Parecer no:

 

MPTC/12.245/2012

                       

 

 

Processo nº:

 

LCC 09/00491957

 

 

 

Origem:

 

Prefeitura Municipal de Barra Velha

 

 

 

Assunto:

 

Processo Licitatório de Concorrência Pública nº 018/2005 e respectivo contrato nº 036/2005 – Concessão de Serviços de Coleta.

 

 

Trata-se de análise do Processo Licitatório Concorrência Pública nº 018/2005 que tem por objeto a concessão dos serviços de Engenharia Sanitária e limpeza urbana no Município de Barra Velha. (fl.14).

A Diretoria de Controle de Licitações e Contratações, em análise do feito, atendo-se aos aspectos legais, concluiu o que segue (fls. 680/711):

3.1. Seja procedida AUDIÊNCIA, nos termos do art. 29, § 1º da Lei Complementar nº 202/2000, do Sr. Valter Marino Zimmermann – Prefeito do Município de Barra Velha, para apresentação de justificativas, em observância ao princípio do contraditório e da ampla defesa, a respeito das irregularidades constantes do presente Relatório, sujeita à aplicação de multa, prevista na Lei Orgânica do Tribunal e no seu Regimento Interno, conforme segue:

3.1.1. Considerações acerca da inobservância das regras e princípios norteadores da Lei n. 11.445/07 – ausência do Plano de Saneamento Básico (item 2.1 do presente Relatório);

3.1.2. Ausência de publicação de ato prévio ao edital de licitação justificando a outorga de concessão, em afronta ao disposto no art. 5º da Lei nº 8987/95 (item 2.2 do presente Relatório);

3.1.3 Cobrança pelo fornecimento do edital, em desacordo com o § 5º do art. 32 da Lei 8.666/93 (item 2.3 do presente Relatório);

3.1.4. Exigência de atestado fornecido somente por membros da comissão, em desacordo com o art. 30, inc. III e § 6º da Lei 8.666/93, bem como ao princípio da competitividade, garantido pelo art. 3º, § 1º, I da Lei n. 8.666/93 (item 2.4 do presente Relatório);

3.1.5. Limitação da forma de destinação dos resíduos sólidos a aterro sanitário, em violação ao princípio da atualidade dos serviços públicos delegados, insculpido nos §§ 1º e 2º do art. 6º da Lei nº. 8987/95 e ao princípio da ampla competição na licitação pública, previsto no art. 3º, § 1º, inc. I, da Lei nº 8.666/93 (item 2.5 do presente Relatório);

3.1.6. Exigência concomitante de capital social mínimo integralizado e Garantia de Execução, contrariando o § 2º do art. 31 da Lei mº 8.666/93 e o violando o princípio da competitividade, garantido pelo art. 3º, § 1º, I da Lei n. 8.666/93 (item 2.6 do presente Relatório);

3.1.7. Exigência da entrega da garantia da proposta em data anterior a da abertura do certame, o que contraria a ordem dos procedimentos estabelecidos pelo art. 43, inc. I da Lei n. 8.666/93, prejudicando o caráter impessoal que deve reger o certame (item 2.7 do presente Relatório);

3.1.8. Valor excessivo da taxa anual de coleta de lixo em comparação a outros municípios (item 2.8 do presente Relatório);

3.1.9. Ilegalidade no item 3.11 do instrumento convocatório, que prevê que a tarifa pública será fixada pela Concessionária, em afronta ao disposto no art. 9º da Lei nº 8987/95 (item 2.10 do presente Relatório);

3.1.10. Previsão contratual de transferência da concessão sem prévia anuência do poder concedente, em violação ao disposto no art. 27 da Lei nº 8.987/95 (item 2.10 do presente Relatório);

3.1.11. Ausência de determinação dos bens reversíveis após a extinção da concessão, em afronta ao art. 35, § 1º, da Lei nº 8.987/95 (item 2.11 do presente Relatório);

3.1.12. Vigência contratual incompatível com a natureza e condições da concessão do serviço público, em afronta ao art. 37, XXI, da CF (item 2.12 do presente Relatório);

3.1.13. Ausência de critérios claros e adequados para a prorrogação contratual, em afronta ao art. 23, inc. XII, da Lei nº 8.987/95 (item 2.13 do presente Relatório);”

 

O Conselheiro Relator se mostrou, no verso da fl. 110, de acordo com a realização das audiências.

À fl. 712 o Diretor da DLC enviou Ofício determinando a audiência do responsável para a apresentação das justificativas a respeito das restrições apontadas no Relatório DLC 61/2010.

Após o recebimento da intimação via AR (fls. 713), o responsável não realizou nenhum tipo de manifestação. Por isso, o Corpo Técnico manteve as restrições constantes no Relatório de Instrução.

Diante da conclusão do Relatório de Instrução DCL 580/2010, o relator acolheu a manifestação deste Procurador, determinando a audiência da empresa contratada após a licitação (fls. 747).

A empresa Recicle Catarinense de Resíduos Ltda., representada pelo Sr. Adalberto da Silva apresentou as justificativas constantes nas fls.751/762.

Através do Relatório de Reinstrução nº DLC – 130/2012, às fls. 785 a 797, a Diretoria Técnica reanalisou o feito em exame, após as justificativas, e concluiu:

3.1. Conhecer do Relatório de Instrução que trata da análise do Processo Licitatório Concorrência Pública nº 18/2005 e respectivo contrato nº 036/2005, lançado pela Prefeitura Municipal de Barra Velha, encaminhada a este Tribunal por meio documental, para CONSIDERÁ-LOS IRREGULARES, com fundamento no art. 36, §2º, alínea "a", da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, os atos examinados diante das seguintes irregularidades evidenciadas:

3.1.1. Em face da ausência de publicação de ato prévio ao edital de licitação justificando a outorga de concessão, em afronta ao disposto no art. 5° da Lei n°. 8987/95 (item 3.1.2 da conclusão e 2.2 do Relatório nº 61/2010);

3.1.2. Em face da cobrança pelo fornecimento do edital, em desacordo com o § 5º do art. 32 da Lei 8.666/93 (item 3.1.3 da conclusão e 2.3 do Relatório nº 61/2010);

3.1.3. Em face à exigência de atestado fornecido somente por membros da comissão, em desacordo com o art. 30, inc. III e § 6º da Lei 8.666/93, bem como ao princípio da competitividade, garantido pelo art. 3º, § 1º, I da Lei n. 8.666/93 (item 3.1.4 da conclusão e 2.4 do Relatório nº 61/2010);

3.1.4. Em face à limitação da forma de destinação dos resíduos sólidos à aterro sanitário, em violação ao princípio da atualidade dos serviços públicos delegados, insculpido nos §§ 1° e 2° do art. 6° da Lei n°. 8987/95 e ao princípio da ampla competição na licitação pública, previsto no art. 3°, § 1°, inc. I, da Lei n°. 8.666/93 (item 3.15 da conclusão e 2.5 do Relatório nº 61/2010);

