PARECER
nº: |
MPTC/13844/2012 |
PROCESSO
nº: |
PCA 08/00075625 |
ORIGEM: |
Fundo Municipal de Saúde de Seara |
INTERESSADO: |
|
ASSUNTO: |
Prestação de contas - exercício de 2007 |
Trata-se de Prestação de Contas de
Administrador do Fundo Municipal de Saúde de Seara – SC, relativa ao exercício
de 2007.
A Unidade Gestora apresentou o
balanço anual de 2007 (fls. 2-37).
A Diretoria de Controle dos
Municípios apresentou relatório técnico (fls. 38-45), através do qual sugeriu a
citação do Sr. Jorge Antoninho Lorenzoni, titular da Unidade à época, para que
apresentasse justificativas relativas às seguintes restrições, passíveis de
imputação de multa:
1.1
– contratação de entidade priva para prestação de serviços na área da Saúde
(médicos), cujas atribuições são de caráter não eventual e inerentes às funções
típicas da administração, devendo estar previstas em Quadro de Pessoal,
traduzindo afronta às disposições do inciso II do artigo 37, c/c o 199, § 1º da
Constituição Federal (item 1.1 deste Relatório);
1.2
– contratação de terceiros para prestação de serviços de consultoria e
assessoria jurídica, cujas atribuições são de caráter não eventual e inerentes
às funções típicas da administração, devendo estar previstas em Quadro de
Pessoal, traduzindo afronta às disposições do inciso II do artigo 37 da
Constituição Federal, c/c com decisão deste Tribunal no Processo nº COM
07/00413421 (item 1.2);
1.3
– contratação de Autônomo de forma reincidente, para prestação de serviços,
cujas atribuições caracterizam serviços administrativos de caráter não
eventual, e inerentes às funções típicas da administração, traduzindo afronta
às disposições do inciso II do artigo 37 da Constituição Federal (item 1.3).
O Relator exarou despacho
determinando a citação (fl. 47).
Efetuada a citação (fls. 48-49 e 53),
o citado encaminhou documentos e justificativas às folhas 54-300.
A Diretoria de Controle dos
Municípios emitiu relatório de instrução (fls. 302-324), no qual opinou pelo julgamento
regular com ressalva das contas anuais referentes ao exercício de 2007, em face
das restrições elencadas nos itens n. 1.1 e 1.2 da parte conclusiva do
relatório.
É o relatório.
Passa-se à análise das restrições
evidenciadas.
Foi constatado que o Fundo Municipal
de Saúde executou contratação de entidades privadas (médicos) para atuarem na
área da saúde, conforme notas de empenhos informadas nas fls. 308-310, no valor
total de R$ 861.190,71 (oitocentos e sessenta e um mil cento e noventa reais e
setenta e um centavos), representando um total de R$ 17,72% das despesas totais
do Fundo.
O responsável alega, em síntese, que
as despesas constantes desta restrição se referem à contratação com o Hospital
São Roque para disponibilização de profissionais do plantão médico-hospitalar e
laboratorial para prestarem atendimentos à população do Município em horários
especiais, por meio do Contrato Administrativo n. 008/2007 (fls. 225-231).
Considerando as informações
consignadas no Contrato (horário de atendimento), disponibilizadas às folhas
225, verifico que as despesas em questão se referem a atendimento médico de
urgência e emergência pelo período noturno, nos dias úteis, e pelo período de
24h, nos finais de semana e feriados, o que, a princípio, poderia justificar
tais contratações, em face do caráter urgente do atendimento prestado.
Em outro ponto, a área técnica verificou a contratação de
serviços para a execução de consultoria jurídica, auditoria e controle e
avaliação das atividades ligadas ao setor de saúde pública, serviço estes que
são de natureza permanente e contínua do Fundo Municipal de Saúde, perfazendo o
valor de R$ 18.847,50 (dezoito mil oitocentos e quarenta e sete reais e
cinquenta centavos) e caracterizando burla ao concurso público, em
descumprimento ao art. 37, II, da Constituição Federal.
O responsável sustentou a legalidade das contratações em
virtude da especialidade dos serviços judiciais, os quais requerem notório
conhecimento jurídico na área da saúde, e da intenção de apartar as atividades
de avaliação e controle dos serviços prestados pela saúde pública dos
servidores efetivos.
Esta irregularidade é objeto de ampla apreciação nessa
Corte de Contas, que possui diversas decisões relacionadas ao tema, nas quais
se registra a irregularidade da prática descrita e aplica-se multa ao
responsável.
