PARECER
nº: |
MPTC/15777/2013 |
PROCESSO
nº: |
REP 12/00134017 |
ORIGEM: |
Prefeitura Municipal de Morro Grande |
INTERESSADO: |
Alex Sandro Teixeira da Cruz |
ASSUNTO: |
Representação do Ministério -
Irregularidades na contratação da empresa Grafit S/C e Cia. para realização
de concurso público |
Trata-se de Representação subscrita
pelo Sr. Alex Sandro Teixeira da Cruz, Promotor de Justiça, noticiando supostas
irregularidades contidas na contratação da empresa Grafit S/C & Cia para
realização de concurso público, no âmbito da Prefeitura Municipal de Morro
Grande.
A Diretoria de Licitações e
Contratações apresentou relatório técnico (fls. 28-34) propondo: (a) o
conhecimento da Representação; (b) considerar improcedente a representação
quanto aos itens 3.1 e 3.3 do relatório; e (c) a determinação de audiência do
Sr. Enio Zuchinali, Prefeito Municipal de Morro Grande, para apresentação de
justificativas acerca da irregularidade apontada abaixo:
3.2. Ausência de formalização de contrato com a empresa Grafit S/C
& Cia Ltda., no valor de R$ 7.683,00, para realizar concurso público, em
desacordo com os artigos 60, 62, § 2º, c/c artigo 55 da Lei 8.666/93.
Na sequência, houve manifestação
deste Ministério Público junto ao Tribunal de Contas pelo conhecimento parcial
da representação e realização de audiência do responsável (fls. 35-36), posição
para a qual convergiu a decisão do Relator às folhas 37-38.
Efetuada a audiência (fls. 41-42), o
responsável apresentou alegações de defesa às folhas 43-48.
Por meio de novo relatório de
instrução (fls. 51-54), a Diretoria de Controle de Licitações e Contratações
opinou pela aplicação de multa ao responsável, Sr. Enio Zuchinali, Prefeito
Municipal de Morro Grande, com fulcro nos arts. 69 e 70, II, da Lei
Complementar n. 202/2000, em razão da irregularidade descrita no item 3.1.1.
É o relatório.
Passo à análise da restrição apontada
pela instrução.
1. Ausência de
formalização de contrato com a empresa Grafit S/C & Cia Ltda., em desacordo
com o artigo 62, § 4º, da Lei n. 8.666/1993.
O responsável arguiu a
dispensabilidade de contrato nos casos de compra com entrega imediata e a
possibilidade de substituição por nota de empenho, com fulcro no art. 62, § 4º,
da Lei n. 8.666/1993.
A instrução, por sua vez, registrou
que os serviços prestados não se tratavam de compra com entrega imediata, visto
que existiam várias “etapas que envolviam o serviço, tais como: elaboração do
edital, efetivação das inscrições, aplicação das provas, correção das mesmas,
definição dos resultados e análise de possíveis recursos, tudo realizado ao seu
tempo e gerando obrigações e direitos futuros para ambas as partes” (fl. 52).
Discorreu, ainda, acerca da nulidade do contratual verbal entre as partes, em
razão do desembolso do valor de R$ 7.683,00 (sete mil seiscentos e oitenta e
três reais), superior ao limite especificado no art. 60, parágrafo único, da
Lei n. 8.666/1993.,
A contratação da empresa Grafit S/C
& Cia Ltda. se deu por dispensa de licitação, em conformidade com os
ditames do art. 24, II, da Lei n. 8.666/1993, por não atingir o valor mínimo
disposto na referida norma, qual seja, de R$ 8.000,00 (oito mil reais).
Muito embora o art. 62 da Lei de
Licitações faculte a formalização de instrumento contratual às licitações com
preços abaixo do valor previsto pelo inciso II do art. 24, há que se observar a
disposição contida no art. 60, parágrafo único, da mesma Lei:
“É nulo e de nenhum efeito o contrato verbal com a
Administração, salvo o de pequenas compras de pronto pagamento, assim entendidas
aquelas de valor não superior a 5% (cinco por cento) do limite estabelecido no
art. 23, inciso II, alínea “a” desta Lei, feitas em regime de adiamento”.
Deste modo, extrai-se da Lei de
Licitações o entendimento de que a ressalva acerca da dispensabilidade do
instrumento contratual somente ampara as licitações que tenham por objeto a
prestação de serviço ou compras com valor abaixo de R$ 4.000,00 (quatro mil
reais). Isto porque a ausência deste termo em grande parte das licitações
poderá trazer insegurança ao certame e eminente dano ao erário, em razão da
inexistência de regras que disponham acerca das formas de pagamento, garantias,
deveres e obrigações dos contratantes, entre outros.
Sobre o tema, seguem os ensinamentos
do ilustre doutrinador Marçal Justen Filho[1]:
1) Formalização do
Contrato Administrativo
O contrato administrativo
deve ser formalizado por escrito, como regra geral. A lei excepciona os
contratos de pequenas compras, com pagamento à vista, que poderão fazer-se
verbalmente. A dispensa de forma escrita destina-se a atender a situações em
que essa formalidade é inviável. Considerando o valor previsto na Lei, haverá
contratação direta. Nada impede que a Administração adote a forma escrita para
todos os casos e hipóteses.
[...]
3) Contratos Verbais
A ausência de forma
escrita acarreta a nulidade do contrato, que não produzirá efeito algum
(excetuada a hipótese acima referida). A gravidade da conseqüência também se
destina a reprimir atuações indevidas e ilícitas. O terceiro não poderá argüir
de boa-fé ou ignorância acerca da regra legal. Se aceder com contração verbal,
arcará com as conseqüências.
