PARECER nº:

MPTC/6710/2011

PROCESSO nº:

REC 08/00716515    

ORIGEM:

Prefeitura Municipal de São José

INTERESSADO:

 

ASSUNTO:

Referente ao Processo -DEN-04/00041553

 

 

 

 

Versam os autos sobre Recurso de Reconsideração interposto pelo Sr. Dário Elias Berger, ex-Prefeito Municipal de São José, em face do Acórdão n. 1503/2008, dessa Corte de Contas, o qual aplicou multas ao recorrente, vazado nos seguintes termos:

Acórdão n. 1503/2008 - DEN 04/00041553. Sessão de 01/10/2008.

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

6.1. Conhecer do Relatório de Instrução que trata de irregularidades praticadas na execução dos Contratos ns. 076/98 e 041/2000, da Prefeitura Municipal de São José, relativos à contratação de empresa privada para a execução de serviços de coleta de lixo reciclável.

6.2. Aplicar ao Sr. Dário Elias Berger - ex-Prefeito Municipal de São José, CPF n. 341.954.919-91, com fundamento nos arts. 70, II, da Lei Complementar n. 202/00 e 109, II, c/c o 307, V, do Regimento Interno instituído pela Resolução n. TC-06/2001, as multas abaixo especificadas, com base nos limites previstos no art. 239, III, do Regimento Interno (Resolução n. TC-11/1991) vigente à época da ocorrência das irregularidades, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:


 

 

6.2.1. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da ausência de elementos objetivos que identificassem o objeto do contrato, decorrente de ausência de projeto básico e adequada caracterização dos serviços licitados e posteriormente contratados quando da realização do Procedimento Licitatório n. 3975 (Convite n. 90/98) realizado no ano de 1998, acarretando a inobservância ao disposto nos arts. 3º e 7º, I e § 2º, da Lei (federal) n. 8.666/93;

6.2.2. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em razão da realização de despesas no exercício de 1999 sem cobertura contratual, haja vista o Contrato n. 76/98 ter exaurido em 28 de junho de 1999, com violação ao disposto nos arts. 37, XXI, da Constituição Federal e 3º da Lei (federal) n. 8.666/93;

6.2.3. R$ 400,00 (quatrocentos reais), pela realização de despesa sem prévio empenho no exercício de 1999, especialmente quanto aos períodos relativos aos meses de janeiro a abril e julho a outubro, acarretando a inobservância do disposto no art. 60 da Lei (federal) n. 4.320/64;

 6.2.4. R$ 400,00 (quatrocentos reais), devido à emissão da Nota de Empenho n. 917/01, em 08 de fevereiro de 2001, para pagamento de serviços prestados nos meses de dezembro de 2000 e janeiro de 2001, violando o art. 60 da Lei (federal) n. 4.320/64;

6.2.5. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em razão da utilização indevida de recursos do orçamento do exercício de 2001 para pagamento de despesa do exercício anterior em decorrência do Contrato n. 041/2000, firmado em 03 de março de 2000, sem que fosse contabilizada em Restos a Pagar, previsto nos arts. 36 e 37 da Lei (federal) n. 4.320/64, conforme verificado na Nota de Empenho n. 917/01, de 08 de fevereiro de 2001, para pagamento dos serviços prestados no mês de dezembro de 2000.

6.3. Determinar o encaminhamento de cópia dos autos ao Ministério Público Estadual, em face do disposto no art. 129, I, da Constituição Federal, uma vez que o art. 92 da Lei (federal) n. 8.666/93 capitula como infração a conduta de admitir, possibilitar ou dar causa à prorrogação contratual sem autorização em lei, em favor do adjudicatório, incidindo nas mesmas penas o contratado que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, obtém vantagem indevida ou se beneficia, injustamente, das modificações ou prorrogações contratuais, consoante exposto no item 2.4 do Relatório DMU.

A Consultoria-Geral dessa Corte de Contas emitiu parecer (fls. 15-29), opinando pelo conhecimento do recurso de reconsideração e, no mérito, pelo seu desprovimento, mantendo-se na íntegra os termos da decisão recorrida.

 

Embora o recorrente tenha feito menção expressa à modalidade recursal eleita (Reconsideração), entendo que, preenchidos os demais requisitos de admissibilidade e por razões de equidade, e considerando, ainda, precedentes desta Corte em casos análogos a peça pode ser conhecida como Recurso de Reexame conforme dispõe os arts. 79 e 80 da Lei Complementar n. 202/2000, por ser o adequado contra a decisão proferida.

