PARECER nº: |
MPTC/6002/2011 |
PROCESSO nº: |
REP
10/00586046 |
UN GESTORA: |
Prefeitura
Municipal de Joinville |
INTERESSADOS: |
Odir Nunes da
Silva e outros |
ASSUNTO: |
Irregularidades
no contrato n. 208/2010, para prestação de serviços de manutenção e instalação
de equipamentos de iluminação pública com fornecimento de materiais. |
RELATÓRIO
Cuidam os autos de
representação interposta pelos vereadores Odir Nunes da Silva, Juarez Nicásio
Pereira e Joaquim Alves dos Santos a respeito de supostas irregularidades na
Dispensa de Licitação n. 091/2010 e respectivo contrato emergencial n. 208/2010
da Prefeitura Municipal de Joinville, cujo objeto é a prestação de serviços
técnicos especializados na manutenção e instalação de equipamentos de
iluminação pública, firmado com a empresa Luminapar – Empresa Paranaense de
Iluminação Ltda., com vigência de quatro meses, no valor global de R$
2.000.000,00 (dois milhões de reais).
Acompanham a peça
vestibular os documentos de fls. 12 a 277.
Os autos foram
submetidos à análise da Diretoria de Controle de Licitações e Contratações, que
se manifestou por meio de dois relatórios técnicos, um referente aos aspectos
jurídicos da dispensa de licitação, e outro aos de engenharia (fls. 278/292).
Conhecida a
representação, procedeu-se à audiência do Sr. Carlito Mers – Prefeito Municipal
de Joinville e do Sr. Márcio Murilo de Cysne – Secretário de Administração,
para apresentação de defesa quanto aos atos tidos como irregulares.
Demais, foi determinado
aos Responsáveis acima nominados a remessa de documentos visando concretizar a
análise quanto aos aspectos técnicos de engenharia (fls.295).
Devidamente notificados,
os Responsáveis apresentaram defesa em duas vias, porém de igual teor (fls.
330/356).
A DLC se manifestou por
meio dos Relatórios de Reinstrução n. 395/2001 e 596/2011, fls. 356/375.
MÉRITO
Com o objetivo de fundamentar o presente
parecer, passo a analisar individualmente as irregularidades apontadas pelo
Corpo Técnico.
1.
Não enquadramento da hipótese de
dispensa de licitação, nos moldes do art. 24, IV, e 26, parágrafo único, I,
ambos da Lei Federal n. 8.666/93, configurando burla ao procedimento
licitatório, segundo determina o art. 37, XXI, da Constituição Federal.
Apontou a Área Técnica a
falta de caracterização de urgência concreta e efetiva para a realização da
Dispensa de Licitação motivada na emergência, e ainda, que houve desídia e
falta de planejamento de providências por parte do Município.
Para discorrer sobre
esse item, necessário retomar o histórico dos contratos e processos
licitatórios para contratação de manutenção de iluminação pública, realizados
pelo Município.
Constam nos autos as
seguintes informações:
Contrato 448/2003 – CC n. 11/2003 |
Vigência: 24.10.2003 a 24.11.2009 |
Contrato Emergencial 329/2009 |
Vigência: 17.12.2009 a 16.03.2010 |
Edital de Concorrência 398/2009 |
Revogado por força de medida
judicial em 12.03.2010 |
Contrato Emergencial 208/2010 |
Vigência: 13.04.2010 a 12.08.2010 |
Diante dos atos relacionados e sua ordem
cronológica, observa-se que no período que vai de 17.12.2009 a 12.08.2010, a
Administração realizou, por duas vezes, contratação amparada no art. 24, IV,
da Lei n. 8.666/93. É cediço que para esse tipo de contratação
deve restar configurada situação emergencial ou calamitosa, e o risco se
apresentar concreto e efetivo. Nesse sentido, é o teor do Prejulgado 1311 dessa Corte de Contas, in verbis: |
O
Poder Público não poderá dispensar o procedimento licitatório, com fundamento
no art. 24, IV, da Lei Federal n. 8.666/93, sem que esteja plenamente configurada
a situação emergencial ou calamitosa, o risco seja concreto e efetivo e a
contratação afaste o risco iminente detectado. |
Demais, a fim de melhor
definir as hipóteses em que estará o Administrador legitimado a utilizar do
permissivo legal, entendo que em razão de protegerem o interesse público,
deverão estar presentes os seguintes pressupostos:
a)
Situação
emergencial ou calamitosa que não possa ser imputada à desídia do
administrador;
b)
Urgência
de atendimento e
c)
Risco
da ocorrência de sérios danos a pessoas ou bens.
