PARECER
nº: |
MPTC/6722/2011 |
PROCESSO
nº: |
PCP 11/00145530 |
ORIGEM: |
Prefeitura Municipal de Barra Velha |
INTERESSADO: |
|
ASSUNTO: |
Prestação de Contas do Prefeito do exercício
de 2010 |
Trata-se de Prestação de Contas da
Prefeitura Municipal de Barra Velha - SC, relativa ao
exercício de 2010.
Foram juntados os documentos
relativos à prestação de contas em comento às fls. 2-450 e 565-567.
A Diretoria de Controle dos
Municípios apresentou relatório técnico (fls. 451-487, anexo de fl. 488 e
apêndices de fls. 489-495) identificando, ao final, a ocorrência das seguintes
restrições:
1.
RESTRIÇÃO DE ORDEM CONSTITUCIONAL
1.1.
Abertura de Créditos Adicionais Suplementares no valor de R$ 49.500,00 por
conta de transposição, remanejamento ou a transferência de recursos de uma
categoria de programação para outra ou de um órgão para outro, sem prévia
autorização legislativa específica, em desacordo com o disposto no artigo 167,
VI da CF/88. (Apêndice 6)
2.
RESTRIÇÕES DE ORDEM LEGAL
2.1.
Ausência de remessa do Parecer do Conselho do FUNDEB, em desacordo com o artigo
27, da Lei nº 11.494/07.
2.2. Aplicação parcial no valor de R$ 120.665,59 referente aos recursos do FUNDEB remanescentes do
exercício anterior no valor de R$
126.000,31 mediante abertura de crédito adicional no primeiro trimestre de
2010, em descumprimento ao estabelecido no § 2º do artigo 21 da Lei nº
11.494/2007 (item 5.2.2, limite 3).
2.3. Atraso na remessa dos Relatórios de Controle Interno
referentes aos 1º, 2º, 3º, 4º bimestres, em desacordo aos artigos 3º e 4º da
Lei Complementar nº 202/2000 c/c artigo 5º, § 3º da Resolução nº TC-16/94,
alterada pela Resolução nº TC-11/2004.
2.4. Divergência, no valor de R$ 123.524,45, entre o Resultado Patrimonial apurado na
Demonstração das Variações Patrimoniais – Anexo 15 (R$ - 7.300.458,54) e o
Saldo Patrimonial do exercício corrente, apurado no Balanço Patrimonial – Anexo
14, (R$ 23.316.861,22), em afronta aos artigos 104 e 105 da Lei nº 4.320/64.
2.5. Divergência, no valor de R$ 79.215,33, apurada entre a variação do saldo patrimonial
financeiro (R$ 2.501.259,03) e o resultado da execução orçamentária – Superávit
(R$ 2.347.594,09), considerando o cancelamento de restos a pagar de R$
74.449,61, em afronta ao artigo 102 da Lei nº 4.320/64.
2.6. Divergência, no valor de R$ 687,07, entre o saldo apresentado na Demonstração da Dívida
Flutuante – Anexo 17 (R$ 6.618.480,34) e o saldo do Passivo Financeiro
constante do Balanço Patrimonial – Anexo 14 da Lei nº 4.320/64 (R$
6.619.167,41), caracterizando afronta aos artigos 85 e 105 da referida Lei.
2.7. Utilização dos recursos da Reserva de Contingência,
no montante de R$ 480.000,00 sem
evidenciar o atendimento de passivos contingentes, riscos ou eventos fiscais
imprevistos, em desacordo com a Lei Complementar nº 101/2000, artigo 5º, III,
“b”. (Apêndice 7).
O Relator
exarou despacho à fl. 497, determinando a abertura de prazo para manifestação
da Prefeitura Municipal de Barra Velha, diante das irregularidades descritas
nos itens 1.1., 2.1., 2.2. e 2.7. da conclusão do relatório de instrução.
O responsável
apresentou justificativas e documentos às fls. 500-564.
A Diretoria
de Controle dos Municípios apresentou novo relatório técnico (fls. 568-612,
anexo de fl. 613 e apêndices de fls. 614-620) e, ao analisar as informações
prestadas pelo responsável, excluiu a irregularidade descrita no item 2.7. e
manteve as demais restrições.
Após análise de toda a
documentação dos autos e do Relatório Técnico, esta Procuradoria constatou que
foram obtidos os seguintes dados relativos aos pontos de controle realizados
pela instrução.
1. Análise da Gestão Orçamentária
Com relação à análise da
gestão orçamentária do Município, destaca-se que o confronto entre a receita
arrecadada e a despesa realizada resultou no superávit de execução orçamentária da
ordem de R$ 2.897.324,32, correspondendo a 6,75% da receita arrecadada.
Ressalta-se
que, excluindo-se o resultado orçamentário do Regime Próprio de Previdência o
Município apresentou superávit de R$ 2.347.594,09.
Salienta-se que a receita
arrecadada do exercício em exame atingiu o montante de R$ 42.944.505,73, equivalendo a 116,78% da receita orçada.
Aponta-se,
ainda, que foram realizadas audiências públicas para elaboração e discussão dos
Projetos do Plano Plurianual, da Lei de Diretrizes Orçamentárias e da Lei
Orçamentária Anual, em cumprimento ao disposto no art. 48, da Lei Complementar
n. 101/2000.