3.1.5. Em face à exigência concomitante de capital social mínimo integralizado e Garantia de Execução, contrariando o § 2º do art. 31 da Lei n°. 8.666/93 e o violando o princípio da competitividade, garantido pelo art. 3º, § 1º, I da Lei n. 8.666/93 (item 3.1.6 da conclusão e 2.6 do Relatório nº 61/2010);

3.1.6. Em face à exigência da entrega da garantia da proposta em data anterior a da abertura do certame, o que contraria a ordem dos procedimentos estabelecida pelo art. 43, inc. I da Lei n. 8.666/93, prejudicando o caráter impessoal que deve reger o certame (item 3.1.7 da conclusão e 2.7 do Relatório nº 61/2010);

3.1.7. Em face da ilegalidade do item 1.3.1 do instrumento convocatório, que prevê que a tarifa pública será fixada pela Concessionária, em afronta ao disposto no art. 9° da Lei n°. 8987/95 (item 3.1.9 da conclusão e 2.9 do Relatório nº 61/2010, item 2.2 do presente Relatório);

3.1.8. Em face da previsão contratual de transferência da concessão sem prévia anuência do poder concedente, em violação ao disposto no art. 27 da Lei n°. 8987/95 (item 3.1.10 da conclusão e 2.10 do Relatório nº 61/2010);

3.1.9. Em face à ausência de determinação dos bens reversíveis após a extinção da concessão, em afronta ao art. 35, §1°, da Lei n°. 8987/95 (item 3.1.11 da conclusão e 2.11 do Relatório nº 61/2010, item 2.3 do presente Relatório);

3.1.10. Em face da vigência contratual incompatível com a natureza e condições da concessão do serviço público, em afronta ao art. 37, XXI, da CF (item 3.1.12 da conclusão e 2.12 do Relatório nº 61/2010);

3.1.11. Em face à ausência de critérios claros e adequados para a prorrogação contratual, em afronta ao art. 23, inc. XII, da Lei n°. 8987/95 (item 3.1.13 da conclusão e 2.13 do Relatório nº 61/2010, item 2.4 do presente Relatório);

3.1.12. Descumprimento à determinação deste Tribunal, em função da não apresentação das justificativas e remessa do fluxo de caixa (item 2.1 do presente relatório e 2.8 do Relatório nº 61/2010);

3.2. Aplicar multa ao Sr. Valter Marino Zimmermann, gestor apontado como responsável, com fundamento no art. 70, incisos II e VII, da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, c/c o art. 109, incisos II e VII do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro de 2001), em face das restrições acima relacionadas (itens da conclusão do presente relatório), fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação do Acórdão no Diário Oficial Eletrônico - DOTC-e, para comprovar ao Tribunal de Contas o recolhimento ao Tesouro do Estado da multa cominada, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da citada Lei Complementar.

3.3. Determinar à Prefeitura Municipal de Barra Velha na pessoa do Sr. Valter Marino Zimmermann - Prefeito Municipal, que promova a ANULAÇÃO do processo licitatório - Concorrência Pública nº 018/2005 e respectivo Contrato nº 036/2005, da Prefeitura Municipal de Barra Velha, no que se refere às irregularidade evidenciadas, no prazo de 30 (trinta) dias, contados da publicação desta Deliberação no Diário Oficial Eletrônico - DOTC-e;

3.4. RECOMENDAR, que a Unidade observe as regras e princípios norteadores da Lei n. 11.445/07, em especial no que se refere ao Plano de Saneamento Básico (item 3.1.1 da conclusão e 2.1 do Relatório nº 61/2010)

3.5. Dar ciência da Decisão do Tribunal Pleno à Prefeitura Municipal de Barra Velha, ao seu Controle Interno e à Assessoria Jurídica; à Sr. Sueli Katia Nheme de Azevedo, na condição de interessada (REP 07/00019286); e à Câmara Municipal de Barra Velha.

É o relatório.

A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da entidade em questão está inserida entre as atribuições dessa Corte de Contas, consoante os dispositivos constitucionais, legais e normativos vigentes (art. 31 da Constituição Federal, art. 113 da Constituição Estadual, art. 1º, inciso III, da Lei Complementar Estadual nº. 202/2000, arts. 22, 25 e 26, da Resolução TC nº. 16/1994 e art. 8° c/c art. 6° da Resolução TC nº. 6/2001).

 

1)              Ausência de Plano de Saneamento Básico

 

Aponta o Corpo Técnico, na instrução, que os serviços contidos no Edital ora analisado são regulados pela Lei 11.445/07 que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico. Nela são estabelecidos os critérios de validade para os contratos de prestação de serviço público de saneamento básico.

Um desses requisitos de validade é a apresentação do Plano de Saneamento Básico, que não foi realizada pelo Município de Barra Velha. A Instrução destaca que o contrato foi celebrado em 2005, antes da vigência Lei, motivo pelo qual não caracteriza a irregularidade.

Dispõe o artigo 11, I da Lei 11.445/07:

Art. 11.  São condições de validade dos contratos que tenham por objeto a prestação de serviços públicos de saneamento básico:

I - a existência de plano de saneamento básico;

II - a existência de estudo comprovando a viabilidade técnica e econômico-financeira da prestação universal e integral dos serviços, nos termos do respectivo plano de saneamento básico;

III - a existência de normas de regulação que prevejam os meios para o cumprimento das diretrizes desta Lei, incluindo a designação da entidade de regulação e de fiscalização;

IV - a realização prévia de audiência e de consulta públicas sobre o edital de licitação, no caso de concessão, e sobre a minuta do contrato. (grifou-se)

Ante a não manifestação do responsável, acompanho o entendimento técnico em recomendar que em uma nova licitação ou eventual prorrogação do contrato atual sejam observas os requisitos de validade dispostos no artigo 11 de Lei 11.445/07, sob pena de irregularidade do contrato.

 

2)              Ausência de publicação de ato prévio ao edital de licitação, justificando a outorga da concessão

 

Sobre esse ponto, destaca a Instrução Técnica que não foi publicado o ato justificando a outorga dos serviços antes da publicação do Edital de licitação em questão, contrariando, assim, o conteúdo da Lei n.º 8.987/95, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos.

Dispõe o artigo 5º da lei supracitada:

Art. 5o O poder concedente publicará, previamente ao edital de licitação, ato justificando a conveniência da outorga de concessão ou permissão, caracterizando seu objeto, área e prazo.

Uma vez que não houve justificativa para a não realização do procedimento e que os documentos obtidos não foram capazes de sanar a restrição, acompanho o entendimento técnico em considerar irregular omissão na publicação de ato prévio ao edital de licitação justificando a outorga da concessão, contrariando o disposto no artigo 5º da Lei 8.987/95.

