PARECER nº:

MPTC/6564/2011

PROCESSO nº:

PCP 11/00093556    

ORIGEM:

Prefeitura Municipal de Araranguá

RESPONSÁVEL:

Mariano Mazzuco Neto

ASSUNTO:

Prestação de Contas do Prefeito referente ao exercício de 2010

 

01. DO RELATÓRIO

 

O presente processo refere-se a Prestação de Contas do Prefeito Municipal de Araranguá, relativa ao exercício de 2010, prestadas em cumprimento ao disposto no Artigo 51 da Lei Complementar nº. 202/2000.

 

 

02. DA INSTRUÇÃO

 

A análise das contas pelo corpo Técnico da DMU/TCE deu origem ao Relatório de Instrução nº. 4.888/2011, que concluiu por apontar restrições para efeito de emissão de Parecer Prévio pelo Egrégio Tribunal Pleno.

 

Tendo em vista as irregularidades apontadas, o Relator do Processo, Conselheiro Adircélio de Moraes Ferreira Júnior, emitiu despacho encaminhando cópia do Relatório de Instrução para que o responsável apresentasse suas alegações de defesa em relação ao apontado.

 

Em 25 de outubro 2011, o responsável encaminhou documentos juntados as fls. 718 a 1117, gerando por parte da DMU o Relatório de Reinstrução nº. 5844/2011, que conclui por apontar diversas restrições, das quais destaco:

1.1. Déficit de execução orçamentária do Município (Consolidado) da ordem de R$3.167.495,57, representando 4,49% da receita arrecadada do Município no exercício em exame, o que equivale a 0,54 arrecadação mensal – média mensal do exercício, em desacordo ao artigo 48, “b” da Lei 4.320/64 e artigo 1º, § 1º, da Lei Complementar nº. 101/2000 (LRF), parcialmente absorvido pelo superávit financeiro do exercício anterior (R$1.628.610,72), com a ressalva da existência de despesas empenhadas no montante de R$ 2.422.512,80 por conta de recursos de Convênio Federal (Contrato de Repasse nº. 0254837-69/2008 – Ministério das Cidades) e de recursos de Operações de Crédito (Contrato de Financiamento nº.  0248314-21/2008 – CEF), que deixaram de ingressar em 2010;

 

 

1.2. Déficit financeiro do Município (Consolidado) da ordem de R$ 1.437.922,85, resultante do resultado orçamentário ocorrido no exercício em exame, correspondendo a 2,04% da receita arrecadada no exercício em exame (R$ 70.487.326,16), e, tomando-se por base a arrecadação média mensal do exercício em questão, equivale a 0,24 arrecadação mensal, em desacordo ao artigo 48, “b” da Lei 4.320/1964 e artigo 1º da Lei Complementar nº. 101/2000 (LRF).

 

1.4. Ausência de abertura de crédito adicional no 1º trimestre de 2010 e, consequentemente, não evidenciação da realização de despesa com os recursos do FUNDEB remanescentes do exercício anterior no valor de R$ 30.496,21, em descumprimento ao estabelecido no § 2º artigo 21da Lei nº. 11.494/2007;

 

1.9. Atraso na remessa dos Relatórios de Controle Interno referentes ao 1º, 2º e 4º bimestres, em desacordo aos artigos 3º e 4º da lei Complementar nº. 202/2000 c/c artigo 5º, § 3º da Resolução TC 16/94, alterada pela Resolução TC 11/2004.

 

 

Em 29 de novembro de 2011, o Processo foi encaminhado para este Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado para competente manifestação.

 

03. DA PROCURADORIA

 

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado, na sua missão constitucional e legal de guarda da lei e fiscal de sua execução, regrada nas Constituições Federal e Estadual e na Lei Complementar Estadual nº. 202/2000, analisando o Relatório de Instrução, constatou que o Município de Araranguá, no exercício de 2010:

a)  Aplicou pelo menos 15% das receitas de impostos, inclusive transferências, em Ações e Serviços Públicos de Saúde, conforme exigido no artigo 77, III, e § 4º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias;

 

b)  Aplicou pelo menos 25% das Receitas Resultantes de Impostos em Manutenção e Desenvolvimento do Ensino, conforme exige o artigo 212 da Constituição Federal;

 

c)  Aplicou, pelo menos, 60% dos recursos recebidos do FUNDEB na remuneração dos profissionais do magistério, conforme exige o artigo 60, XII, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias c/c artigo 22 da Lei n°. 11.494/2007;

 

d)  Aplicou pelo menos, 95% dos recursos recebidos do FUNDEB em despesas com Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica, conforme exige o artigo 21 da Lei n°. 11.494/2007;

