Parecer no:

 

MPTC/16.459/2013

                       

 

 

Processo nº:

 

RLA 10/00718643

 

 

 

Origem:

 

Empresa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S.A. - EPAGRI

 

 

 

Assunto:

 

Auditoria Ordinária. Análise da Legalidade e Execução dos contratos de terceirização no período 2009/2010, referente ao Programa Microbacias 3

 

 

 

 

 

A Diretoria de Controle da Administração Estadual realizou Auditoria Ordinária na Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de SC – EPAGRI, para a análise da legalidade e execução dos contratos de terceirização realizados durante o período de 01/10/2009 a 30/09/2010, referentes ao Programa Microbacias 3, conforme o objeto da proposta n.º 005/2010 (fl. 05).

A DCE emitiu Relatório de Auditoria n.º 1.063/2010 (fls. 1258 a 1299), sugerindo que fosse procedida à audiência do Sr. Luiz Ademir Hessmann, nos termos do art. 15, II, da Lei Complementar n.º 202/2000, face às pretensas irregularidades apontadas, sujeitas à aplicação de multas, conforme relacionado abaixo:

4.1. Determinar a audiência do Senhor:

4.1.1 – LUIZ ADEMIR HESSMANN, CPF nº 352.288.499-04 (Presidente da EPAGRI desde 05/02/2009), domiciliado à Rodovia Admar Gonzaga, nº 1.347, Bairro Itacorubi, Florianópolis/SC – CEP 88034-901, nos termo do art. 15, II, da Lei Complementar nº 202/2000, para, no prazo de (30) trinta dias, a contar da data de publicação desta Decisão no Diário Oficial do Estado, com fulcro no art. 57, V, c/c o art. 66, §3º, do Regimento Interno, apresentar alegações de defesa acerca das irregularidades apontadas neste relatório:

4.1.1.1 – Passível de Aplicação de Multas:

4.1.1.1.1 – A contratação dos consultores externos para comporem a Secretaria Executiva de Microbacias 3 foi ilícita, pois infringiram os seguintes regramentos jurídicos: o art. 154 §2º, “a” da Lei Federal nº 6.404/76 – pela prática de ato de liberalidade; instituto do concurso público (art. 37, II, da Constituição Federal); o princípio da moralidade administrativa (art. 37, caput, da Constituição Federal); os parágrafos segundo e terceiro do art. 2º, do Decreto nº 2.678/2009 (item 2.1.3.1)

4.1.1.1.2 – Ausência de documentação de suporte à liquidação das despesas referentes aos Contratos de Consultores, em desacordo com os arts. 62 e 63 da Lei Federal nº 4.320/64. Não constam dos relatórios quaisquer documentos que comprovem a realização dos serviços alegados pelos consultores, não sendo possível afirmar a execução dos serviços pactuados, de forma a garantir a efetiva realização de tais despesas e a consequente liquidação destas (item 2.1.4)

4.1.1.1.3 – Inobservância de cláusulas contratuais dos contratos firmados com a Sr. Yriam Fávero e o Sr. Valmir José Luciano, infringindo os princípios administrativos previstos no art. 37 da Constituição Federal, em especial o da legalidade e da moralidade (item 2.1.4).

O Conselheiro Relator emitiu Despacho (fls. 1300 a 1301) determinando a audiência do Responsável para que apresentasse justificativas acerca das restrições apontadas.

A audiência foi cumprida, conforme se constata às fls. 1308 a 1315 (documentos acostados às fls. 1316 a 1382), com justificativas protocoladas pelo Sr. Luiz Ademir Hessmann, presidente da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina – EPAGRI à época dos fatos.

À luz dos esclarecimentos e documentos apresentados, o Órgão Técnico emitiu Relatório de Reinstrução DCE n.º 591/2012 às fls. 1385 a 1394, no qual sugeriu o conhecimento do Relatório de Auditoria realizado na Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina - EPAGRI, na forma do disposto no art. 70, II da Lei Complementar nº 202/2000, conforme o que segue:

3.1. Conhecer do Relatório de Auditoria que trata sobre a legalidade e execução dos contratos de terceirização (consultoria/prestação de serviços), referente ao Programa Microbacias 3 da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina – EPAGRI, compreendendo o período de 2009/2010.