 

 

 

 

 

3)              Cobrança abusiva pelo fornecimento do edital

 

Extrai-se do Relatório de Instrução que o Município cobrou o valor de R$ 500,00 para o fornecimento do Edital n.º 18/05. Além da publicação do aviso de licitação no jornal A Notícia de 07/06/05 (fls. 665), há recibos do pagamento pelas empresas Sotec Soluções Tecnológicas, Cavo Serviços e Meio Ambiente, Engepasa Ambiental Ltda., Recicle Catarinense de Resíduos e Proactiva Ambiental Brasil (fls. 544, 549, 558, 565 e 567, respectivamente).

Sobre o assunto, dispõe a Lei 8.666/93:

Art. 32. Os documentos necessários à habilitação poderão ser apresentados em original, por qualquer processo de cópia autenticada por cartório competente ou por servidor da administração ou publicação em órgão da imprensa oficial.

§ 5o  Não se exigirá, para a habilitação de que trata este artigo, prévio recolhimento de taxas ou emolumentos, salvo os referentes a fornecimento do edital, quando solicitado, com os seus elementos constitutivos, limitados ao valor do custo efetivo de reprodução gráfica da documentação fornecida. (grifou-se)

E ensina Marçal Justen Filho:

O § 5º decorre da vedação a proibições indiretas à participação na licitação. Como visto, o direito de licitar é um direito abstrato, ainda que condicionado. As condições do direito de licitar são diretamente vinculadas à condição de sujeito concorrente ao objeto licitado. Por isso, são inconstitucionais os constrangimentos indiretos e oblíquos à participação na licitação que não apresentem qualquer utilidade à participação no certame.[1]

Como não houve por parte da Unidade e do gestor qualquer comprovação do efetivo custo da reprodução gráfica da documentação, não se entende razoável o valor cobrado para o fornecimento do Edital.

Destarte, acompanho o entendimento técnico em considerar irregular a cobrança pelo fornecimento do edital, sem a comprovação efetiva do custo do material, em desacordo com o § 5º do art. 32 da Lei 8.666/93.

 

4)              Exigência de atestado fornecido somente por membros da comissão

 

O Corpo Técnico questiona a exigência da apresentação de Atestado de Vistoria Técnica como requisito de habilitação, emitido pela Administração Pública após Visita Técnica a ser realizada em local e hora determinados. Sobre isso aponta (fls. 689/690):

Sobre o tema em análise, é preciso perquirir acerca da legalidade da imposição de agendamento de visita técnica em data única e em conjunto com o órgão licitante, uma vez que o presente certame tem por objeto a prestação de serviços públicos, e todas as informações pertinentes a sua prestação devem ser delineadas no próprio instrumento convocatório. Ademais, a assunção das responsabilidades do contratado como conhecedor das informações necessárias à formulação da proposta e conhecimento do local onde o serviço deve ser prestado pode ser suprida por uma declaração da empresa licitante, que consigne seu conhecimento acerca do local, bem como dos demais aspectos que possam influir direta ou indiretamente quando da execução. [...]

Nota-se que a ausência de justificativa para a exigência de apresentação de Atestado de Vistoria Técnica como requisito para habilitação técnica compromete a exigência edilícia, notadamente nos termos do presente edital, quando há condicionantes para o fornecimento do Atestado, bem como limitação dos dias de visita ao local dos serviços.

Nesse sentido, considerando que esta visita técnica objetiva suprir informações não fornecidas no edital de licitação e que esta visita pode ser substituída por declaração fornecida pela própria empresa licitante, entende-se que tal exigência edilícia afronta o princípio da competição [...].

Sobre a qualificação técnica, dispõe a Lei 8.666/93, art. 30, III:

Art. 30.  A documentação relativa à qualificação técnica limitar-se-á a:

III - comprovação, fornecida pelo órgão licitante, de que recebeu os documentos, e, quando exigido, de que tomou conhecimento de todas as informações e das condições locais para o cumprimento das obrigações objeto da licitação;

A doutrina jurídica mostra que o conteúdo e a extensão da qualificação técnica dependem diretamente do objeto da licitação. Ao definir o objeto a ser contratado, a Administração Pública estará delimitando a qualificação técnica que deverão apresentar os eventuais interessados em participar da licitação.[2]

Não houve, no entanto, justificativa para tal exigência como requisito para a habilitação. Além disso, a limitação do local e horário para a visita técnica compromete de fato o processo licitatório, violando o princípio da competição contido no artigo 3º da Lei de Licitações:

Art. 3o  A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.

§ 1o  É vedado aos agentes públicos:

I - admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo, inclusive nos casos de sociedades cooperativas, e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato, ressalvado o disposto nos §§ 5o a 12 deste artigo e no art. 3o da Lei no 8.248, de 23 de outubro de 1991.

De acordo com Justen Filho (2005), o tratamento igualitário é assegurado aos interessados que apresentarem condições necessárias para contratar a Administração Pública. A vitória de um deles dependerá de seus próprios méritos. Não se discute a intenção de beneficiar um ou mais concorrentes.[3] Deve-se, então, preservar o caráter competitivo do processo licitatório, eximindo-o de qualquer mecanismo que possa limitar tal característica.

Dessa forma, manifesto-me de acordo com o entendimento técnico, considerando irregular a exigência de Atestado de Vistoria Técnica como requisito para habilitação uma vez que viola o disposto no art. 3º, §1º, I, e art. 30, III da Lei 8.666/93.

 

 

5)              Limitação da forma de destinação dos resíduos sólidos a aterro sanitário

 

De acordo com o Relatório de Instrução, entende o Corpo Técnico (fls. 691/692):

O Edital de Concorrência Pública n.º 018/05 prevê em seu item 4.9 um rol de documentos complementares, dentre os quais se destacam os contidos no subitem 4.9.5, que determina a necessidade de comprovação de propriedade de aterro sanitário [...].

Ademais, o item 4.10.4 do instrumento convocatório exige como requisito para habilitação a apresentação de licença ambiental de operação desse aterro sanitário [...].

[...] os editais que visam à contratação do serviço de coleta, transporte e destinação de resíduos sólidos não devem limitar a destinação destes unicamente a aterros sanitários, pois, desta forma, estará vedando qualquer destino oriundo de nova tecnologia ambientalmente aceita. [...]

Vale ressaltar, nesse ponto, que o serviço público delegado à concessionária deve ser prestado de forma adequada, o que implica dizer que deve ser prestado de acordo com a modernidade das técnicas, do equipamento e das instalações, sempre buscando a melhoria e a expansão do serviço. [...]