 

e)  Os gastos com pessoal do Município ficaram abaixo do limite máximo de 60% da Receita Corrente Líquida, conforme exigido pelo artigo 169 da Constituição federal c/c o artigo 19, III da Lei de Responsabilidade Fiscal;

 

f)   Os gastos com pessoal do Poder Executivo no exercício em exame, ficaram abaixo do limite máximo de 54% da Receita Corrente Líquida, conforme exigido pelo artigo 20, III da Lei de Responsabilidade Fiscal;

 

g)  Os gastos com pessoal do Poder Legislativo no exercício em exame, ficaram abaixo do limite máximo de 6% da Receita Corrente Líquida, conforme exigido pelo artigo 20, III da Lei de Responsabilidade Fiscal;

 

h)  O resultado da execução orçamentária do exercício em exame apresentou um déficit da ordem de R$ 3.167.495,57, cerca de 4,49% da receita arrecadada no exercício em tela, parcialmente absorvido pelo superávit financeiro do exercício anterior, em descumprimento ao princípio do equilíbrio financeiro, conforme exige o artigo 48, “b” da Lei 4.320/64 e artigo 1º, § 1º da LRF.

 

i)    O resultado financeiro do exercício apresentou um déficit da ordem de R$ 1.437.922,85, descumprindo, portanto, ao princípio do equilíbrio de caixa exigido pelo artigo 48, “b” da Lei 4.320/64 e artigo 1º, § 1º da Lei de Responsabilidade Fiscal.

 

 

Constata-se que a Unidade Gestora aplicou corretamente os percentuais enumerados na Carta Magna e legislação infraconstitucional. Restaram, contudo, restrições de ordem legal, as quais este Órgão Ministerial passa a analisar:

 

1.1. Déficit de execução orçamentária do Município (Consolidado) da ordem de R$3.167.495,57, representando 4,49% da receita arrecadada do Município no exercício em exame, o que equivale a 0,54 arrecadação mensal – média mensal do exercício, em desacordo ao artigo 48, “b” da Lei 4.320/64 e artigo 1º, § 1º, da Lei Complementar nº. 101/2000 (LRF), parcialmente absorvido pelo superávit financeiro do exercício anterior (R$1.628.610,72), com a ressalva da existência de despesas empenhadas no montante de R$ 2.422.512,80 por conta de recursos de Convênio Federal (Contrato de Repasse nº. 0254837-69/2008 – Ministério das Cidades) e de recursos de Operações de Crédito (Contrato de Financiamento nº.  0248314-21/2008 – CEF), que deixaram de ingressar em 2010;

 

 

1.2. Déficit financeiro do Município (Consolidado) da ordem de R$ 1.437.922,85, resultante do resultado orçamentário ocorrido no exercício em exame, correspondendo a 2,04% da receita arrecadada no exercício em exame (R$ 70.487.326,16), e, tomando-se por base a arrecadação média mensal do exercício em questão, equivale a 0,24 arrecadação mensal, em desacordo ao artigo 48, “b” da Lei 4.320/1964 e artigo 1º da Lei Complementar nº. 101/2000 (LRF).

 

 

Destacamos que o Déficit Orçamentário combinado com o Déficit Financeiro, originário de causas injustificáveis, é um resultado contábil vedado pela Lei 4.320/64 em seu artigo 48, “b”, e a partir de maio de 2000, pela Lei Complementar nº. 101 – Lei de Responsabilidade Fiscal em seu artigo 1º, § 1º, portanto, ilegal, lesivo ao erário e a sociedade, pois em níveis expressivos e macroeconômicos eleva os preços e causa impacto negativo na economia nacional, devendo, portanto, ser duramente combatido pelos órgãos de controle externo.

 

Diz a Lei 4.320/64:

 

Art. 48 – A fixação das cotas a que se refere o artigo anterior atenderá aos seguintes objetivos:

a)  (omissis)

b)                                        Manter, durante o exercício, na medida do possível, o equilíbrio entre a receita arrecadada e a despesa realizada, de modo a reduzir ao mínimo eventuais insuficiências de tesouraria.

 

Diz a LC nº. 101 de 04/05/2000:

 

Art. 1º, § 1º – A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas...

 

      Entretanto, é preciso avaliar o contexto do Resultado Financeiro, quais as suas causas, tendo em vista, por exemplo, o princípio contábil da continuidade estabelecido na Resolução nº. 750/93 do Conselho Federal de Contabilidade, em que a análise das contas deve considerar que “a informação contábil representa fatos que não estão totalmente acabados, eis que a entidade governamental tem vida ilimitada e que os finais de exercícios financeiros representam cortes na vida da entidade para apresentar resultados das operações, situação financeira e as suas modificações que incluem fatos cujos efeitos não terminam na data dos balanços do período”.

