PARECER nº:

MPTC/15321/2012

PROCESSO nº:

REC 11/00632600    

ORIGEM:

Centrais Elétricas de Santa Catarina S.A. - CELESC

INTERESSADO:

César Augusto Bleyer Bresola

ASSUNTO:

Embargos de Declaração contra decisão exarada no Processo n. TCE-01/04520795 - Tomada de contas especial - Conversão do proc. APE-01/04520795 - Irregularidades constatadas quando da auditoria sobre atos de pessoal do exercício de 2000

 

1. DO RELATÓRIO

 

            O presente processo versa sobre recurso na modalidade Embargos de Declaração, interposto por Paulo César da Silveira e César Augusto Bleyer Bresola, pertinente ao Acórdão n. 1902/11, exarado no processo TCE-0104520795 – Tomada de Contas Especial – que imputou débitos aos recorrentes pela percepção de verbas salariais indevidas.         

            O fundamento do recurso está assentado na contradição da decisão do Acórdão n. 1902/2011 com as decisões proferidas nos autos dos processos AOR/TC  02/5030668, pertinente ao exercício de 1995 da CELESC – Acórdão 1820/2004 e BLA-TC 027591180, correspondente ao exercício de 1997 – Acórdão n. 418/2011(fls. 7-35 do recurso).

            Colhe-se das fls. 34-35 dos autos, a anotação dos recorrentes nos seguintes termos:

 

Ante o exposto, conclui-se que essa Corte de Contas julgou nos Autos do Processo  TCE-01/04520795 – Acórdão 1902/2011, idêntica matéria já julgada nos Processos  AOR /TC 02/50 30668 (EXERCICIO DE 1995 – ACÓRDÃO  N.º 1820/2004) E BLA-TC 027591180 (EXERCICIO DE 1997 – ACÓRDÃO Nº 418/2011), porém, estando o referido Acórdão nº 1902/2011, em total contradição com os citados Acórdãos, merecendo destarte reforma por esse E. Plenário.

 

2. DA INSTRUÇÃO

 

            A matéria foi objeto de avaliação da Consultoria Geral dessa Corte de Contas através de análise em dois pareceres, identificados por COG 876/2011 de fls. 36-47 e COG 1482/2012, de fls. 48-50.

            Quando da análise contida no Parecer COG 876/2011, observou a Consultoria Geral à fl. 43 que não há correlação entre decisões distintas para que se possa utilizar este argumento em sede recursal de Embargos de Declaração e sustenta este ponto de vista com base nos acórdãos n. 5839-32/10, 0850-13/10-P do TCU (fls. 44, 45, 46), concluindo pela ausência de contradição, elemento essencial para recepção desta modalidade recursal.

            No outro parecer também egresso da Consultoria Geral, Parecer COG 1482/2012 de fls. 48-50, é abordada a matéria recursal com enfoque da chamada “contradição externa”, egressa do entendimento de julgados em processos diversos que amplia as hipóteses de conhecimento dos embargos de declaração. Mesmo considerando esta evolução jurisprudencial, ao entendimento da Consultoria Geral no parecer citado não ficou demonstrado no recurso razões para discutir e modificar o mérito da decisão recorrida.                    

 

3. DA PROCURADORIA

 

            O tema tratado no presente recurso de Embargos de Declaração comporta interpretação nova quanto aos postulados clássicos deste instituto processual.

            Essa é a tese que emerge das razões recursais. E que foi registrada à fl. 46 da manifestação da Consultoria Geral nos seguintes termos:

 

Ademais, cumpre observar que pode essa Corte de Contas evoluir em seu entendimento acerca de determinada matéria. Nesse sentido já decidiu o Tribunal de Contas da União:

 

[Embargos de declaração. Evolução de entendimento. Ausência de omissão, obscuridade ou contradição]

[VOTO]

6. Cabe ainda enfatizar que a adoção de posicionamento distinto de outros julgados em que restou abordado tema análogo – conforme os embargantes pugnam ter ocorrido nos Acórdãos nº [...] do Plenário – é faculdade inerente a esta Corte de Contas, ao atuar sob a égide das competências que lhe foram outorgadas pelo Texto Maior, sendo-lhe permitido evoluir em seu entendimento sobre determinada matéria.

