PARECER nº:

MPTC/10540/2012

PROCESSO nº:

LCC 10/00260280    

ORIGEM:

Prefeitura Municipal de Penha

INTERESSADO:

 

ASSUNTO:

Edital de Concorrência 01/2006 - Contratação de Serviço Público de Engenharia Sanitária.

 

 

 

 

 

 

Trata-se de análise do Edital de Concorrência 01/2006, lançado pela Prefeitura de Penha, e respectivo contrato firmado com a empresa Recicle Catarinense de Resíduos Ltda., cujo objeto é a contratação de serviços de engenharia sanitária.

A Diretoria de Controle de Licitações e Contratações emitiu o Parecer Técnico 1003/2010 (fls. 663-691) sugerindo a audiência do Sr. Julcemar Alcir Coelho, ex-Prefeito Municipal de Penha, para que apresentasse justificativas acerca das seguintes irregularidades:

3.1.1. Ausência de indicação de metas no edital da concessão, em desacordo com o inc. I do art. 18 da Lei nº. 8.987/95 (item 2.1 deste Relatório);

3.1.2. Fixação no edital de critérios de pontuação técnica subjetivos, desrespeitando os artigos 3º, 40, inc. VII, 45 e 46 da Lei n. 8.666/93 (item 2.2 Deste Relatório);

3.1.3. Ausência de informações no edital referentes ao Fluxo de Caixa para verificação e manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, desatendendo a regra do art. 9º da Lei n. 8987/95 (item 2.3 deste Relatório);

3.1.4. Ausência de condições para prorrogação do prazo da concessão, conforme determina o art. 23, inciso XII, e art. 9º, § 4º, ambos da Lei nº. 8.987/95, c/c a alínea “d” do inciso II do artigo 65 da Lei nº 8.666/93 (item 2.4 deste Relatório);

3.1.5. Inexistência de indicação de órgão regulador do serviço público concedido, em desacordo com o artigo 30, parágrafo único, da Lei nº 8.987/95 (item 2.5 deste Relatório);

3.1.6. Inexistência de critérios, indicadores, fórmulas e parâmetros definidores da qualidade dos serviços concedidos, em desacordo com o inciso III, artigo 23 da Lei nº 8.98795 (item 2.6 deste Relatório);

3.1.7. Ausência de cláusula contratual com previsão de prestação de constas, em desacordo com o inc. XIII do art. 23 da Lei nº 8.987/95 (item 2.7 deste Relatório);

3.1.8. Ausência de cláusula com a exigência da publicação de demonstrações financeiras da concessionária – cláusula essencial do Contrato de Concessão, em descumprimento ao artigo 23 da Lei nº 8.987/95 (item 2.8 deste Relatório);

3.1.9. Ausência de indicação da legislação local que autorizou a concessão e do regulamento da concessão inobservando o disposto nos arts. 34; 107 e 108 da Lei nº 1071 de 05/11/1999 (Lei Orgânica do Município de Penha) e art. 55 da Lei nº 8.666/93 (item 2.9 deste Relatório);

3.1.10. Ausência de critério de avaliação dos bens reversíveis ao final da concessão, desrespeitando o art. 23, IX da Lei nº. 8.987/95 (item 2.10 deste Relatório);

 

O responsável remeteu os documentos de fls. 702-710.

A Diretoria de Controle de Licitações e Contratações –DLC, Inspetoria 1 emitiu o Parecer Técnico 406/2011 (fls. 713-720) opinando pela aplicação de multas ao responsável em face das irregularidades de caráter técnico, referidas nos itens 3.1.1, 3.1.2 e 3.1.3 da conclusão do relatório.

A Diretoria de Controle de Licitações e Contratações –DLC, Inspetoria 2 emitiu o Parecer Técnico 05/2012 (fls. 721-752) opinando pela aplicação de multas ao responsável em face das irregularidades descritas nos itens 3.4.1 a 3.4.8 da conclusão do relatório.

Preliminarmente, o responsável sustenta a suspensão da tramitação destes autos em face da existência de decisão judicial na 2ª Vara Cível da Comarca de Balneário Piçarras, que determinou ao Município de Penha o cumprimento dos termos do Contrato de Concessão 14/2007, registrando que tal decisão está em grau de recurso.

Contudo, tal manifestação não deve ser levada em conta, conforme já mencionou a instrução nestes autos, já que se tratam de esferas distintas: a administrativa e a judicial, e, em face do principio da independência das instâncias, não há nenhuma vinculação entre as decisões de uma esfera à outra.

Passo à análise das restrições apontadas pela instrução.

