PARECER
nº: |
MPTC/6626/2011 |
PROCESSO
nº: |
PCP 11/00176095 |
ORIGEM: |
Prefeitura Municipal de Guatambu |
RESPONSÁVEL: |
Pedro Borsoi |
ASSUNTO: |
Prestação de Contas do Prefeito referente ao
exercício de 2010 |
01.
DO RELATÓRIO
O presente
processo refere-se a Prestação de Contas do Prefeito Municipal de Guatambu,
relativo ao Exercício de 2010, em cumprimento ao disposto no Artigo 51 da Lei
Complementar nº. 202/2000.
02. DA
INSTRUÇÃO
A análise das
contas pelo corpo Técnico da Diretoria de Controle dos Municípios - DMU abrange
o Balanço Anual do exercício financeiro de 2010, bem como as informações dos
registros contábeis e de execução orçamentária, enviadas por meio
informatizado.
Após acurado
exame das informações prestadas pela Unidade Gestora, a Instrução elaborou o
Relatório nº. 5.961/2011, conforme registro às fls. 640 - 673 que concluiu por
apontar as seguintes restrições para efeito de emissão de Parecer Prévio pelo
Egrégio Tribunal Pleno:
I - RESTRIÇÕES DE ORDEM
LEGAL:
I.1. Despesas com
Manutenção e Desenvolvimento da educação básica no valor de R$ 730.463,95,
equivalendo a 90,48% (menos que 95%) dos recursos do FUNDEB, gerando aplicação
a menor no valor de R$ 36.499,84, em descumprimento ao artigo 21 da Lei nº
11.494/2007;
I.2. Ausência de remessa
do Parecer do Conselho do FUNDEB, em desacordo ao artigo 27, da Lei nº
11.494/2007;
I.3. Divergência, no
valor de R$ 1.879,77, apurada entre a variação do saldo patrimonial financeiro
(R$ 338.877,62) e o resultado da execução orçamentária – Superávit (R$ 326.683,15),
considerando o cancelamento de restos a pagar de R$ 14.074,24, em afronta ao
artigo 102 da Lei nº 4.320/64.
Em 30 de
novembro de 2011, o Processo foi encaminhado para este Ministério Público junto
ao Tribunal de Contas do Estado para competente manifestação.
03. DA
PROCURADORIA
O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado, na sua
missão constitucional e legal de guarda da lei e fiscal de sua execução,
regrada nas Constituições Federal e Estadual e na Lei Complementar Estadual nº.
202/2000, analisando o Relatório de Instrução, constatou que o Município de
Guatambu, no exercício de 2010:
a)
Aplicou
pelo menos 15% das receitas produto de impostos, inclusive transferências, em
Ações e Serviços Públicos de Saúde, conforme exigido no artigo 77, III, e § 4º
do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias;
b)
Aplicou
pelo menos 25% das Receitas Resultantes de Impostos em Manutenção e
Desenvolvimento do Ensino, conforme exige o artigo 212 da Constituição Federal;
c)
Aplicou,
pelo menos, 60% dos recursos recebidos do FUNDEB na remuneração dos
profissionais do magistério, conforme exige o artigo 60, XII, do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias c/c artigo 22 da Lei n°. 11.494/2007;
d)
Não
aplicou 95% dos recursos recebidos do FUNDEB em despesas com Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica, conforme exige o artigo 21 da Lei n°.
11.494/2007;
e)
Os gastos
com pessoal do Município ficaram abaixo do limite máximo de 60% da Receita
Corrente Líquida, conforme exigido pelo artigo 169 da Constituição federal c/c
o artigo 19, III da Lei de Responsabilidade Fiscal;
f)
Os gastos
com pessoal do Poder Executivo no exercício em exame ficaram abaixo do limite
máximo de 54% da Receita Corrente Líquida, conforme exigido pelo artigo 20, III
da Lei de Responsabilidade Fiscal;
g)
Os gastos
com pessoal do Poder Legislativo no exercício em exame ficaram abaixo do limite
máximo de 6% da Receita Corrente Líquida, conforme exigido pelo artigo 20, III
da Lei de Responsabilidade Fiscal;
h)
O
resultado financeiro do exercício foi bom, apresentando superávit na ordem de R$ 523.938,65, em
observância ao princípio do equilíbrio de caixa exigido pelo artigo 48, “b” da
Lei 4.320/64 e artigo 1º, § 1º da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Constata-se que a Unidade
Gestora não aplicou corretamente os percentuais enumerados na legislação
infraconstitucional. Restaram, ainda, demais restrições de ordem legal, eivadas
de incorreções procedimentais, as quais este Órgão Ministerial passa a
analisar:
I – RECURSOS DO FUNDEB
- Despesas com
Manutenção e Desenvolvimento da educação básica no valor de R$ 730.463,95,
equivalendo a 90,48% (menos que 95%) dos recursos do FUNDEB, gerando aplicação
a menor no valor de R$ 36.499,84, em descumprimento ao artigo 21 da Lei nº
11.494/2007;
- Ausência de remessa do
Parecer do Conselho do FUNDEB, em desacordo ao artigo 27, da Lei nº
11.494/2007.
