo, para que governem as finanças do Estado, impondo os
princípios que devem normalizar as atividades financeiras do Estado, no sentido
de assegurar os recursos de que necessita para a mantença de seus serviços e
cumprimento de suas precípuas finalidades, ao mesmo tempo em que traça as
normas por que se dever pautar a aplicação destes recursos.
O Direito Fiscal ou
Direito Administrativo Fiscal representa-se pelo conjunto de regras e
princípios que, estabelecendo os impostos e taxas, institui as normas que devem
ser aplicadas na arrecadação das rendas tributárias, inclusive de sua
fiscalização, sem se imiscuir na administração dessas rendas e em sua
aplicação, o que se já se faz objeto do Direito Financeiro. (grifei)
Regularidade dos itens
4.1.2 e 4.1.2.1, do Edital
5. Não obstante o
acima asseverado, a DLC interpretou a existência de “grave infração” a uma
norma legal de caráter principiológico, para sugerir aplicação de multa. Não
identificou norma procedimental ferida; preferiu a aleatoriedade da alegação de
infração a uma norma principiológica, para enquadrar como “grave” a própria
tese do que advogou como transgressão à Lei 8.666/93, desvirtuando até o
sentido dos fatos para adequá-los ao silogismo que propôs.
Contestou a
autorização da mudança (depois de encerrado a licitação) do número de portas
que os ônibus de 12m deveriam possuir (tão somente isto!!), referida no item
4.1.2.1, do Edital de Concorrência nº 47/2002 (de fls.20), a seguir:
4.1.2. Especificações
dos veículos:
4.1.2.1. Ônibus comum
com capacidade mínima para 32 passageiros sentados e carga total de 80
passageiros, apresentando 40% da sua capacidade de carga para passageiros
sentados, considerando que a ocupação de passageiros em pé é de 6 por metro
quadrado. Este veículo deve apresentar comprimento total máximo de 12,00 metros
e três portas 1,10m, sendo duas localizadas nos balanços dianteiro e traseiro e
uma no entre eixos do veículo, a porta dianteira para veículos motor dianteiro
pode apresentar 0,80m de vão livre mínimo. Os bancos devem ser em material
plástico com assento e encosto acolchoados e piso em material antiderrapante tipo taraflex ou
similar.
Sem explicar de onde
tirou a informação (o Ofício nº 105/2002, de fls. 545, não faz referência a
respeito), asseverou que a supracitada autorização se baseou no permissivo
contido no item 4.2.1, assim redigido:
4.2 – Da Frota:
4.2.1. A frota de
veículos para o transporte coletivo será composta de acordo com as
determinações do Poder Concedente para operação do sistema, em conformidade com
o item 4.1, podendo, entretanto, ser alterado a critério do Poder Concedente, a
qualquer momento, desde que constatada a ineficiência do sistema.
O Edital, em que se
baseou a Concorrência, aprovado pela assessoria jurídica da Prefeitura, foi
regular; em momento algum o item 4.1.2.1, ou o item 4.2.1, foram objeto de
impugnação, seja com base no art. 41 da Lei nº 8.666/93, seja através de
Mandado de Segurança. Em si, a Concorrência realizou-se na forma da lei,
gerando todos os direitos decorrentes desta modalidade licitatória, assegurados
pelos princípios básicos de licitação.
A licitação foi
realizada com absoluto acatamento aos mandamentos legais, a ela inerentes; suas
regras revestiram-se de integral legalidade. E isto ficou caracterizado em seu
resultado final, mesmo com recursos administrativos e o mandado de segurança
impetrados (referidos às fls. 908 a 917). Se contivesse irregularidade, a
Justiça assim teria declarado; o que não aconteceu, significando pois seu
reconhecimento da legalidade do certame.
Daí, também, a
improcedência da determinação de anulação do certame, mormente pelo motivo
aventado: a autorização do Poder Concedente, na fase da execução contratual,
para os ônibus terem 02 portas, em vez das 03 previstas no Edital, Se existiu
erro nessa autorização, posterior ao término da licitação, medidas cabíveis de
adotar devem se prender apenas a ele, ainda mais (como no caso) estando o fato
interligado à execução do contrato, não se transmitindo à licitação já
encerrada, pois circunscrito estritamente à situação e ao momento a que se
vinculou.