A prestação de serviços relacionados à assessoria,
consultoria jurídica e advocacia, bem como aos de auditoria, são de natureza
permanente e contínua, e deles não pode o Fundo Municipal de Saúde prescindir,
sob pena de inviabilizar as atividades e serviços prestados, dessa forma, a
realização de concurso público para o provimento dos cargos de advogado e
auditor é medida que se impõe.
Em reiteradas decisões este Tribunal de Contas tem
firmado o entendimento nessa linha de orientação, consoante os Prejulgados
abaixo relacionados, os quais salientam que, excepcionalmente, na
hipótese de inexistência de cargo efetivo ou de vacância, pode haver a
contratação do profissional para esses fins, desde que em caráter temporário.
Eis o teor de alguns Prejulgados sobre a matéria:
Prejulgado
1121:
Os
serviços de assessoria jurídica (incluindo defesa em processos judiciais) podem
ser considerados atividade de caráter permanente e, como tal, implica na
existência de cargos específicos para referida atividade no quadro de cargos ou
empregos da entidade. Contudo, o ingresso em cargos e empregos na
administração pública direta e indireta, aí incluídas as sociedades de economia
mista, depende de aprovação em concurso público de provas ou provas e títulos,
consoante regra prescrita no artigo 37, II, da Carta Magna Federal.
A
contratação de profissionais de advocacia sem vínculo empregatício com a
entidade pública contratante somente ocorre quando houver contratação de
serviço, mediante processo licitatório, nos termos da Lei Federal nº. 8.666/93,
que admite apenas a contratação de advogados ou escritório de advocacia para a
defesa dos interesses da empresa em específica ação judicial que, por sua
natureza, matéria ou complexidade (objeto singular), não possa ser realizada
pela assessoria jurídica da entidade, justificando a contratação de
profissional de notória especialização, caso em que a contratação se daria por
inexigibilidade de licitação, nos termos dos arts. 25 e 26 do referido diploma
legal.
Salvo
a contratação nos termos da Lei Federal nº. 8.666/93, as demais formas de
contratação de profissional da advocacia gera vínculo empregatício com a
entidade contratante, quer na contratação definitiva por concurso público (art.
37, II, da CF), quer na contratação temporária (art. 37, IX, da CF).
A
possibilidade de contratação de advogados, para suprir deficiência temporária
destes profissionais nos quadros da empresa de economia mista, seria aquela
prevista no inciso IX do artigo 37 da Constituição Federal (contratação
temporária), desde que existente norma estadual autorizativa definindo os casos
de excepcional interesse público, a forma de seleção dos profissionais, a forma
de pagamento e o prazo do contrato, aplicando-se tal regra, também, à
Administração Indireta, pois não há exceção no citado dispositivo
constitucional.
Prejulgado
1579:
1.
O arcabouço normativo pátrio, com apoio doutrinário e jurisprudencial, atribui
à execução das funções típicas e permanentes da Administração Pública a
servidores de seu quadro de pessoal, ocupantes de cargos efetivos - admitidos
mediante concurso público, nos termos do art. 37, II, da Constituição Federal -
ou por ocupantes de cargos comissionados, de livre nomeação e exoneração.
Contudo, deve-se atentar para o cumprimento do preceito constitucional inscrito
no art. 37, inciso V, da Constituição Federal, segundo o qual os cargos em
comissão são destinados exclusivamente ao desempenho de funções de direção,
chefia e assessoramento, devendo ser criados e extintos por lei local, na
quantidade necessária ao cumprimento das funções institucionais do Órgão,
limitados ao mínimo possível, evitando-se a criação desmesurada e sem critérios
técnicos, obedecendo-se também aos limites de gastos com pessoal previstos pela
Lei Complementar nº. 101/00.
2.
Havendo necessidade de diversos profissionais do Direito para atender aos
serviços jurídicos de natureza ordinária do ente, órgão ou entidade, que inclui
a defesa judicial e extrajudicial e cobrança de dívida ativa, é recomendável a
criação de quadro de cargos efetivos para execução desses serviços, com
provimento mediante concurso público (art. 37 da Constituição Federal), podendo
ser criado cargo em comissão para chefia da correspondente unidade da estrutura
organizacional (Procuradoria, Departamento Jurídico, Assessoria Jurídica, ou
denominações equivalentes). Se a demanda de serviços não exigir tal estrutura,
pode ser criado cargo em comissão de assessor jurídico, de livre nomeação e
exoneração.
3.
