PARECER
nº: |
MPTC/15503/2013 |
PROCESSO
nº: |
REC 12/00413080 |
ORIGEM: |
Companhia Catarinense de Águas e Saneamento
- CASAN |
INTERESSADO: |
Dalírio José Beber |
ASSUNTO: |
Recurso de
Embargos de Declaração da decisão do processo - ELC-10/00614945 - Edital de Concorrência
n° 15/2010 - Execução de obras civis com fornecimento de materiais
hidráulicos e equipamentos para implantação do Sistema de Esgotamento Sanitário
de Criciúma |
1. DO PROCESSO
Para exame e parecer desta Procuradoria, o Processo epigrafado que versa sobre Embargos de Declaração interposto pelo Sr. Dalírio José Beber, Diretor Presidente da Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN, em face da Decisão nº 4082/2012 da Corte de Contas, proferido nos autos do processo ELC-10/00614945.
2. DA INSTRUÇÃO
Os argumentos aduzidos
receberam exame por parte da Consultoria Geral que se manifestou por intermédio
do Parecer COG nº 1551/2012,
fls. 013-018, e ao examinar os pressupostos de admissibilidade recursal opinou
pelo conhecimento do Recurso de Embargos Declaratórios, e no mérito negar-lhe
provimento, por não haver o recorrente demonstrado a ocorrência dos
pressupostos previstos em lei.
3. DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Este Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, analisando as razões recursais e tudo mais que dos autos consta, passa a se manifestar.
Inicialmente cabe registrar que esta Procuradoria, emitiu parecer de fls. 645 a 657, nos autos do processo principal sob nº ELC-10/00614945.
Com
o fito de subsidiar o julgamento pelo Plenário,
manifestamo-nos pela procedência do ato licitatório praticado pela CASAN e
objeto do presente recurso. Naquela ocasião chamávamos atenção para o relevante
interesse público que permeia o objeto da licitação em exame e também para
decisão exarada pelo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de autorizar a
realização da contratação e execução da obra.
Por oportuno, traz-se a baila excerto que destacamos
da decisão:
Com certeza, a concorrência
é o pilar que suporta o
instituto da licitação. Na espécie, ela pode ter sido suprimida,
com prejuízo à licitante que foi excluída do certame. Milita a
favor dessa possibilidade o pronunciamento do MM. Juiz de
Direito. Mas o efeito de sua decisão prejudica toda a comunidade que será
beneficiada pela obra pública. Num país, em que se diz que inexiste rede de
esgotos porque, à míngua de visibilidade, esse serviço público não rende votos,
a oportunidade de evitar danos à saúde pública e ao meio ambiente não pode ser desperdiçada.
Ao MM. Juiz de Direito essa
avaliação é vedada. O Presidente do Superior Tribunal de Justiça pode fazê-la,
para evitar que o esgoto do Município de Criciúma continue sendo
"despejado na natureza sem qualquer tratamento" (fl. 13).
É público e notório - está dito na petição inicial
"que o tratamento de esgotos ainda é um grande desafio no
Brasil. De acordo com pesquisa do IBGE, em 2002, apresentada no Plano Nacional
de Recursos Hídricos, 47,8 dos municípios brasileiros não coletam nem tratam os
esgotos.
Entre os 52,2 dos municípios que têm o serviço
de coleta, apenas 20,2 tratam o esgoto coletado e os restantes 32 apenas
coletam. O esgoto coletado e não tratado é conduzido por tubulações para
despejo in natura, transformando rios e mares em focos para disseminação de
doenças, afetando a qualidade da água e o ecossistema ambientar (fl.10)”.
O entendimento ministerial ratificando a posição externada no parecer de
fls. 645/657, é no sentido de acolhimento do presente Embargos de Declaração
interposto, conferindo-lhe efeitos infringentes para, em caráter excepcional,
aprovar o procedimento licitatório realizado.
Senão vejamos.
Conforme se verifica dos autos, a Consultoria Geral opinou pelo desprovimento dos Embargos Declaratórios por entender que as questões ventiladas pelo Embargante não se enquadram entre as hipóteses previstas no art. 78 da Lei Complementar nº 202/2000.
Entretanto, observa-se que a própria Consultoria
Geral ressaltou a existência de fato superveniente, a qual o Relator poderá
aquilatar a ocorrência do prolatado prejuízo irrecuperável mencionado pelo
Recorrente em suas razões recursais, que implicariam inclusive na
impossibilidade de realização da obra pela perda dos recursos oriundos do PAC
II, em se confirmando a anulação do contrato em decorrência da declarada
ilegalidade da licitação.
Sendo assim, diante da excepcionalidade do caso, há que se
fazer uma exegese dos autos levando em consideração o cenário ora existente.
Vejamos: caso rejeitados os presentes embargos, surge para a
CASAN o direito de apresentar, ou não, Recurso de Reexame em face da decisão
ora embargada.
Apresentado o recurso, que será dotado de efeito
suspensivo, tal qual como o que ora se examina, a decisão final ficará a mercê
de toda uma tramitação que, por certo, demandará alguns meses, podendo ao fim,
ser modificada ou não a decisão.