O recorrente é legítimo para interpor o recurso, uma vez que foi apontado como responsável pelas irregularidades narradas, a decisão atacada foi publicada na imprensa oficial em 1º.10.2008 e a peça recursal protocolizada nessa Corte de Contas no dia 16.10.2008, portanto, tempestiva.

Logo, encontram-se presentes todos demais requisitos de admissibilidade do presente recurso.

Em suas razões, o recorrente afirma, em síntese, que:

1. não dispõe de meios para comprovar documentalmente o projeto básico pelo tempo decorrido, porém, está convicto de que as empresas se pautaram em tal documento para apresentarem suas propostas;

2. a vigência do contrato 76/98 era de 12 meses (1º.7.1998 a 30.6.1999), e por equívoco, no contrato constou o pagamento a ser realizado apenas em 2008, o que foi regularizado mediante termo aditivo, solicitado pelo executor, antes da conclusão do contrato;

3. para o empenhamento das despesas do contrato 76/98, no exercício de 1999, foi firmado o termo aditivo de correção (nº 020/99), e ainda que tenha ocorrido atraso nos procedimentos e emissão da nota de empenho, a reserva orçamentária para a cobertura da despesa já havia sido efetuada; 

4. o contrato nº 41/2000 tinha sua vigência até 8.3.2001 e o empenho nº 917/01 foi emitido anteriormente a realização das despesas e do pagamento;

5. os empenhos do contrato nº 41/2000, no exercício de 2000, foram emitidos pelo orçamento da Fundação Municipal do Meio Ambiente e Agricultura, enquanto em 2001 as despesas passaram à responsabilidade da Prefeitura de São José, o empenhamento ocorreu no exercício da liquidação e anteriormente ao pagamento.

Após a análise dos documentos e informações que constam nos autos, verifico que os argumentos trazidos pelo recorrente não têm o condão de elidir as multas consignadas no Acórdão nº. 1503/2008, haja vista que não foram apresentadas alegações suficientes para afastar o posicionamento dessa Corte de Contas.

Passo à análise do mérito quanto aos apontamentos irregulares.

1                Ausência de projeto básico e adequada caracterização dos serviços licitados.

Em que pese as alegações do responsável, constatou-se na documentação relativa à licitação a falha referente à ausência de projeto básico já no primeiro relatório de instrução, mesmo após a audiência e as justificativas apresentadas.

Nessa oportunidade, o recorrente não logrou êxito em refutar as alegações da área técnica e apresentar qualquer comprovação de que o referido projeto básico existiu.

Sobre o tema, trago por pertinente o seguinte comentário da doutrina de Marçal Justen Filho[1], que dispõe sobre a importância da elaboração do projeto básico com todos seus elementos necessários como etapa necessária e prévia ao lançamento do edital:

A minúcia do inc. IX revela a relevância do tema para a Lei. O projeto básico deverá representar uma projeção detalhada da futura contratação, abordando todos os ângulos de possível repercussão para a Administração. Deverão ser abordadas as questões técnicas, as financeiras, os prazos, os reflexos ambientais (inclusive por força do art. 225, inc. IV, da CF) etc. O projeto básico não se destina a disciplinar a execução da obra ou do serviço, mas a demonstrar a viabilidade e a conveniência de sua execução. Deve evidenciar que os custos são compatíveis com as disponibilidades financeiras; que todas soluções técnicas possíveis foram cogitadas, selecionando-se a mais conveniente; que os prazos para execução foram calculados; que os reflexos sobre o meio ambiente foram sopesados etc. Inclusive questões jurídicas deverão ser cogitadas, na medida em que serão fornecidos subsídios para o plano de licitação [grifei].

Além disso, a instrução destacou a improcedência dos argumentos apresentados pelo responsável em face do acesso, pela equipe técnica de auditoria, aos originais do procedimento licitatório.

Portanto, a ausência do referido projeto básico é, no meu entender, uma grave irregularidade, pois, além de afronta a dispositivo legal que impõe expressamente tal obrigação, é pré-requisito sem o qual a obra ou o serviço não poderia ser iniciado.

Dessa forma, correta é a competente análise da instrução e da Consultoria-Geral, com as quais esta Representante Ministerial se coaduna, pela manutenção da multa aplicada.

2                Realização de despesas no exercício de 1999 sem cobertura contratual.

Embora o responsável torne a alegar a legalidade das despesas realizadas em virtude da existência de termo aditivo (Aditivo nº 068/99), verifica-se que a prorrogação ocorreu após o término da vigência do Contrato nº 076/98, o que confirma a ilegalidade.