Nesse sentido, colhe-se
da Decisão TCU 347/94-Plenário:
2. responder ao ilustre
Consulente, quanto à caracterização dos casos de emergência ou de calamidade
pública, em tese:
a) que, além da adoção
das formalidades previstas no art. 26 e seu parágrafo único da Lei nº 8.666/93,
são pressupostos da aplicação do caso de dispensa preconizado no art. 24,
inciso IV, da mesma Lei:
a.1) que a situação adversa, dada como de emergência ou de
calamidade pública, não se tenha originado, total ou parcialmente, da falta de
planejamento, da desídia administrativa ou da má gestão dos recursos
disponíveis, ou seja, que ela não possa, em alguma medida, ser atribuída à
culpa ou dolo do agente público que tinha o dever de agir para prevenir a
ocorrência de tal situação;
a.2) que exista urgência
concreta e efetiva do atendimento a situação decorrente do estado emergencial
ou calamitoso, visando afastar risco de danos a bens ou à saúde ou à vida de
pessoas;
a.3) que o risco, além
de concreto e efetivamente provável, se mostre iminente e especialmente
gravoso;
a.4) que a imediata
efetivação, por meio de contratação com terceiro, de determinadas obras,
serviços ou compras, segundo as especificações e quantitativos tecnicamente
apurados, seja o meio adequado, efetivo e eficiente de afastar o risco iminente
detectado.
Acerca da presente
restrição alegam os Responsáveis que a contratação justifica-se em razão da
revogação da Concorrência Pública n. 398/2009, que por sua vez foi motivada
pela decisão constante no Mandado de Segurança n. 038.10.001643-7.
No caso em espécie, o
ente Municipal iniciou Concorrência Pública para contratar os serviços, sem
que, contudo, obtivesse êxito, em razão de deficiência no procedimento,
questionada pelo Poder Judiciário, haja vista a não divulgação no Diário
Oficial do adiamento da abertura do certame.
Como se observa, a
licitação foi interrompida em razão da presença de vício formal, possível de
ser evitado, caracterizando negligência na regularização dos serviços por
fatores afetos às atribuições dos gestores.
Não se pode olvidar que
antes desse episódio, a mesma gestão já havia realizado uma contratação
emergencial (contrato n. 329/2009) sem a presença dos pressupostos legais,
percebendo-se, assim, uma continuidade de atos irregulares.
Assim sendo, alinho-me
ao entendimento da Área Técnica quando conclui que “as contratações diretas
foram ocorrendo devido à falta de planejamento e não adoção, com antecedência
necessária, de providências para a realização de processos licitatórios, com
vistas a concluí-los antes do término dos contratos em vigência.”
2.
Ausência de justificativa do preço
para os lotes I, II e III, em desacordo com o inciso III, parágrafo único, do
art. 26 da Lei Federal n. 8.666/93.
Através do Relatório de
Instrução n. 39/2011 (fl. 291), os auditores questionam a ausência de
comprovação da compatibilidade entre o preço pactuado e o preço de mercado, em
violação aos preceitos legais da Lei n. 8.666/93.
De fato, o art. 26,
parágrafo único, III, do Estatuto Licitatório preconiza que as Dispensas de
Licitação amparadas no art. 24, IV da mesma lei devem ser instruídas com
justificativa do preço, demostrando ser esse compatível com os preços
praticados no mercado; demonstração a qual entendo deva ser feita por meio de
documentos que comprovem que a contratada cotou o menor preço dentre os
apresentados, primando pelos princípios da vantajosidade da licitação e da
economicidade.
Eis o assento do Acórdão
do TCU:
Instrua os processos
de contratação direta segundo os procedimentos estabelecidos no artigo 26,
parágrafo único, da Lei 8.666/1993, de modo que sejam devidamente formalizados
os elementos requeridos pelos incisos I a III desse dispositivo por meio de
expedientes específicos e devidamente destacados no processo, caracterizando a motivação do
administrador para a prática dos atos e juntando-se justificativa de preços
que demonstre, item a item, a adequação dos preços àqueles praticados no
mercado local, assim como parecer jurídico conclusivo que opine inclusive
sobre a adequação dos preços unitários propostos pela entidade selecionada.
(Acórdão 690/2005 TCU - Segunda Câmara).
In casu, não se
vislumbra nos autos nenhum documento capaz de tal comprovação, tampouco foi
apresentada a “cotação de preços” citada no Memorando n. 98/10 acostado à fl.
322, que, segundo o Município, teria servido de fundamento para a escolha da
empresa contratada.
Convém registrar que os
Responsáveis alegam que o valor previsto no Contrato n. 208/2010 foi estimado
em função de gasto mensal médio utilizado nos contratos de iluminação pública
firmados em anos anteriores pela Prefeitura.
Porém, entendo que a justificativa não deve ser considerada,
porquanto, além de, como já destacado, contrariar a legislação citada, observo
que o procedimento adotado apresenta riscos para o contrato, haja vista a
possibilidade de terem ocorrido eventuais alterações no mercado e consequentes
variações nos preços praticados que não seriam, dessa forma, consideradas pelo
Município.
Diante do exposto, opino pela manutenção da restrição.