1.     Ausência de indicação de metas no edital de concessão.

Foi identificado pela instrução que no Edital de Concessão 14/2007 não havia a indicação de metas e investimentos a serem atingidos, por meio de cronogramas e especificações, em desacordo com o inciso I, do art. 18 da Lei 8.987/95, in verbis:

Art. 18. O edital de licitação será elaborado pelo poder concedente, observados, no que couber, os critérios e as normas gerais da legislação própria sobre licitações e contratos e conterá, especialmente:

I - o objeto, metas e prazo da concessão;

[...]

O responsável alega que as metas a serem obtidas durante o prazo da concessão são as mesmas exigidas desde o início da contratação, e que não haveria necessidade de constar no edital.

Contudo, a justificativa apresenta diverge claramente da exigência legal.

É importante frisar que o plano de metas é um documento de extrema relevância no âmbito da concessão, pois é por meio dele que se pode aferir se os objetivos contratuais estão ou não sendo atingidos, a cada etapa do contrato, e, consequentemente, servirá como parâmetro essencial para que o poder concedente possa fiscalizar a prestação do serviço.

Considerando que o responsável não apresentou alegações passíveis de aceitação, resta mantida a restrição.

2.     Fixação no edital de critérios de pontuação técnica subjetivos. 

A instrução apurou que no Contrato de Concessão 14/2007, houve a fixação de critérios de pontuação técnica subjetivos, desrespeitando os arts. 3º, 40, VII, 45 e 46 da Lei 8.666/93, conforme item 5.2 do edital (fl. 730-731), abaixo:

Pontuação técnica

Item

Tópicos

Pontos a atribuir

Não atende

Atende parcialmente

Atende totalmente

5.2.1

a) descrição e planejamento dos serviços

0

15

30

b) plano de emergência

0

10

20

5.2.2

a) descrição e planejamento dos serviços

0

15

30

5.2.3

A1) sistemas técnico-administrativos

0

5

10

A2) relação de pessoal

0

2

4

b) plano de manutenção e conservação

0

5

10

c) plano de substituição de veículos

0

5

10

d) plano de segurança e higiene

0

3

6

 

O subitem 5.2.4 do edital menciona que a pontuação atribuída a cada tópico dos itens 5.2.1 à 5.2.3, da Proposta Técnica, obedeceria ao seguinte critério:

Definição

Critério

Não Atendimento

Não atendimento a qualquer exigência contida no item 5.1 do Edital, para cada tópico específico (ausência de tópico ou ainda por falhas que comprometam a Proposta Técnica).

Atendimento Parcial

Atendimento parcial a qualquer exigência contida no item 5.1 do Edital. Para cada tópico específico, desde que não comprometa a Proposta Técnica.

Atendimento Total

Pelo não atendimento integral e qualquer exigência contida no item 5.1 do Edital, para cada tópico específico.

 

O responsável afirma que a análise da proposta técnica é feita com base nos parâmetros estabelecidos para o serviço a ser prestado e julgado por comissão especial de licitação. E que a matéria se encontra superada, já que o contrato foi assinado e não houve prejuízo ao erário municipal.

Conforme expôs a instrução à fl. 670, as definições do item 5.2.4 do edital, para “não atendimento” e “atendimento parcial”, são totalmente subjetivas, pois não demonstra quais falhas são aptas a comprometer a proposta técnica, tampouco visualiza se o nãoatendimento de um tópico específico pode ser considerado falha formal sem prejuízo à proposta técnica. Portanto, impossível saber objetivamente se o tópico atende totalmente ou apenas parcialmente para efeito de atribuição de notas.

Na esteira do raciocínio, afirma Marçal Justen Filho[1]:

A Administração deverá adotar o máximo de cautela na prática de licitação nessas modalidades. Além de justificar adequadamente a opção pelo tipo específico de licitação, deverão ser elaborados editais minuciosos, que discriminem claramente as exigências técnicas e os critérios de julgamento. Ademais, a comissão de licitação deverá ser integrada por profissionais de capacitação compatível com a dificuldade do certame. As decisões deverão ser devidamente motivadas, reportando-se aos dados técnicos que nortearam o julgamento. [grifei]

 

Ainda sobre o tema, trago ainda a abordagem feita no XII Ciclo de Estudos da Administração Municipal deste Tribunal de Contas, por esclarecedora:

7 É POSSÍVEL A PREVISÃO DE CRITÉRIOS SUBJETIVOS PARA PONTUAÇÃO DAS PROPOSTAS TÉCNICAS?

Na Decisão nº 0912/09 (SANTA CATARINA, 2010b) o TCE entendeu ilegal a realização de licitação para a concessão dos serviços Públicos de Abastecimento de água e esgotamento sanitário com a previsão de critérios subjetivos para fins de pontuação das propostas técnicas.