Limitar a destinação dos resíduos sólidos tão-somente a aterro sanitário, além de estar em descompasso com o princípio da atualidade, também prejudica a ampla competição entre as empresas interessadas no serviço [...].

As exigências quanto à comprovação de propriedade de aterro sanitário e a limitação de destinação dos resíduos sólidos, afrontam ao disposto no art. 3º, §1º, I da Lei de Licitações, já que estabelece distinções impertinentes:

Art. 3o  A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.

§ 1o  É vedado aos agentes públicos:

I - admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo, inclusive nos casos de sociedades cooperativas, e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato, ressalvado o disposto nos §§ 5o a 12 deste artigo e no art. 3o da Lei no 8.248, de 23 de outubro de 1991. (grifou-se)

Além disso, a destinação somente a aterros sanitários não é a mais adequada, visto que se observado o Plano Nacional de Resíduos Sólidos o gerenciamento de resíduos deve ser pautado por elevados padrões de proteção ambiental e sustentabilidade. O aterro sanitário é o que possui menor custo, mas hoje não dão deve ser visto como prioridade em face da questão ambiental. Deve haver a possibilidade de outras destinações aos rejeitos, não se limitando apenas a aterros sanitários.

É importante que o tema seja observado em futuras licitações com o mesmo objeto, uma vez que a preservação ambiental também é dever da Administração Pública. De acordo com a Associação Brasileira de Empresas de Tratamento de Resíduos – Abetre:

A partir de 2010, a Política Nacional de Resíduos Sólidos traz um conjunto muito abrangente de diretrizes, que cobrem todos os aspectos necessários à desejada transformação desse cenário. Vai à origem do problema, criando diversas medidas que resultarão no maior aproveitamento dos resíduos e na redução dos rejeitos, e, embora ainda timidamente, abre a possibilidade de um plano nacional para a descontaminação de áreas órfãs contaminadas. Foca-se no futuro, mas não deixa para trás os passivos ambientais do passado.

Trata-se de um novo cenário, que abre inúmeras oportunidades para novos empreendimentos em todas as etapas do gerenciamento de resíduos sólidos: limpeza urbana, logística reversa, triagem e reciclagem, recuperação de resíduos, desenvolvimento de novas aplicações para materiais reciclados, aproveitamento energético, transporte, etc., além de estruturas administrativas para planejamento e controle. (grifou-se)[4]

Por fim, há afronta ao princípio da atualidade contido no artigo 6º, §2º da Lei 8.987/95, que dispõe sobre as concessões, onde determina que o serviço deve ser prestado adequadamente, observada a modernidade das técnicas, do equipamento e das instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e expansão do serviço.

Destarte, diante da ausência de justificativa para o feito, acompanho o entendimento técnico em considerar irregular a limitação da forma de destinação dos resíduos sólidos a aterro sanitário, em desacordo com o §2° do art. 6° da Lei n°. 8.987/95 e com o art. 3°, § 1°, inc. I, da Lei n°. 8.666/93.

 

6)              Exigência concomitante de capital social mínimo integralizado e garantia de proposta

 

Extrai-se do Relatório Técnico (fls. 693/694):

O item 4.7.3 do edital de Concorrência Pública n.º 018/05 dispõe que a empresa licitante deve comprovar que possui capital social mínimo de R$ 1.400.000,00 plenamente legalizado como requisito para habilitação financeira [...].

Já o item 4.4 do instrumento convocatório prevê como documento para habilitação o recolhimento de garantia para licitar, cujas características estão previstas no item 15.1 do mesmo edital [...].

No entanto, a Lei 8.666/93 dispõe que tais exigências são alternativas e não cumulativas como consta no Edital em questão:

Art. 31.  A documentação relativa à qualificação econômico-financeira limitar-se-á a:  

2o  A Administração, nas compras para entrega futura e na execução de obras e serviços, poderá estabelecer, no instrumento convocatório da licitação, a exigência de capital mínimo ou de patrimônio líquido mínimo, ou ainda as garantias previstas no § 1o do art. 56 desta Lei, como dado objetivo de comprovação da qualificação econômico-financeira dos licitantes e para efeito de garantia ao adimplemento do contrato a ser ulteriormente celebrado. (grifou-se)

Ainda, sobre o tema, ensina Marçal Justen Filho:

A redação do §2º comporta interpretação bastante razoável, em que as três alternativas ali indicadas seriam consideradas como equivalente. Isso significa que o particular poderia comprovar sua capacitação econômico-financeira por uma de três vias. [...]

Essa interpretação redunda na atribuição ao particular da possibilidade de comprovar o preenchimento desses requisitos por uma das três vias, à sua escolha.[5]

Assim, tal exigência excessiva pode comprometer o caráter competitivo do processo nos termos do artigo 3º, §1º, I da Lei 8.666/93.

Por isso, acompanho o entendimento técnico em considerar irregular a exigência concomitante de capital social mínimo integralizado e garantia de proposta, uma vez que, de acordo com a Lei, são alternativos, afrontando, assim, o artigo 31, §2º e artigo 3º, §1º, I da Lei 8.666/93.

 

 

7)              Exigência da entrega da garantia da proposta em data anterior a da abertura do certame

 

De acordo com a Instrução Técnica (fls. 696/697):

O item 15.1 prevê que a empresa proponente deve recolher a garantia no valor de R$ 555.000,00 até o 3º dia útil anterior à data de entrega dos envelopes.

A garantia faz parte da qualificação econômico-financeira prevista no artigo 31, III da Lei 8.666/93:

Art. 31.  A documentação relativa à qualificação econômico-financeira limitar-se-á a:

III - garantia, nas mesmas modalidades e critérios previstos no "caput" e § 1o do art. 56 desta Lei, limitada a 1% (um por cento) do valor estimado do objeto da contratação.

A qualificação econômico-financeira, por sua vez, é requisito para a habilitação da proponente no procedimento licitatório. A obrigatoriedade é dada pelo artigo 27, III da Lei de Licitações:

Art. 27.  Para a habilitação nas licitações exigir-se-á dos interessados, exclusivamente, documentação relativa a:

I - habilitação jurídica;

II - qualificação técnica;

III - qualificação econômico-financeira;

IV – regularidade fiscal e trabalhista;     

V – cumprimento do disposto no inciso XXXIII do art. 7o da Constituição Federal. 

Assim, a garantia faz parte do rol de documentos necessários à habilitação, devendo estar junto deles no envelope entregue à licitante, como dispõe o artigo 43, I, da Lei 8.666/93.[6] A entrega da garantia em data distinta do envelope compromete o processo uma vez que não condiz com o procedimento legal.

Acompanho, então, o entendimento técnico em considerar irregular a exigência da entrega da garantia da proposta em data anterior a da abertura do certame, contrariando o art. 43, inc. I da Lei n. 8.666/93, visto que a garantia é requisito para habilitação.