O
Corpo Instrutivo do Tribunal de Contas registra que os recursos do FUNDEB
aplicados pela Unidade Gestora não foram suficientes para atingir o percentual
exigido na Lei nº 11.494/2007.
O
Tribunal de Contas, com o objetivo de oportunizar a manifestação da Prefeitura
Municipal de Guatambu acerca das irregularidades, encaminhou expediente fixando
prazo de 15 dias para apresentação de justificativas.
No intuito de sanar a
irregularidade, o Responsável anexou aos autos, demonstrativo de despesa com a
folha de pagamento dos meses de janeiro a dezembro, realizados por intermédio
de recursos do FUNDEB.
Dessa
forma, suscita o cumprimento do limite estabelecido na Lei nº 11.494/2007.
A
Instrução pondera que o Responsável não comprovou, através de documentos, o
pagamento de despesas com recursos do FUNDEB, pertinentes à manutenção e
desenvolvimento do ensino.
Outrossim,
pelas inconsistências contábeis, não há como identificar quais empenhos foram
pagos com esses recursos, tendo em vista que o histórico não menciona o número
das notas de empenho.
Considerando
os argumentos apresentados pela Unidade Gestora e as objeções elencadas pelo
Corpo Técnico, há que se ponderar que tais divergências não ensejam, por si só,
a rejeição das contas.
No
entanto, deve a Prefeitura Municipal de Guatambu observar os requisitos
normativos à correta aplicação dos recursos provenientes do FUNDEB e encaminhar
o Relatório Conselho, evitando assim, futuras objeções do Tribunal de Contas
quanto à aprovação das Contas do Município.
II – DIVERGÊNCIAS
CONTÁBEIS
- Divergência, no valor
de R$ 1.879,77, apurada entre a variação do saldo patrimonial financeiro (R$
338.877,62) e o resultado da execução orçamentária – Superávit (R$ 326.683,15),
considerando o cancelamento de restos a pagar de R$ 14.074,24, em afronta ao
artigo 102 da Lei nº 4.320/64.
O art. 85, da
Lei Federal nº. 4.320/64, determina que os serviços de contabilidade devem ser
organizados de maneira que permitam o acompanhamento da execução orçamentária,
o conhecimento da composição patrimonial, a determinação dos custos dos
serviços industriais, o levantamento dos balanços gerais, a análise e a
interpretação dos resultados econômicos e financeiros.
O Professor Francisco G. L.
Mota conceitua Contabilidade Pública:
A Contabilidade Pública é o ramo da Ciência
Contábil que aplica na administração pública as técnicas de registro dos atos e
fatos administrativos, apurando resultados e elaborando relatórios periódicos,
levando em conta as normas de Direito Financeiro (Lei 4.320/64), os princípios
de finanças públicas e os princípios de contabilidade. (Dissertação sobre Consolidação de Balanços
Públicos. Análise Empírica da Conformidade dos Balanços Estaduais-União no ano
de 2003. p. 190 Brasília 2004).
A Lei nº 4.320/64 define
como objetivo da Contabilidade Pública “Evidenciar perante a Fazenda Pública a
situação de todos quantos, de qualquer modo, arrecadem receitas, efetuem
despesas, administrem ou guardem bens a ela pertencentes ou confiados”.
Para tanto, analisando as
inconsistências contábeis acima anotadas, cabe salientar que apesar de
afrontarem a legislação vigente, não interferem significativamente na posição
financeira, orçamentária e patrimonial do exercício de 2010.
Desta forma, a Prefeitura
Municipal de Guatambu deve obediência às normas gerais de escrituração
aplicadas à contabilidade pública e aos resultados gerais do exercício
demonstrados nos Balanços, dispostas na Lei nº 4.320/64.
III
- DO FUNDO MUNICIPAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (FIA)
A Constituição
Federal prestigia a defesa dos direitos da criança e do adolescente,
especialmente a partir da adoção expressa do princípio da prioridade absoluta,
constante de seu art. 227, caput, in verbis:
Art. 227. É dever da família, da sociedade
e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta
prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
E como forma de
efetivar tais garantias, a Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do
Adolescente) prevê a criação de Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e
do Adolescente e a manutenção de Fundos Municipais dos Direitos da Criança e do
Adolescente, conforme se lê no art. 88 do referido diploma legal:
Art. 88. São diretrizes da política de
atendimento:
II - criação de conselhos municipais,
estaduais e nacional dos direitos da criança e do adolescente, órgãos
deliberativos e controladores das ações em todos os níveis, assegurada a
participação popular paritária por meio de organizações representativas,
segundo leis federal, estaduais e municipais;
IV - manutenção de fundos nacional,
estaduais e municipais vinculados aos respectivos conselhos dos direitos da
criança e do adolescente;
O Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA) e a Resolução do Conselho Nacional dos Direitos
da Criança e do Adolescente (CONANDA) nº 105/2005 regram a atuação do Fundo,
com o objetivo de assegurar ações de atendimento a crianças e adolescentes em
áreas prioritárias por meio de receita vinculada aos seus objetivos e a sua
finalidade, sendo a forma de aplicação dos recursos determinada pelos Conselhos
Municipais.