(AC-2416-42/09-P, sessão: 14/10/09, Relator: Ministro AUGUSTO NARDES)

 

            Como bem observado na manifestação do Conselheiro Salomão Ribas Júnior à fl. 50, o posicionamento exposto na análise da Consultoria é o que tem escopo na doutrina e jurisprudência que predomina.

            Mas observa o eminente Relator que a doutrina também contempla interpretação que agasalha a tese dos recorrentes, ao citar artigo de autoria do advogado Cristiano Simão Miller intitulado “A “contradição externa” como vício capaz de ensejar a oposição de embargos de declaração:

            Do artigo citado extrai-se de fl. 50-51 a seguinte anotação:

 

Tem-se contradição externa quando a fundamentação e o dispositivo de dois recursos, não obstante tenham sido julgados  pela mesma turma e envolvessem demandas idênticas quanto à tese jurídica, foram flagrantemente contraditórios.

[...]

 

III – A possibilidade de a “contradição externa” servir de fundamento para a oposição de embargos de declaração

 

(...) é ponto bastante tranquilo na doutrina e na jurisprudência que a contradição que permite o cabimento dos embargos de declaração é aquela ocorrida no bojo do ato a ser impugnado, ou seja, é a “contradição interna”.

 

Todavia, parece-nos prudente, ao menos para fins de provocação ao debate, pensarmos na possibilidade de se ter a oposição de embargos de declaração também quando houver a constatação de “contradição externa”.

 

E, nesse particular, levantamos a questão especificamente quanto à eventual existência de contradição entre decisões provenientes do mesmo órgão julgador. Será possível, então, a oposição de embargos de declaração quando, um mesmo julgador, for responsável por julgamentos absolutamente contraditórios entre si? A resposta, segundo pensamos, deve ser positiva.

 

[...]

 

 

Diante dessa afirmativa, e dentro dessa linha que, repita-se, tem norteado o atual direito processual civil brasileiro, não é esperado, e nem tampouco desejável, que, diante de um mesmo Tribunal (e, principalmente, diante de um mesmo julgador), situações absolutamente idênticas, sejam tratadas de forma diametralmente opostas.

(...)

 

Destaque-se que a tese aqui levantada – da “contradição externa” como viabilizadora dos embargos de declaração – leva em consideração  o fato de os recursos, envolvendo  a mesma situação fática e jurídica, terem sido resolvidos  de maneira radicalmente contraditória.

 

E, segundo pensamos (o que fazemos, vale destacar, diante de uma reflexão inicial), tal contradição, considerando a atual tendência do direito processual brasileiro – de evidente valorização dos precedentes judiciais em prol da previsibilidade dos resultados e, consequentemente, da segurança jurídica – deve possibilitar a oposição de embargos de declaração, para que o órgão julgador esclareça aos envolvidos no processo o porquê dos posicionamentos conflitantes acerca do mesmo assunto. Tal esclarecimento, segundo nos parece, deve ser assegurado às partes, encartando-se na garantia constitucional de se obter a devida fundamentação dos julgados.

 

                      

            Tais considerações levaram o Relator a propor à fl. 52  o conhecimento do recurso, determinando à Consultoria Geral o exame de mérito.

            Entendo procedente a tese contida no Despacho acima citado, motivo pelo qual a acolho, e nesse sentido me posiciono pelo conhecimento do recurso.

            Quanto ao mérito, julgo necessário adentrar na análise do conjunto de peças que integram o presente volume processual, constituído dos processos TCE 01/04520795 (Tomada de Contas Especial – Volume I tendo como responsável Francisco de Assis Kuster e Volume II – tendo como responsável Paulo César da Silveira e César Augusto Bleyer Brezola), REC 05/00029377 (Recurso de Reconsideração interposto por Francisco de Assis Kuster), REC 05/00166366 (Recurso de Reexame proposto pelo Conselheiro Salomão Ribas Júnior) e o presente processo de Embargos de Declaração, interposto por Paulo César da Silveira e César Augusto Bleyer Brezola.

            Assim, colhe-se do conjunto de informações dos autos as seguintes anotações.

 

 

 

 

 

TCE 01/04520795 – Volume I

 

 

Manifestação do MPTC à fl. 375 em que se observou a ocorrência deste tipo de procedimento administrativo gerador de despesa em gestões anteriores e em exercícios anteriores e reconhecidos pelo e. Tribunal de Contas.