 

8)              Valor excessivo da taxa anual de coleta de lixo em comparação a outros municípios

 

Sobre o assunto, manifestou-se o Corpo Técnico na instrução (fls. 697):

Denota-se que, de fato, os valores praticados em Barra Velha são mais altos que os de municípios próximos, cujo serviço é prestado pela mesma empresa.

Infere-se, ainda, que o critério de julgamento de propostas do Edital de Concorrência Pública n.º 18/2005 é o de “menor valor de taxa/tarifa/mês por unidade habitacional” (fls. 600). No entanto, o Contrato nº 36/2005, às folhas 12/22, firmado entre a Prefeitura e a empresa concessinária sequer faz menção a esse valor.

Apontou o responsável na justificativa apresentada (fls. 757):

Nenhuma razão assiste no que tange ao aponte firmado neste item, devendo-se relevar o fator comparativo invocado no relatório, posto que o mesmo baseia-se, única e exclusivamente no cotejo direto do valor da tarifa, desconsiderando por completo que os municípios paradigmas possuem extensão territorial diferenciada, topografias totalmente desiguais, densidade demográfica variada, concentração populacional distinta vez que umas se encontram em plano mais verticalizado e outra no plano horizontal, carecendo de um conjunto específico de equipamentos e veículos quantidade de mão de obra específica, e ainda, pavimentação ou não dos ruamentos, inclusive vicinais, razão pela qual a citada metodologia é alcançada pela inanidade.

Apesar da errônea informação tarifária às fls. 697, cabe, verbi gratia, esclarecer que os preços praticados mensalmente pela Recicle na cidade de Barra Velha é menor do que os que se pratica nas cidades de Araquari [R$20,28]; Guabiruba [R$ 16,58]; Navegantes [R$17,42]; Balneário Piçarras [R$ 17,16]; Brusque [R$ 16,44], conforme documentação em anexo para fins comparativos.

Apenas para arrematar de vez a regular simetria dos padrões monetários da tarifa da coleta de lixo praticados pela Recicle, para fins ad comparandum, se junta cópia da ―Fatura da Tarifa de Balneário Camboriú – emitida pela Coneville, no valor mensal de R$ 24,25 – município este com extensão territorial reduzida e com características geográficas topograficamente verticalizada, e com edificações também em vertical, com acessos lineares adequados e concentrados para a realização da prestação dos serviços sem maiores incidentes, com total pavimentação de suas avenidas e ruamentos vicinais.

 

Tem razão a empresa concessionária quanto à comparação equivocada da tarifa em ralação aos outros municípios onde a empresa atual. Tal cálculo envolve muito fatores e considera a peculiaridade de cada município.

No entanto, ante a não manifestação sobre o ponto por parte do gestor e da Unidade, não há justificativa para o valor da taxa cobrada pela coleta de lixo no Município de Barra Velha. Além disso, não foi apresentado o fluxo de caixa com as variáveis componentes do cálculo da tarifa, como determinado às folhas 698.

Destarte, acompanho o entendimento técnico ao modificar a restrição, caracterizando a irregularidade pelo descumprimento de determinação deste Tribunal, uma vez que não houve apresentação das justificativas sobre o valor da taxa anual de coleta de lixo, nem remessa do fluxo de caixa, sendo passível, então, a aplicação de multa ao responsável, nos termos do artigo 70, inciso VII, da Lei Complementar nº 202/00.

 

9)              A fixação da tarifa pública pela concessionária

 

Sobre esse ponto, manifestou-se a Instrução Técnica (fls. 698):

O item 1.3.1 do Edital relativo à Concorrência Pública nº. 018/05 prevê que o preço público a ser cobrado dos usuários de serviço público de coleta de resíduos sólidos deve ser estabelecido pela empresa concessionária e homologado pelo Poder Concedente, nesses termos:

1.3.1 – A tarifa relativa aos serviços referidos na alínea “c” do item 1.2.1, caberá em todos os casos, desde o início da contratação, ao gerador dos resíduos mediante imposição de preço público estabelecido pela Concessionária e homologado pelo Poder Concedente, com seu devido monitoramento.

[...]

De acordo com a norma jurídica [...] o preço público deve ser fixado de acordo com a proposta sagrada vencedora no certame licitatório. Com efeito, o valor da tarifa pública decorre da engenharia econômico-financeira da concessão.

No caso em tela, sagrou-se vencedora da Concorrência Pública n.º 018/05 a empresa Recicle Catarinense de Resíduos Ltda., cuja proposta de preços para o valor da tarifa por Unidade Habitacional, relativo à coleta regular, transporte, transbordo e descarga de resíduos domiciliares sólidos, comerciais com características de doméstico e outros compactáveis, em aterro sanitário devidamente licenciado e aprovado pelo Município de Barra Velha, com periodicidade média de 08 coletas/mês, foi de R$ 8,45.

Nota-se que o valor da tarifa pública em R$ 8,45, fixada após adjudicado o objeto do certame à empresa Recicle Catarinense de Resíduos Ltda., não pode mais ser modificado unilateralmente por qualquer das partes, sob pena de afronta ao princípio do equilíbrio econômico-financeiro do Contrato n.º 036/05, salvo nas hipóteses legalmente previstas, tais como de revisão ou reajuste tarifário.

 

 

 

 

 

Justificou-se a concessionária (fls. 154):

 

Obrigação de cumprimento exigível e exclusiva por parte do Poder Público Licitante – Inimputável ao particular, cabendo, todavia, o esclarecimento de que ora Defendentes, aludem primeiramente que no presente caso [coleta de lixo] de taxa não se trata e que, o valor da tarifa anual praticado até o momento, corresponde exatamente ao valor da proposta vencedora do certame, devidamente homologado pelo Poder Concedente [conforme dispõe o item 10.5 do Edital], com modificação atuarial anual com base no índice de Correção Monetária IGPDI [item 12.5 do Edital].

 

Sobre a política tarifária, dispõe a Lei 8987/95:

Art. 9o A tarifa do serviço público concedido será fixada pelo preço da proposta vencedora da licitação e preservada pelas regras de revisão previstas nesta Lei, no edital e no contrato.

§ 1o A tarifa não será subordinada à legislação específica anterior e somente nos casos expressamente previstos em lei, sua cobrança poderá ser condicionada à existência de serviço público alternativo e gratuito para o usuário.

§ 2o Os contratos poderão prever mecanismos de revisão das tarifas, a fim de manter-se o equilíbrio econômico-financeiro.

§ 3o Ressalvados os impostos sobre a renda, a criação, alteração ou extinção de quaisquer tributos ou encargos legais, após a apresentação da proposta, quando comprovado seu impacto, implicará a revisão da tarifa, para mais ou para menos, conforme o caso.