Pressupostos básicos
6. Antes de discutir
os silogismos propostos pela Diretoria de Controle de Licitações e
Contratações, cabe salientar os seguintes elementos básicos para o conhecimento
e compreensão da matéria, em questão:
a) a Concorrência nº
47/2002 teve por objeto a concessão de serviços públicos de transporte coletivo
urbano de passageiros, e não fornecimento de ônibus para o patrimônio da
Prefeitura;
b) após vencer a
licitação e firmar o contrato de concessão é que, em regra, a empresa
concessionária cuida de adquirir a frota de ônibus, que utilizará a partir da
data aprazada para o início da prestação de serviços;
c) nenhuma empresa,
das que licitaram, fabrica ônibus; compra-os, após obterem a concessão, com as
características autorizadas pelo Poder Concedente;
d) a impugnação
sugerida pela DLC refere-se, tão-somente, ao fato de a Prefeitura ter
autorizado o uso de ônibus de 02 portas, e não de 03 como previsto.
Suposições inconsistentes
7. A Diretoria de
Controle, para impugnar a licitação, prendeu-se tão somente a suposições do que
poderia ocorrer. É o evidenciado, a todo, instantes, nos Relatórios nºs
208/2008 (fls. 880 a 921) e 834/2008 (fls. 943 a 950), como a seguir se
demonstra:
a) fls. 202 (4º
par.): “Ocorreu, neste caso, uma série de especificações desnecessárias,
inúteis e restritivas, que podem ter sido determinantes ao desinteresse de
outras empresas do ramo.”
b) fls. 202 (5º
par.): “Logo, pode-se considerar que tais especificações serviram, tão somente,
para afastar outros interessados em participar do certame (...)”
c) fls. 905 (4º
par.): “Salvo melhor juízo, a inclusão das especificações da frota, na forma
indicada no edital, frustrou o caráter competitivo da licitação e trata-se de
ato vedado e não tolerado pela legislação pertinente.”
d) fls. 944,
enunciado do item 2.1: “(...) e tais especificações podem ter sido
determinantes ao desinteresse de tantos outros interessados (...) o que pode
ter beneficiado a empresa vencedora do certame...”
e) fls. 946 (1º
par.): “(...) como afirmado anteriormente, podendo ter sido determinantes ao
desinteresse de outras empresas do ramo.”
Em nenhum momento, a
Diretoria Técnica provou a ocorrência de irregularidade na licitação, em si.
Seus raciocínios pautam-se no levantamento de hipóteses do que poderia ter
acontecido, mas sem provar que elas são verdadeiras. Jamais pode-se admitir um
raciocínio técnico conclusivo, pela anulação de um contrato, desta forma, ainda
mais com a condicional de “salvo melhor juízo”.
Frente a tais
suposições inconsistentes levantadas, o Eg. Plenário determinou a anulação do
contrato, porém sem provar a ilegalidade da licitação – que a Justiça
reconheceu como legal.
8. Sem ter como
provar suas alegações, a DLC exagerou no uso de adjetivações e meias verdades
sobre o apontado, como forma de obter credibilidade, atuando como acusador
descompromissado, e não como órgão de um Tribunal, de que se espera
imparcialidade. Exemplo disto é seu texto, às fls. 904, ao se reportar à
doutrina que transcreveu:
“Em verdade, a
transcrição acima, (...) vem calcada na intenção de firmar convicção que o
Edital de Concorrência nº 47/2002, na parte referente às especificações dos
veículos não estava preocupada com o atendimento da vantajosidade para a
Administração (com excesso de exigências afugentou outros interessados (14
retiraram cópia do edital pagando taxa de R$ 100,00, o que certamente tem a ver
com o interesse no conhecimento das condições, por inteiro, e avaliar a sua
participação ou não do certame), na medida em que apenas três empresas
apresentaram documentos de habilitação (uma delas foi inabilitada), diminuindo
a competição e, como consequência, a garantia da vantajosidade para a
Administração, e supletivamente, entende-se que tratamento isonômico aos
interessados fica prejudicado, se o próprio instrumento convocatório, ao impor
regras que a própria Administração vem a considera-las inúteis antes mesmo da
assinatura do contrato.