2. Análise da Gestão Patrimonial e Financeira
No que tange à análise da
gestão patrimonial e financeira do Município, destaca-se que o confronto entre
o ativo financeiro e o passivo financeiro do exercício encerrado resulta em
superávit financeiro de R$ 1.440.074,54, cumprindo-se, assim, o princípio do
equilíbrio de caixa exigido pelo art. 48, alínea “b”, da Lei n. 4.320/64, e
pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
Salienta-se que, em
relação ao exercício anterior, ocorreu variação positiva de R$ 2.501.259,03, passando de um déficit de R$ 1.061.184,49 para um superávit de R$ 1.440.074,54.
3. Análise do cumprimento de limites
Normas constitucionais e
legais estabelecem limites mínimos para aplicação de recursos nas áreas da
Saúde e da Educação, assim como limites máximos para despesas com pessoal.
Na área da Saúde,
observa-se que foi aplicado, em ações e serviços públicos de saúde para o
exercício de 2010, o montante de R$ 5.116.265,57, correspondente ao percentual de 21,81% da receita com
impostos, incluindo transferências, percentual este superior, portanto, ao
limite mínimo de 15% estipulado no art. 77, inciso III e § 4º, do ADCT, à luz
do art. 198, da CRFB/88.
Por sua vez, na área da
Educação, observa-se que foi aplicado, em gastos com manutenção e
desenvolvimento do ensino para o exercício de 2010, o montante de R$ 5.998.666,63, correspondente ao
percentual de 25,57
da receita com impostos, incluindo transferências, percentual este superior,
portanto, ao limite mínimo de 25% estipulado no art. 212, caput, da CRFB/88.
Também na área da
Educação, com relação ao FUNDEB, observa-se que foi aplicado, na remuneração
dos profissionais do magistério para o exercício de 2010, o montante de R$ 4.733.774,58, correspondente ao
percentual de 76,30%
dos recursos oriundos do FUNDEB, percentual este superior, portanto, ao limite
mínimo de 60% estipulado no art. 60, XII, do ADCT, c/c o art. 22, da Lei n.
11.494/07.
Igualmente no que toca ao
FUNDEB, observa-se que foi aplicado, em despesas com manutenção e
desenvolvimento da educação básica para o exercício de 2010, o montante de R$ 6.127.689,25, correspondente ao
percentual de 98,76%
dos recursos oriundos do FUNDEB, percentual este superior, portanto, ao limite
mínimo de 95% estipulado no art. 21, da Lei n. 11.494/07,
caracterizando o cumprimento da referida norma legal.
Ainda quanto ao FUNDEB,
observa-se que o Município utilizou parcialmente o saldo do exercício anterior
do fundo, no valor de R$ 120.665,59 (o saldo total era de R$ 126.000,31), mediante abertura de
crédito adicional no 1º trimestre, descumprindo,
portanto, o mandamento estipulado no art. 21, § 2º, da Lei n. 11.494/07, o qual
determina a abertura de crédito adicional no 1º trimestre do exercício
subsequente para a utilização da totalidade do saldo remanescente do referido
fundo. Salienta-se que a justificativa do responsável de que o valor seria
incapaz de gerar prejuízo por irrisório não merece guarida, porquanto a regra
do dispositivo legal em questão não traz outra exceção, conforme salientado
pela instrução, à fl. 595 do relatório técnico final.
Por seu turno, no que
tange aos limites máximos para despesas com pessoal, observa-se que o Município
gastou 46,81%
do total da receita corrente líquida em despesas com pessoal no exercício de
2010, percentual este inferior, portanto, ao limite máximo de 60% estipulado no
art. 169 da CRFB/88, e regulamentado pela Lei Complementar n. 101/2000.
Também com relação aos
limites máximos para despesas com pessoal, observa-se que o Poder Executivo do
Município gastou 44,27% do total da receita corrente líquida em despesas com seu
pessoal no exercício de 2010, percentual este inferior, portanto, ao limite
máximo de 54% estipulado no art. 20, inciso III, alínea “b”, da Lei
Complementar n. 101/2000.
Finalmente, ainda com
relação aos limites máximos para despesas com pessoal, observa-se que o Poder
Legislativo do Município gastou 2,54% do total da receita corrente
líquida em despesas com seu pessoal no exercício de 2010, percentual este
inferior, portanto, ao limite máximo de 6% estipulado no art. 20, inciso III,
alínea “a”, da Lei Complementar n. 101/2000.
4. Controle Interno
Inicialmente, cumpre
esclarecer que a exigência de manutenção do sistema de controle interno do
Poder Executivo Municipal é de caráter constitucional, consoante preceitua a
CRFB/88, nos seguintes dispositivos:
Art. 31. A fiscalização do Município será
exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e pelos
sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei.
§ 1º O controle externo da Câmara Municipal
será exercido com o auxílio dos Tribunais de Contas dos Estados ou do Município
ou dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, onde houver.
§ 2º O parecer prévio, emitido pelo órgão
competente sobre as contas que o Prefeito deve anualmente prestar, só deixará
de prevalecer por decisão de dois terços dos membros da Câmara Municipal.