Da mesma forma, na Decisão nº 3.674/08 (Santa Catarina, 2010a), o TCE declarou ilegal a Concorrência realizada para a seleção de única empresa ou consórcio para a prestação de Serviço Público de Transporte Coletivo de Passageiros em razão, dentre outras questões apontadas, da previsão de critérios subjetivos para fins de julgamento nas propostas.

O julgamento deve ser pautado por meio de critérios definidos no edital de forma objetiva, sob pena de se contrariar ao disposto nos arts. 14 da lei nº 8.987/95 e aos arts. 40, 44 e 45 da lei nº8.666/93 [grifei].

 

NO entender desta Procuradora, os critérios “atendimento parcial” e “não atendimento” não se mostram suficientemente claros, portanto, insuficientes para se estabelecer um julgamento objetivo e imparcial do certame, razão pela qual o pino também pela manutenção da restrição.

3. Ausência de informações no edital referentes ao fluxo de caixa.

Foi constatado pela instrução que no edital de concessão não havia prescrição acerca do fluxo de caixa da contratada.

Conforme expôs o relatório técnico, o fluxo de caixa é importante para que desde o início do contrato haja uma correspondência proporcional entre as entradas e saídas de valores, de modo que se estabeleça certa simultaneidade entre o desembolso e o ingresso apto a compensá-lo, repercutindo na estabilidade contratual. No caso em tela, de acordo com o serviço prestado, pode haver uma variação de valores imensa nos 20 anos da concessão, por isso é importante haver a clara definição do objeto para a efetiva prestação do serviço.

Em suas alegações de defesa, o responsável afirma que a exigência do fluxo de caixa não está previsto em lei, e ainda, que o contrato prevê mecanismos de fiscalização da concessão, os quais dão amplo acesso às informações dos serviços e permite exigir da concessionária os documentos necessários.

A instrução, por sua vez, afirma que o fluxo de caixa, no caso de concessões se confunde com o próprio orçamento básico, que é previsto em lei, pois é fonte para avaliação de custos das obras e serviços. A ausência do fluxo de caixa representa um orçamento básico mal avaliado, portanto afronta aos dispositivos legais.

 Aduz ainda que o responsável deveria ter demonstrado a viabilidade da prestação do serviço, assim como documentos que comprovassem a realização de estudo de estimativa de fluxo de caixa circunstanciado.

Sobre política tarifária, positiva a Lei n. 8.987/95:

Art. 9º A tarifa do serviço público concedido será fixada pelo preço da proposta vencedora da licitação e preservada pelas regras de revisão previstas nesta Lei, no edital e no contrato.

§ 1º A tarifa não será subordinada à legislação específica anterior e somente nos casos expressamente previstos em lei, sua cobrança poderá ser condicionada à existência de serviço público alternativo e gratuito para o usuário.

§ 2º Os contratos poderão prever mecanismos de revisão das tarifas, a fim de manter-se o equilíbrio econômico-financeiro.

§ 3º Ressalvados os impostos sobre a renda, a criação, alteração ou extinção de quaisquer tributos ou encargos legais, após a apresentação da proposta, quando comprovado seu impacto, implicará a revisão da tarifa, para mais ou para menos, conforme o caso.

§ 4º Em havendo alteração unilateral do contrato que afete o seu inicial equilíbrio econômico-financeiro, o poder concedente deverá restabelecê-lo, concomitantemente à alteração.

Art. 10. Sempre que forem atendidas as condições do contrato, considera-se mantido seu equilíbrio econômico-financeiro.

Art. 11. No atendimento às peculiaridades de cada serviço público, poderá o poder concedente prever, em favor da concessionária, no edital de licitação, a possibilidade de outras fontes provenientes de receitas alternativas, complementares, acessórias ou de projetos associados, com ou sem exclusividade, com vistas a favorecer a modicidade das tarifas, observado o disposto no art. 17 desta Lei.

Parágrafo único. As fontes de receita previstas neste artigo serão obrigatoriamente consideradas para a aferição do inicial equilíbrio econômico-financeiro do contrato.

Dessa maneira, nota-se uma grande preocupação do legislador com a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato. E neste sentido é necessário destacar a relevância do fluxo de caixa, um dos principais itens para o acompanhamento do contrato de concessão, o que parece ter sido novamente olvidado na elaboração do edital por parte da Unidade Gestora, a qual não demonstrou a realização de estudo de fluxo de caixa que pudesse dar o devido suporte à fixação do valor máximo da tarifa média.