Ou, então, quando
assim diz, às fls. 906:
“A doutrina acima
está em total consonância com a posição defendida neste relatório. A
Administração Pública de Gaspar, quando da elaboração do edital CC 47/2002,
inseriu condições que, além de frustrar o caráter competitivo da licitação, não
eram apenas rigorosas, mas inadequadas, inúteis e incompatíveis como objeto da
licitação, o qual poderia ser levado a termo sem tamanhas exigências.”
Várias são as
impropriedades lançadas no texto: a afirmação de que a Administração não estava
preocupada em obter vantagens para o Município (sem explicar de onde tirou essa
suposição); a existência de “excesso de exigências” – qual seja, a previsão de
03 portas para os ônibus de 12m; que este excesso “afugentou” outros
interessados; que a Administração considerou inúteis regras do edital – o que
nunca esta assim entendeu; a condição de exigir 03 portas nos ônibus foi
rigorosa, inadequada, inútil e incompatível com o objeto da licitação.
De salientar, no
comportamento da Diretoria Técnica, a intenção de “firmar convicção” (Dic. Aurélio:
certeza adquirida, ou persuasão íntima) e de estar “defendendo posição”, no
relatório, caracterizando parcialidade na apreciação da matéria. Diante da
ausência de provas a respeito de suas alegações, propôs-se formular tese,
criando argumentação da forma acima, cheia de adjetivações, para “firmar
convicção”, “defender posição” – o que não precisaria, se o apontado não fosse
hipotético.
Motivação da
Impugnação
9. A razão de o
Egrégio Tribunal Pleno ter multado o Recorrente e pretender que seja anulado o
Contrato, oriundo da Concorrência nº 047/2002, é assim expressa, no Acórdão nº
0302/2010:
“(...) por ter
incluído no edital da Concorrência n. 47/2002 as cláusulas restritivas
constantes dos itens 4.1 e 4.1.2.1, contemplando exigências consideradas desnecessárias
pela Administração antes do início da operação do sistema de transportes
coletivos, violando, com isso, as disposições dos arts. 37, XXI, da
Constituição Federal e 3º, § 1º, I, da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 2.1 do
Relatório DLC)”
O enunciado do item
2.1, do Relatório nº DLC/Insp.2/Div.6 – 834/2008 (às fls. 944) está assim
redigido:
Pela inclusão, no
Edital CC 47/2002, de cláusula restritiva, no concernente às especificações da
frota (item 4.1 e 4.1.2.1 do Edital), que fazia exigências consideradas
desnecessárias pela Administração, antes do início da operação do sistema e
tais especificações podem ter sido determinantes ao desinteresse de tantos
outros interessados que retiraram cópia do Edital, descumprindo o próprio
Edital que previa a modificação da frota, “a critério do Poder Concedente, a
qualquer momento, desde que constatada a ineficiência do sistema”, haja vista
que o sistema ainda não havia iniciado, portanto, não havia meios para
constatar tal condição, o que pode ter beneficiado a empresa vencedora do
certame, configurando desatendimento ao inc. I, § 1º, do art. 3º da Lei nº
8.666/93 (Item II.5 do Relatório nº 208, fls. 880/921).
A Diretoria de
Controle de Licitações e Contratações entendeu como “cláusulas restritivas” o
fato de o Edital ter previsto que os ônibus com 12m deveriam possuir 03 portas;
depois, após a assinatura do Contrato SAF nº 136/2002 (mas no mesmo dia),
autorizou que a empresa poderia utilizar ônibus com 02 portas (foi a essa
especificação de 03 portas que a DLC qualificou de rigorosas, inadequadas,
inúteis e incompatíveis com o objeto da licitação, o qual poderia ser levado a
termo sem tamanhas exigências.)
Teria razão a tese da
DLC se o objeto da Concorrência nº 047/2002 fosse a compra de ônibus com 03
portas, pela Prefeitura, e existisse no mercado, de um lado, empresas que só
comercializassem ônibus com 03 portas e, de outro, empresas que só vendessem
ônibus com 02 portas. Se assim fosse e o Edital exigisse que os ônibus a
comprar devessem ter 03 portas, resultariam excluídos do certame os
fornecedores de ônibus de 02 portas; então, a cláusula especificadora de 03
portas seria restritiva aos fornecedores de veículos com 02 portas. Aí, sim, a
mudança do objeto contratual, para comprar ônibus de 02 portas, configuraria
restrição à participação dos fornecedores de ônibus com 02 portas, no certame.
