PARECER nº:

MPTC/15862/2013

PROCESSO nº:

RLI 09/00626550    

ORIGEM:

Prefeitura Municipal de Formosa do Sul

INTERESSADO:

Anestor Antônio Simonato

ASSUNTO:

Restrições apartadas das contas do exercício de 2008

 

 

 

 

Trata-se da formação de autos apartados determinada pelo Tribunal Pleno, consoante Parecer Prévio nº. 124/2009 (fls. 2-4), proferido na Sessão de 28.10.2009, para exame das matérias referentes às seguintes restrições:

[...]

6.2.1. Aplicação de 55,39% dos recursos oriundos do FUNDEB em gastos com a remuneração dos profissionais do magistério em efetivo exercício, no valor de R$ 279.860,17, quando o percentual legal de 60% representaria gastos da ordem de R$ 303.145,61, configurando valor a menor de R$ 23.285,44 ou 4,61%, em descumprimento aos arts. 22 da Lei n. 11.494/2007 e 60, II, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias - ADCT (item A.5.1.2.1 do Relatório DMU);

 6.2.2. Despesas com manutenção e desenvolvimento do ensino no valor de R$ 348.849,01, representando 69,05% dos recursos oriundos do FUNDEB, quando o percentual mínimo de 95% representaria gastos da ordem de R$ 479.980,55, configurando aplicação a menor de R$ 131.131,54 ou 25,95%, em descumprimento ao art. 21 da Lei n. 11.494/2007 (item A.5.1.3.1 do Relatório DMU);

 6.2.3. Não remessa de informações através do Sistema e-Sfinge referentes à previsão da Meta Fiscal do Resultado Nominal e da Meta Fiscal do Resultado Primário, em desacordo com a Instrução Normativa n. TC-04/2004, alterada pela Instrução Normativa n. TC-01/2005, podendo caracterizar ausência de previsão na LDO, sujeitando o ente às sanções previstas no art. 5º da Lei n. 10.028/2000 (itens A.6.1.1.1 e A.6.1.2.1 do Relatório DMU);

 6.2.4. Despesa liquidada até 31/12/2008, empenhada, liquidada e cancelada e, consequentemente, não inscrita em Restos a Pagar, no montante de R$ 197.957,93, em descumprimento aos arts. 58, 60, 61, 63 e 83 da Lei (federal) n. 4.320/64 e 55, III, "b", da Lei Complementar (federal) n. 101/00 (item A.8.1 do Relatório DMU);

 6.2.5. Reincidência da não remessa do Parecer do Conselho de Acompanhamento do FUNDEB, em descumprimento ao art. 27, parágrafo único, da Lei n. 11.494/2007 (item A.8.2 do Relatório DMU);

 6.2.6. Não remessa do Relatório Circunstanciado, em desacordo com os arts. 3º e 4º da Lei Complementar n. 202/00 c/c o art. 20 da Resolução n. TC-16/94 (item A.8.3 do Relatório DMU).

[...]

 

A Diretoria de Controle dos Municípios apresentou relatório técnico (fls. 5-18), sugerindo a realização de audiência do Sr. Anestor Antônio Simonato, ex-Prefeito Municipal de Formosa do Sul, para que apresentasse justificativas quanto às restrições apontadas no Parecer Prévio 124/2009.

Procedida a audiência (fl. 20), o responsável remeteu os documentos de fls. 21-130.

A Diretoria de Controle dos Municípios apresentou novo relatório técnico (fls. 132-141), opinando pela aplicação de multas ao responsável em face das restrições apontadas nos itens 1.1 a 1.4 da conclusão do relatório técnico.

A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da entidade em questão está inserida entre as atribuições desta Corte de Contas, consoante os dispositivos constitucionais, legais e normativos vigentes (arts. 70 e 71, inciso II da Constituição Federal, arts. 58 e 59, inciso II, da Constituição Estadual, art. 1º, incisos III e XI, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, art. 17 da Resolução TCE/SC n. 16/1994 e art. 8° c/c art. 6° da Resolução TCE/SC n. 6/2001).

É o relatório.

Passo à análise das irregularidades verificadas pela instrução.

1. Verbas do FUNDEB não aplicadas devidamente.

A irregularidade apontada no item 6.2.1 do Parecer Prévio 124/2009 refere-se à aplicação das verbas oriundas do programa federal “Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica – FUNDEB”, na remuneração de profissionais do magistério abaixo da previsão legal de 60%, equivalendo, no caso em questão, a 55,39%.

A previsão legal está contida no caput do art. 22 da Lei 11.494/2007, in verbis:

Art. 22.  Pelo menos 60% (sessenta por cento) dos recursos anuais totais dos Fundos serão destinados ao pagamento da remuneração dos profissionais do magistério da educação básica em efetivo exercício na rede pública.