Para suprir a falta transitória de titular de cargo, quando não houver cargo de
advogado, assessor jurídico ou equivalente na estrutura administrativa da
Prefeitura ou Câmara, ou pela necessidade de ampliação do quadro de
profissionais, e até que haja o devido e regular provimento, inclusive mediante
a criação dos cargos respectivos, a Prefeitura ou a Câmara, de forma
alternativa, podem adotar:
a)
contratação de profissional em caráter temporário, nos termos do inciso IX do
art. 37 da Constituição Federal;
b)
contratação de serviços jurídicos por meio de processo licitatório (arts. 37,
XXI, da Constituição Federal e 1º e 2º da Lei Federal nº. 8.666/93), salvo nos
casos de dispensa previstos nos incisos II e IV do art. 24 da Lei Federal nº.
8.666/93, atendidos aos requisitos do art. 26 daquele diploma legal, cujo
contrato deverá especificar direitos e obrigações e responsabilidades do
contratado, a carga horária e horário de expediente, prazo da contratação e o
valor mensal do contrato, observada a compatibilidade com a jornada de trabalho
e o valor de mercado regional.
4.
A contratação de profissional do ramo do Direito por inexigibilidade de
licitação só é admissível para atender a específicos serviços (administrativo
ou judicial) que não possam ser realizados pela assessoria jurídica dada a sua
complexidade e especificidade, caracterizando serviços de natureza singular, e
que o profissional seja reconhecido como portador de notória especialização na
matéria específica do objeto a ser contratado, devidamente justificados, e se
dará nos termos dos arts. 25, II, § 1º combinado com o art. 13, V e § 3º, e 26
da Lei Federal nº. 8.666/93, observado o disposto nos arts. 54 e 55 da mesma
Lei e os princípios constitucionais que regem a Administração Pública. Os
serviços jurídicos ordinários da Prefeitura (apreciação de atos, processos,
procedimentos e contratos administrativos, projetos de lei, defesa do município
judicial e extrajudicial, incluindo a cobrança da dívida ativa) e da Câmara
(análise de projetos de lei, das normas regimentais, e de atos administrativos
internos) não constituem serviços singulares ou que exijam notória
especialização que autorize a contratação por inexigibilidade de licitação.
5.
Quando a municipalidade realizar contratação de advogados mediante licitação,
não poderá limitar somente à sociedade de advogados, devendo possibilitar a
contratação do profissional autônomo, sob pena de limitação do universo de
participantes, procedimento vedado pelo art. 3º, § 1º, I, da Lei Federal nº.
8.666/93.
6.
O contrato a ser firmado com o profissional do Direito deverá estabelecer valor
fixo, não podendo prever percentual sobre as receitas auferidas pelo ente com
as ações administrativas ou judiciais exitosas pelo contratado, salvo se a
Administração firmar contrato de risco puro, onde não haja qualquer dispêndio
de valor com a contratação, sendo a remuneração do contratado exclusivamente
proveniente dos honorários de sucumbência devidos pela parte vencida, nos
montantes determinados pelo Juízo na sentença condenatória.
No presente caso, todavia, não se configura nenhuma das
hipóteses excepcionais em que caberia a contratação terceirizada, conforme a
orientação contida nos prejulgados.
De acordo com a análise da instrução, por meio da
averiguação do Contrato n. 28/2007 e ao Relatório Circunstanciado, observou-se,
ainda, que os serviços prestados pelos consultores são de caráter rotineiro e
contínuo do meio jurídico, como “envios de ofícios ao Ministério Público,
reuniões de caráter administrativo, ofícios diversos, contestação de ofícios da
Promotoria Pública da Comarca de Seara, dentre outros”, motivo pelo qual é
imprescindível a realização de concurso público para tal fim, em respeito ao
disposto no art. 37, inc. II, da Constituição Federal.
Porém, em decorrência da
impossibilidade de o gestor do fundo ser responsabilizado pelas irregularidades
acima elencadas, conforme já vem decidindo esta Corte de Contas através dos
julgados PCA n. 07/00069208, 06/00498042 e 07/00192581, entendo ser necessária
a citação do Prefeito Municipal, a fim de apresentar justificativas sobre as
restrições indicadas.
Ante
o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na
competência conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar n.
202/2000, manifesta-se pela CITAÇÃO do
Sr. Aurélio Nardi, Prefeito Municipal de Seara à época, para que apresente
justificativas acerca das seguintes irregularidades:
1.1
– Contratação de terceiros para prestação de serviços de consultoria e
assessoria jurídica, cujas atribuições são de caráter não eventual e inerentes
às funções típicas da administração, devendo estar previstas em Quadro de
Pessoal, traduzindo afronta às disposições do inciso II do artigo 37 da
Constituição Federal;
1.2
– Contratação de Autônomo para prestação de serviços, cujas atribuições
caracterizam serviços administrativos de caráter não eventual, inerentes às
funções típicas da administração, traduzindo afronta às disposições do inciso
II do artigo 37 da Constituição Federal.
Florianópolis,
17 de outubro de 2012.
Procuradora