Entretanto, o objeto
da licitação não é compra de ônibus, mas outorga de concessão de serviço
público de transporte coletivo urbano (aspecto acentuado no tópico 6 acima) – o
que altera radicalmente a percepção a se ter da matéria. Mas, a DLC não atentou
para tal fato, parece.
Qualquer empresa que
licita a outorga de concessão de serviços de transporte coletivo urbano de
passageiros, em regra, se preocupa em investir na aquisição dos veículos
necessários à prestação somente após ser-lhe adjudicada a concorrência. Só
então irá adquirir os veículos, com as especificações estabelecidas pelo Poder
Concedente.
Neste caso, o ônibus
dever possuir 02 ou 03 portas é detalhe de menor importância, haja vista
bastará à concessionária especificar ao fornecedor do veículo quantas portas
ele deverá possuir e assim eles lhe serão entregues. Na hora de construí-lo, o
fabricante procederá conforme o pedido, sem nenhum problema. Aliás, quem é do ramo
sabe que qualquer ônibus de 12m (mesmo pronto e acabado) é passível de
adequar-se ao número de portas que se quiser. A colocação de terceira porta,
num ônibus, leva em torno de três dias, a um preço médio de R$ 6.000,00; custo
que será diluído no valor da tarifa, segundo a metodologia de seus cálculos e
as diversas variáveis envolvidas, ao longo da concessão.
10. Por conseguinte,
é inteiramente despropositada a assertiva da DLC, de que a autorização para os
ônibus usarem 02 portas, possa ter servido para restringir a participação de
alguma empresa na licitação; ou possa “ter sido determinantes ao desinteresse
de tantos outros interessados”, ou “pode ter beneficiado a empresa vencedora do
certame”. Isto não aconteceu e nem haveria como acontecer.
Quanto a isto, aliás,
em nenhum de seus relatórios, a Diretoria de Controle foi capaz de demonstrar
em contrário. Construiu todo um silogismo à base de argumentos hipotéticos, mas
eximindo-se de apresentar elementos consistentes, capazes de demonstrar a
verdade de suas premissas.
A licitação foi
realizada conforme os princípios básicos e a legislação, que a regem. Nenhuma
mácula restou-lhe, o que a própria Justiça reconheceu – fato conhecido pelo
Tribunal de Contas, como retrato nos autos. E nesta consideração estão
incluídos os Itens 4.2.1 e 4.1.2.1, que a DLC alega terem servido de base para
a autorização de uso de 02 portas, nos ônibus de 12m (embora o Ofício nº
105/2002, de fls. 545, não tivesse se referido a eles).
11. A Secretaria do
Interior, Assuntos Estratégicos e Desenvolvimento, da Pref. Mun. de Gaspar,
através de seu Ofício nº 0105/2002, após assinado o Contrato nº SAF 136/2002
(de fls. 825 a 830), autorizou a empresa concessionária a alterar de 03 para 02
o número de portas dos ônibus de 12m, a serem utilizados na prestação dos
serviços. As razões que justificaram a medida prenderam-se à alçada daquela
Secretaria e quase 8 anos após, afastado do cargo de Prefeito, não tem o
Recorrente como identificar o que levou o Secretário, à época, a assim decidir.
A Secretaria
Municipal contatou à LOGISTRAN, indagando-lhe sobre a conveniência de os ônibus
disporem de 02 portas, em vez de 03. A resposta da empresa deu-se em 12-8-2002
(fls. 546/547), após a abertura e o julgamento das propostas (vide Ata de
05-08-02, de fls. 815).
Na Carta de 12-8-02,
a LOGISTRAN afirmou não haver problema nenhum em operar com ônibus de 02
portas; disse que assim havia recomendado – o que não procede; sua sugestão
anterior era para ônibus com 03 portas, conforme o “Plano de Transporte Público
do Município de Gaspar” (item 6.1, às fls. 525).
Em função deste
detalhe, a DLC investiu vigorosamente contra a Carta da LOGISTRAN, procurando
revestir a nova sugestão como contradição, capaz de prejudicar a participação
de alguém na licitação, pretextando ainda que 02 portas, em vez de 03,
constituiriam características mais difíceis de serem atendidas, desta forma
afunilando o leque de concorrentes; alegando, com isto, evidências de burla à
competitividade.