    

     Neste sentido, julgamos ser importante avaliar o comportamento do resultado financeiro de exercícios passados antes de responsabilizar o administrador público por encerrar o Balanço com Déficit Financeiro, como é o caso da Prefeitura Municipal de Araranguá.

 

O comportamento do resultado financeiro dos últimos dois exercícios e registrados à fl. 1139 é o seguinte:

 

2009 – Superávit de R$ 1.628.610,72; e

2010 – Déficit de R$ 1.437.922,85.

 

Este comportamento do resultado financeiro da Prefeitura Municipal de Araranguá evidencia que o responsável pela Unidade no exercício em tela, não manteve o equilíbrio financeiro de 2009 de forma a atender o disposto no art. 48, “b” da Lei 4.320/64, artigo 1º, § 1º e 42 da LRF, pelo contrário, produziu um Déficit Orçamentário de R$ 3.167.495,57 e equivalente a 4,49% da receita arrecadada no exercício, tornando o caixa insuficiente.

 

Em suas alegações de defesa, o responsável comprova que o município celebrou Convênio Federal (Contrato de Repasse nº. 0254837-69/2008 – Ministério das Cidades) e de recursos de Operações de Crédito (Contrato de Financiamento nº.0248314-21/2008 – CEF),  cujo repasse, que se vinculava a execução de etapas das obras, não foi devidamente efetivado no exercício de 2010, já que ocorreram atrasos em razão do excesso de chuvas ocorridas no exercício.

 

Conforme demonstrado, fica claro que o não repasse de recursos no montante de R$ 2.422.512,80, interferiu diretamente no resultado deficitário, e que se as obras tivessem obedecido os prazos estabelecidos, a Unidade teria ainda assim apresentado um Déficit Orçamentário, no entanto, seu resultado Financeiro seria superavitário em R$ 984.589,95.  

 

Sendo assim, entendo não ser cabível a imputação de responsabilidade ao Município pelo não recebimento dos recursos, que por sua vez suportariam as obrigações já contraídas, razão pela qual, concluo que a restrição possa ser tolerada.

 

 

1.4. Ausência de abertura de crédito adicional no 1º trimestre de 2010 e, consequentemente, não evidenciação da realização de despesa com os recursos do FUNDEB remanescentes do exercício anterior no valor de R$ 30.496,21, em descumprimento ao estabelecido no § 2º artigo 21da Lei nº. 11.494/2007;

 

A lei do FUNDEB determina que no mínimo 95% dos recursos sejam aplicados no exercício, e a sobra deve ser aplicada no primeiro trimestre do próximo exercício:

 

Lei 11494/07, Art. 21 §2º: Até 5% (cinco por cento) dos recursos recebidos à conta dos Fundos, inclusive relativos à complementação da União recebidos nos termos do §1º do art. 6º desta Lei, poderão ser utilizados no 1º (primeiro) trimestre do exercício imediatamente subsequente, mediante abertura de crédito adicional.

 

Ressalto que o desenvolvimento do País, assim como a melhoria da qualidade de vida, a consolidação do processo democrático, e a inclusão social de parcela mais significativa da população, passam necessariamente por um sistema educacional mais amplo e eficaz. Sem dúvida, a excelência no ensino está atrelada a vários fatores, como por exemplo: melhores instalações, equipamentos, transporte, merenda e principalmente, profissionais capacitados e bem remunerados que possam desempenhar seu papel fundamental de educar.

 

Assim, se o município ainda não efetuou a devida aplicação do saldo financeiro remanescente do FUNDEB do exercício de 2009, deve adotar, o mais rápido possível, os procedimentos para a sua efetivação.

 

Em relação às divergências contábeis, dispostas nos itens 1.5, 1.6, 1.7 e 1.8:

 

Conforme disposto no art. 85 da Lei Federal nº. 4.320/64, os serviços de contabilidade devem ser organizados de maneira que permitam o acompanhamento da execução orçamentária, o conhecimento da composição patrimonial, a determinação dos custos dos serviços industriais, o levantamento dos balanços gerais, a análise e a interpretação dos resultados econômicos e financeiros.