Não apresentado o recurso, a CASAN terá de promover a
anulação do certame em cumprimento a determinação dessa Corte. Nesse caso, é de
se presumir que a empresa contratada não aceitará pacificamente o ato, já que
atingida por um ato jurídico do qual não fez parte.
Muito provavelmente a empresa contratada adotará medidas
judiciais que poderão culminar na nulidade do ato de anulação e do próprio
julgamento desta Corte.
A propósito, o chamamento da contratada aos autos fora
proposto pela manifestação de fl. 658/666, não levada a efeito, verbis:
"Neste ponto a
apreciação conclusiva dos autos é
refreada, considerando a qualidade das ilegalidades de que se trata nestes
autos, que poderão suscitar determinação deste Tribunal para a Unidade Gestora
anular o certame com as consequências advindas desse procedimento (art. 49, § 2° da Lei de Licitações), interesse de terceiro
poderá ser afetado, mais precisamente, a Empresa Itajuí Engenharia de Obras
Ltda. com a qual a CASAN assinou Contrato, cuja execução acha-se suspensa por
condicionante pendente de
solução, qual seja: ajuste com a CEF acerca do repasse de recursos do PAC II.
À vista das discussões que o
tema provoca, isto é, a
pertinência de o Tribunal de Contas proporcionar às empresas
interessadas a oportunidade de exercer o contraditório e a ampla
defesa, particularmente, depois da edição da Súmula Vinculante n. 03 pela
Suprema Corte, menciono os processos REC-10/00002826 e o REC-09/00513861, nos
quais o Sr. Conselheiro Relator Salomão Ribas Junior aborda a matéria com
absoluta propriedade em seu Voto.
Transcrevo aqui abreviado
excerto:
... Já no caso da existência de contrato
assinado, aí sim se estaria efetivamente diante de um direito protegido por
diversos estatutos normativos. Havendo um contrato, fica claro o interesse,
lembrando que a Súmula não exige a ocorrência prejuízo, mas sim "anulação
ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado. Penso ser este
o objetivo e o alcance imediato da Súmula Vinculante n. 03: permitir ao
contratado pela Administração Pública que exerça a ampla defesa perante as
Cortes de Contas sem ter o seu contrato rescindido diretamente pelo Poder
Legislativo. ( ... ).
O provimento dos recursos teve como
efeito a anulação dos Acórdãos impugnados, consoante os Acórdãos 119/2011 e
106/2011, e determinação para citação das empresas ali referidas.
O r. Tribunal de Contas da União
conduz o assunto de modo semelhante. Tanto que, por exemplo, nos Acórdãos nºs. 326/2010 e 411/2008-Plenário constata-se
que as empresas interessadas foram notificadas previamente à decisão conclusiva
para se manifestarem perante a Corte de Contas da União.
Já os Acórdãos 288/2005-1 a Câmara e 52/2009-Plenário examinam
situação idêntica àquela que se passou nesta Corte de Contas, mencionada acima,
isto é: houve anulação da deliberação para que fosse efetivada a oitiva das
empresas interessadas.
Então, com referência aos
presentes autos, proponho que se promova a citação da Empresa Itajuí Engenharia
de Obras Ltda.,
através de seu Representante legal, para exercer o direito ao
contraditório e à ampla defesa, com base no art. 5~ inc. LV, da CF; na Súmula
Vinculante n. 03, do Supremo Tribunal Federal; e, ainda, nos precedentes
citados.
A manifestação deve ater-se
ao que consta da Decisão n. 4983/2010, a ser encaminhada junto com cópia dos
Relatórios Técnicos nºs 845 e
851/2010, da DLC ".
Aliás, no que tange a determinação acima, anoto que
é absolutamente
questionável que a manifestação da empresa contratada seja restrita a decisão nº 4983/2010, pois, talvez, estar-se-á
cerceando seu direito à ampla defesa e contraditório.
Destarte, e por certo, a empresa contratada defenderia a
anulação de todo o processo a partir da assinatura do contrato com a CASAN,
momento em que nasceu seu direito.
Essa digressão é feita apenas demonstrar que o presente
processo pode estar longe de ter um fim, quiçá a realização de um novo processo
licitatório, e que a grande prejudicada por essa demora pode ser a sociedade
Criciumense, sem contar com a possibilidade comprovada de perda dos recursos
pela CASAN, visto que o declaratório vem acompanhado de Oficio da Caixa
Econômica Federal dando conta da aprovação do processo licitatório para
continuidade das obras e informando que até a primeira medição deve ser
apresentada a ordem de serviço e AR T de fiscalização e execução.