 

Em suas justificativas, o responsável afirma que o montante de R$ 67.920,99 oriundos do FUNDEB, foram empenhados com fontes de recursos de impostos, não tendo sido vinculadas à especificação das despesas do FUNDEB, de números 18 e 19 dos balancetes anuais emitidos pelo gestor.

Para comprovar o alegado, o gestor apresentou a relação de empenhos com pessoal realizados na fonte de recursos de impostos, constando, dentre estes, despesas empenhadas em nome da Sra. Cleusa Salete Lazarotto Pavão, no montante de R$ 67.920,99 (fl. 31), sendo a credora detentora do cargo de professora (fls. 32-40).

Somando o montante acima citado aos gastos efetivos com o magistério resataria o percentual de 68,82%, ultrapassando, desta forma, o mínimo legal exigido.

Todavia, conforme registrou a instrução, o responsável não apresentou nenhum documento que comprovasse que as verbas empenhadas com recursos de impostos tenham sido efetivamente as oriundas do referido programa federal, o que impossibilita a aceitação das suas justificativas.

Neste contexto, necessário frisar a importância dos corretos investimentos na educação e do FUNDEB – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – o qual substituiu o antigo FUNDEF (restrito ao ensino fundamental), a partir da Emenda Constitucional n. 53, de 19 de dezembro de 2006.

Cumprir os ditames básicos da Lei 11.494/07, a qual regulamentou o fundo, é a ação mínima dos gestores municipais no que se relaciona aos investimentos quantitativos na educação, isso sem falar no abandonado aspecto qualitativo, já que atualmente no País

o que mais profundamente estigmatiza a educação básica é a perda de qualidade, em contínuo declínio, ano a ano, e acentuada na última década. Os sistemas de avaliação, aprimorados ao longo do tempo, postos em prática regularmente, de alguns anos para cá, põem a descoberto essa triste e constrangedora realidade. Em parte, agravada pela atenção maior que tem sido dada ao fazer crescer o atendimento quantitativo do ensino público. Mas que não mais pode manter-se relegada a um segundo plano.[1]

A propósito, a inobservância do que determina a legislação em questão (Lei n. 11.494/07) é irregularidade gravíssima, porquanto mesmo quando cumpridos os limites mínimos estipulados em Lei, o Brasil segue em situação precária no que se refere à educação, consoante inclusive o mais recente relatório da UNESCO sobre o tema, o “Education for All Global Monitoring Report 2011[2], no qual o País permaneceu na 88ª colocação de tal ranking da educação, atrás de países como Paraguai, Namíbia e Botswana.

Este estudo abrange as ações de cada nação na ampliação da educação infantil, na universalização do ensino primário, no combate das desigualdades de gênero na educação e na melhoria de sua qualidade, dentre outros aspectos, por meio do cálculo do chamado EDI (EFA Development Index, o Índice de Desenvolvimento do Programa Educação Para Todos).

Em face do exposto, opino pela manutenção da referida irregularidade.

2. Verbas do FUNDEB aplicadas abaixo do valor legal.

A irregularidade apontada no item 6.2.2 do Parecer Prévio 124/2009 refere-se à aplicação a menor das verbas oriundas do FUNDEB na manutenção e desenvolvimento da educação básica na ordem de R$ 131.131,54, representando um total de 69,05%, quando o art. 21 da Lei 11.494/2007 prevê a aplicação das verbas do FUNDEB deve ser da ordem de 95%.

O referido dispositivo legal prevê, in verbis:

Art. 21.  Os recursos dos Fundos, inclusive aqueles oriundos de complementação da União, serão utilizados pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, no exercício financeiro em que lhes forem creditados, em ações consideradas como de manutenção e desenvolvimento do ensino para a educação básica pública, conforme disposto no 

§ 1o  Os recursos poderão ser aplicados pelos Estados e Municípios indistintamente entre etapas, modalidades e tipos de estabelecimento de ensino da educação básica nos seus respectivos âmbitos de atuação prioritária, conforme estabelecido nos 

§ 2o  Até 5% (cinco por cento) dos recursos recebidos à conta dos Fundos, inclusive relativos à complementação da União recebidos nos termos do § 1o do art. 6o desta Lei, poderão ser utilizados no 1o (primeiro) trimestre do exercício imediatamente subsequente, mediante abertura de crédito adicional.

 

O gestor, por sua vez, alega que as despesas oriundas do FUNDEB foram aplicadas da seguinte forma:

a) R$ 279.860,17 na fonte 112 – Remuneração Magistério;

b) R$ 111.751,12, na fonte 113 – Manutenção e Desenvolvimento Ensino Fundamental;

c) R$ 67.920,99 na fonte imprópria 101, com remuneração de pessoal do magistério.

A instrução técnica afirma que da soma dos gastos alegados pelo gestor, seria obtido o montante de R$ 459.532,28, o que corresponderia a 90,95% da arrecadação do FUNDEB, ou seja, ainda sim seria inferior à margem legal de 95% obrigados por lei.