§ 3º As contas dos Municípios ficarão,
durante sessenta dias, anualmente, à disposição de qualquer contribuinte, para
exame e apreciação, o qual poderá questionar-lhes a legitimidade, nos termos da
lei.
§ 4º É vedada a criação de Tribunais,
Conselhos ou órgãos de Contas Municipais.
Art. 70. A fiscalização contábil, financeira,
orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da
administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade,
economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida
pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle
interno de cada Poder.
Art. 74. Os Poderes Legislativo, Executivo e
Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno com a
finalidade de:
I - avaliar o cumprimento das metas previstas
no plano plurianual, a execução dos programas de governo e dos orçamentos da
União;
II - comprovar a legalidade e avaliar os
resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira
e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da
aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado;
III - exercer o controle das operações de
crédito, avais e garantias, bem como dos direitos e haveres da União;
IV - apoiar o controle externo no exercício
de sua missão institucional.
Por sua vez, a
Constituição do Estado de Santa Catarina possui disposição semelhante nos
seguintes verbetes:
Art. 58. A fiscalização contábil, financeira,
orçamentária, operacional e patrimonial do Estado e dos órgãos e entidades da
administração pública, quanto a legalidade, legitimidade, economicidade,
aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pela Assembléia
Legislativa, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de
cada Poder.
Art. 62. Os Poderes Legislativo, Executivo e
Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno com a
finalidade de:
I - avaliar o cumprimento das metas previstas
no plano plurianual, a execução dos programas de governo e dos orçamentos do
Estado;
II - comprovar a legalidade e avaliar os
resultados quanto a eficácia e a eficiência da gestão orçamentária, financeira
e patrimonial nos órgãos e entidades da administração estadual, bem como da
aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado;
III - exercer o controle das operações de
crédito, avais e outras garantias, bem como dos direitos e haveres do Estado;
IV - apoiar o controle externo no exercício
de sua missão institucional.
O art. 60 da Lei
Complementar Estadual n. 202/2000, detém redação idêntica ao último dispositivo
transcrito, tendo tal diploma, em seu art. 119, com redação determinada pela
Lei Complementar Estadual n. 246/2003, estipulado o final do exercício de 2003
como prazo para organização desses sistemas de controle interno.
Neste contexto, a
Resolução n. TC-06/2001, além de também possuir dispositivo com redação
idêntica (art. 128), regulamentou a elaboração do relatório do Órgão Central do
sistema de controle interno municipal, consoante os seguintes dispositivos:
Art. 3º O órgão de Controle Interno
competente encaminhará ou colocará à disposição do Tribunal, em cada exercício,
por meio de acesso a banco de dados informatizado, o rol de responsáveis e suas
alterações, com a indicação da natureza da responsabilidade de cada um, além de
outros documentos ou informações necessários, na forma prescrita em instrução
normativa.
Art. 82. O Tribunal apreciará as contas
prestadas anualmente pelo Prefeito, às quais serão anexadas as do Poder
Legislativo, mediante parecer prévio, separadamente, a ser elaborado antes do
encerramento do exercício no qual foram prestadas.
Art. 83. As contas prestadas anualmente pelo
Prefeito, até o dia 28 de fevereiro do exercício seguinte, consistirão no
Balanço Geral do Município e no relatório do órgão central do sistema de
controle interno do Poder Executivo sobre a execução dos orçamentos de que
trata o art. 120, § 4º, da Constituição Estadual.
Art. 84. O relatório do órgão central do
sistema de controle interno do Poder Executivo que acompanha as Contas do
Governo Municipal deverá conter, no mínimo, os seguintes elementos:
I - considerações sobre matérias econômica,
financeira, administrativa e social relativas ao Município;
II - descrição analítica das atividades dos
órgãos e entidades do Poder Executivo e execução de cada um dos programas
incluídos no orçamento anual, com indicação das metas físicas e financeiras
previstas e das executadas;
III - observações concernentes à situação da
administração financeira municipal;
IV - análise da execução dos orçamentos
fiscal, da seguridade social e de investimento das empresas em que o Município,
direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a
Voto;
V - balanços e demonstrações da posição
financeira e patrimonial do Governo Municipal nas entidades da administração
indireta e nos fundos da administração direta;
VI - execução da programação financeira de
desembolso;
VII - demonstração da dívida ativa do
Município e dos créditos adicionais abertos no exercício;
VIII - notas explicativas que indiquem os
principais critérios adotados no exercício, em complementação às demonstrações
contábeis;
IX - informações sobre as atividades
inerentes ao Poder Legislativo relativas à execução dos respectivos programas
incluídos no orçamento anual.
Por seu turno, a
Resolução n. TC-16/1994, com redação dada pela Resolução n. TC-11/2004, também
dispõe sobre o assunto, ao regulamentar a remessa do referido relatório do
Órgão de controle interno do Município.
Portanto restou
devidamente positivada a questão da organização de sistema de controle interno,
seja no âmbito constitucional, legal ou regulamentar.
Assim, a inexistência ou
deficiência de controle interno afronta dispositivos constitucionais, legais e
regulamentares que impõem expressamente tal obrigação, cuja inobservância
acarreta a violação de deveres essenciais do Administrador, no sentido de atuar
com cautela e compromisso na utilização dos recursos públicos, com vistas a
evitar o mau uso do erário.