O direito à manutenção das cláusulas econômicas e financeiras tem raiz constitucional, no art. 37, XXI da Carta Magna. Tem previsão na Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Lei n° 8.666/93, e, quanto às Concessões Públicas, o direito ao equilibro encontra respaldo na Lei nº 8.987/95, dentre outros dispositivos legais.

Acerca da importância do fluxo de caixa, trago as palavras do Ministro Walton Alencar Rodrigues, relator do Acórdão n° 393/2002 – TCU-Plenário:

"O fluxo de caixa é o instrumento que permite, a qualquer instante, verificar se a taxa interna de retorno original está sendo mantida. Cabe ressaltar que a Taxa Interna de Retorno – TIR é extraída diretamente da proposta vencedora da licitante e expressa a rentabilidade que o investidor espera do empreendimento. Em termos matemáticos, a TIR é a taxa de juros que reduz a zero o valor presente líquido do fluxo de caixa, ou seja, a taxa que iguala o fluxo de entradas de caixa com as saídas, num dado momento.

Assim, pode-se dizer que a manutenção da taxa interna de retorno é garantia tanto do Poder Público, quanto da concessionária, e sua modificação dá ensejo à revisão contratual, na forma prevista na lei e no contrato."

Assim, diante da ausência de informações acerca do fluxo de caixa, que seria indispensável para aferir a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, a presente irregularidade também merece ser mantida.

4. Ausência de condições para prorrogação do prazo da concessão.

Restou identificado que tanto o Edital de Concorrência 01/2006, quanto o Contrato de Concessão 14/2007 não descreverem as condições para a prorrogação do contrato, o que é obrigatório segundo o art. 23, XII, da Lei 8.987/95, abaixo transcrito:

Art. 23. São cláusulas essenciais do contrato de concessão as relativas:

[...]

XII - às condições para prorrogação do contrato;

[...]

Em suas alegações, o responsável afirma que o texto do edital fala em “prorrogável” e que isso não assegura a prorrogação do contrato, conforme sugere a instrução e que a perpetuação ficaria a critério do poder concedente.

Contudo, o cerne da questão se dá em face da ausência de condições para a prorrogação, não se questiona a possibilidade de prorrogar, que é legalmente prevista em lei.

A prorrogação contratual nessas hipóteses deve ser a exceção, por isso a norma estipulou a existência de condições que a justifique.

Também é equivocado o entendimento de que a prorrogação contratual deve se dar a critério exclusivo do poder concedente, pois, em respeito ao princípio da impessoalidade, é imprescindível a sua motivação.

Sobre a necessidade de expressar as condições para a prorrogação do prazo de concessão, Maria Sylvia Zanella Di Pietro[2] traz o seguinte ensinamento:

Quanto à prorrogação do contrato, é ela possível desde que prevista no edital e no contrato, ainda que a Lei º 8.987 só contenha a menção a essa exigência no art. 23, inciso XII, entre as cláusulas essenciais ao contrato de concessão. Assim é porque o principio da vinculação ao instrumento convocatório, inerente a todos os tipos de licitação (art. 3º da Lei nº 8.666), impediria a previsão, no contrato se não tivesse havido a menção expressa a essa possibilidade no edital de licitação. Nesse instrumento é que a Administração deverá estabelecer os critérios e as condições em que a prorrogação será possível.

A rigor, a própria lei deveria conter esses critérios para evitar burla à exigência de licitação, constante do art. 175 da Constituição Federal. Como os prazos das concessões são, em regra, bastante longos, a prorrogação somente se justifica em situações excepcionais, para atender ao interesse público devidamente justificado ou mesmo na hipótese em que o prazo originariamente estabelecido se revele insuficiente para amortização dos investimentos. De outro modo, a prestação do serviço poderá ficar indefinidamente nas mãos da mesma empresa, burlando realmente o principio da licitação [grifou-se].

 

A propósito, cita-se ainda o posicionamento de Eurico de Andrade Azevedo e Maria Lúcia Mazzei de Alencar[3]:

A prorrogação é faculdade do poder concedente, que só deverá efetuá-la se o concessionário estiver cumprindo bem suas obrigações e a tarifa for compatível com o nível econômico da maioria dos usuários do serviço, mas sempre dependendo do exame da conveniência e oportunidade da medida.

A nosso ver, a prorrogação da concessão deve ser medida excepcional, pois a regra é a licitação. [...]. A prorrogação quase automática das concessões ainda é um resquício da influência das poderosas empresas estatais, antigas concessionárias dos principais serviços públicos em nosso País.