Além disso, tendo em vista ainda que a despesa no montante de R$ 67.920,99 não ficou comprovada ter sido efetuada com verbas oriundas do FUNDEB, conforme item anterior destes parecer, não há como aceitar tal alegação.

Desta forma, vê-se que o limite legal de 95% de aplicação dos recursos oriundos do FUNDEB não foi devidamente aplicado, devendo ser mantida a presente restrição.

3. Deficiência nas informações do sistema e-Sfinge.

Em análise das informações fornecidas pela Prefeitura Municipal de Formosa do Sul ao sistema de controle externo deste Tribunal de Contas (e-Sfinge), a instrução identificou a ausência da remessa de informações referentes à previsão de Meta Fiscal do Resultado Nominal e do Resultado Primário.

Em suas alegações, o responsável confirma a irregularidade, afirmando que pode ter havido falhas no envio de informações em face da troca do encarregado pelo Controle Interno do município. Aduz, ao final, que as informações ausentes foram remetidas em 2009.

Todavia, em nova análise ao sistema e-Sfinge, o corpo técnico não identificou a remessa dos documentos referentes às metas fiscais de resultado primário e nominal para o exercício de 2008, razão pela qual a irregularidade resta mantida.

4. Despesas não inscritas em Restos a Pagar.

Na análise do Ofício Circular TC/DMU 1.620/2009, remetido pelo Município de Formosa do Sul a esse Tribunal de Contas, a instrução apurou a existência de um montante de R$ 197.957,93 representando despesas que foram empenhadas, liquidadas e canceladas até a data de 31.12.2008 sem, todavia, terem sido inscritas na forma de “Restos a Pagar”.

Em suas alegações, o responsável aduz que, por equívoco de interpretação, as informações constantes do Ofício Circular 1.620/2009 não seriam corretas, na medida em que os empenhos relatados no documento não seriam liquidados ou liquidados em parte, ou ainda, liquidados e anulados, porque teriam sido substituídos por outros para corrigir erros de classificação e outras irregularidades percebidas após a sua liquidação.

Para comprar suas alegações, o gestor juntou aos autos cópia do relatório de empenhos anulados no exercício de 2008 (fls. 78-79), contendo registros de informações efetuadas manualmente ao lado de cada empenho, na tentativa de descaracterizar os dados apresentados.

No entanto, tal documento não pode ser aceito, pois não se reveste das formalidades necessárias à correção do erro detectado pela instrução.

5. Reincidência na ausência de remessa do Parecer do Conselho de Acompanhamento do FUNDEB.

Em análise as contas do Município de Formosa do Sul foi identificada a ausência do Parecer do Conselho de Acompanhamento do FUNDEB, em afronta ao parágrafo único do art. 27 da Lei 11.494/07, que prevê, nos seguintes termos:

Art. 27.  Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios prestarão contas dos recursos dos Fundos conforme os procedimentos adotados pelos Tribunais de Contas competentes, observada a regulamentação aplicável.

Parágrafo único.  As prestações de contas serão instruídas com parecer do conselho responsável, que deverá ser apresentado ao Poder Executivo respectivo em até 30 (trinta) dias antes do vencimento do prazo para a apresentação da prestação de contas prevista no caput deste artigo.

 

Em suas alegações, o responsável confirma a irregularidade, no entanto, remete cópia do documento ausente à fl. 81.

Remete também as cópias das atas que comprovam a efetiva realização das reuniões do conselho responsável pela análise das verbas oriundas do FUNDEB, conforme fls. 96-109.

Assim sendo, em consonância com o corpo técnico, opino pela regularização da presente restrição.

6. Ausência de remessa do Relatório Circunstanciado.

Em análise as contas do Município de Formosa do Sul foi identificada a ausência do Relatório Circunstanciado sobre a execução orçamentária e a situação da administração financeira municipal, em afronta aos arts. 3º e 4º da Lei Complementar 202/00 e art. 20, I da Resolução TC-16/94.

O responsável afirma que o documento ausente foi devidamente enviado ao Tribunal de Contas.

Em análise aos documentos de fls. 110-129, vê-se que de fato o responsável apresentou os documentos ausentes, devendo, desta forma, ser retirada a restrição ora em análise.

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se pela IRREGULARIDADE dos atos descritos nos itens 1.1 a 1.4 da conclusão do relatório de instrução, na forma do art. 36, § 2º, letra “a”, da mesma lei, e pela APLICAÇÃO DE MULTAS ao responsável, Sr. Anestor Antônio Simonato, ex-Prefeito Municipal de Formosa do Sul, nos termos do art. 70, inciso II, da mesma norma, em face das referidas irregularidades.

Florianópolis, 12 de março de 2013.

 

 

 

Cibelly Farias

Procuradora

 



[1] CALLEGARI, César (organizador). O FUNDEB e o financiamento da educação pública no Estado de São Paulo. 5 ed. São Paulo: IBSA, 2010, p. 189.