Veja-se, inclusive, a
importância do controle interno destacada no XII Ciclo de Estudos de Controle
Público da Administração Municipal, editado por esse Tribunal de Contas, onde
se lê, à p. 301:
O Sistema de Controle Interno deve funcionar
como guardião do patrimônio público, vigiando permanentemente as ações ou atos
expedidos pela administração que venham a ocasionar perda, desperdício ou
desvio do propósito primordial e norteador da administração pública que é o
interesse público.
Desta forma, deverá emitir relatórios
consistentes e circunstanciados que propiciem aos gestores uma visão gerencial
e de planejamento das ações, metas e objetivos a serem alcançados.
Destaca-se, portanto, o fato de que
deficiências relacionadas à atuação do controle interno são consideradas falhas
gravíssimas, sendo tal tipo de irregularidade passível de emissão de parecer
prévio recomendando a rejeição das contas prestadas por Prefeitos, à luz do
art. 9º, inciso XI, da Decisão Normativa n. TC-06/2008:
Art. 9º As restrições que podem ensejar a
emissão de Parecer Prévio com recomendação de rejeição das contas prestadas
pelo Prefeito, dentre outras, compõe o Anexo I, integrante desta Decisão
Normativa, em especial as seguintes:
[...]
XI – CONTROLE INTERNO – Ausência de efetiva
atuação do Sistema de Controle Interno demonstrado no conteúdo dos relatórios
enviados ao Tribunal de Contas, ou em auditoria in loco.
No presente caso,
observa-se que a Lei Municipal n. 027/2003 instituiu o Órgão de Controle
Interno do Município de Barra Velha, tendo como responsável o Sr. Ivo
Irineu Bernardo (ato de nomeação em 05/01/2009), sendo remetido a esse Tribunal de
Contas quatro dos relatórios bimestrais de controle interno com atraso (1º, 2º, 3º
e 4º bimestres), em descumprimento aos arts. 3º e 4º, da Lei Complementar Estadual n.
202/2000, c/c o art. 5º, § 3º, da Resolução n. TC-16/1994, com redação dada
pela Resolução n. TC-11/2004.
Sob uma ótica geral,
pode-se concluir que não há graves falhas relacionadas com a atuação do
controle interno do Município que possam ensejar a rejeição das contas em
análise.
5. Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente
(FIA)
Após um legado de
abandono aos outrora chamados menores, a CRFB/88 claramente prestigiou a defesa
dos direitos da criança e do adolescente, especialmente a partir da adoção
expressa do princípio da prioridade absoluta, constante de seu art. 227, caput, in verbis:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e
do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão. (GRIFEI).
A fim de efetivar tais
garantias, surge o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069/90), cujo
art. 88, incisos II e IV, da seguinte maneira dispõe:
Art. 88. São diretrizes da política de
atendimento:
II - criação de conselhos municipais,
estaduais e nacional dos direitos da criança e do adolescente, órgãos
deliberativos e controladores das ações em todos os níveis, assegurada a
participação popular paritária por meio de organizações representativas,
segundo leis federal, estaduais e municipais;
IV - manutenção de fundos nacional, estaduais
e municipais vinculados aos respectivos conselhos dos direitos da criança e do
adolescente;
Assim, restou prevista a
criação de Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente e a
manutenção de Fundos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente,
respectivamente, como diretrizes da política de atendimento do ECA – tudo para
garantir a efetividade do princípio constitucional da prioridade absoluta e do
princípio da proteção integral da criança e do adolescente.
O próprio ECA e a
Resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
(CONANDA) n. 105/2005 determinam a maneira de atuação do Fundo em questão,
responsável por assegurar ações de atendimento a crianças e adolescentes em
áreas prioritárias por meio de receita vinculada aos seus objetivos e a sua
finalidade, sendo a forma de aplicação dos recursos determinada pelos Conselhos
Municipais. Neste sentido, há a elaboração do Plano de Ação e a posterior aprovação
do Plano de Aplicação realizada anualmente, o que operacionaliza a atuação do
referido Fundo.
Importante também trazer
os Prejulgados desse Tribunal de Contas que tratam do referido fundo.
Prejulgado n. 1832:
1. O Fundo de Direitos da Criança e do
Adolescente, instituído em cada ente da Federação, tem por objetivo receber
recursos e realizar despesas para a consecução dos objetivos pretendidos pelo
art. 227 da Constituição da República e pela Lei nº 8.069/90 - Estatuto da
Criança e do Adolescente.
2. O Conselho dos Direitos da Criança e do
Adolescente é órgão paritário, com metade de seus membros representantes do
Poder Público e a outra metade da sociedade civil, instituído em cada ente da
Federação, com o objetivo de proporcionar condições de implementação dos
direitos e garantias das crianças e dos adolescentes, devendo, além de outras
atribuições, gerir o Fundo de Direitos da Criança e do Adolescente.
3. Os recursos do Fundo de Direitos da
Criança e do Adolescente devem ser empregados exclusivamente em programas,
projetos e atividades de proteção sócio-educativos voltados ao atendimento da
criança e do adolescente.
