PARECER
nº: |
MPTC/5423/2011 |
PROCESSO
nº: |
PCP 11/00096571 |
ORIGEM: |
Prefeitura Municipal de Navegantes |
RESPONSÁVEL: |
Roberto Carlos de Souza |
ASSUNTO: |
Prestação de Contas do Prefeito - Exercício de
2010 |
01. DO
RELATÓRIO
O presente
processo refere-se a Prestação de Contas do Prefeito Municipal de Navegantes,
relativa ao exercício de 2010, prestadas em cumprimento ao disposto no Artigo
51 da Lei Complementar nº. 202/2000.
02. DA
INSTRUÇÃO
A análise das
contas pelo corpo Técnico da Diretoria de Controle dos Municípios - DMU abrange
o Balanço Anual do exercício financeiro de 2010, bem como as informações dos
registros contábeis e de execução orçamentária, enviadas por meio
informatizado.
Após exame
acurado das informações prestadas pela Unidade Gestora, a Instrução elaborou o
Relatório nº. 4.655/2011, conforme registro às fls. 1292 - 1323, que concluiu
por apontar as seguintes restrições para efeito de emissão de Parecer Prévio
pelo Egrégio Tribunal Pleno:
I – DO PODER EXECUTIVO:
I-A. RESTRIÇÕES DE ORDEM
LEGAL:
A.1. Despesas com
pessoal do Poder Executivo no valor de R$ 50.662.387,89, representando R$
54,14% da Receita Corrente Líquida (R$ 93.569.784,43), quando o percentual
legal máximo de 54,00% representaria gastos da ordem de R$ 50.527.683,59,
configurando, portanto, gasto a maior de R$ 134.704,30 ou 0,14%, em
descumprimento ao artigo 20, III, “b” da Lei Complementar nº 101/2000,
ressalvado o disposto no artigo 23 da citada Lei;
A.2. Ausência de
abertura de crédito adicional no primeiro trimestre de 2010 e,
consequentemente, não evidenciação da realização de despesa com os recursos do
FUNDEB remanescentes do exercício anterior no valor de R$ 72.172,64, em
descumprimento ao estabelecido no § 2º do artigo 21 da Lei nº 11.494/2007;
A.3. Atraso na remessa
do Relatório de Controle Interno referente ao 1º bimestre, em desacordo aos
artigos 3º e 4º da Lei Complementar nº 202/2000 c/c artigo 5º, § 3º da
Resolução TC-16/94, alterada pela Resolução TC – 11/2004;
A.4. Registro dos
informes de Despesas do FUNDEB, via sistema e-Sfinge, nas fontes de Recursos 18
e 19, no valor de R$ 20.824.509,68, em relação ao saldo financeiro de
31/12/2010 (R$ 26.704,62), a maior que o apurado (R$ 20.597.201,77),
evidenciando uma diferença de R$ 227.307,91, demonstrando fragilidade no
controle contábil da referida conta, em desconformidade com o disposto nos
artigos 3º e 4º da Lei Complementar nº 202/2000 e o artigo 85 da Lei Federal nº
4.320/64.
Em 07 de outubro
de 2011, o Processo foi encaminhado para este Ministério Público junto ao
Tribunal de Contas do Estado para competente manifestação.
03. DA
PROCURADORIA
O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado, na sua
missão constitucional e legal de guarda da lei e fiscal de sua execução,
regrada nas Constituições Federal e Estadual e na Lei Complementar Estadual nº.
202/2000, analisando o Relatório de Instrução, constatou que o Município de
Navegantes, no exercício de 2010:
a)
Aplicou
pelo menos 15% das receitas produto de impostos, inclusive transferências, em
Ações e Serviços Públicos de Saúde, conforme exigido no artigo 77, III, e § 4º
do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias;
b)
Aplicou
pelo menos 25% das Receitas Resultantes de Impostos em Manutenção e
Desenvolvimento do Ensino, conforme exige o artigo 212 da Constituição Federal;
c)
Aplicou,
pelo menos, 60% dos recursos recebidos do FUNDEB na remuneração dos
profissionais do magistério, conforme exige o artigo 60, XII, do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias c/c artigo 22 da Lei n°. 11.494/2007;
d)
Aplicou
pelo menos, 95% dos recursos recebidos do FUNDEB em despesas com Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica, conforme exige o artigo 21 da Lei n°.