Nos memorais apresentados pela embargante há informação
comprovada de que o início das obras já fora autorizado pelo agente
financiador. A propósito, pinço o seguinte dos memoriais apresentados:
"Em
apertada síntese, diante da garantia ofertada pelo Ministério das Cidades,
através da habilitação das propostas para a contratação dos recursos por meio
de Operação com a Caixa Econômica Federal, a Companhia, antecipadamente, iniciou
processo licitatório para a execução de referida obra, sendo realizada a
Concorrência Pública n° 15/2010 e firmado em 24/10/2010 o Contrato de
Empreitada de Obras Civis - EOC n° 831/2010. Entretanto, com a mudança
das datas para a contratação, pelo próprio Ministério das Cidades, a CASAN se
obrigou a aguardar a conclusão do processo de contratação do financiamento, sob
pena dos valores que viessem a ser investidos pela Companhia não terem suas
medições reconhecidas pela CAIXA ECONOMICA FEDERAL e, consequentemente, não
serem reembolsados pelo agente financeiro ante o teor do "MANUAL DE
FOMENTO SANEAMENTO PARA TODOS CAlXA/SUFUG/GEAVO- Versão 2.7 - Vigência 1.11.2012", documento
disponível no site www.caixa.gov.br.
Salientamos
que, atualmente, o fluxo de caixa da Companhia não dispõe de folga que permita
assumir parcela adicional de investimentos, além daquelas já fixadas para contra partida que, in caus,
é da ordem de R$ 2.384.150,20 de um contrato com valor global de R$
47.682.995,20.
Destaque-se,
por oportuno, que em 19 de novembro de 2012 recebemos o Oficio n°
1753/2012 - GIDURlFL,
noticiando em seu item 02 que as pendências verificadas pela CAIXA ECONOMICA
FEDERAL foram solucionadas e o projeto considerado apto à execução (doe. 10
anexo), estando assim o início das obras autorizado pela agente financiador. "
(os grifos são do original).
Cabe novamente registrar, que a anulação do processo
licitatório, o que vale também para o contrato administrativo, no mais das
vezes, pressupõe não só a comprovação da existência de nulidade insanável, mas
também do prejuízo ao interesse público e ao erário. Não se pode, simplesmente,
por apego parnasiano ao formalismo excessivo, anular ato administrativo cuja
manutenção traria, certamente, menor sacrifício ao próprio interesse público,
devendo ser adequadamente temperado com o disposto na vetusta Súmula 473 do
STF.
É oportuno por demais esclarecer que a abertura de novo certame demandaria mais ônus à Administração, em contraponto ao princípio da economia processual, devendo a Unidade Gestora dar continuidade ao processo em consonância com as exigências editalícias.
Além do mais a utilização desse procedimento licitatório traz evidentes vantagens à administração, lembrando, sempre que quando houver conflito entre um interesse individual e um interesse público, deve prevalecer o interesse público. São as prerrogativas conferidas à Administração Pública, porque esta atua por conta de tal interesse.
Embora os embargos declaratórios não se destinem
normalmente a modificar o julgado, constituem um recurso que visa a corrigir
obscuridade, omissão ou contradição anterior. A correção há de ser feita para
tornar claro o que estava obscuro, para preencher uma lacuna do julgado, ou
para tornar coerente o que ficou contraditório.
A concessão de efeitos infringentes aos embargos
declaratórios é medida admitida excepcionalmente, e cabível no presente caso,
por conta do interesse público que permeia o objeto da licitação e o risco da
perda dos recursos obtidos junto ao agente financiador, visto que a realização
de novo certame e sua conclusão pode se arrastar por período de tempo
indefinido.
No caso, a decisão só ficará coerente se houver a
alteração do dispositivo, a fim de que este se conforme com a fundamentação.
O Supremo
Tribunal Federal nos autos do Recurso Extraordinário nº 59.040, já
decidiu “Temos admitido que os embargos
declaratórios, embora, em princípio, não tenham efeito modificativo, podem,
contudo, em caso de erro material ou em circunstâncias excepcionais, ser
acolhidos para alterar o resultado anteriormente proclamado".
Anoto que a providência que ora
recomendamos não é inédita e segue exemplo do acontecido quando do julgamento
do REC 08/00655702.
Verifica-se, portanto, ser
inegável que os embargos de declaração, em alguns casos, terão,
necessariamente, a força e o efeito de modificar o julgamento, sob pena de ser
impossível declará-lo.
Dentro do raciocínio exposto acima, entendo plenamente
aplicável ao caso presente a manifestação do eminente Conselheiro Júlio Garcia
nos autos do processo nº REC0800408454, acatada pelo e. Plenário na sessão de
22/09/2010, cujo Acórdão nº 4.372, reconheceu a omissão adentrando inclusive no
mérito da causa principal em razão da particularidade da quaestio.
Ademais, as irregularidades apontadas
não são suficientes para ensejar a anulação do processo licitatório, tanto que
não houve a sustação cautelar do mesmo. O interesse público recomenda a
realização da obra.
Por
todo exposto e tudo mais que dos autos consta, este Ministério Público junto ao
Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos
I e II, da Lei Complementar 202/2000, manifesta-se pelo acolhimento dos embargos apresentados, conferindo-lhes efeitos
infringentes e, em caráter excepcional, aprová-lo, autorizando o início da
execução das obras contratadas, a exemplo do acontecido quando do julgamento do
REC 08/00655702 e REC0800408454.
Florianópolis, em 25 de janeiro de 2013.
MÁRCIO DE SOUSA ROSA
Procurador Geral
zas