3.
Ausência das razões para escolha do
fornecedor/prestador de serviços, em desacordo com o art. 26, parágrafo único,
II, da Lei federal n. 8.666/93.
A Diretoria Técnica
assevera que não há nos autos elementos que demonstrem que o fornecedor ou
executante possui capacidade técnica compatível com a complexidade e o porte do
objeto a ser contratado, bem como que atende aos requisitos relacionados à
habilitação jurídica e à qualificação econômico-financeira.
Aduzem os Responsáveis
possuir a empresa Luminapar a qualificação necessária nos moldes exigidos. E
que a escolha também está amparada por pesquisa de preço, realizada com três
empresas do ramo, sendo que a contratada apresentou a melhor proposta.
Porém, não ficaram
comprovadas documentalmente as alegações trazidas aos autos. Destaca-se que as
razões de escolha da contratada deveriam ser juntadas no respectivo processo
administrativo, comprovando-se todos os elementos que caracterizem a capacidade
técnica e a realização de prévia pesquisa de preços.
Com efeito, a jurisprudência
do TCU:
Os processos
de dispensa de licitação devem conter documentos que indiquem a prévia pesquisa
de preços de mercado, em relação ao objeto a ser contratado/adquirido, e a
habilitação do respectivo fornecedor/prestador de serviços. (Acórdão
2.986/2006, 1ª C., rel. Min. Augusto Nardes).
Em qualquer
contratação efetuada com dispensa de licitação, observe, com rigor, o disposto
no art. 26 da Lei nº 8.666/93, de modo que sejam devidamente justificados os
motivos da escolha do fornecedor ou executante e os preços pactuados. (Decisão
n. 30/2000, Plenário, rel. Min. Guilherme Palmeira).
Considerando
a inexistência de comprovação da justificativa para escolha da empresa
contratada, opina-se por não acolher as razões de defesa dos Responsáveis.
4.
Orçamento básico não se configura
propriamente avaliado pela ausência de fundamentação de todos os custos e
quantitativos envolvidos, contrariando o que está previsto nos arts. 7º, §2º,
II e 6º, IX, f, da Lei n. 8.666/93.
Nos termos da
representação relatam os nobres vereadores que o contrato emergencial n.
208/2010 apresenta preço excessivo, principalmente se comparado à proposta de
outra empresa da área – o Consórcio Quantun/Sadenco/Enerconsult S.A..
A DLC ao expor haver
indício de prova nos autos a respeito de um possível sobrepreço no valor do
contrato, que pode resultar em superfaturamento, entendeu necessária a
requisição dos seguintes documentos para melhor análise do fato (fl.279):
5.
Orçamento
básico que deu suporte ao processo de dispensa n. 091/2010, detalhando os
quantitativos, preços unitários e previsão de BDI, com as bases fundamentadas
para a origem dos preços;
6.
Orçamentos
propostos pelos participantes do processo de dispensa, detalhando os
quantitativos, preços unitários e o BDI praticado – BDI aberto;
7.
Orçamento
contratado no contrato anterior n. 329/2009, referente ao processo de dispensa
n. 416/2009, firmado com o Consórcio Quantum/Sadenco/Enerconsult S.A..
Segundo o Corpo Técnico
a solicitação dos referidos documentos servem para analisar o orçamento
elaborado pelo município, bem como os orçamentos constantes no processo de
Dispensa, visando verificar se de fato há sobrepreço na contratação
emergencial.
O município trouxe aos
autos a documentação de fls. 316/327, repetida às fls. 342/353.
A análise que se reporta
aos pontos de engenharia (fls. 359/360), ao verificar as justificativas
apresentadas, concluiu que “o responsável não explica com clareza a avaliação
dos custos envolvidos, uma vez que demonstra as quantidades de forma parcial,
não definindo todos os serviços e materiais envolvidos” E que “o orçamento
básico não se configura propriamente avaliado pela ausência de fundamentação de
todos os custos e quantitativos envolvidos (...)”.
Diante dos argumentos do
Corpo Técnico especializado, bem como do que dos autos consta, esse Órgão
Ministerial acompanha o entendimento exarado pela DLC.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, o
Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência
conferida pelo art. 108 da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se por não
acolher as justificativas dos Responsáveis, com adoção das seguintes medidas:
A) Considerar irregular o Contrato n.
208/2010, em razão das restrições detectadas nos Relatórios de Reinstrução n.
395/2001 e 596/2011, com fundamento no art. 36, §2º da Lei Complementar n.
202/2000;
B) Aplicar multa aos Srs. Carlito Mers
– Prefeito Municipal de Joinville e Márcio Murilo de Cysne – Secretário de
Administração, com fulcro no art. 70 da Lei Complementar n. 202/2000.
Florianópolis,
16 de novembro de 2011.
Procurador-Geral do Ministério
Público
Junto ao Tribunal de Contas