Nada disto aconteceu.
Se o Edital contivesse exigências capazes de prejudicar a participação de algum
interessado, por certo teria sido impugnado. Ainda mais que não se está falando
de pequenos licitantes, mas de fortes empresas ou grupos empresariais atuantes
no setor de transporte coletivo urbano, com suas assessorias jurídicas,
conhecedores dos direitos que as Leis nº 8666/93 e 8987/95 lhes garantem. Os
itens apontados como impróprios jamais mereceram impugnação que demonstrassem
vícios contidos; e no reconhecimento da legalidade do Edital, pela Justiça,
eles também se inseriam.
A Secretaria do
Interior, Assuntos Estratégicos e Desenvolvimento autorizou o uso de ônibus com
02 portas, embora o Edital previsse 03. Mas, isto aconteceu após terminada a
Concorrência, constituindo detalhe que, frente ao objeto licitado e contratado
– concessão – não configurou prejuízo ao direito de qualquer concorrente. Por
outro lado, resultou em benefício aos usuários; como afirmou a LOGISTRAN, (Item
4, da Carta de 12-8-02, às fls. 547), o uso de duas portas traria ganho de
conforto no interior dos veículos, por acrescentar-lhes mais 4 assentos.
Em nenhum momento e
frente ao detalhe alterado, a Diretoria de Controle de Licitações e
Contratações demonstrou cabalmente que o fato de ser autorizado o uso de ônibus
02 portas, em vez de 03, efetivamente prejudicou a participação de algum
interessado na licitação.
Referiu-se
aleatoriamente à possibilidade de assim acontecer, sem analisar no que
implicava o detalhe de existir 02 ou 03 portas e a importância disto para
atingir os fins de uma licitação, como a realizada; demonstrou até desconhecer
o que se asseverou acima; uma concessionária comprar, para prestar serviços de
transporte, um ônibus com 02 ou 03 portas é de somenos importância; basta
indicar ao fabricante a especificação do que o veículo deve ter; até mesmo um
ônibus de duas portas, se for o caso, pode ser alterado para incluir uma
terceira em sua carroceria, num prazo médio de apenas três dias, sem grande
custo.
12. Consequentemente,
o Recorrente não cometeu qualquer ato que justifique a multa aplicada,
entendendo improcedente a afirmação de ter incluído cláusulas restritivas no
Edital de Concorrência nº 47/2002, capazes de prejudicar a participação de
algum interessado.
A Administração nunca
entendeu desnecessárias as exigências feitas, como constou do ato convocatório
da licitação. Entretanto, percebendo que o uso de ônibus com 02 portas traria
vantagens principalmente aos usuários, admitiu essa pequena alteração, da mesma
forma que poderia ter assim permitido um, dois, ou três anos após, e o
resultado seria o mesmo.
6.3. Determinar, com
fundamento no art. 29, caput, da Lei Complementar (estadual) n. 202/2000, que a
Unidade Gestora, representada pelo atual Prefeito Municipal de Gaspar, nos
termos do art. 49, caput, e § 2º, da Lei (federal) n. 8.666/93, promova a
anulação do contrato oriundo da Concorrência n. 47/2002, comprovando tal
procedimento a esta Corte de Contas no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da
publicação deste acórdão no Diário Oficial eletrônico deste Tribunal.
13. Tratam os autos
de inspeção “in loco”, realizada pela Diretoria de Controle de Licitações e
Contratações, na Prefeitura Municipal de Gaspar, para analisar o procedimento
licitatório e contratual, atinente à Concorrência nº 047/2002, cujo objeto foi
a outorga de concessão dos serviços de transporte coletivo urbano de
passageiros, no Município de Gaspar.
Das sugestões
contidas no Relatório de Reinstrução nº DLC/Insp.2/Div.6 – 834/2008, ao julgar
o processo, decidiu o Colendo Tribunal Pleno determinar, ao atual Prefeito
Municipal de Gaspar, que promova a anulação do contrato oriundo daquela
Concorrência. Para tanto, baseou-se no art. 29, caput, da LC 202/00.
