PARECER
nº: |
MPTC/5968/2011 |
PROCESSO
nº: |
PCP 11/00062758 |
ORIGEM: |
Prefeitura Municipal de Xanxerê |
RESPONSÁVEL: |
Bruno Linhares Bortoluzzi |
ASSUNTO: |
Prestação de Contas do Prefeito - Exercício de
2010 |
01. DO
RELATÓRIO
O presente
processo refere-se a Prestação de Contas do Prefeito Municipal de Xanxerê,
relativa ao Exercício de 2010, em cumprimento ao disposto no Artigo 51 da Lei
Complementar nº. 202/2000.
02. DA
INSTRUÇÃO
A análise das
contas pelo corpo Técnico da Diretoria de Controle dos Municípios - DMU abrange
o Balanço Anual do exercício financeiro de 2010, bem como as informações dos
registros contábeis e de execução orçamentária, enviadas por meio
informatizado.
Após exame
acurado das informações prestadas pela Unidade Gestora, a Instrução elaborou o
Relatório nº 4.832/2011, conforme registro às fls. 426 – 456, que concluiu por
apontar as seguintes restrições para efeito de emissão de Parecer Prévio pelo
Egrégio Tribunal Pleno:
I – RESTRIÇÃO DE ORDEM
CONSTITUCIONAL:
I.1. Abertura de Créditos
Adicionais Suplementares, no montante de R$ 180.000,00, Decreto nº BLB
290/2010, de 06/10/2010, do Fundo Municipal de Habitação, por conta da
transposição ou remanejamento de recursos, sem prévia autorização legislativa
específica, em desacordo com o disposto no artigo 167, V e VI da C/88.
II – RESTRIÇÃO DE ORDEM
LEGAL
II.1. Atraso na remessa
do Relatório de Controle Interno referente ao 1º e 2º bimestres, em desacordo
aos artigos 3º e 4º da Lei Complementar nº 202/2000 c/c artigo 5º, § 3º da
Resolução TC-16/94, alterada pela Resolução TC – 11/2004;
Em 11 de outubro
de 2011, o Processo foi encaminhado para este Ministério Público junto ao
Tribunal de Contas do Estado para competente manifestação.
03. DA
PROCURADORIA
O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado, na sua
missão constitucional e legal de guarda da lei e fiscal de sua execução,
regrada nas Constituições Federal e Estadual e na Lei Complementar Estadual nº.
202/2000, analisando o Relatório de Instrução, constatou que o Município de
Xanxerê, no exercício de 2010:
a)
Aplicou
pelo menos 15% das receitas produto de impostos, inclusive transferências, em
Ações e Serviços Públicos de Saúde, conforme exigido no artigo 77, III, e § 4º
do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias;
b)
Aplicou
pelo menos 25% das Receitas Resultantes de Impostos em Manutenção e
Desenvolvimento do Ensino, conforme exige o artigo 212 da Constituição Federal;
c)
Aplicou,
pelo menos, 60% dos recursos recebidos do FUNDEB na remuneração dos
profissionais do magistério, conforme exige o artigo 60, XII, do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias c/c artigo 22 da Lei n°. 11.494/2007;
d)
Aplicou
pelo menos, 95% dos recursos recebidos do FUNDEB em despesas com Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica, conforme exige o artigo 21 da Lei n°.