4. A definição das despesas que podem ser
custeadas com recursos do Fundo de Direitos da Criança e do Adolescente cabe ao
seu gestor, a quem compete avaliar, no momento da autorização da despesa, se o
objeto do gasto está inserido nos programas, projetos e atividades de proteção
sócio-educativos voltados ao atendimento da criança e do adolescente, bem como
se está em conformidade com os critérios de utilização dos recursos do Fundo
fixados pelo Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente.
Prejulgado n. 1681:
1. Conforme o disposto no § 2º do art. 260 da
Lei nº 8069/90 - Estatuto da Criança e do Adolescente, os critérios de
utilização dos recursos do fundo, tanto daqueles oriundos de doações ou
deduções do imposto de renda, quanto dos provenientes de repasses de entes
públicos, devem ser fixados pelo Conselho dos Direitos da Criança e do
Adolescente, através de plano de aplicação.
2. A administração dos recursos é tarefa
exercida pelo órgão público designado pelo Chefe do Poder Executivo para a
execução orçamentária e contábil do fundo.
3. O Conselho vai dizer o quanto de recursos
será destinado para tal programa de atendimento e o órgão público irá proceder
à liberação e ao controle dos valores dentro das normas legais e contábeis.
No presente caso,
observa-se que a despesa do Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do
Adolescente representa 0,12% da despesa total realizada pela Prefeitura Municipal.
Também foi verificado que
a nominata e os atos de posse dos Conselheiros do Conselho Municipal dos
Direitos da Criança e do Adolescente estão devidamente acostados aos autos (fls. 375-379).
Constatou-se, ainda, que, apesar da
remessa de documentação relativa à Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO)
referentes às metas voltadas à criança e ao adolescente, não houve a devida remessa do
Plano de Ação e do Plano de Aplicação, devendo ambos ser elaborados e aprovados
pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente, como visto
acima, caracterizando-se o descumprimento
do art. 260, § 2º, do ECA, c/c o art. 1º, da Resolução do CONANDA n. 105/2005.
Por fim, observa-se que a
remuneração dos Conselheiros Tutelares foi paga com recursos da Prefeitura
Municipal
(fls. 402-410), portanto, corretamente
tais despesas não correram à conta do FIA, haja vista que as finalidades do
fundo da criança e do adolescente não abrangem, por exemplo, despesas de
caráter continuado.
6. Inconsistências
contábeis
A Unidade
Técnica apontou três inconsistências contábeis às fls. 601-602, relacionadas,
em síntese, com divergências entre o Resultado Patrimonial apurado na
Demonstração das Variações Patrimoniais e o Saldo Patrimonial do exercício
corrente apurado no Balanço Patrimonial, entre a variação do saldo patrimonial
financeiro e o resultado da execução orçamentária, e entre o saldo apresentado
na Demonstração da Dívida Flutuante e o saldo do Passivo Financeiro constante
do Balanço Patrimonial.
7. Outras restrições
A Unidade
Técnica assinalou a ausência de remessa do parecer do Conselho do FUNDEB, em
desacordo com o art. 27 da Lei n. 11.494/07, salientando que o responsável
remeteu, por meio da documentação anexada as suas justificativas (fls.
559-564), o parecer conclusivo e a ata de aprovação referentes ao exercício de
2009, e não de 2010.
Como já visto
no item 4 deste parecer, a instrução apontou o atraso na remessa de quatro dos
relatórios bimestrais de controle interno, em desconformidade aos arts. 3º e 4º, da Lei Complementar
Estadual n. 202/2000, c/c o art. 5º, § 3º, da Resolução n. TC-16/1994, com
redação dada pela Resolução n. TC-11/2004.
A instrução
destacou, também, a abertura de Créditos Adicionais Suplementares por conta da
transposição, remanejamento ou transferência de recursos de uma categoria de
programação para outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização
legislativa específica, em desacordo com o art. 167, inciso VI, da CRFB/88,
irregularidade esta que será debatida no item 9. deste parecer.
Finalmente, a
Área Técnica havia apontado a utilização da Reserva de Contingência, no
montante de R$ 480.000,00, sem evidenciar o atendimento de passivos
contingentes, riscos ou eventos fiscais imprevistos, em afronta ao art. 5º,
inciso III, alínea “b”, da Lei Complementar n. 101/2000.
Em suas
justificativas, o responsável esclareceu que a utilização dos recursos da
Reserva de Contingência decorreu da declaração de situação de emergência no
Município, tendo os documentos de fls. 520-558 (Lei Orçamentária, Lei de
Diretrizes Orçamentárias e Decretos n. 588 e 611/2010) comprovado tal situação,
restando atendido, assim, o disposto no art. 5º, inciso III, alínea “b”, da Lei
Complementar n. 101/2000.
Por sua vez,
o documento de fl. 565 (Decreto n. 595/2010) refere-se à Reserva Matemática
Previdenciária utilizada pelo Regime Próprio de Previdência de Barra Velha para
suplementar despesas deste órgão.
Assim, a
presente restrição da utilização da Reserva de Contingência restou sanada.
8.