Em conformidade com o
art. 59, II, da Constituição Estadual, e com a Lei Complementar nº 202/2000, em
seu Título II, Capítulo I, Seções I e II, arts. 1º, III, e 7º a 24, a
competência legal para julgar, atribuída ao Tribunal de Contas do Estado de
Santa Catarina, é adstrita a Contas Públicas. Em relação a outras matérias,
essa Corte é capaz para manifestar-se sobre a sua juricidade, mas não para
julgá-las.
Impropriedade do
Julgamento em face do Objeto
14. A Lei Orgânica do
Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, consoante o art. 59, da
Constituição Estadual, fixa a competência básica do Tribunal de Contas, no
controle externo da Administração Municipal, como sendo:
a) apreciar, mediante
parecer prévio, as Contas Anuais do Estado, apresentadas pelo Prefeito;
b) julgar as Contas
dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores da
administração direta e indireta, (...), e as Contas daqueles que derem causa a
perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário;
c) apreciar, para
fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal, exceto as
nomeações para cargo de provimento em comissão, bem como a legalidade dos atos
de concessão de aposentadorias, reformas, transferências para a reserva e
pensões.
O Acórdão 0302/2010
não trata de julgamento de contas públicas, nem de parecer prévio ou de ato de
pessoal. Refere-se a julgamento de Ato Jurídico, integrante de procedimento
licitatório, de que resultou inclusive responsabilização da Pessoa Física.
Data vênia, a Eg.
Corte de Contas atuou em desconformidade com a competência legal que lhe é atribuída
pelas Constituições Federal (art. 71, II, c/c art. 75) e Estadual (art. 59,
II).
O Órgão
Constitucional, a que compete deliberar sobre como o direito deva ser atuado,
que tem judicatura para decidir sobre Atos Jurídicos, é o Poder Judiciário.
O Tribunal de Contas
é órgão vinculado ao Poder Legislativo, sendo suas atribuições vinculadas ao
exercício da função administrativa de Estado, e não jurisdicional. Por
conseguinte, na esfera de sua alçada, cabe-lhe julgar Contas e somente quando
assim proceder, poderá arguir a ilegalidade de ato administrativo vinculado à
Conta; porém, sem se afastar desse limite, sem assumir a função do Judiciário,
de decidir como a lei deva ser atuada.
O presente processo
não envolveu julgamento de conta pública. Mas, o Tribunal de Contas cometeu Ato
de Julgamento, a respeito de matéria não inserida na competência que lhe atriui
o art. 59, II, da C.E., e o art. 1º, III, da Lei Complementar nº 202, de 2000,
como sói ser a deliberação sobre a juridicidade de “atos jurídicos administrativos”,
de que se originou a imputação de multa e a determinação de anulação de
contrato de concessão.
Por não tratar de
julgamento de Conta Pública, não se configurou condição fática constitucional
que legitime a emissão de decisão, para aplicar multa e determinar a nulidade
de contrato de concessão, pelo Tribunal de Contas.
Cabe este tipo de
deliberação se o Egrégio Plenário julgar Contas (art. 59, II, da C.E.) e
constatar impropriedades inerentes a elas, em função de ilegalidade cometida
por administrador, por responsável pela guarda e aplicação de bens, direitos e
valores públicos, ou por quem tenha dado causa a perda, extravio ou outra
irregularidade resultante em prejuízo ao erário. Não é o caso dos presentes
autos, que se referem a licitação para outorga de concessão de serviços
públicos.
Razão também de se
entender improcedente o embasamento da decisão no art. 29, caput, da LC 202/00,
que diz:
Art. 29. Na
fiscalização de que trata esta seção, o Tribunal de Contas determinará a adoção
de providências com vistas à evitar a ocorrência de irregularidade semelhante,
quando for constatada falta ou impropriedade de caráter formal, que não
caracterize transgressão à norma legal ou regulamentar de natureza contábil,
financeira, orçamentária, operacional e patrimonial.
Este dispositivo, na
LO/TCSC, integra o Título II (Exercício do Controle Externo), Capítulo II
(Fiscalização a cargo do Tribunal), Seção IV (Fiscalização de atos e
contratos). Portanto, não deve ser interpretada isoladamente, mas segundo os fins
teleológicos da Lei Orgânica, em sua harmonia com o art. 59, da Constituição
Estadual. Logo, é aplicável tão-somente quando o Tribunal de Contas exerce sua
função constitucional de julgar contas públicas, em que não se inclui
julgamento de procedimento licitatório e contratual atinente a concessão de
serviço público.