Esta representante ministerial manifestou-se nos autos principais pela irregularidade em questão, nos seguintes termos:

A prorrogação é necessariamente um ato prévio ao termo final do ajuste celebrado, portanto, nesse contexto, não se poderia em outubro de 1999 prorrogar um contrato que já não estava vigente desde 30.6.1999.

O citado termo aditivo n. 068/99 é ato eivado de nulidade, e, consequentemente, também o são as despesas realizadas após 30.6.1999, por ausência de suporte contratual.

Em face da ausência de novas informações capazes de alterar a restrição, por corretas às análises da instrução e da Consultoria-Geral, opino pela manutenção da multa aplicada ao responsável.

3. Despesas realizadas sem prévio empenho, relativas ao contrato 076/98.

Quanto à ausência de prévio empenho, o responsável afirma em sua defesa que não houve interrupção em virtude do termo aditivo e que havia reserva orçamentária para o pagamento do contrato em questão.

As alegações suscitadas pelo recorrente não são em nada inovadoras, limitam-se a repetir os argumentos já apresentados nos autos em apenso, que foram devidamente refutados pela instrução, por este Ministério Público e pelo Tribunal de Contas.

Assim, considerando a ausência de novos elementos de convicção que possa alterar o entendimento já firmado, opino pela manutenção da irregularidade relativa à emissão de empenhos posteriores a realização de pagamentos do contrato 076/98.

4. Emissão da Nota de Empenho 917/01 em fevereiro/2001 para pagamento de despesas de dezembro de 2000 e janeiro de 2001.

Quanto a essa irregularidade, tal qual o item anterior, o art. 60 da Lei n. 4320/64 determina que seja feito um prévio empenho das despesas, e, como demonstrado no relatório de instrução (fl. 777-779 dos autos principais), ficou constatado que foram liquidadas despesas independentemente de emissão de prévio empenho, o que caracteriza afronta ao dispositivo supramencionado.

Dessa forma, uma vez não emitidos empenhos anteriormente à liquidação de despesas, caracterizada está a irregularidade, e conforme descrito nesse item do julgado, foi aplicada multa de R$ 400,00 ao ora recorrente em face da realização de despesa sem prévio empenho.

Novamente nesse tópico o recorrente não apresentou novos argumentos capazes de descaracterizar a irregularidade, razão pela qual proponho a manutenção da sanção pecuniária, na mesma linha dos precedentes desse Tribunal.

5. Utilização indevida de recursos do orçamento de 2001 para pagamento de despesas de 2000, sem a contabilização em Restos a Pagar.

No que tange esta impropriedade, esta representante ministerial se manifestou nos autos principais nos seguintes termos:

O responsável aduz, em síntese, que não houve duplicidade de empenhos e que, considerando que o contrato n. 041/2000 teve sua vigência a partir de 8.3.2000, entendeu-se que a liquidação da despesa mensal havia ocorrido em 8.1.2000.

A irregularidade apontada neste tópico está correlacionada com a verificada no item anterior.

Na ordem natural dos fatos, os serviços prestados em dezembro de 2000 deveriam ter sido previamente empenhados e posteriormente quitados com os recursos do orçamento do mesmo exercício ou inscrita a despesa em restos a pagar.

Entretanto, além de não efetuar o prévio empenho da despesa (que só se deu em fevereiro de 2001), serviços prestados em 2000 foram quitados com recursos orçamentários do exercício seguinte, em evidente confronto à disposição contida no inciso II do art. 35 da Lei 4.320/64.

Portanto, pouco importa o dia em que iniciou a vigência contratual, despesas realizadas (e que deveriam ter sido legalmente empenhadas) em 2000 pertencem a esse exercício financeiro e não poderiam ser quitadas com recursos financeiros provenientes do exercício seguinte.

Compulsando os autos apensados verifiquei que os mesmos argumentos apresentados, relativos a esta irregularidade, estão contidos nos autos principais (DEN 04/00041553), os quais também foram devidamente refutados pela instrução, por este Ministério Público, pelo Relator e pelo Pleno, mantendo-se, desta forma, a penalidade imposta.

Portanto, considerando que novamente não foram apresentadas informações que posam elidir as irregularidades constatadas, manifesto-me pela manutenção, na íntegra, do julgamento proferido nos autos do Processo DEN 04/00041553.  

Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se pelo CONHECIMENTO do recurso interposto, para, no mérito, NEGAR-LHE PROVIMENTO, mantendo-se hígida a decisão recorrida.

Florianópolis, 7 de dezembro de 2011.

 

 

 

 

Cibelly Farias

Procuradora do Ministério Público de Contas

 



[1] FILHO, Marçal Justen. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 11 ed. São Paulo, Dialética, 2005, p.100.