 

E é nessa linha de orientação – a de que é imprescindível a motivação para justificar a prorrogação da concessão -, que esse Tribunal de Contas tem se pautado, conforme orientação publicada no caderno referente ao XII Ciclo de Estudos de Controle Público da Administração Municipal, que abaixo transcrevo, por esclarecedor:

4. É CORRETA A PREVISÃO DE PRORROGAÇÃO DO PRAZO DA CONCESSÃO SEM DEFINIÇÃO DAS CONDIÇÕES MÍNIMAS NECESSÁRIAS PREVIAMENTE NO CONTRATO?

Na Decisão nº. 0912/2009 (processo ELC 08/00069307) o TCE entendeu ilegal a realização de licitação para a concessão dos serviços Públicos de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário sem a previsão de condições de prorrogação que não atendem à exigência contida no inciso XII, do art. 23 da Lei federal nº. 8.987/95.

É certo que é possível a prorrogação do prazo da concessão, mas esta não poderá ser determinada sem definição das condições mínimas previstas no contrato.

Como exemplo, o Tribunal de Contas apontou a previsão, contida em edital, de prorrogação do prazo da concessão por mais 30 anos, se houver interesse das partes, a exclusivo critério do poder concedente.

O prazo da concessão deve ser definido pelo prazo suficiente para a total amortização dos investimentos.

No plano ideal, se o estudo de viabilidade econômico-financeira (fluxo de caixa) refletir ao longo da concessão todos os custos e receitas necessárias para a amortização do investimento, é de se esperar que esta se realize dentro do prazo inicialmente fixado, de modo que não se apresenta correta a prorrogação do prazo da concessão, salvo se houver a necessidade de, ao fim da concessão, ainda persistir a necessidade de serem amortizados os investimentos feitos, principalmente aqueles realizados nos últimos meses da concessão. Aliás, este é um dos papeis fundamentais dos órgãos reguladores, qual seja, durante a execução, ajustar os direitos e obrigações de forma a zerar o fluxo de caixa ao final do prazo da concessão.

Uma vez atingidos os objetivos e metas da concessão anterior, e considerando que a concessionária já foi remunerada pela obras e serviços prestados ao longo da concessão, não se apresenta correta a simples replicação do prazo da concessão, pois esta nova concessão não representará as mesmas características da anterior, nem fáticas, nem econômico-financeiras. Deste modo, se o poder concedente deseja manter a exploração dos serviços com a iniciativa privada, deverá definir novos objetivos e metas, elaborando novos estudos econômico-financeiro para que a nova concessionária possa atuar, após escolha em novo procedimento licitatório. Esta é uma das condições para que a concessão possa ser prorrogada, e como se trata de medida excepcional, deve vir expressamente prevista no contrato.

Não se deve prorrogar concessão por entender que os serviços estão sendo bem prestados, ou porque a concessionária já dispõe de conhecimento suficiente e por possuir o domínio das técnicas necessárias para execução dos serviços, ou pior, por ser mais “fácil ou cômodo” à administração prorrogar a concessão, por não saber como fazer nova licitação.

Em nenhuma das hipóteses ventiladas no parágrafo anterior a prorrogação deve ser autorizada. Nova licitação deve ser determinada pela autoridade competente, primeiro, porque a boa e regular prestação dos serviços é obrigação da concessionária e não critério para qualificá-la como pré ou única qualificada à prestação destes serviços, de modo que a qualidade da prestação dos serviços não pode ser considerada para que o titular do poder concedente autorize a prorrogação. Pior ainda é prorrogar por não saber como fazer nova licitação, ou por não saber como definir os principais aspectos exigidos para a exploração dos serviços, tais com a elaboração do plano de saneamento básico, exigido pela Lei federal nº. 11.445/07, como condição sine qua non para viabilização da concessão destes serviços.

 

Salienta-se ainda que a presente irregularidade já foi objeto de análise nos autos do Processo ELC n. 11/00048259 e assim ficou assentada a irregularidade:

O TRIBUNAL PLENO, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59, c/c o art. 113 da Constituição Estadual, 1º da Lei Complementar n. 202/2000 e 6º da Instrução Normativa n. TC-05/2008, decide:

6.1. Conhecer do Edital de Concorrência n. 08/2010, de 29/12/2010, da Prefeitura Municipal de Tubarão, cujo objeto é a outorga de permissão de serviços funerários no Município de Tubarão, compreendendo a venda de urnas e/ou ataúdes, preparação, higienização e transporte de cadáveres humanos, aluguel de altares e mesas, locação de banquetas, castiçais, velas e paramentos afins, locação de capelas velatórias, tanatopraxia, confecção de coroas de flores e ornamentação com flores, pelo período de 20 (vinte) anos, e arguir as ilegalidades abaixo descritas, apontadas pelo Órgão Instrutivo no Relatório de Instrução DLC n. 129/2011:

[...]