No julgamento da matéria – Acórdão n. 1095/2004 – (fl. 383) foi considerada irregular a despesa no montante de R$ 39.259,50 e imputada a responsabilidade ao então Presidente da CELESC à época, referente a pagamento de salário a empregados eleitos diretores, extrapolando o estabelecido no art. 30, §§ 1.º e 3.º do Estatuto Social da CELESC.

 

 

REC 05/00029377

 

           

Este recurso, interposto pelo sr. Francisco Kuster foi complementado pelo Recurso de Reexame de Conselheiro REC 05/00166366, conhecido e provido para anular a decisão do Acórdão recorrido e nos termos do novo Acórdão n. 1956/2005 determinar a citação dos srs. Paulo César da Silveira e César Augusto Bleyer Brezola para apresentação de alegações de defesa.

            Assim, a discussão da matéria fica remetida a informações existentes nos autos adiante anotadas.

            Segundo extrai-se do presente processo recursal, os recorrentes citam à fl. 5  a existência de contradição entre decisões, o que configuraria a chamada “contradição externa” destacada nos autos como intepretação doutrinária que se inclina pela sua ocorrência e receptividade no campo do direito processual. Uma vez admitida esta situação peculiar e especial de, pela via recursal dos embargos buscar-se nova avaliação da matéria, possível é a discussão do mérito, eis que os pressupostos de admissibilidade recursal se encontram satisfeitos, remetendo para o mérito da insurgência o deslinde da matéria.

            O entendimento do Órgão Técnico Instrutivo no Parecer COG 1482/2012 de fls. 48-50, é da improcedência na postulação recursal exatamente pela ausência de contradição na decisão recorrida e ainda, segundo leitura de fl. 49-f/v “... ainda que não tenha trazido aos autos cópia dos documentos a que faz alusão em suas razões recursais, tampouco tenha feito o cotejo dos fatos a ponto de esclarecer com a necessária precisão, a contradição alegada.”

No exame dos argumentos recursais, não se projeta discussão sobre a contradição centrada numa única decisão, conforme a clássica configuração da doutrina jurídica acerca de pontos divergentes num mesmo julgado. A tese é outra, e comporta uma interpretação em que se caracterizaria a chamada “contradição externa”, isto é, decisões diferentes emanadas do mesmo órgão julgador sobre matéria similar. Este é o foco recursal.

            E é precisamente dele que se podem extrair elementos para conclusão de sua viabilidade jurídica ou não.  

 

 

 

a)   Processo AOR-02/5030668 – Acórdão n. 1820/2004

 

Balanço Anual CELESC – Prestação de Contas de Administrador – exercício de 1995  - Sessão de Julgamento  26.10.2011, em que foram julgadas irregulares despesas nos valores de R$ 29.277,20, de responsabilidade do sr. Paulo César da Silveira, na condição de ex-Diretor de Distribuição da CELESC e de R$ 10.576,16  de responsabilidade do sr. César Augusto Bleyer Brezola, na condição de ex-Diretor de Engenharia e Operações da CELESC.

 

b)   Processo BLA-0275911/80 – Balanço Anual CELESC

 Prestação de Contas de Administrador – exercício de 1997  - Sessão de Julgamento  23.05.2011, em que foi determinado à CELESC a cessação de realização de despesas com empregados contratados pela Fundação CELOS e reembolsados pela CELESC (item 6.3.2 do julgado);

 

c)   Processo TCE 01/04520795 -  Auditoria na CELESC – Atos de Pessoal – exercício de 2000

 

Voto do Conselheiro Salomão A. Ribas Jr., constante de fl. 527-532:

 

As irregularidades apontadas pelo Órgão de Controle, passíveis de imputação de débito, dizem respeito aos salários pagos a diretores empregados da CELESC, Srs. Paulo César da Silveira e César Augusto Bleyer  Brezola, referentemente ao exercício de 2000.

 

O Órgão de Controle verificou, quando da auditoria realizada na Unidade, que ambos os Diretores acima citados, pertencentes ao quadro de servidores da CELESC, ao assumirem os cargos de direção mantiveram as vantagens inerentes a seus cargos de empregados, somando a estas o salário e representação percebida pela Diretoria (fls. 05/06 dos autos – 1. º  volume).