Lembre-se, outrossim,
os termos do art. 113, § 2º, da Lei nº 8.666/93:
Art. 113 – O controle
das despesas decorrentes dos contratos e demais instrumentos regidos por esta
Lei será feito pelo Tribunal de Contas competente, na forma da legislação
pertinente, ficando os órgãos interessados da Administração responsáveis pela
demonstração da legalidade e regularidade da despesa e execução, nos termos da
Constituição e sem prejuízo do sistema de controle interno nela previsto.
§ 2º - Os Tribunais
de Contas e os órgãos integrantes do sistema de controle interno poderão
solicitar para exame, até o dia útil imediatamente anterior à data de
recebimento das propostas, cópia do edital de licitação já publicado,
obrigando-se os órgãos ou entidades da Administração interessada à adoção de
medidas corretivas pertinentes que, em função desse exame, lhes forem
determinadas.
A orientação
finalística da norma está em seu caput; refere-se a demonstração da legalidade
e regularidade da despesa. Não trata de concessão.
Outrossim, a
abrangência da capacidade delegada aos Tribunais de Contas, no § 2º do art.
113, estende-se à solicitação de cópia do edital de licitação e à obrigação de
órgãos ou entidades de adotarem medidas corretivas determinadas, decorrentes do
exame do edital. Não confere poder legal às Cortes de Contas de determinar a
anulação de contrato por suposta impropriedade do edital.
Legalidade do
Contrato
15. Baseou-se a
deliberação do Eg. Plenário, de determinar a anulação do contrato, no art. 49,
§ 2º, da Lei nº 8.666/93, segundo o qual “a nulidade do procedimento
licitatório induz à do contrato”.
Entretanto, não está
comprovado, nos autos, que os itens 4.1.2 e 4.1.2.1 do Edital contêm vício de
nulidade, possível de gerar a ilegalidade da licitação e, em razão disto,
constituir determinante de nulidade do contrato.
Citadas regras não
foram objeto de impugnação administrativa, nem a Justiça assim os declarou.
Toda a licitação foi
realizada tendo por parâmetro a obediência das especificações constantes destes
itens; e os licitantes apresentaram suas propostas em conformidade com as
especificações destes itens.
16. Após a assinatura
do Contrato SAF 136/2002 (embora no mesmo dia), através do Ofício 105/2002 (de
fls. 545), a Secretaria Municipal do Interior, Assuntos Estratégicos e
Desenvolvimento autorizou a concessionária a utilizar ônibus de 02 portas.
Isto, porém, não
afetou a natureza das regras licitatórias, até porque – como já esclarecido
anteriormente – os ônibus possuírem 03 ou 02 portas é detalhe menor, em se
tratando de contrato de concessão de transporte coletivo urbano de passageiros,
ao contrário do que seria, se fosse para a Prefeitura contratar a compra de
ônibus.
As alegações de que a
Prefeitura se contradisse, ou entendeu inútil a exigência de ônibus com três
portas, não decorreu de afirmação do Poder Público Municipal, mas de ilação da
Diretoria de Controle de Licitações e Contratações.
A razão de os itens
4.1.2 e 4.1.2.1 não constituem cláusulas restritivas – tese construída pela DLC
(porém, não comprovadas com base na realidade operacional da concessão
outorgada) está arrazoada, nos tópicos 5 a 11, deste recurso. Ratificam-se
inteiramente seus termos.
É infundada e
inconsistente a motivação proposta pela Diretoria de Controle, na defesa de sua
tese de a especificação de 03 portas, para os ônibus a usar, ter configurado
exigência restritiva à participação de interessados, na licitação. Em momento
algum, demonstrou cabalmente este fato; buscou “firmar convicção” (expressão
que usou) apenas no vigor de adjetivos empregados em suas frases, cuja análise
mais consentânea com a realidade dos fatos permite verificar sua total
improcedência – como demonstrou o Recorrente.
Entretanto, esse
arrazoado da DLC foi base para a determinação de anulação do Contrato de
Concessão, em tela, conforme o Item 6.3, do Acórdão nº 0302/2010, embora –
repete-se – a real falta de importância para o resultado do julgamento da
Concorrência nº 047/2002, bem como para o contrato de concessão, que os ônibus
a utilizar tivessem duas ou três portas.