6.1.8. Prazo da permissão e previsão de prorrogação sem a devida sustentação legal, conforme determinam os arts. 23, XII, e 9º, § 4º, da Lei (federal) nº 8.987/95 c/c a alínea “d” do inciso II do art. 65 da Lei (federal) nº 8.666/93 (item 2.8 do Relatório DLC);

[...] (grifou-se).

 

Assim, pode-se concluir que as condições para a prorrogação do contrato de concessão devem vir expressas na minuta do contrato, o que não foi observado no presente caso, considerando-se ainda que o edital de concessão apenas define que o prazo poderá ser prorrogado por igual período ao inicialmente estipulado, sem apresentar nenhum esclarecimento com relação às condições necessárias que devem anteceder a tal prorrogação.

Dessa forma, entende esta Procuradora que não podem ser aceitas as alegações do responsável, haja vista que não sanam a ilegalidade levantada pela instrução.

5. Inexistência de indicação de órgão regulador do serviço público concedido.

A instrução apurou que o Contrato de Concessão n. 14/2007 limitou-se a prever de forma genérica como se dará a fiscalização dos serviços, sem delimitar as atividades de fiscalização, assim como não indicou o órgão regulador competente para exercê-la, conforme cláusulas terceira e décima quinta do contrato (fls. 737-738), o que afronta ao inciso VII do art. 23, e art. 30, parágrafo único, da lei 8.987/95, vazados nos seguintes termos:

Art. 23. São cláusulas essenciais do contrato de concessão as relativas:

[...]

VII - à forma de fiscalização das instalações, dos equipamentos, dos métodos e práticas de execução do serviço, bem como a indicação dos órgãos competentes para exercê-la;

Art. 30. No exercício da fiscalização, o poder concedente terá acesso aos dados relativos à administração, contabilidade, recursos técnicos, econômicos e financeiros da concessionária.

Parágrafo único. A fiscalização do serviço será feita por intermédio de órgão técnico do poder concedente ou por entidade com ele conveniada, e, periodicamente, conforme previsto em norma regulamentar, por comissão composta de representantes do poder concedente, da concessionária e dos usuários [grifei].

 

Em suas alegações, o responsável afirma que a lei menciona que a fiscalização do serviço será feita por intermédio de órgão técnico do poder concedente ou por entidade com ele conveniada, alegando que não faltam órgãos fiscalizadores, como o próprio Tribunal de Contas, FATMA, IBAMA, entre outros.

De fato existem alguns órgãos fiscalizadores conforme menciona o responsável, no entanto, isso não exime o poder concedente de instituir um órgão fiscalizador próprio para o contrato de concessão ou de firmar um convênio específico para tal finalidade, conforme obriga a lei.

Novamente valho-me das orientações repassadas por esse Tribunal de contas a todos os gestores municipais por intermédio da publicação relativa ao XII Ciclo de Estudos da Administração Municipal, que corrobora a irregularidade aqui constatada:

8 É NECESSÁRIA A DESIGNAÇÃO DA ENTIDADE DE REGULAÇÃO E FISCALIZAÇÃO? E QUAIS OS SEUS PODERES REGULAMENTARES?

Na Decisão nº 0912/09 (SANTA CATARINA, 2010b) o TCE entendeu ilegal a realização de licitação para a concessão dos serviços Públicos de Abastecimento de água e esgotamento sanitário sem a designação da entidade de regulação e fiscalização.

Atualmente, a prestação dos serviços públicos pressupõe a existência de órgãos reguladores da atividade dotados de instrumentos hábeis para que o objetivo maior da concessão seja alcançado, ou seja, a prestação de serviço público eficiente, atual e de qualidade com tarifação módica.

O âmbito de atuação de cada órgão regulador deverá ser definido na lei que os instituir. O importante é que os órgãos reguladores devem ser criados com independência, autonomia e orientado com critérios que privilegiem a capacitação técnica de sua atuação, livre de pressões políticas ou de interesses econômicos, especialmente com o estabelecimento de mandatos fixos e reconhecimento de estabilidade dos dirigentes, com vista a disciplinar e controlar as atividades desenvolvidas pelas concessionárias, para o cumprimento de regras gerais e/ou específicas já positivadas no ordenamento jurídico, a fiscalizar a execução dos serviços outorgados pelo poder público e a aplicar sanções aos que descumprirem as normas previstas em lei, regulamento ou contrato referente aos serviços ou atividade e a zelarem pela defesa dos direitos dos usuários do serviço público.

[...]

Desta forma, fica mantida a restrição.