§ 4o Em havendo alteração unilateral do contrato que afete o seu inicial equilíbrio econômico-financeiro, o poder concedente deverá restabelecê-lo, concomitantemente à alteração. (grifou-se)

Ocorre que a empresa alega que a tarifa cobrada está de acordo com a proposta vencedora da licitação, no entanto, não apresenta qualquer comprovação do alegado, motivo pelo qual não se pode extinguir a restrição.

A fixação do valor da tarifa deverá ser realizada em conformidade com contrato, não havendo mais como ser alterado e/ou modificado unilateralmente por qualquer das partes, o que caracteriza afrontar o princípio do equilíbrio econômico-financeiro do Contrato. Somente nas hipóteses legalmente previstas (revisão ou reajuste), em conformidade com o previsto na Lei nº 8.987/95 (artigo 9º e seus parágrafos) poder-se-á promover a alteração deste valor.

Assim, por delegar ilegalmente a fixação da tarifa para a Concessionária, nos termos do item 1.3.1 do Edital n.º 018/05, acompanho o entendimento técnico em considerar irregular tal previsão, por ir de encontro ao disposto no art. 9° da Lei n°. 8.987/95.

 

10)           Previsão contratual de transferência da concessão sem prévia anuência do poder concedente

 

Sobre esse ponto, manifestaram-se os auditores técnicos (fls. 700):

A cláusula décima segunda do Contrato de Concessão n.º 036/05 prevê hipóteses de transferência da concessão, das subcontratações e da decisão contratual. O item 12.4 permite a transferência da concessão ou do controle acionário, nesses termos (fls. 19):

12.4. Sem prejuízo das responsabilidades e dos riscos previstos neste edital, a CONCESSIONÁRIA poderá realizar a cessão total ou parcial do objeto licitado, bem como a fusão ou incorporação com terceiros, independentemente da anuência do PODER CONCEDENTE.

No mesmo sentido dispõe o item 20.4 do edital relativo à Concorrência Pública n.º 018/05.

(grifou-se)

Não houve justificativa sobre esse ponto por parte dos responsáveis.

De acordo com o artigo 27 da Lei 8.987/95, a transferência de concessão ou do controle societário da concessionária sem prévia anuência do poder concedente implicará a caducidade da concessão, resultando, assim, na extinção do contrato nos termos do artigo 35, I da mesma Lei.

Além disso, deve-se observar o disposto no artigo 26 do referido diploma:

Art. 26. É admitida a subconcessão, nos termos previstos no contrato de concessão, desde que expressamente autorizada pelo poder concedente.

§ 1o A outorga de subconcessão será sempre precedida de concorrência.

§ 2o O subconcessionário se sub-rogará todos os direitos e obrigações da subconcedente dentro dos limites da subconcessão.

(grifou-se)

Destarte, o legislador autoriza a subconcessão desde que sejam observados os preceitos legais, quais sejam: a) previsão contratual (contrato de concessão); b) autorização do poder concedente;  c) ser precedida de licitação pública e, d) transferência total ou parcial dos direitos e obrigações.

Não pode, então, a Administração Pública suprimir tais regras como ocorreu no Edital do Município de Barra Velha, eximindo o Poder Público de anuir à subconcessão.

Por isso, acompanho o entendimento técnico em considerar irregular a previsão contratual de transferência da concessão sem prévia anuência do poder concedente, ante a não observância ao disposto nos arts. 26 e 27 da Lei nº 8.987/95

 

11)           Ausência de determinação dos bens reversíveis após a extinção da concessão

 

Sobre o assunto, aponta o Corpo Técnico na Instrução (fls. 702):

No caso em tela, a possibilidade de repasse dos investimentos realizados e bens adquiridos pela empresa concessionária durante a vigência de Contrato de Concessão n.º 036/05 está prevista em sua Cláusula nona, especificamente nos itens 9.2 e 9.3, [...]

De acordo com a Cláusula nona do contrato referido, conclui-se que se trata de concessão de serviço público que permite a transferência dos investimentos realizados e bens adquiridos. Ademais, o item 9.3 qualifica essa reversão onerosa, uma vez que condiciona a transferência à indenização das parcelas dos investimentos vinculados a bens reversíveis.

[...]

Ocorre que nem o edital de Concorrência Pública  n.º 018/05 nem o Contrato de Concessão n.º 36/05 especificam quais são os investimentos necessários à realização do serviço concedido. Também não existe previsão contratual de quais bens a empresa contratada disponibiliza para a prestação dos serviços, tampouco laudo de avaliação e entrega. Essa omissão do poder concedente compromete a eficácia da Cláusula nona do referido contrato, já que impede a determinação de quais bens permanecerão com a empresa concessionária e quais serão transferidos ao poder concedente ao término da concessão. Nesse último caso, considerando-se que se trata de reversão na modalidade onerosa, a omissão do poder concedente prejudica a definição do quantum da indenização devida no caso de transferência.

Resta prejudicada, também, a avaliação pelo poder concedente sobre possível pedido de prorrogação contratual pela concessionária. [...]

Nesse caso, em havendo indeterminação dos investimentos e bens necessários para a prestação do serviço público concedido e omissão do poder concedente na definição de quais bens serão transferidos ao poder concedente e quais bens permanecerão com a concessionária, há impossibilidade de análise de eventual pedido de prorrogação contratual.

 

Na audiência, manifestou-se a concessionária (fls. 759):

Obrigação de cumprimento exigível e exclusiva por parte do Poder Público Licitante – Inimputável ao particular, mas, o entendimento constante de fls. 703 é equivocado, haja vista que o item 4.9.3 do Edital discrimina expressamente quais são os equipamentos mínimos necessários para o início da prestação dos serviços [rol descritivo constante do item 4.9.3.1. e, além disso, o item 17.2.4. expressamente indica o que deve ser considerado como bens dessa natureza.

Se isto não bastasse, observa-se no corpo da Cláusula 17, disposições estabelecendo que outros bens podem ser considerados com a referida natureza, e tudo o mais que for necessário por parte do Poder Público para dar continuidade serviçal no caso da caducidade ou recisão, cumuladas com a necessidade do repasse [item 17.2.1.] mediante prévia avaliação [item 17.2.2.], culminando com a indenização [item 17.3].

Cumpre ainda esclarecer, sob o ponto de vista da Concessionária, que tais previsões somente são possíveis numa dimensão strictu sensu em vista que ao longo da vigência contratual, incorporam-se uma série de bens, equipamentos e tecnologias em razão do crescimento populacional e maior produção de resíduos, detritos e lixo de toda ordem.  

Sobre os bens reversíveis na extinção do contrato, dispõe a Lei 8.987/95:

Art. 35. Extingue-se a concessão por:

I - advento do termo contratual;

II - encampação;

III - caducidade;

IV - rescisão;

V - anulação; e

VI - falência ou extinção da empresa concessionária e falecimento ou incapacidade do titular, no caso de empresa individual.