 

O Professor Francisco G. L. Mota assim conceitua Contabilidade Pública:

 

A Contabilidade Pública é o ramo da Ciência Contábil que aplica na administração pública as técnicas de registro dos atos e fatos administrativos, apurando resultados e elaborando relatórios periódicos, levando em conta as normas de Direito Financeiro (Lei 4.320/64), os princípios de finanças públicas e os princípios de contabilidade. (Dissertação sobre Consolidação de Balanços Públicos. Análise Empírica da Conformidade dos Balanços Estaduais-União no ano de 2003. p. 190 Brasília 2004).

 

A Lei nº 4.320/64 define como objetivo da Contabilidade Pública “Evidenciar perante a Fazenda Pública a situação de todos quantos, de qualquer modo, arrecadem receitas, efetuem despesas, administrem ou guardem bens a ela pertencentes ou confiados”. 

 

Para tanto, analisando as inconsistências contábeis acima anotadas, cabe salientar que apesar de afrontarem a legislação vigente, não interferem significativamente na posição financeira, orçamentária e patrimonial do exercício de 2010.

 

Desta forma, a Prefeitura Municipal de Araranguá deve obediência às normas gerais de escrituração aplicadas à contabilidade pública e aos resultados gerais do exercício demonstrados nos Balanços, dispostas na Lei nº 4.320/64.

 

1.9. Atraso na remessa dos Relatórios de Controle Interno referentes ao 1º, 2º e 4º bimestres, em desacordo aos artigos 3º e 4º da lei Complementar nº. 202/2000 c/c artigo 5º, § 3º da Resolução TC 16/94, alterada pela Resolução TC 11/2004.

             

Controle, em sentido lato, é a maneira de manter o equilíbrio na relação existente entre Estado e Sociedade, fazendo surgir daquele as funções que lhe são próprias, exercidas por meio dos seus órgãos.

Ao Estado cabe manter mecanismos de controle das atividades estatais, eivados da necessidade de se resguardar a própria administração pública e os direitos e garantias coletivos, em consonância aos princípios da eficiência administrativa e da eficácia.

Assim, o controle interno visa assegurar à proteção do patrimônio, exatidão e fidedignidade dos dados contábeis, eficiência operacional, como meios para alcançar os objetivos globais da organização.

Para assegurar o cumprimento de tais preceitos, a Constituição Federal é taxativa em relação ao controle interno:

 

Art. 74. Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno com a finalidade de:

I - avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a execução dos programas de governo e dos orçamentos da União;

II - comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado;

III - exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como dos direitos e haveres da União;

IV - apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional.

(...)

 

Assim, para que se torne efetivo o controle interno na Administração Pública, há que se adotar medidas corretivas ou complementares, a fim de adequar e integrar toda a estrutura administrativa.

No Manual do Sistema de Controle Interno do Poder Executivo Federal, exarado pela Secretaria Federal de Controle Interno por intermédio da Instrução Normativa Nº 01/2001, o controle interno é abordado da seguinte forma:

 

Seção VIII – Normas relativas aos controles internos administrativos:

[...]

2. Controle interno administrativo é o conjunto de atividades, planos, rotinas, métodos e procedimentos interligados, estabelecidos com vistas a assegurar que os objetivos das unidades e entidades da administração pública sejam alcançados, de forma confiável e concreta, evidenciando eventuais desvios ao longo da gestão, até a consecução dos objetivos fixados pelo Poder Público. (SFC 2001, p.67)

 

 

Emerge, para tanto, a necessidade de se efetuar o controle interno em qualquer esfera de poder, objetivando resguardar e evitar a ocorrência de impropriedades e possíveis irregularidades.

 

Nesse sentido, deve a Unidade Gestora encaminhar os Relatórios de Controle Interno no prazo previsto na legislação pertinente à matéria.

 

CONCLUSÃO

 

Analisando ainda, a gestão orçamentária, financeira e patrimonial constante do Relatório Técnico da DMU/TCE, entendo que o Balanço Geral do Município de Araranguá representa de forma adequada a posição financeira, orçamentária e patrimonial, assim como não há registro de fatos relevantes que possam comprometer os princípios fundamentais da contabilidade aplicados a administração pública.

 

 Ante o exposto, concluo sugerindo que o eminente Relator possa propor ao Egrégio Tribunal Pleno, que recomende à Câmara Municipal, a APROVAÇÃO das contas do exercício de 2010 da Prefeitura Municipal de Araranguá, com fundamento nos artigos 53 e 54 da Lei Complementar nº. 202/2000.

 

 

Florianópolis, 1º de dezembro de 2011.

 

 

 

 

 

 

Mauro André Flores Pedrozo

          Procurador-Geral

          Ministério Público junto ao Tribunal de Contas

RLF