 

O pagamento de tais vantagens pessoais representou afronta ao Estatuto Social da Companhia, que faz previsão no sentido da opção da remuneração do respectivo cargo, sem prejuízo da verba de representação, ao servidor elevado à condição e diretor (art. 30,  § 1.º e 3.º)

 

[...]

 

No caso concreto, apurou-se in loco que os empregados foram guindados aos cargos de Diretores, não fizeram opção acerca da remuneração e passaram a perceber as vantagens inerentes aos cargos de empregados mais a remuneração do cargo de diretor e a verba de representação, o que não está de acordo com a própria lei interna (Estatuto) das Centrais Elétricas de Santa Catarina SA.

 

[...]

 

 

 

 

 

E assim conclui o Órgão de Controle: não havendo opção expressa dos Diretores, a remuneração a ser recebida por eles deveria ser constituída dos honorários mais verba de representação, configurando  ilegalidade a incidência de vantagens pessoais como Anuênio, Produtividade e Participação CCQ’S (vantagens estas incidentes sobre salários de empregados) sobre a remuneração paga a ambos os Diretores, além de FG-Vantagem Pessoal paga somente ao Diretor de Distribuição Paulo César da Silveira (fls. 05 e 06, 1.º Volume dos autos). 

 

 

d)   Processo REC 11/00632600 – Embargos de Declaração em exame

 

O Parecer da Consultoria Geral – COG 1482/2012, de fls. 48-50 formula tabela comparativa de fls. 48-f/v e 49 discriminando e confrontando as matérias tratadas nos processos TCE 01/04520795 (Acórdão 1902/2011), TCE 0250306/68 (Acórdão 1820/2004) e BLA 0275911/80 (Acórdão 418/2011), em que anota matéria diversa de um processo e acórdão em relação aos outros, observando a ausência, nas decisões de contradição, motivo da proposição final (fl. 50)  da improcedência do recurso de embargos declaratórios “uma vez que inexiste contradição na decisão recorrida”.

Em conclusão, e considerando que recepcionamos a tese da “contradição externa” manifestamo-nos pelo conhecimento do recurso de Embargos de Declaração.

No entanto, embora se recepcione parte das razões recursais, entendemos que a peça não está suficientemente alicerçada na argumentação dos recorrentes, e neste sentido faz-se referência ao exposto no parecer instrutivo conclusivo de fl. 49-f/v “... ainda que não tenha trazido aos autos cópia dos documentos a que faz alusão em suas razões recursais, tampouco tenha feito o cotejo dos fatos a ponto de esclarecer com a necessária precisão, a contradição alegada.” A realidade que decorre desta análise nos leva a formular sugestão ao eminente Relator que em caráter de excepcionalidade seja ofertada aos recorrentes oportunidade de esclarecimento adicional, à vista do disposto no RI/TCE/SC:

 

Art. 123. O Relator presidirá a instrução do processo, determinando, mediante despacho singular, por sua ação própria e direta ou por provocação do órgão de instrução ou do Ministério Público junto ao Tribunal, antes de pronunciar-se quanto ao mérito, as diligências que se fizerem necessárias, a citação ou a audiência dos responsáveis e as demais providências com vistas ao saneamento dos autos, podendo ainda sugerir o sobrestamento do julgamento, após o que submeterá o feito ao Plenário ou à Câmara respectiva para decisão de mérito, competindo-lhe ainda:

 

[...]

 

§ 3º Diligência é o ato pelo qual  o Tribunal Pleno, as Câmaras, o Relator ou o titular do órgão de controle, solicitam ao titular da unidade gestora documentos e informações complementares indispensáveis à instrução do processo.

 

                                                                                             (grifo nosso)

 

 

 

Decorre da leitura dos autos que no lançamento da análise técnica comparativa da Instrução no quadro de fls. 48-f/v e 49, aponta negativa de conexão de matéria lançada em decisões dessa Corte de Contas nos três processos que menciona TCE 01/04520795 (Acórdão 1902/2011), TCE 0250306/68 (Acórdão 1820/2004) e BLA 0275911/80 (Acórdão 418/2011), motivo que nos leva ao entendimento da necessidade de diligência complementar para esclarecimento da matéria. 

 

 

 

 

Florianópolis, 17 de dezembro de 2012.

 

 

                        MÁRCIO DE SOUSA ROSA

         Procurador-Geral do Ministério Público j/TCE/SC

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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