11.494/2007;
e)
Os gastos
com pessoal do Município ficaram abaixo do limite máximo de 60% da Receita
Corrente Líquida, conforme exigido pelo artigo 169 da Constituição federal c/c
o artigo 19, III da Lei de Responsabilidade Fiscal;
f)
Os gastos
com pessoal do Poder Executivo no exercício em exame ficaram abaixo do limite
máximo de 54% da Receita Corrente Líquida, conforme exigido pelo artigo 20, III
da Lei de Responsabilidade Fiscal;
g)
Os gastos
com pessoal do Poder Legislativo no exercício em exame ficaram abaixo do limite
máximo de 6% da Receita Corrente Líquida, conforme exigido pelo artigo 20, III
da Lei de Responsabilidade Fiscal;
h)
O
resultado financeiro do exercício foi bom, apresentando superávit na ordem de R$ 2.335.692,51, em
observância ao princípio do equilíbrio de caixa exigido pelo artigo 48, “b” da
Lei 4.320/64 e artigo 1º, § 1º da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Denota-se
que a Unidade Gestora aplicou corretamente os percentuais enumerados na Carta
Magna e legislação infraconstitucional. Restaram, contudo, restrições de ordem
constitucional e legal, eivadas de incorreções procedimentais, as quais este
Órgão Ministerial passa a analisar:
I – RESTRIÇÃO DE ORDEM
CONSTITUCIONAL:
- Abertura de Créditos
Adicionais Suplementares, no montante de R$ 180.000,00, Decreto nº BLB
290/2010, de 06/10/2010, do Fundo Municipal de Habitação, por conta da
transposição ou remanejamento de recursos, sem prévia autorização legislativa
específica, em desacordo com o disposto no artigo 167, V e VI da C/88.
A Prefeitura
Municipal de Xanxerê anulou dotação orçamentária no montante de R$ 180.000,00
para suplementar outra insuficientemente provida, sem autorização legislativa
específica, baseando-se somente, na autorização genérica, constante na Lei
Orçamentária do Município.
Os créditos
adicionais suplementares abertos com base na autorização concedida na própria
lei orçamentária e com fundamento em aporte de recursos oriundos de anulação
parcial ou total de dotações orçamentárias só podem ocorrer quando se tratar de
deslocamento de recursos dentro do mesmo órgão e da mesma categoria de
programação.
Pelo princípio da proibição de estorno de verbas, é vedada a
transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria
de programação para outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização
legislativa.
A Corte de
Contas, pelo Prejulgado nº 522/1998, assim declina sobre a matéria:
A transposição, o
remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria de programação
para outra, ou de um órgão para outro, só pode ocorrer quando previamente
autorizados por lei, consoante dispõe o
artigo 167, inciso VI, da CF.
A Decisão
Normativa TC-06/2008 estabelece as restrições que poderão ensejar a rejeição
das contas prestadas pelo Prefeito, conforme se depreende do art. 9, in verbis:
Art. 9º As
restrições que podem
ensejar a emissão
de Parecer Prévio com
recomendação de rejeição
das contas prestadas
pelo Prefeito, dentre
outras, compõem o
Anexo I, integrante
desta Decisão Normativa,
em especial as seguintes:
(...)
IV – ORÇAMENTO (CRÉDITOS ORÇAMENTÁRIOS E
ADICIONAIS) - Transposição, Remanejamento
ou Transferências de
Recursos de uma categoria
de programação para
outra ou de um
órgão para outro
sem prévia autorização
legislativa (Constituição Federal, art. 167, VI).
Portanto,
impreterível a autorização legislativa específica para Abertura de Créditos
Adicionais Suplementares por conta de transposição, remanejamento ou a
transferência de recursos, em atenção ao disposto no art. 167, V e VI, da
Constituição Federal.
Resta claro que, comprovada a
irregularidade, a manifestação pela rejeição das contas deve ser a consequência
natural. Todavia, precedente a essa conclusão, é imprescindível cientificar o
responsável, apontando a irregularidade e oportunizando sua manifestação, em
homenagem ao princípio constitucional do contraditório e da ampla defesa.
Importante frisar que, da ciência do
gestor, poderão advir justificativas que apontem, inclusive, para a não
existência da irregularidade. Motivo suficiente para que seja oportunizado o
direito de defesa, sem o risco de se manter apontamentos gravosos no parecer
prévio, ensejando possível rejeição das contas.
Nesse sentido, em
observância ao princípio do contraditório e da ampla defesa, este Órgão
Ministerial opina pela CITAÇÃO
do responsável para que, em querendo, apresente justificativas e
esclarecimentos acerca da irregularidade acima anotada.