Despesas vinculadas a terceirizações e contratações temporárias
Além das
divergências apontadas pela Unidade Técnica, esta representante ministerial
verificou, às fls. 11-15, a existência dos seguintes gastos relacionados no
Resumo Geral da Despesa – Anexo 2 – Administração Direta, Indireta e
Fundacional, no qual consta o demonstrativo das despesas empenhadas por
elemento segundo os grupos de natureza de despesa:
DESPESAS POR
ELEMENTOS |
VALOR (R$) |
Vencimentos e Vantagens Fixas – Pessoal Civil |
9.068.774,09 |
Contratação
por Tempo Determinado |
7.225.401,29 |
Outras
Despesas de Pessoal decorrentes de Contratos de Terceirização |
- |
Outros
Serviços Temporários |
- |
Outros
Serviços de Terceiros – Pessoa Física |
245.160,65 |
A partir da
análise dos dados apresentados, verifica-se que as despesas realizadas no
exercício de 2010 com contratações por tempo determinado, com outras despesas
de pessoal decorrentes de contratos de terceirização, com outros serviços
temporários e com outros serviços de terceiros (pessoa física) correspondem a
um elevado percentual, no total 82,37%
do montante gasto com vencimentos e vantagens fixas dos servidores e/ou
empregados públicos no mesmo exercício.
Inicialmente,
cumpre registrar que não consta nestes autos (referente ao exercício de 2010)
como já houve outrora em outras análises anuais de prestações de
contas efetivadas pela DMU , o demonstrativo das despesas empenhadas,
liquidadas e pagas nas rubricas “outros serviços de terceiros – pessoa física”
e “outras despesas de pessoal decorrentes de contratos de terceirização”, o
que, por si só, impossibilita a análise detalhada da natureza dessas
contratações e aponta, já à primeira vista, para a necessidade de se apreciar o
tema em outro processo, em face da análise numérica apresentada.
Além de se
perquirir a natureza dessas contratações, faz-se necessária uma apreciação
acerca dos motivos que ensejam a manutenção dos referidos gastos, para que se
possa aferir a legalidade e a legitimidade dos mesmos, informações que não
estão disponíveis nestes autos.
Nesse contexto,
seguindo a mesma linha de análises de exercícios anteriores, esta Procuradora
tem adotado o seguinte procedimento: nas hipóteses em que os gastos com
contratações temporárias e/ou terceirizações ultrapassam 50% (cinquenta por
cento) dos gastos com pessoal efetivo do quadro de servidores, entendo que há
indícios de irregularidades e manifesto-me pela autuação em apartado para que
se possa melhor analisar a matéria, inclusive conferindo o direito ao
contraditório e à ampla defesa.
É evidente
que se houvesse informações mais precisas acerca da natureza das contratações,
as conclusões quanto à possibilidade de existência de irregularidades poderiam
ser mais evidentes, todavia, considerando os dados apresentados nestes autos, a
apreciação numérica é a única alternativa que se mostra viável.
Com relação
às despesas em questão, que pese a previsão constitucional que possibilita as
contratações temporárias (art. 37, inciso IX, da CRFB/88) – somente para
atender a necessidade temporária de excepcional interesse público –, a prática
demonstra que tal instituto tem sido desvirtuado pelas administrações
municipais, aplicado a contratos que se prolongam por vários exercícios, sem
nenhuma comprovação quanto a sua excepcionalidade e, ainda, para o desempenho
de atividades contínuas e permanentes que deveriam ser atribuídas a servidores
do quadro de pessoal do Órgão.
Nessa linha,
há um número considerável de julgados dessa Corte de Contas que aplica multas
aos gestores em face dessa irregularidade. Cito como exemplo as seguintes
decisões: Acórdãos n. 0059/2010, n. 0005/2010, n. 0053/2010, n. 0143/2010, n.
0180/2010, n. 0283/2010, n. 0291/2010, n. 0373/2010, n. 0384/2010 e n.
0382/2010.
Ao discorrer
sobre o tema relativo à terceirização no âmbito da administração pública, Maria
Sylvia Zanella Di Pietro[1]
tece as seguintes considerações, que bem demonstram o quão perniciosas podem se
configurar essas contratações quando realizadas à margem da mencionada
autorização constitucional:
No
âmbito da Administração Pública Direta e Indireta, a terceirização, como contrato de fornecimento de mão-de-obra,
[...], não tem guarida, nem mesmo com base na Lei nº 6.019, que disciplina o
trabalho temporário, porque a Constituição, no art. 37, inciso II, exige que a
investidura em cargos, empregos ou funções se dê sempre por concurso público.
[...].
Tais
contratos têm sido celebrados sob a fórmula de prestação de serviços técnicos especializados, de tal modo a
assegurar uma aparência de legalidade. No entanto, não há, de fato, essa
prestação de serviços por parte da empresa contratada, já que esta se limita,
na realidade, a fornecer mão-de-obra para o Estado; ou seja, ela contrata
pessoas sem concurso público, para que prestem serviços em órgãos da
Administração direta e indireta do Estado. Tais pessoas não têm qualquer
vínculo com a entidade onde prestam serviços, não assumem cargos, empregos ou
funções e não se submetem às normas constitucionais sobre servidores públicos. Na realidade, a terceirização, nesses
casos, normalmente se enquadra nas referidas modalidades de terceirização
tradicional ou com risco, porque mascara a relação de emprego que seria própria
da Administração Pública; não protege o interesse público, mas, ao contrário,
favorece o apadrinhamento político; burla a exigência constitucional de
concurso público; escapa às normas constitucionais sobre servidores públicos;
cobra taxas de administração incompatíveis com os custos operacionais, com os
salários pagos e com os encargos sociais; não observa as regras das
contratações temporárias; contrata servidores afastados de seus cargos para
prestarem serviços sob outro título, ao próprio órgão do qual está afastado e
com o qual mantém vínculo de emprego público.