§1o Extinta a concessão, retornam ao poder concedente todos os bens reversíveis, direitos e privilégios transferidos ao concessionário conforme previsto no edital e estabelecido no contrato.

São bens reversíveis “aqueles bens vinculados "extremamente" necessários à prestação do serviço público e que por força dos princípios da continuidade, regularidade e atualidade da prestação do serviço público deverão reverter (serão transferidos) ao poder concedente para que a prestação do serviço não sofra uma solução de continuidade”.[7]

A cláusula sobre bens reversíveis é cláusula essencial nos contratos de concessão, nos termos do artigo 23, da Lei 8.987/95, e compõe o contrato em questão nos itens 9.2.1, 9.2.2, 9.2.3, 9.2.3.1 e 9.3 (fls. 17). Não há, no entanto, especificação dos bens necessários à prestação do serviço.

Por permanecer a omissão injustificada, acompanho o entendimento técnico em considerar irregular ausência de delimitação dos bens reversíveis quando da extinção da concessão, caracterizando previsão em desacordo com o artigo 35, §1º da Lei Federal nº 8.987/95.

 

 

 

 

12)           Vigência contratual incompatível com a natureza e condições da concessão do serviço público

 

Sobre o ponto, manifesta-se a Instrução Técnica (fls. 704/705):

[...] a Cláusula sétima do Contrato n.º 036/05 estabelece normas sobre o prazo contratual, cuja redação segue abaixo (fls. 16):

7.1 Fica fixado o prazo de vigência da presente Concessão para 25 (vinte e cinco) anos, a ser iniciado a partir de 01 de janeiro de 2006 ou da data de emissão da respectiva Ordem de Serviço, podendo este prazo ser prorrogável por iguais e sucessivos períodos, conforme a legislação vigente, a critério do PODER CONCEDENTE, por no máximo até duas prorrogações, nas

mesmas condições estabelecidas nesse Contrato.

[...]

 

Não há fixação de prazo para os contratos de concessão de serviços públicos na legislação. No entanto, é vedada a assinatura de contrato por prazo indeterminado, conforme expressamente prescreve o artigo 57, §3º da Lei Federal nº 8.666/93.

O prazo estabelecido no Contrato de concessão deve assegurar ao concessionário o ressarcimento do capital investido, sem onerar excessivamente os usuários mediante a cobrança de tarifa pública. Ocorre que, no caso do contrato em questão, o prazo não se faz razoável uma vez que fora fixado com a possibilidade de 02 (duas) prorrogações, ou seja, 75 (setenta e cinco) anos.

Por isso, acompanho o entendimento técnico ante a irregularidade da vigência do contrato. A fixação do prazo da concessão deve estar devidamente justificada, com o intuito de permitir além da remuneração dos investimentos promovidos pela concessionária a amortização dos mesmos, sem, contudo, converter-se em uma camisa de força para a Administração.

 

 

13)           Ausência de critérios claros e adequados para a prorrogação contratual

 

Sobre os critérios para a prorrogação contratual, apontou o Corpo Técnico (fls. 706/708):

Não obstante a falta de compatibilidade entre prazo contratual e objeto contratado, haja vista ser 25 anos um prazo excessivo para as condições da presente concessão, nota-se existir a possibilidade de prorrogação por mais 50 anos, desde que requerido pela empresa concessionária e decidido pelo Poder Concedente. Frisa-se, por oportuno, que eventual ato de prorrogação processual invariavelmente deverá ser motivado, em consonância com o princípio da motivação dos atos administrativos.

Com efeito, dispõe o item 2.12 do Edital de Concorrência Pública n.º 018/05 que “o prazo de vigência da prestação de serviços concedidos, objeto desta Licitação, será de 25 (vinte e cinco) anos, podendo ser prorrogado, para fins de amortização de investimentos realizados pela empresa vencedora que vier a ser contratada” (fls. 592).

Ocorre que, nos autos em tela, não foi possível localizar quaisquer elementos que possibilitem eventual prorrogação com fundamento em amortização de investimentos. De fato, não há menção a investimentos na descrição tanto do objeto licitado (fls. 590) quanto do objeto contratado (fls. 12/13), tampouco clareza na descrição do objeto básico (fls. 631/636). Ademais, dentre as obrigações contratuais da empresa concessionária, não foi possível visualizar deveres específicos de investimento (fls. 13/14).

Ademais, ressalta-se que a presente a presente concessão admite reversão de bens adquiridos pela concessionária quando do advento do termo contratual, porém tal reversão é de natureza onerosa, ou seja, exige-se indenização das parcelas dos investimentos vinculados aos bens reversíveis, não há como subsistir como justificativa para a prorrogação contratual a necessidade de amortização dos investimentos, conforme previsto no item 2.12 do edital de Concorrência Pública n.º 018/05.

Vale frisar, por oportuno, que qualquer prorrogação de contrato de concessão deve sempre respeitar o equilíbrio econômico-financeiro inicialmente pactuado entre as partes, nos termos do art. 65, II, “d” da Lei n.º 8.666/93. Ocorre que, no caso em tela, há indeterminação dos investimentos e bens necessários para a prestação do serviço público concedido e omissão do poder concedente na definição de quais bens serão transferidos ao poder concedente e quais bens permanecerão com a concessionária, fatos estes que prejudicam a análise de eventual pedido de prorrogação contratual.

Justificou-se o responsável (fls. 760):

Obrigação de cumprimento exigível e exclusiva por parte do Poder Público Licitante – inimputável ao particular. Entendem os Defendentes, que o item 7.1 e 7.2 do Contrato de Licitação, encontram-se totalmente conformados com as disposições do artigo 23, inciso XII, da Lei supra citada, tendo em vista que o objetivo do provimento legal é no sentido de vetar disposição abstrata e simplesmente aleatória de poder ser o contratado administrativo prorrogado, sem dizer o período, quantidade de vezes, competência para solicitação e o lapso para o exercício da prerrogativa , condições estas plenamente atendidas tanto pelo Edital de nº 018/2005, quanto pelo Contrato de Concessão de nº 036/2005.

 

A prorrogação do contrato de concessão deverá levar em consideração o equilíbrio econômico-financeiro, nos termos artigo 65, II,  “d” da Lei nº 8.666/93.

No caso ora analisado, não há clareza na determinação dos investimentos e bens necessários à prestação do serviço público concedido, caracterizando omissão do Poder Concedente em relação à definição de quais bens serão transferidos e quais permanecerão com a concessionária, o que efetivamente prejudica a apreciação do pedido de prorrogação do contrato de concessão.