II – CONTROLE INTERNO
- Atraso na remessa do
Relatório de Controle Interno referente ao 1º e 2º bimestres, em desacordo aos
artigos 3º e 4º da Lei Complementar nº 202/2000 c/c artigo 5º, § 3º da
Resolução TC-16/94, alterada pela Resolução TC – 11/2004;
Controle, em sentido lato, é
a maneira de manter o equilíbrio na relação existente entre Estado e Sociedade,
fazendo surgir daquele as funções que lhe são próprias, exercidas por meio dos
seus órgãos.
Ao Estado cabe manter
mecanismos de controle das atividades estatais, eivados da necessidade de se
resguardar a própria administração pública e os direitos e garantias coletivos,
em consonância aos princípios da eficiência e eficácia administrativa.
O controle interno visa
assegurar à proteção do patrimônio, exatidão e fidedignidade dos dados
contábeis, eficiência operacional, como meios para alcançar os objetivos
globais da organização.
Para assegurar o cumprimento
de tais preceitos, a Constituição Federal é taxativa em relação ao controle
interno:
Art. 74. Os Poderes Legislativo,
Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle
interno com a finalidade de:
I - avaliar o cumprimento das metas
previstas no plano plurianual, a execução dos programas de governo e dos
orçamentos da União;
II - comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à
eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos
órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos
públicos por entidades de direito privado;
III
- exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como dos
direitos e haveres da União;
IV -
apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional.
(...)
Assim,
para que se torne efetivo o controle interno na Administração Pública, há que
se adotar medidas corretivas ou complementares, a fim de adequar e integrar
toda a estrutura administrativa.
No Manual do Sistema de
Controle Interno do Poder Executivo Federal, exarado pela Secretaria Federal de
Controle Interno por intermédio da Instrução Normativa Nº 01/2001, o controle
interno é abordado da seguinte forma:
Seção VIII – Normas relativas aos controles
internos administrativos:
[...]
2. Controle interno administrativo é o conjunto de
atividades, planos, rotinas, métodos e procedimentos interligados,
estabelecidos com vistas a assegurar que os objetivos das unidades e entidades
da administração pública sejam alcançados, de forma confiável e concreta,
evidenciando eventuais desvios ao longo da gestão, até a consecução dos
objetivos fixados pelo Poder Público. (SFC 2001, p.67)
Emerge,
para tanto, a necessidade de se efetuar o controle interno em qualquer esfera
de poder, objetivando resguardar e evitar a ocorrência de impropriedades e
possíveis irregularidades.
Nesse sentido,
deve a Unidade Gestora encaminhar os Relatórios de Controle Interno no prazo
previsto na legislação pertinente à matéria.
IV
- DO FUNDO MUNICIPAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (FIA)
A Constituição
Federal prestigia a defesa dos direitos da criança e do adolescente,
especialmente a partir da adoção expressa do princípio da prioridade absoluta,
constante de seu art. 227, caput, in verbis:
Art. 227. É dever da família, da sociedade
e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta
prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
E como forma de
efetivar tais garantias, a Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do
Adolescente) prevê a criação de Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e
do Adolescente e a manutenção de Fundos Municipais dos Direitos da Criança e do
Adolescente, conforme se lê no art. 88 do referido diploma legal:
Art. 88. São diretrizes da política de
atendimento:
II - criação de conselhos municipais,
estaduais e nacional dos direitos da criança e do adolescente, órgãos deliberativos
e controladores das ações em todos os níveis, assegurada a participação popular
paritária por meio de organizações representativas, segundo leis federal,
estaduais e municipais;
IV - manutenção de fundos nacional,
estaduais e municipais vinculados aos respectivos conselhos dos direitos da
criança e do adolescente;
O Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA) e a Resolução do Conselho Nacional dos Direitos
da Criança e do Adolescente (CONANDA) nº 105/2005 regram a atuação do Fundo,
com o objetivo de assegurar ações de atendimento a crianças e adolescentes em
áreas prioritárias por meio de receita vinculada aos seus objetivos e a sua
finalidade, sendo a forma de aplicação dos recursos determinada pelos Conselhos
Municipais.
Importante
colacionar os Prejulgados desse Tribunal de Contas que tratam da matéria.
