PARECER
nº: |
MPTC/10282/2012 |
PROCESSO
nº: |
REP 11/00683949 |
ORIGEM: |
Prefeitura Municipal de São José |
INTERESSADO: |
Leandro Stadler |
ASSUNTO: |
Irregularidades no edital de Pregão
Eletrônico n. 155/2011, visando o registro de preços para aquisição materiais
de uso escolar a serem distribuídos aos alunos da rede de ensino fundamental,
centros de educação infantil e creches do município. |
Trata-se de Representação
protocolizada pela VESTISUL INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA. ME, sob documento de nº
24388/2011, para apreciação por essa Corte de Contas.
Na peça é relata a ocorrência de
supostas irregularidades no edital de Pregão Eletrônico nº. 155/2011, lançado
pelo Município de São José, referente ao registro de preços para aquisição de
materiais de uso escolar a serem distribuídos aos alunos da rede de ensino
fundamental, centros de educação infantis e creches do município.
A Diretoria de Controle de Licitações e
Contratações apresentou o Relatório Técnico nº 868/2011 (fls. 73-85), propondo
o conhecimento da Representação e a
determinação para realização de audiência dos Srs. William Ramos Moreira,
Procurador Municipal que aprovou o edital; Humberto Alcino da Silva, Pregoeiro
que assinou o Edital de Licitação; Érico Rodrigues da Silva Koenig, Secretário
Interino de Administração; e Djalma Vando Berger, Prefeito Municipal de São
José, para apresentarem alegações de defesa acerca da suposta irregularidade:
3.2.1. Do
prazo considerado exíguo para apresentação das amostras, em contrariedade ao
princípio da isonomia e da competitividade do certame, previstos no art. 3º, caput e §1º, inciso I, da Lei nº
8.666/93, e ao princípio da razoabilidade – princípio implícito da Constituição
Federal.
Opinou ainda pela suspensão cautelar
do certame em razão da existência de irregularidades graves que o maculavam,
como a exigência de amostra de todos os participantes antes da etapa de lances.
O Relator, por meio de Despacho
Singular nº 6/12 (fls. 86-89), decidiu pelo conhecimento da representação e
pela determinação das audiências sugeridas pelo relatório. Entretanto, não
acolheu a concessão da medida assecuratória em virtude desta ter perdido o
objeto pelo fato de o processo ter ido à análise da Relatoria em data posterior
à abertura das propostas.
Após o encaminhamento dos ofícios
(fls. 91-94) foi protocolizada a resposta conjunta de todos os responsáveis
(fls. 108-117).
A
Diretoria de Controle de Licitações e Contratações apresentou relatório de
reinstrução (fls. 125-131), opinando:
(a)
por considerar procedente a Representação;
(b)
pela determinação para que a Prefeitura Municipal de São José não reitere a
irregularidade descrita no item 2.1.1 da conclusão do relatório em futuros
procedimentos licitatórios;
(c)
e pela aplicação de multa aos Srs. Djalma Vando Berger, William Ramos Moreira,
Humberto Alcino da Silva e Érico Rodrigues da Silva Koening, em face da
irregularidade apontada no item 2.1.1.
É o relatório.
Passo
à análise da irregularidade apontada no relatório de instrução.
Prazo considerado exíguo para a
apresentação das amostras, em contrariedade ao princípio da isonomia e da
competitividade do certame, previstos no art. 3º, caput, inciso I, da Lei nº 8.666/93 e ao princípio da razoabilidade
– princípio implícito na Constituição Federal.
Nas
alegações de defesa dos responsáveis, estes aduzem que a Representação
careceria de fundamento, pois a amostra somente foi exigida do licitante
vencedor, estando em consonância com o disposto no item 14 do edital, enquanto
a representante sequer colacionou sua proposta de preços no sistema de pregão
eletrônico.
Ademais,
alegam que o prazo de 48 horas para a apresentação das amostras não seria
exíguo, uma vez que o prazo de publicidade do instrumento convocatório é de 8
dias, tratando-se de contratação de bens e serviços comuns.
Para
fortalecer seus argumentos, os responsáveis citam o doutrinador Marçal Justen
Filho e a jurisprudência do Tribunal de Contas da União – Acórdão nº 1182/2007
– os quais afirmam que o procedimento do Pregão exclui a possibilidade de
dilação temporal. Além disto, colacionam editais de outros órgãos que
estabelecem o prazo de 2 dias para a apresentação de amostras nos casos do
pregão eletrônico.