Destarte, acompanho o entendimento técnico em considerar irregular a ausência de critérios claros e adequados para a prorrogação contratual, em desacordo com o artigo 23, XII da Lei Federal nº 8.987/95[8], uma vez que houve omissão do Município, em relação aos bens que serão transferidos e aqueles que permanecerão com a empresa concessionária, não sendo possível estabelecer os investimentos realizados pela concessionária.

 

14. Da sustação/anulação do contrato

 

Os documentos em anexo revelam que o Município firmou contrato com a empresa que se sagrou vencedora no certame licitatório. O Contrato no 36/2005 (fl. 185-195) foi celebrado com a empresa Recicle Catarinense de Resíduos Ltda.

Nestas circunstâncias, ex vi do art. 71, §§ 1o e 2o da Carta Magna e do art. 59, §§ 1o e 2o da Constituição Estadual[9][3], não cabe à Corte determinar a sustação do contrato, quanto mais a sua anulação, como sugeriu a DLC. Quem não pode o menos, não poderá o mais.

Poderá sim a Corte, contudo, recomendá-lo, sendo que o descumprimento desta recomendação produziria efeitos no sentido caracterizar o dolo na manutenção da execução do contrato ilícito. Esta caracterização poderá contribuir com a eventual e futura aferição de responsabilidades cíveis e penais, e inclusive com eventual apuração de danos ao erário. Não se poderia cogitar, neste caso, contudo, das conseqüências sancionadoras previstas no art. 70, III da Lei Complementar no 202/2000.

Imprescindível, contudo, será a comunicação ao Poder Legislativo local, para que aquele Órgão decida, requerendo a comunicação dessa decisão para os fins do art. 59, § 2o da Constituição Estadual.

 

 

Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se:

1) pelo conhecimento do Relatório de Análise da Concorrência Pública n.º 018/2005 e do Contrato n.º 036/2005 realizados pelo Município de Barra Velha, para nos termos do art. 36, § 2º, “a” da Lei Complementar nº 202/2000;

2) Pela irregularidade da Concorrência Pública nº 018/2005 e o Contrato nº 036/2005, com fundamento na Lei Complementar nº 202/2000 (artigo 36, parágrafo 2º, alínea “a”), em razão das seguintes irregularidades:

2.1) ausência de publicação de ato prévio ao edital de licitação justificando a outorga da concessão, contrariando o art. 5º da Lei Federal nº. 8.987/95;

2.2) ausência de justificativa plausível para o valor cobrado a título de fornecimento do edital, em desrespeito ao art. 32, §5º da Lei Federal nº 8.666/93;

2.3) exigência de Atestado de Vistoria Técnica como requisito para habilitação uma vez que viola o disposto no art. 3º, §1º, I, e art. 30, III da Lei 8.666/93;

2.4) limitação da forma de destinação dos resíduos sólidos a aterro sanitário, em descumprimento ao artigo 6º, §§ 1º e 2º da Lei nº 8.987/95 e ao artigo 3º, § 1º da Lei nº 8.666/93;

2.5) exigência concomitante de capital social mínimo integralizado e garantia da proposta, afronta ao artigo 31, § 2º da Lei Federal nº 8.666/93;

2.6) exigência da entrega da garantia da proposta em data anterior a abertura do certame, violando o artigo 43, I da Lei Federal nº 8.666/93;

2.7) valor de cobrança da taxa anual de coleta de lixo, visto que não há justificativas sobre o cálculo do mesmo;

2.8) fixação da tarifa pública pela concessionária, em descumprimento à Lei Federal nº 8.987/95 (artigo 9º, parágrafos 1º e 4º);

2.9) previsão contratual de transferência da concessão sem a prévia anuência do poder concedente, em flagrante desrespeito ao artigo 9º e seus parágrafos, da Lei nº 8.987/95;

2.10) ausência da previsão dos bens reversíveis após a extinção da concessão, afrontando o artigo 35, § 1º da Lei Federal nº 8.987/95;

2.11) prazo de vigência da concessão, sem justificativas, afrontando o art. 37, XXI da Constituição Federal e o art. 23, I da Lei nº 8.666/93; e

2.12) ausência de critérios claros à prorrogação da concessão, em flagrante desrespeito ao art. 23, XII da Lei nº 8.987/95.

3) Pela aplicação de multa ao Sr. Valter Marino Zimmermann, Prefeito Municipal de Barra Velha, em razão das irregularidades apontadas, com fundamento na Lei Complementar nº 202/2000 (artigo 70, incisos I a III) c/c à Resolução TCE/SC nº 06/2001 (artigo 109, incisos I a III).

4) Determinar, nos termos do caput do art. 29 da Lei Complementar Estadual nº 202/00, que o Sr. Valter Marino Zimmermann, promova a ANULAÇÃO da Concorrência Pública nº 018/2005, promovida pelo Município de Barra Velha, e aplique o disposto no caput e § 2º do art. 49 da Lei Federal nº 8.666/93, com efeitos sobre o respectivo Contrato nº 036/2005 decorrente (fls. 12/22), firmado entre o Município de Barra Velha e a empresa Recicle Catarinense de Resíduos LTDA., a partir da publicação do Acórdão.

5) Pela comunicação do acórdão, relatório e voto ao Responsável e à Câmara de Vereadores do Município de Barra Velha.

 

Florianópolis, 16 de agosto de 2012.

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas

 

 



[1] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de licitações e Contratos administrativos. 11. ed. São Paulo: Dialética, 2005. p. 358.

[2] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de licitações e Contratos administrativos. 11. ed. São Paulo: Dialética, 2005. p. 322.

[3] JUSTEN FILHO, 2005, p. 63.

[4] DEL BEL, Diógenes; SALGOSA, Ademar. A IMPORTÂNCIA DA INFRAESTRUTURA DE DESTINAÇÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS: política nacional de resíduos sólidos acelera oportunidades de mercado. Revista SANEAS. Ano XII, nº 43, 2012. p. 18 Acesso em: jul/2012: <http://www.aesabesp.org.br/arquivos/saneas/saneas43.pdf>

[5] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de licitações e Contratos administrativos. 11. ed. São Paulo: Dialética, 2005. p. 350.

[6] Art. 43.  A licitação será processada e julgada com observância dos seguintes procedimentos:

I - abertura dos envelopes contendo a documentação relativa à habilitação dos concorrentes, e sua apreciação;

[7] PESSOA, Leonardo Ribeiro. As diversas origens dos bens vinculados à prestação dos serviços públicos e os seus regimes jurídicos. Acesso em jul. 2012.  http://jus.com.br/revista/texto/5988/as-diversas-origens-dos-bens-vinculados-a-prestacao-dos-servicos-publicos-e-os-seus-regimes-juridicos#ixzz208y3Z0WT

[8]  Art. 23. São cláusulas essenciais do contrato de concessão as relativas:  

   XII - às condições para prorrogação do contrato;