Prejulgado
n. 1832:
1. O Fundo de Direitos da Criança e do
Adolescente, instituído em cada ente da Federação, tem por objetivo receber
recursos e realizar despesas para a consecução dos objetivos pretendidos pelo
art. 227 da Constituição da República e pela Lei nº 8.069/90 - Estatuto da
Criança e do Adolescente.
2. O Conselho dos Direitos da Criança e do
Adolescente é órgão paritário, com metade de seus membros representantes do
Poder Público e a outra metade da sociedade civil, instituído em cada ente da
Federação, com o objetivo de proporcionar condições de implementação dos
direitos e garantias das crianças e dos adolescentes, devendo, além de outras
atribuições, gerir o Fundo de Direitos da Criança e do Adolescente.
3. Os recursos do Fundo de Direitos da
Criança e do Adolescente devem ser empregados exclusivamente em programas,
projetos e atividades de proteção sócio-educativos voltados ao atendimento da
criança e do adolescente.
4. A definição das despesas que podem ser
custeadas com recursos do Fundo de Direitos da Criança e do Adolescente cabe ao
seu gestor, a quem compete avaliar, no momento da autorização da despesa, se o
objeto do gasto está inserido nos programas, projetos e atividades de proteção
sócio-educativos voltados ao atendimento da criança e do adolescente, bem como
se está em conformidade com os critérios de utilização dos recursos do Fundo
fixados pelo Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente.
Prejulgado
n. 1681:
1. Conforme o disposto no § 2º do art. 260
da Lei nº 8069/90 - Estatuto da Criança e do Adolescente, os critérios de
utilização dos recursos do fundo, tanto daqueles oriundos de doações ou
deduções do imposto de renda, quanto dos provenientes de repasses de entes
públicos, devem ser fixados pelo Conselho dos Direitos da Criança e do
Adolescente, através de plano de aplicação.
2. A administração dos recursos é tarefa
exercida pelo órgão público designado pelo Chefe do Poder Executivo para a
execução orçamentária e contábil do fundo.
3. O Conselho vai dizer o quanto de
recursos será destinado para tal programa de atendimento e o órgão público irá
proceder à liberação e ao controle dos valores dentro das normas legais e
contábeis.
Analisando o caso
em tela, observa-se que a despesa do Fundo Municipal dos Direitos da Criança e
do Adolescente (Unidade Orçamentária) representa 0,37% da despesa total
realizada pela Prefeitura Municipal.
A nominata e os
atos de posse dos Conselheiros do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e
do Adolescente estão devidamente acostados aos autos.
A Unidade Gestora
não encaminhou os Planos de Ação e Aplicação, em descumprimento ao disposto no
art. 260, § 2º, do ECA e art. 1º, da Resolução do CONANDA n. 105/2005.
Verifica-se, ainda, que a
remuneração dos Conselheiros Tutelares foi arcada pelo Fundo Municipal da
Infância e Adolescência, vedado expressamente pelo art. 16, da Resolução
CONANDA n. 137/2010.
Tal prática caracteriza
desvirtuamento dos objetivos atrelados à formação do referido fundo, o que
prejudica a concretização de ações concretas voltadas à efetiva proteção da
criança e do adolescente, além de configurar violação ao princípio
constitucional da proteção integral previsto no art. 227, caput, da CF/88.
Considerando que tal
incorreção não está inserida no rol de restrições passíveis de acarretar a
rejeição das contas municipais, mas que, todavia, reveste-se de gravidade
suficiente para, uma vez comprovada, carrear em sanções aos responsáveis, opino pela autuação em apartado e
realização de auditoria, objetivando averiguar possíveis irregularidades
vinculadas ao FIA do Município de Xanxerê.
4. CONCLUSÃO
Ante o exposto, concluo sugerindo que o eminente
Relator possa propor ao Egrégio Tribunal Pleno, que recomende à CITAÇÃO do
responsável, para que se manifeste especificamente acerca da Abertura
de Créditos Adicionais Suplementares por
conta da transposição ou remanejamento de recursos, sem prévia autorização
legislativa específica.
Florianópolis,
10 de novembro de 2011.
MAURO ANDRÉ FLORES PEDROZO
Procurador-Geral
Ministério Público junto
ao Tribunal de Contas