3.2. Aplicar ao Diretor Presidente da EPAGRI, Sr. Determinar a Audiência do Sr. Luiz Ademir Hessmann, (05/02/2009 – 05/02/2010 e 06/02/2010 – 31/12/2014), CPF nº 352.288.499-04, domiciliado à Rodovia Admar Gonzaga, nº 1.347, Bairro Itacorubi, Florianópolis/SC – CEP 88034-901, multas previstas no art. 70, inciso I, da Lei Complementar 202/2000, pelas irregularidades abaixo descritas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste acórdão no Diário oficial Eletrônico do Tribunal de Contas – DOTC-e para comprovar ao Tribunal o recolhimento das multas aos cofres públicos, sem o que fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observando o disposto nos arts. 43, II e 71 da Lei Complementar n.º 202/2000:

3.2.1 – Contratação dos consultores externos para comporem a Secretaria Executiva de Microbacias 3 de forma ilícita, pois infringiram os seguintes regramentos jurídicos: o art. 154 §2º, “a” da Lei Federal nº 6.404/76 – pela prática de ato de liberalidade; instituto do concurso público (art. 37, II, da Constituição Federal); o princípio da moralidade administrativa (art. 37, caput, da Constituição Federal) e; os parágrafos segundo e terceiro do art. 2º, do Decreto nº 2.678/2009 (item 2.2.2.1 deste relatório);

3.2.2 – Ausência de documentação de suporte à liquidação das despesas referentes aos Contratos de Consultores, em desacordo com os arts. 62 e 63 da Lei Federal nº 4.320/64. Não constam dos relatórios quaisquer documentos que comprovem a realização dos serviços alegados pelos consultores, não sendo possível afirmar a execução dos serviços pactuados, de forma a garantir a efetiva realização de tais despesas e a consequente liquidação destas (item 2.2.2.2 deste relatório)

3.2.3 – Inobservância de cláusulas contratuais dos contratos firmados com a Sr. Yriam Fávero e o Sr. Valmir José Luciano, infringindo os princípios administrativos previstos no art. 37 da Constituição Federal, em especial o da legalidade e da moralidade (item 2.2.2.3 deste relatório).

É o relatório.

A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da entidade em questão está inserida entre as atribuições dessa Corte de Contas, consoante os dispositivos constitucionais, legais e normativos vigentes (art. 31 da Constituição Federal, art. 113 da Constituição Estadual, art. 1º, inciso III, da Lei Complementar Estadual nº. 202/2000, arts. 22, 25 e 26, da Resolução TC nº. 16/1994 e art. 8° c/c art. 6° da Resolução TC nº. 6/2001).

 

1.              Da contratação irregular de 18 Consultores externos para comporem a Secretaria Executiva Estadual (SEE) do Programa Microbacias 3

Consoante exposto no Relatório de Auditoria n.º 1.063/2010 (fls. 1.258 a 1299) e no Relatório de Reinstrução n.º 591/2012 (fls. 1.385 a 1.394), a Diretoria de Controle da Administração Estadual realizou a análise das regularidades dos contratos de terceirização (Consultoria/Prestação de Serviços) referentes ao Programa Microbacias 3, no período compreendido entre 01/10/2009 a 30/09/2012, tendo como unidade auditada a Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina – EPAGRI.

O primeiro apontamento restritivo levantado pela Instrução concerne à contratação irregular de 18 consultores externos, efetuada pela EPAGRI para comporem a Secretaria Executiva Estadual (Unidade Gestora do Programa Microbacias 3).

De acordo com o relatório emitido pelo Corpo Técnico, a admissão destes profissionais constituiu-se em ato de liberalidade, visto que realizada em data anterior à publicação dos Decretos Estaduais n.º 2.678/2009 e n.º 2.704/2009, que previram tais contratações.

Ademais, teriam estas desvirtuado os aludidos Decretos, vez que estes somente autorizavam a admissão de profissionais cedidos pelos órgãos executores do Programa Microbacias 3, restando vedada a contratação de pessoal externo.

Quanto ao apontamento, manifestou-se o responsável:

No tocante ao primeiro ponto, que se refere à data de assinatura dos contratos em 30.09.2009, antes da publicação do Decreto autorizador, verifica-se que é uma restrição já sanada, justamente porque na sequencia veio o decreto autorizando as contratações, logo, não persiste a alegação de que seria um ato de liberalidade, a não ser que o Decreto não fosse editado. Não foi o caso.