Aliás,
não estando investidas legalmente em cargos, empregos ou funções, essas pessoas
não têm condições de praticar qualquer tipo de ato administrativo que implique
decisão, manifestação de vontade, com produção de efeitos jurídicos; só podem
executar atividades estritamente materiais; são simples funcionários de fato. Foi uma das muitas fórmulas que se arrumou
para burlar todo um capítulo da Constituição Federal (do art. 37 ao 41), para
servir aos ideais de nepotismo e apadrinhamento a que não pode resistir
tradicionalmente à classe política brasileira.
[...].
Tais
contratos são manifestamente ilegais e
inconstitucionais. Eles correspondem a uma falsa terceirização e não escondem a intenção de burla à
Constituição.
Também
não há fundamento constitucional para essas empresas contratarem pessoal sem
concurso público. O art. 37, inciso II,
da Constituição Federal, ao exigir concurso público para investidura em cargo
ou emprego, atinge todas as entidades da Administração indireta, seja qual for
o tipo de atividade que exerçam (serviço público ou atividade econômica)
[GRIFEI].
Convém registrar
que, em recente decisão publicada em 16/6/2010, nos autos do processo REsp n.
1.191.095, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a
decisão da Justiça paulista que havia condenado, por improbidade
administrativa, o ex-prefeito de Taubaté (SP), acusado pelo Ministério Público
de contratar servidores sem concurso público.
O ex-prefeito
teve os direitos políticos suspensos por cinco anos e foi condenado, ainda, a
pagar multa de 20 vezes sua remuneração como prefeito, além de perder o cargo
público que ocupava atualmente.
Para o
Tribunal de Justiça de São Paulo, o ex-prefeito fez uso abusivo da lei que
autoriza a contratação sem concurso em situações excepcionais, transformando-a
em mecanismo rotineiro de burla à Constituição.
Segundo o
acórdão do tribunal paulista, a irregularidade restou claramente evidenciada,
pois não se cuidou de realizar nenhum concurso público ou, ao menos, de
estabelecer um cronograma de concursos durante a gestão do recorrente.
Tal decisão
corrobora a gravidade da eventual irregularidade aqui tratada, o que reitera a
necessidade de apuração dos fatos que levaram o município a efetuar gastos
nesse montante com terceirizações e contratações temporárias.
Por tais
razões esta representante ministerial sugere, ao final, a determinação para
autuação em apartado para aferição da regularidade ou não dos gastos efetuados
com terceirizações e contratações temporárias pelo município.
9.
Conclusão
Da análise
das informações apresentadas nestes autos e do relatório técnico, tem-se que o
responsável pela Unidade Gestora não apresentou justificativas suficientes para
elidir a irregularidade detectada pela instrução, referente ao descumprimento
do art. 167, incisos V e VI, da CRFB/88, cujo teor veda a abertura de Créditos Adicionais
Suplementares por conta da transposição, do remanejamento ou da transferência de
recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro,
sem prévia autorização legislativa específica.
Neste
contexto, oportuno transcrever o que preceitua nossa Lei Maior:
Art.
167. São vedados:
[...]
V
– a abertura de crédito suplementar ou especial sem prévia autorização
legislativa e sem indicação dos recursos correspondentes;
VI – a
transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria
de programação para outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização
legislativa;
Ocorre que
tal restrição é considerada gravíssima, a ponto de ensejar a rejeição das
contas apresentadas, conforme jurisprudência consolidada dessa Corte de Contas
expressamente consignada no art. 9º, incisos III e IV, da Decisão Normativa n.
TC-06/2008, in verbis:
Art.
9º As restrições que podem ensejar a
emissão de Parecer Prévio com recomendação de rejeição das contas prestadas
pelo Prefeito, dentre outras, compõe o Anexo I, integrante desta
Decisão Normativa, em especial as seguintes: [grifei]
[...]
III
– ORÇAMENTO (CRÉDITOS ADICIONAIS) – Suplementares ou Especiais. Abertura sem
prévia autorização legislativa e sem a indicação dos recursos correspondentes
(Constituição Federal, art. 167, V).
IV
– ORÇAMENTO (CRÉDITOS ORÇAMENTÁRIOS E ADICIONAIS) – Transposição, Remanejamento
ou Transferências de Recursos de uma categoria de programação para outra ou de
um órgão para outro sem prévia autorização legislativa (Constituição Federal,
art. 167, VI).