Importante
colacionar os Prejulgados desse Tribunal de Contas que tratam da matéria.
Prejulgado
n. 1832:
1. O Fundo de Direitos da Criança e do
Adolescente, instituído em cada ente da Federação, tem por objetivo receber
recursos e realizar despesas para a consecução dos objetivos pretendidos pelo
art. 227 da Constituição da República e pela Lei nº 8.069/90 - Estatuto da
Criança e do Adolescente.
2. O Conselho dos Direitos da Criança e do
Adolescente é órgão paritário, com metade de seus membros representantes do
Poder Público e a outra metade da sociedade civil, instituído em cada ente da
Federação, com o objetivo de proporcionar condições de implementação dos
direitos e garantias das crianças e dos adolescentes, devendo, além de outras
atribuições, gerir o Fundo de Direitos da Criança e do Adolescente.
3. Os recursos do Fundo de Direitos da
Criança e do Adolescente devem ser empregados exclusivamente em programas,
projetos e atividades de proteção sócio-educativos voltados ao atendimento da
criança e do adolescente.
4. A definição das despesas que podem ser
custeadas com recursos do Fundo de Direitos da Criança e do Adolescente cabe ao
seu gestor, a quem compete avaliar, no momento da autorização da despesa, se o
objeto do gasto está inserido nos programas, projetos e atividades de proteção
sócio-educativos voltados ao atendimento da criança e do adolescente, bem como
se está em conformidade com os critérios de utilização dos recursos do Fundo
fixados pelo Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente.
Prejulgado
n. 1681:
1. Conforme o disposto no § 2º do art. 260
da Lei nº 8069/90 - Estatuto da Criança e do Adolescente, os critérios de
utilização dos recursos do fundo, tanto daqueles oriundos de doações ou
deduções do imposto de renda, quanto dos provenientes de repasses de entes
públicos, devem ser fixados pelo Conselho dos Direitos da Criança e do
Adolescente, através de plano de aplicação.
2. A administração dos recursos é tarefa
exercida pelo órgão público designado pelo Chefe do Poder Executivo para a
execução orçamentária e contábil do fundo.
3. O Conselho vai dizer o quanto de
recursos será destinado para tal programa de atendimento e o órgão público irá
proceder à liberação e ao controle dos valores dentro das normas legais e
contábeis.
Analisando o caso em tela,
observa-se que a despesa do Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do
Adolescente (Unidade Orçamentária) representa 0,60% da despesa total realizada
pela Prefeitura Municipal.
A nominata e os atos de
posse dos Conselheiros do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do
Adolescente estão devidamente acostados aos autos.
A Unidade Gestora não
encaminhou os Planos de Ação e Aplicação, em descumprimento ao disposto no art.
260, § 2º, do ECA e art. 1º, da Resolução do CONANDA n. 105/2005.
Constata-se, ainda, que a
remuneração dos Conselheiros Tutelares foi suprida com recursos do Fundo
Municipal da Infância e Adolescência, condição vedada pelo art. 16, da
Resolução CONANDA n. 137/2010.
Tal prática caracteriza
desvirtuamento dos objetivos atrelados à formação do referido fundo, o que
prejudica a concretização de ações concretas voltadas à efetiva proteção da
criança e do adolescente, além de configurar violação ao princípio
constitucional da proteção integral previsto no art. 227, caput, da CF/88.
Considerando que tal
incorreção não está inserida no rol de restrições passíveis de acarretar a
rejeição das contas municipais, mas que, todavia, reveste-se de gravidade
suficiente para, uma vez comprovada, carrear em sanções aos responsáveis, opino pela autuação em apartado e
realização de auditoria, objetivando averiguar possíveis irregularidades
vinculadas ao FIA do Município de Guatambu.
4. CONCLUSÃO
Analisando ainda, a gestão
orçamentária, financeira e patrimonial constante do Relatório Técnico da
DMU/TCE, entendemos que o Balanço Geral do Município de Guatambu representa de
forma adequada a posição
financeira, orçamentária e patrimonial, assim como não há registro de fatos
relevantes que possam comprometer os princípios fundamentais da contabilidade
aplicados a administração pública.
Ante o exposto, concluo sugerindo que o eminente Relator possa propor ao Egrégio
Tribunal Pleno, que recomende à Câmara Municipal, a APROVAÇÃO das contas do exercício de 2010 da Prefeitura Municipal
de Guatambu, com fundamento nos artigos 53 e 54 da Lei Complementar nº.
202/2000.
Florianópolis,
02 de dezembro de 2011.
MAURO ANDRÉ FLORES PEDROZO
Procurador-Geral
Ministério Público junto
ao Tribunal de Contas