11.494/2007;
e)
Os gastos
com pessoal do Município ficaram abaixo do limite máximo de 60% da Receita
Corrente Líquida, conforme exigido pelo artigo 169 da Constituição federal c/c
o artigo 19, III da Lei de Responsabilidade Fiscal;
f)
Os gastos
com pessoal do Poder Executivo no exercício em exame, superaram o limite máximo
de 54% da Receita Corrente Líquida, em descumprimento ao disposto pelo artigo
20, III da Lei de Responsabilidade Fiscal;
g)
Os gastos
com pessoal do Poder Legislativo no exercício em exame, ficaram abaixo do
limite máximo de 6% da Receita Corrente Líquida, conforme exigido pelo artigo 20,
III da Lei de Responsabilidade Fiscal;
h) O Resultado Orçamentário demonstra superávit financeiro do exercício
anterior.
i) O Balanço Anual Consolidado demonstra adequadamente a posição
financeira, orçamentária e patrimonial, não apresentando divergências relevantes
entre as peças que o compõem.
Denota-se
que a Unidade Gestora aplicou corretamente os percentuais enumerados na Carta
Magna e legislação infraconstitucional. Restaram, contudo, restrições de ordem
legal, eivadas de incorreções procedimentais, as quais este Órgão Ministerial
passa a analisar:
I – DESPESAS COM PESSOAL
A.1. Despesas com
pessoal do Poder Executivo no valor de R$ 50.662.387,89, representando R$
54,14% da Receita Corrente Líquida (R$ 93.569.784,43), quando o percentual
legal máximo de 54,00% representaria gastos da ordem de R$ 50.527.683,59,
configurando, portanto, gasto a maior de R$ 134.704,30 ou 0,14%, em
descumprimento ao artigo 20, III, “b” da Lei Complementar nº 101/2000,
ressalvado o disposto no artigo 23 da citada Lei;
A
Lei de Responsabilidade Fiscal descreve dispositivos que delimitam as despesas
com pessoal em relação à receita corrente líquida, estabelecendo limite global
de 54% ao executivo municipal.
Tal
limitação decorre da excessiva carga com despesa de pessoal, um dos principais
fatores de dispêndio de recursos no setor público do país. O seu descontrole
pode acarretar consequências extremamente negativas à administração pública.
Portanto,
imprescindível a necessidade de impedir que essa despesa sobreponha o limite
legal.
A
LRF disciplina que “se a despesa total com pessoal, do Poder ou órgão referido no art. 20,
ultrapassar os limites definidos no mesmo artigo, sem prejuízo das medidas
previstas no art. 22, o percentual
excedente terá de ser eliminado nos dois quadrimestres seguintes, sendo
pelo menos um terço no primeiro, adotando-se, entre outras, as providências
previstas nos §§ 3º e 4o do art. 169 da Constituição”.
Desta forma, deve a Unidade
Gestora adotar providências visando sanar tal irregularidade.
II – NÃO ABERTURA DE CRÉDITO
ADICIONAL NO 1º TRIMESTRE
- Ausência de abertura de
crédito adicional no primeiro trimestre de 2010 e, consequentemente, não
evidenciação da realização de despesa com os recursos do FUNDEB remanescentes
do exercício anterior no valor de R$ 72.172,64, em descumprimento ao
estabelecido no § 2º do artigo 21 da Lei nº 11.494/2007;
A Emenda Constitucional nº 53, de 20 de dezembro de 2006, entre outras
medidas, criou o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de
Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB, como fonte adicional de
financiamento da educação básica.
O objeto primordial é
arrecadar fundos dos Estados e Municípios para posterior aplicação na Educação
Básica Pública, conforme disposto na Lei Federal nº. 11.494/2007.
A lei do FUNDEB
determina que no mínimo 95% dos recursos sejam aplicados no exercício, e a
sobra deve ser aplicada no primeiro trimestre do próximo exercício:
Art. 21 §2º: Até 5%
(cinco por cento) dos recursos recebidos à conta dos Fundos, inclusive
relativos à complementação da União recebidos nos termos do §1º do art. 6º
desta Lei, poderão ser utilizados no 1º (primeiro) trimestre do exercício
imediatamente subsequente, mediante abertura de crédito adicional.
Ressalte-se que
o desenvolvimento do País, assim como a melhoria da qualidade de vida, a consolidação
do processo democrático, e a inclusão social de parcela mais significativa da
população, passam necessariamente por um sistema educacional mais amplo e
eficaz.