Daí, a inconformidade
do Recorrente, em relação ao Acórdão nº 0302/2010, cuja sustentação baseou-se
nas ilações hipotéticas da Diretoria de Controle de Licitações e Contratações,
do que ela considerou poderia ter acontecido, porém sem nada provar, até não
demonstrando firmeza no que propôs, a ponto de ressalvar, com a expressão
“salvo melhor juízo” (fls. 905), sua tese de a exigência de 03 portas, para a
frota de ônibus, frustrar o caráter competitivo da licitação.
III – Do Pedido
Considerando o
exposto e fundamentado nos arts. 79 e 80 da L.C. nº 202, de 15-12-2000, c/c o
parágrafo único do art. 139 do RI/TCSC, aprovado pela Res. Nº 06/2001, de
03-12-2001, REQUER a esse Colendo Tribunal Pleno sejam conhecidas as razões de
defesa acima enunciadas, para, reexaminando o Acórdão nº 0991/2004, considerar
insubsistentes:
a) as razões que
levaram à multa, aplicada nos termos do Item 6.2, da decisão recorrida,
determinando o seu cancelamento, com o reconhecimento de que as disposições dos
itens 4.1.2 e 4.1.2.1, do Edital de Concorrência nº 047/2002, não configuraram
cláusula restritiva à participação de interessados, na licitação;
b) a motivação de que
decorreu a determinação de anulação do Contrato SAF nº 136/2002, pela
Prefeitura Municipal de Gaspar.”
A Consultoria Geral elaborou
o Parecer Técnico de fls. 30-48, concluindo:
“3.1. Conhecer do
Recurso de Reexame interposto nos termos do art. 80 da Lei Complementar nº 202,
de 15 de dezembro de 2000, contra o Acórdão nº 0302/2010, exarado na Sessão
Ordinária de 17 de maio de 2010, nos autos do Processo nº DEN 03/07452760, e no
mérito dar provimento para:
3.1.1. Anular a
Deliberação Recorrida.
3.2. Encaminhar os
presentes autos à Diretoria de Controle de Licitações e Contratações para que
apure a possível irregularidade do ato que alterou o contrato de concessão, com
a necessária citação da autoridade que tomou dita decisão, ou seja, que expediu
o ofício nº 0105/2002 autorizando a redução do número de portas (fls. 545 dos
autos DEN 03/07452760).
3.3. Dar ciência da
Decisão, ao Sr. Pedro Celso Zuchi, à Prefeitura Municipal de Gaspar, ao Sr.
Jair Bogo, autor da denúncia e, ao Ministério Público do Estado de Santa
Catarina, em face do item 6.4 do Acórdão recorrido.”.
É o relatório.
A sugestão
da Consultoria Técnica, pelo conhecimento do Recurso de Reexame, merece ser
acolhida, tendo em vista preencher os requisitos de admissibilidade.
Especificamente
quanto à tempestividade, a Decisão recorrida foi publicada no DOTC nº. 508 de
31-05-2010 (segunda-feira), e o
Caminhou
bem a COG ao examinar as preliminares apresentadas pelo recorrente.
Não
vislumbro, porém, a necessidade e a possibilidade de acolher a
O
Não me
parece relevante rediscutir uma previsão editalícia restritiva, apenas porque a
materialização dela deu-se a posteriori,
na fase de execução contratual. Se o Município necessitava de veículos de duas
portas não havia razão para licitar com três. A verdadeira necessidade restou
plenamente caracterizada, já que antes mesmo de iniciar a execução contratual a
mudança de requisitos já se concretizava. Cada exigência inútil no certame
caracteriza por si só restrição injustificável.
O
É pertinente, porém, a sugestão da
COG no sentido de se promover o desapensamento do processo RPA 07/00528083, já
que o mesmo não teve o seguimento pretendido nos autos ora analisados.
Ante o exposto, o Ministério Público
junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108,
inciso II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se:
1)
2) No
3) Pelo desapensamento do processo RPA 07/00528083, para que o feito siga
seu curso processual.
4) Pela comunicação da
Florianópolis, 14 de outubro de 2011.
Diogo
Roberto Ringenberg