6. Inexistência de critérios, indicadores, fórmulas e parâmetros definidores da qualidade dos serviços concedidos.

A instrução identificou que na cláusula oitava do Contrato de Concessão 14/2007 não estão previstos os critérios definidores da qualidade do serviço concedido, ou seja, não há parâmetros quantitativos e qualitativos para avaliar a prestação do serviço, em afronta ao inciso III, do art. 23 da Lei 8.987/95, que assim estabelece:

Art. 23. São cláusulas essenciais do contrato de concessão as relativas:

[...]

III - aos critérios, indicadores, fórmulas e parâmetros definidores da qualidade do serviço;

[...]

O responsável alega que na cláusula oitava estão previstos os critérios necessários, e que no caso em tela não se tratam de serviços complexos que demandariam análises técnicas precisas, mas seriam parâmetros de fácil identificação.

A instrução expõe sobre a necessidade de definição expressa desses critérios da seguinte forma (fl. 717):

“os critérios são importantes na definição dos requisitos mínimos necessários para se avaliar a qualidade dos serviços que serão prestados.

Os indicadores correspondem aos níveis de qualidade que se pode definir no contrato e avaliar a partir da comparação dos critérios estabelecidos com a utilização de uma determinada metodologia para sua obtenção.

As fórmulas sinalizam a expressão da metodologia de aferição para fins de se verificar a qualidade dos serviços.

Os parâmetros correspondem à definição de uma padronização, um modelo a ser atendido pela concessionária.”

 

Vê-se ainda a abordagem feita sobre o tema no XII Ciclo de Estudos da Administração Municipal deste Tribunal de Contas, a qual reitera a ilegalidade na omissão relatada neste tópico:

6 É NECESSÁRIA A DEFINIÇÃO DE CRITÉRIOS, INDICADORES, FÓRMULAS E PARÂMETROS DEFINIDORES DA QUALIDADE  DOS SERVIÇOS CONCEDIDOS?

Na Decisão nº 0912/09 (SANTA CATARINA, 2010b) o TCE entendeu ilegal a realização de licitação para a concessão dos serviços Públicos de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário sem a definição dos critérios, indicadores, fórmulas e parâmetros definidores da qualidade dos serviços concedidos.

Trata-se de cláusula essencial de todo contrato de concessão, previsto como regra geral no art. 23, inc. III da lei nº 8.987/95.

É cediço que constitui dever do Poder Público a prestação de serviços com qualidade mínima que atenda ao interesse público motivador da prestação dos serviços, independentemente se esta prestação se faz direta ou indiretamente. E mais, do outro lado da moeda, encontramos como direito básico dos usuários dos serviços públicos o recebimento de um serviço público adequado.

Mas como aferir objetivamente o cumprimento da qualidade prestada pelo concessionário, se o Poder Público não a definir previamente no edital e lançá-la no contrato? E mais, como reconhecer a caducidade pelo descumprimento dos padrões mínimos de qualidade se estes não vierem descritos objetivamente no contrato?

Sintaticamente, pode-se entender que os critérios importam na definição dos requisitos mínimos necessários para se aferir a qualidade dos serviços que serão prestados. Indicadores correspondem aos níveis de qualidade que se pode objetivamente definir no contrato e aferir a partir do cotejo dos critérios estabelecidos com a utilização de uma determinada metodologia para sua obtenção, ou seja, está mais relacionado com a realidade da situação fática que vive cada poder concedente que indica qual a postura ou ação que deve ser adotada pela concessionária para atingir à finalidade pública almejada com a concessão. Por sua vez, fórmulas sinalizam a expressão da metodologia de aferição para fins de se verificar a qualidade dos serviços, e por fim, os parâmetros correspondem à definição de uma padronização, um modelo a ser atendido pela concessionária.

 

Assim, entendo que não possam ser aceitas as alegações do responsável, tendo em vista que não há no Contrato de Concessão 14/2007 os critérios necessários para avaliar a qualidade dos serviços prestados. Deste modo, fica mantida a restrição.

7. Ausência de cláusulas contratuais com previsão de prestação de contas e de publicação de demonstrações financeiras da concessionária.

O item analisado refere-se aos apontamentos de números 2.2.4 e 2.2.5 do relatório DLC 05/2012.

A instrução identificou que tanto no Edital de Concorrência 01/2006, quanto no Contrato de Concessão 14/2007 não estão presentes as cláusulas de previsão da prestação de contas, e de publicidade de demonstrações financeiras periódicas da concessionária, em afronta aos incisos XIII e XIV, do art. 23 da Lei 8.987/95, que assim dispõem:

Art. 23. São cláusulas essenciais do contrato de concessão as relativas:

[...]