A excelência no
ensino está atrelada a vários fatores: melhores instalações, equipamentos,
transporte, merenda e principalmente, profissionais capacitados e bem
remunerados que possam desempenhar seu papel fundamental de educar.
Dessa forma, deve a Unidade
Gestora adotar os procedimentos necessários à abertura de crédito adicional sempre
que houver recursos do FUNDEB
remanescentes do exercício anterior, atendendo o disposto na Lei Federal nº
11.494/2007.
III – CONTROLE INTERNO
- Atraso na remessa do
Relatório de Controle Interno referente ao 1º bimestre, em desacordo aos
artigos 3º e 4º da Lei Complementar nº 202/2000 c/c artigo 5º, § 3º da
Resolução TC-16/94, alterada pela Resolução TC – 11/2004;
Controle, em sentido lato, é
a maneira de manter o equilíbrio na relação existente entre Estado e Sociedade,
fazendo surgir daquele as funções que lhe são próprias, exercidas por meio dos
seus órgãos.
Ao Estado cabe manter
mecanismos de controle das atividades estatais, com o objetivo de resguardar a
própria administração pública e os direitos e garantias coletivos, em
consonância aos princípios da eficiência e eficácia administrativa.
O controle interno visa
assegurar a proteção do patrimônio, exatidão e fidedignidade dos dados
contábeis, eficiência operacional, como meios para alcançar os objetivos
globais da organização.
Para assegurar o cumprimento
de tais preceitos, a Constituição Federal é taxativa em relação ao controle
interno:
Art. 74. Os Poderes Legislativo,
Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle
interno com a finalidade de:
I - avaliar o cumprimento das metas
previstas no plano plurianual, a execução dos programas de governo e dos
orçamentos da União;
II - comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à
eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos
órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos
públicos por entidades de direito privado;
III
- exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como dos
direitos e haveres da União;
IV -
apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional.
(...)
Assim,
para que se torne efetivo o controle interno na Administração Pública, há que
se adotar medidas corretivas ou complementares, a fim de adequar e integrar
toda a estrutura administrativa.
No Manual do Sistema de
Controle Interno do Poder Executivo Federal, exarado pela Secretaria Federal de
Controle Interno por intermédio da Instrução Normativa Nº 01/2001, o controle
interno é abordado da seguinte forma:
Seção VIII – Normas relativas aos controles internos
administrativos:
[...]
2. Controle interno administrativo é o conjunto de
atividades, planos, rotinas, métodos e procedimentos interligados,
estabelecidos com vistas a assegurar que os objetivos das unidades e entidades
da administração pública sejam alcançados, de forma confiável e concreta,
evidenciando eventuais desvios ao longo da gestão, até a consecução dos
objetivos fixados pelo Poder Público. (SFC 2001, p.67)
Emerge,
para tanto, a necessidade de se efetuar o controle interno em qualquer esfera de
poder, objetivando resguardar e evitar a ocorrência de impropriedades e
possíveis irregularidades.
Nesse sentido,
deve a Unidade Gestora encaminhar os Relatórios de Controle Interno no prazo
previsto na legislação pertinente à matéria.
IV – DIVERGÊNCIAS
CONTÁBEIS
- Registro dos informes de Despesas do FUNDEB,
via sistema e-Sfinge, nas fontes de Recursos 18 e 19, no valor de R$
20.824.509,68, em relação ao saldo financeiro de 31/12/2010 (R$ 26.704,62), a
maior que o apurado (R$ 20.597.201,77), evidenciando uma diferença de R$
227.307,91, demonstrando fragilidade no controle contábil da referida conta, em
desconformidade com o disposto nos artigos 3º e 4º da Lei Complementar nº
202/2000 e o artigo 85 da Lei Federal nº 4.320/64.
O art. 85 da Lei
Federal nº. 4.320/64 determina que os serviços de contabilidade devem ser
organizados de maneira que permitam o acompanhamento da execução orçamentária,
o conhecimento da composição patrimonial, a determinação dos custos dos
serviços industriais, o levantamento dos balanços gerais, a análise e a
interpretação dos resultados econômicos e financeiros.
O Professor Francisco G. L.