Em suas
justificativas (fls. 520-558), o responsável aduz que o Município não
descumpriu a legislação vigente, uma vez que promoveu as alterações necessárias
para ajuste do orçamento com a devida autorização prévia do Poder Legislativo
Municipal por meio do art. 27, inciso VI, da Lei de Diretrizes Orçamentárias, e
dos arts. 17, 18 e 19, da Lei Orçamentária Anual.
Todavia, o
remanejamento de recursos de uma atividade para outra deve estar amparado em
lei específica, consoante os
dispositivos acima transcritos, além do disposto no Prejulgado n. 1312, dessa
Corte de Contas, o qual melhor pormenoriza a presente questão:
1.
Os créditos suplementares e especiais necessitam de autorização legislativa
através de lei de iniciativa do Chefe do Poder Executivo, devendo a abertura se
dar através de decreto do Executivo, mediante prévia exposição justificativa e
indicação da origem dos recursos correspondentes. Pode haver autorização na Lei
Orçamentária Anual, conforme arts. 165, §8º, da Constituição Federal e 7º, I,
da Lei nº 4.320/64, somente para as hipóteses de superávit financeiro do
exercício anterior, excesso de arrecadação e operações de crédito, sendo
irregulares as autorizações na Lei Orçamentária Anual para as suplementações
cujos recursos sejam resultantes de anulação parcial ou total de dotações
orçamentárias, de que trata o art. 43, III, da Lei nº 4.320/64.
2.
A transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria
de programação para outra ou de um órgão para outro, de que trata o art. 167,
VI, da Constituição Federal, devem ocorrer mediante prévia autorização
legislativa específica, sendo incabível previsão neste sentido na Lei
Orçamentária Anual.
Portanto a
Lei de Diretrizes Orçamentárias e a Lei Orçamentária Anual para o exercício de
2010 não podem ser consideradas como justificativa para o ato, já que se trata
de autorização legislativa não
específica, logo, à margem da previsão constitucional.
Necessário,
ainda, frisar o fato de a Decisão Normativa n. TC-06/2008 encontrar-se em pleno em vigor.
A referida
norma foi fruto de diversos debates e estudos antes de sua edição, o que
culminou com o incremento de algumas irregularidades passíveis de rejeição de
contas antes não previstas na Portaria TC n. 233/2003.
O que se pode
concluir é que houve uma evolução no entendimento sobre a matéria no âmbito
dessa Corte de Contas, surgiram novos apontamentos, novas possibilidades de
rejeição de contas, as quais, ainda que sejam objeto de discordâncias pessoais,
estão claramente contidas na legislação interna em vigor.
Por fim,
salienta-se que a razão de ser do impedimento constitucional é não armar o
gestor com um cheque em branco para dispor, da maneira que bem entenda,
unilateralmente, do dinheiro público, sem a aquiescência da Câmara Municipal. O
dispositivo constitucional em foco representa também o mecanismo de freios e
contrapesos constante de nossa Constituição Cidadã.
É
que a prática do remanejamento de recursos, mediante transposições e transferências
de alta monta sem autorização legislativa específica para tal, macula os
princípios básicos que regem as normas orçamentárias, sobretudo o preceito de
que “o ordenador de despesas só pode fazer aquilo que as respectivas leis lhe
permitem – e nos termos e limites dessa permissão”.[2]
Por todas as
razões expostas, entendo que as contas em questão não podem ser tidas como boas
e opino, ao final, pela emissão de parecer propondo a sua rejeição.
E
considerando que as restrições
apontadas nos itens 2.1. e 2.2. da conclusão do relatório de
instrução podem
configurar grave infração à norma legal de natureza contábil, financeira,
orçamentária, operacional e patrimonial, devendo constar, na conclusão do
parecer prévio, a determinação para formação de autos apartados para fins de
exame desses atos de gestão.
Ante o exposto, o Ministério Público
de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II,
da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, manifesta-se:
1. pela emissão de parecer
recomendando à Câmara Municipal a REJEIÇÃO das contas da Prefeitura Municipal
de Barra Velha, relativas ao exercício de 2010;
2. pela DETERMINAÇÃO para formação de
autos apartados com vistas ao exame dos atos descritos nos itens 2.1. e 2.2. da conclusão do relatório de
instrução;
3. pela DETERMINAÇÃO para formação
de autos apartados para exame do ato referente à ausência de remessa do Plano
de Ação e do Plano de Aplicação referente ao Fundo Municipal da Infância e
Adolescência, em descumprimento do art. 260, § 2º, do ECA, c/c o art. 1º da
Resolução do CONANDA n. 105/2005;
4. pela DETERMINAÇÃO para realização de auditoria detalhada no Fundo Municipal
dos Direitos da Criança e do Adolescente, em face das irregularidades
constantes do capítulo 7 do relatório técnico (item 5 deste parecer), que podem
apontar para a existência de outras falhas relacionadas ao
gerenciamento e à utilização do referido fundo municipal;
5. pela
6.
pela RECOMENDAÇÃO para que sejam adotadas
providências visando à correção das deficiências de natureza contábil
constantes do capítulo 8 do relatório técnico (item 6 deste parecer), bem como
com vistas à
não reincidência no atraso da remessa de relatórios de controle interno a esse
Tribunal de Contas.
Florianópolis, 7 de dezembro de 2011.
Cibelly
Farias
Procuradora do Ministério Público de Contas