XIII - à obrigatoriedade, forma e periodicidade da prestação de contas da concessionária ao poder concedente;

XIV - à exigência da publicação de demonstrações financeiras periódicas da concessionária; e

[...]

O responsável, em suas alegações de defesa, afirma que apesar de não haver a cláusula mencionada, ainda pode ser criada por meio de complementação adicional do contrato, já que, segundo ele, o poder fiscalizatório o permite.

Contudo, as alegações do responsável não devem prosperar. A lei é clara quando cita que a cláusula do contrato que contenha a prestação de contas é essencial à efetividade do contrato. Tampouco é possível desprezar a cláusula que exige a publicação das demonstrações financeiras da concessionária, haja visto que ambos os institutos são de extrema importância para aferir as reais condições em que se dá a prestação do serviço concedido, em respeito ao princípio da publicidade e da transparência.

Assim, em face dessas omissões contratuais, opino também pela manutenção das irregularidades aqui analisadas.

8. Ausência de indicação da legislação local que autorizou a concessão e do regulamento da concessão inobservando lei municipal.

A instrução apurou que não houve nenhuma referência à lei que permitisse a concessão dos serviços licitados, em afronta ao inciso XII do art. 55 da Lei 8.666/93.

O responsável alega que a Lei Federal 9.074/95 traz ressalva com relação à necessidade de lei autorizativa nos casos de prestação de serviço de saneamento básico e limpeza urbana, conforme seu art. 2º, assim redigido:

Art. 2º É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios executarem obras e serviços públicos por meio de concessão e permissão de serviço público, sem lei que lhes autorize e fixe os termos, dispensada a lei autorizativa nos casos de saneamento básico e limpeza urbana e nos já referidos na Constituição Federal, nas Constituições Estaduais e nas Leis Orgânicas do Distrito Federal e Municípios, observado, em qualquer caso, os termos da Lei no 8.987, de 1995.

Diante da justificativa apresentada pelo gestor, acompanho o entendimento da Unidade Técnica e opino também pela exclusão dessa restrição.

9. Ausência de critérios de avaliação de bens reversíveis ao final da concessão.

 A cláusula nona do contrato de concessão prevê, no momento da extinção da ligação jurídica, o retorno ao poder concedente de todos os bens reversíveis, direitos e privilégios transferidos à concessionária, previstos no contrato de concessão. Segundo o subitem 9.2.4, “bens reversíveis” são as obras do aterro sanitário.

Com relação à restrição, aponta a instrução:

“Destarte, encerrada a concessão, o concessionário terá o dever de restituir ao poder concedente os bens afetados. Contudo, conforme se vê no referido dispositivo legal, o exame da matéria exige algumas considerações mais amplas acerca da situação dos bens relacionados com a prestação do serviço. Nessa perspectiva, o edital deve prever não apenas os bens reversíveis, mas também os critérios para a sua oportuna avaliação.

Isto porque a reversão não se faz gratuitamente, uma vez que como regra o valor dos bens reversíveis é amortizado ao longo da concessão. As tarifas deverão ser calculadas de modo a amortizar o valor empregado pela concessionária na prestação do serviço, daí porque é relevante a identificação dos bens reversíveis e dos métodos de avaliação para que seja possível determinar o valor dos bens e fixar as tarifas aptas a amortizar seu valor.”

 

O responsável por sua vez afirma que no edital não há a menção de qualquer bem público colocado à disposição da concessionária. Afirma ainda que as obras no aterro não são consideradas como bens reversíveis, pois o aterro sanitário pertence à Concessionária Recicle, e não se situa no perímetro do município de Penha.

Considerando que não haveria bens reversíveis na presente concessão, resta prejudicado o presente apontamento restritivo.

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se:

1. Pela IRREGULARIDADE do Contrato de Concessão 14/2007, lançado pela Prefeitura Municipal de Penha, com fundamento no art. 36, § 2°, alínea “a”, da Lei Complementar n° 202/2000;

2. Pela APLICAÇÃO DE MULTAS ao responsável, Sr. Julcemar Alcir Coelho, ex-Prefeito Municipal de Penha, na forma prevista no art. 70, inciso II, Lei Complementar n. 202/2000, em face das irregularidades descritas nos itens 3.4.1 à 3.4.8 da conclusão do relatório de instrução;

3. pela COMUNICAÇÃO descrita no item 3.7 da conclusão do relatório de instrução.

Florianópolis, 12 de junho de 2012.

 

Cibelly Farias

Procuradora

 



[1] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 11 ed.  São Paulo: Dialética, 2005 p. 447-448

[2] Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública. 8ª Ed. Editora Atlas. p. 114-115.

[3] Concessão de Serviços Públicos. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 101.