Mota conceitua Contabilidade Pública:
A Contabilidade Pública é o ramo da Ciência
Contábil que aplica na administração pública as técnicas de registro dos atos e
fatos administrativos, apurando resultados e elaborando relatórios periódicos,
levando em conta as normas de Direito Financeiro (Lei 4.320/64), os princípios
de finanças públicas e os princípios de contabilidade. (Dissertação sobre Consolidação de Balanços
Públicos. Análise Empírica da Conformidade dos Balanços Estaduais-União no ano
de 2003. p. 190 Brasília 2004).
A Lei nº 4.320/64 define
como objetivo da Contabilidade Pública “Evidenciar perante a Fazenda Pública a
situação de todos quantos, de qualquer modo, arrecadem receitas, efetuem
despesas, administrem ou guardem bens a ela pertencentes ou confiados”.
Analisando as
inconsistências contábeis acima anotadas, cabe salientar que apesar de
afrontarem a legislação vigente, não interferem significativamente na posição
financeira, orçamentária e patrimonial do exercício de 2010.
Desta forma, a Prefeitura
Municipal de Navegantes deve obediência às normas gerais de escrituração
aplicadas à contabilidade pública e aos resultados gerais do exercício
demonstrados nos Balanços, dispostas na Lei nº 4.320/64.
V
- DO FUNDO MUNICIPAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (FIA)
A Constituição Federal
prestigia a defesa dos direitos da criança e do adolescente, especialmente a
partir da adoção expressa do princípio da prioridade absoluta, constante de seu
art. 227, caput, in verbis:
Art.
227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao
adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão.
E como forma de efetivar
tais garantias, a Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) prevê
a criação de Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente e a
manutenção de Fundos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente,
conforme se lê no art. 88 do referido diploma legal:
Art. 88. São diretrizes da política de
atendimento:
II - criação de conselhos municipais,
estaduais e nacional dos direitos da criança e do adolescente, órgãos
deliberativos e controladores das ações em todos os níveis, assegurada a
participação popular paritária por meio de organizações representativas,
segundo leis federal, estaduais e municipais;
IV - manutenção de fundos nacional,
estaduais e municipais vinculados aos respectivos conselhos dos direitos da
criança e do adolescente;
O Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA) e a Resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e
do Adolescente (CONANDA) nº 105/2005 regram a atuação do Fundo, com o objetivo
de assegurar ações de atendimento a crianças e adolescentes em áreas
prioritárias por meio de receita vinculada aos seus objetivos e a sua
finalidade, sendo a forma de aplicação dos recursos determinada pelos Conselhos
Municipais.
Neste sentido, é
necessária a elaboração do Plano de Ação e a posterior aprovação do Plano de
Aplicação para operacionalizar a atuação do referido Fundo.
Analisando o caso em tela,
observa-se que a despesa do Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do
Adolescente (Unidade Orçamentária) representa 0,05% da despesa total realizada
pela Prefeitura Municipal.
A nominata e os atos de
posse dos Conselheiros do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do
Adolescente estão devidamente acostados aos autos.
A remuneração dos
Conselheiros Tutelares foi arcada pela Prefeitura Municipal.
Verifica-se, no entanto,
que a Unidade Gestora não encaminhou os Planos de Ação e de Aplicação,
caracterizando descumprimento ao disposto no art. 260, § 2º, do ECA e art. 1º,
da Resolução do CONANDA nº 105/2005.
Nesse sentido, deve a
Prefeitura Municipal de Navegantes adotar as medidas necessárias visando
corrigir as incorreções acima anotadas.
4. CONCLUSÃO
Analisando ainda, a gestão
orçamentária, financeira e patrimonial constante do Relatório Técnico da
DMU/TCE, entendemos que o Balanço Geral do Município de Navegantes representa
de forma adequada a posição
financeira, orçamentária e patrimonial, assim como não há registro de fatos
relevantes que possam comprometer os princípios fundamentais da contabilidade
aplicados a administração pública.
Ante o exposto, concluo sugerindo que o eminente
Relator possa propor ao Egrégio Tribunal Pleno, que recomende à Câmara
Municipal, a APROVAÇÃO das contas do exercício de 2010 da Prefeitura
Municipal de Navegantes, com fundamento nos artigos 53 e 54 da Lei Complementar
nº. 202/2000.
Florianópolis,
17 de outubro de 2011.
MAURO ANDRÉ FLORES PEDROZO
Procurador-Geral
Ministério Público junto
ao Tribunal de Contas