Colhe-se, também, o seguinte posicionamento
do Superior Tribunal de Justiça, ao interpretar a regra do art. 60 da Lei n.
8.666/93:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. CHEQUE
PRESCRITO. CONTRATO VERBAL DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. TRANSPORTE. AUSÊNCIA DE
LICITAÇÃO E PRÉVIO EMPENHO. ALEGADA VIOLAÇÃO DOS ARTS. 59, § 4º, DA LEI
4.320/64, 59 E 60, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 8.666/93. OCORRÊNCIA.
OBRIGATORIEDADE DA LICITAÇÃO. PRINCÍPIO DE ORDEM CONSTITUCIONAL (CF/88, ART.
37, XXI). FINALIDADE (LEI 8.666/93, ART. 3º). FORMALIZAÇÃO DOS CONTRATOS
ADMINISTRATIVOS. REGRA GERAL: CONTRATO ESCRITO (LEI 8.666/93, ART. 60,
PARÁGRAFO ÚNICO). INOBSERVÂNCIA DA FORMA LEGAL. EFEITOS. NULIDADE. EFICÁCIA
RETROATIVA (LEI 8.666/93, ART. 59, PARÁGRAFO ÚNICO). APLICAÇÃO DAS NORMAS DE
DIREITO FINANCEIRO. PROVIMENTO. 1. Da análise do acórdão recorrido, verifica-se
que não há dúvidas quanto à existência do contrato verbal de prestação de
serviços celebrado entre o Município de Morretes/PR e a Viação Estrela de Ouro
Ltda, bem como do cheque emitido e não-pago pela municipalidade a título de
contraprestação pelo arrendamento de três ônibus efetivamente utilizados no
transporte coletivo. Nesse contexto, a questão controvertida consiste em saber
se, à luz das normas e princípios que norteiam a atuação da Administração
Pública, é válido e eficaz o contrato administrativo verbal de prestação de
serviço firmado. 2. No ordenamento jurídico em vigor, a contratação de obras,
serviços, compras e alienações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do
Distrito Federal, dos Municípios e entidades da administração pública indireta,
está subordinada ao princípio constitucional da obrigatoriedade da licitação pública,
no escopo de assegurar a igualdade de condições a todos os concorrentes e a
seleção da proposta mais vantajosa (CF/88, art. 37, XXI; Lei 8.666/93, arts.
1º, 2º e 3º). 3. Além disso, a Lei 8.666/93, na seção que trata da formalização
dos contratos administrativos, prevê, no seu art. 60, parágrafo único, a regra
geral de que o contrato será formalizado por escrito, qualificando como nulo e
ineficaz o contrato verbal celebrado com o Poder Público, ressalvadas as
pequenas compras de pronto pagamento, exceção que não alcança o caso concreto.
4. Por outro lado, o contrato em exame não atende às normas de Direito
Financeiro previstas na Lei 4.320/64, especificamente a exigência de prévio
empenho para realização de despesa pública (art. 60) e a emissão da 'nota de
empenho' que indicará o nome do credor, a importância da despesa e a dedução
desta do saldo da dotação própria (art. 61). A inobservância dessa forma legal
gera a nulidade do ato (art. 59, § 4º). 5. Por todas essas razões, o contrato
administrativo verbal de prestação de serviços de transporte não-precedido de
licitação e prévio empenho é nulo, pois vai de encontro às regras e princípios
constitucionais, notadamente a legalidade, a moralidade, a impessoalidade, a
publicidade, além de macular a finalidade da licitação, deixando de
concretizar, em última análise, o interesse público. 6. No regime jurídico dos
contratos administrativos nulos, a declaração de nulidade opera eficácia ex
tunc, ou seja, retroativamente, não exonerando, porém, a Administração do dever
de indenizar o contratado (Lei 8.666/93, art. 59, parágrafo único), o que,
todavia, deve ser buscado na via judicial adequada. 7. Recurso especial
provido." (STJ - REsp. n. 545.471/PR - Relª. Minª. Denise Arruda -
Primeira Turma - Julg. 23/08/2005 - 'DJ' 19/09/2005, p. 187)
A natureza do contrato firmado gerou
obrigações continuadas pela contratada, uma vez que havia diversos
procedimentos a serem cumpridospara a realização de um concurso público, o que
não enquadra no conceito de “compra com entegra imediata e integral dos bens
adquiridos”, conforme prevê o § 4º do art. 62 da Lei de Licitações.
Assim, em regra, após a homologação e
adjudicação do processo licitatório, deverá ser formalizado contrato, na forma
escrita, entre a Administração Pública e a entidade contratada, salvo nos casos
em que o valor licitado esteja abaixo do montante de R$ 4.000,00 (quatro mil
reais).
Visto que o desembolso de recursos
públicos no presente caso atingiu a importância de R$ 7.683,00 (sete mil
seiscentos e oitenta e três reais), entendo por pertinente a manutenção da
irregularidade, em observância à legislação e em conformidade com o
posicionamento manifestado pela instrução.
Ante o exposto, o Ministério Público
junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108,
incisos I e II, da Lei Complementar n. 202/2000, manifesta-se:
1. pela IRREGULARIDADE dos atos de gestão em análise, na forma do art. 36,
§ 2º, a, da Lei Complementar n.
202/2000, em face da irregularidade descrita no item 3.1.1 da conclusão do
relatório de instrução;
2. pela APLICAÇÃO DE MULTA ao responsável, Sr. Enio Zuchinali, já
qualificado, conforme previsto nos arts. 69 e 70, II, da Lei Complementar n.
202/2000, em face de citada irregularidade.
Florianópolis,
13 de março de 2013.
Cibelly Farias
Procuradora
[1] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos
Administrativos. 7. ed. São Paulo: Dialética, 2000, p. 537.