Na
mesma linha, dizem que a intenção na exigência das amostras nada mais foi do
que garantir que o vencedor do certame atendesse todos os requisitos e
critérios de avaliação.
Quanto
à definição do prazo, alegam que esta seria um ato discricionário da
administração pública, devendo-se questioná-la apenas quando houvesse
impossibilidade de ser atendido em tempo.
Por
fim, aduzem a inexistência de qualquer tipo de lesão, já que a empresa
vencedora da licitação apresentou as amostras no prazo estipulado, cumprindo os
requisitos pretendidos pela Administração.
Inicialmente,
cabe ressaltar que o fato de a representante não ter participado do certame ora
em análise não desclassifica a presente Representação, pois qualquer pessoa,
seja jurídica ou física, pode representar ao Tribunal de Contas, como se extrai
do seguinte artigo da Lei 8.666/93:
Art. 113. O controle das
despesas decorrentes dos contratos e demais instrumentos regidos por esta Lei
será feito pelo Tribunal de Contas competente, na forma da legislação
pertinente, ficando os órgãos interessados da Administração responsáveis pela
demonstração da legalidade e regularidade da despesa e execução, nos termos da
Constituição e sem prejuízo do sistema de controle interno nela previsto.
§ 1o Qualquer
licitante, contratado ou pessoa física ou jurídica poderá representar ao
Tribunal de Contas ou aos órgãos integrantes do sistema de controle interno
contra irregularidades na aplicação desta Lei, para os fins do disposto neste
artigo.
§ 2o Os
Tribunais de Contas e os órgãos integrantes do sistema de controle interno
poderão solicitar para exame, até o dia útil imediatamente anterior à data de
recebimento das propostas, cópia de edital de licitação já publicado,
obrigando-se os órgãos ou entidades da Administração interessada à adoção de
medidas corretivas pertinentes que, em função desse exame, lhes forem
determinadas.
Superada
esta questão, cabe salientar que, apesar de a Lei de Licitações não trazer
expressamente uma previsão legal, tem-se admitido a exigência de amostras pelos
licitantes para a verificação da conformidade de cada proposta com os
requisitos do edital.
Por
outro lado, em que pese esta permissão quanto à exigência de apresentação das
amostras, deve esta demanda se enquadrar tanto nos princípios próprios do pregão
quanto nos princípios gerais que regem todas as modalidades licitatórias, sobretudo
os contidos no artigo 3º da Lei nº 8.666/93, como a isonomia, a ampla competitividade
do certame, a seleção da proposta mais vantajosa, entre outros.
Entretanto,
o que se pode concluir da situação aqui exposta, é que houve violação aos
princípios descritos, uma vez que o exíguo prazo estipulado, aliado ao fato de
que o material licitado (uniformes escolares com padronização específica) ser
especialmente produzido para essa licitação, excluiu outros potenciais
licitantes da participação no certame.
Além
disto, apesar de os responsáveis alegarem que a determinação do prazo para a
apresentação da amostra é ato discricionário da Administração Pública, deveria
esta requisição atender aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade,
imersos em nosso ordenamento jurídico.
Nesta
linha, Joel de Menezes Niebuhr elucida a relação existente entre esses
princípios e a discricionariedade do administrador público:
“Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade são
fundamentais para o controle da discricionariedade concedido em favor dos
agentes administrativos.
[...]
Na licitação pública
e, também, na modalidade pregão, os agentes administrativos devem praticar uma
série de atos no exercício de competência discricionária [...] daí a
importância dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, que se prestam a servir de parâmetro a tais
competências discricionárias, rechaçando os atos arbitrários e injustos,
incompatíveis com o interesse público.
[...]
Ele [princípio da
razoabilidade] significa que as
decisões administrativas, especialmente as discricionárias, devem encontrar
amparo em justificativas racionais, no bom senso. Dessa sorte, o
princípio em tela proíbe que os agentes administrativos tomem decisões que não
visem a quaisquer utilidades, despropositadas, que fujam dos parâmetros do
senso comum.”[1]
Ora,
não se pode dizer que o prazo estipulado não acarretou prejuízos ao certame e,
consequentemente, ao interesse público, quando se percebe que possíveis
concorrentes, a exemplo claro da representante, deixaram de participar da
licitação.
Por
estes motivos, entendo também que resta mantida a restrição.
Ante o
Florianópolis, 22 de
junho de 2012.
Cibelly
Farias
Procuradora
[1] NIEBUHR, Joel de Menezes. Pregão
Presencial e Eletrônico. 6 ed. Belo Horizonte: Fórum, 2011. 42 p.