É fundamental destacar que, embora o decreto tenha sido publicado após a assinatura dos contratos auditados, naquela data já se tinha ciência inequívoca de sua edição, cuja publicação sofreu atraso, daí a incompatibilidade de datas, salientando-se que a intenção era tão somente que as atividades administrativas na Secretaria Executiva não sofressem solução de continuidade, tudo de acordo com aval prévio do Banco Mundial manifestado nos TOR’s respectivos, fatos que foram reconhecidos, inclusive, pelo corpo técnico dessa Corte ao comentar essa restrição.

Já em relação ao segundo ponto, no sentido de que o Decreto autorizador não estabeleceu ser a regra a contratação dos consultores, mas sim a utilização dos empregados pertencentes aos órgãos executores, igualmente não se verifica plausível a utilização dessa premissa para a responsabilização deste ordenador.

Com efeito, da leitura do Decreto nº 2.704/2009, que incluiu o parágrafo terceiro ao art. 2º do Decreto nº 2.678/2009, verifica-se que, sendo ou não sendo a regra, não havia vedação paras contratações realizadas [...].

Não houve, portanto, qualquer intenção de burla ao concurso público, mas tão somente a tomada de medidas tendentes a viabilizar a logística de transição entre os programas Microbacias 2 e Microbacias 3 (SC Rural)

Noutro giro, no que se refere à possibilidade de empregados dos órgãos executores realizarem os serviços contratados, mormente da Epagri, vislumbrou-se, naquela oportunidade, sua inviabilidade, eis que, além de importar em ato de disposição para outro órgão, não havia em seus quadros empregados disponíveis para tal, porquanto, além do Projeto Microbacias, a Epagri possuía e possui diversos convênios e atividades permanentes, cuja rotina não permitia a cessão de empregados para atuarem somente no Projeto Microbacias.

[...]

Ademais, conforme dito outrora, as contratações realizadas contaram ao aval prévio do banco Mundial, não sendo objeto de questionamento por este, pelo contrário, eis que o Banco demonstrou-se totalmente favorável pela permanência dos contratos durante a transição dos Projetos, consoante se verifica de suas manifestações quando da análise do TOR’s que embasaram a confecção dos contratos. (SIC).

As justificativas apresentadas pelo Responsável não encontram amparo legal.

Consoante salientado pelo Corpo Técnico, a assinatura dos contratos de consultoria realizados no âmbito da EPAGRI se deram em momento anterior aos Decretos Estaduais n.º 2.678/2009 e n.º 2.704/2009, normas reguladoras da matéria em comento.

O Decreto Estadual n.º 2.678/2009, responsável pela criação da Unidade de Coordenação da Estrutura Executiva do Programa Santa Catarina Rural/Microbacias 3, somente foi publicado em 8 de outubro de 2009, data a partir da qual entrou em vigor.

Ato contínuo, na data de 23 de outubro de 2009, foi publicado o Decreto n.º 2.704/2009, que apenas acresceu o §3º ao art. 2º do Decreto n.º 2.678/2009.

Entretanto, pela análise dos documentos anexados aos presentes autos (fls. 156 a 227), verifica-se que a celebração de 18 contratos de consultoria efetuados no âmbito da EPAGRI ocorreu na data de 30 de setembro de 2009, tendo sido realizada sem qualquer embasamento legal. Afora estes, um contrato fora firmado na data de 12 de julho de 2010 (fls. 228 a 231), para a substituição do Secretário Executivo Estadual anteriormente contratado.

Em relação ao primeiro argumento colacionado pelo responsável – de que se trata de uma restrição já sanada em virtude do advento posterior de tais decretos, cuja promulgação era dada como certa – cabe lembrar a este que a análise da legalidade destes contratos faz-se conforme as normas em vigência no momento de sua celebração e execução, não sendo a expectativa de publicação de um decreto fundamento capaz de amparar a contratação direta de 18 consultores.

Não bastasse, a vigência dos referidos contratos, inicialmente compreendida no período de 01 de outubro de 2009 a 30 de abril de 2010, fora ampliada mediante termos aditivos. Os distratos anexos às fls. 1.319 a 1.382 comprovam que 16 dos 18 contratos firmados continuaram a vigorar até a data de 30 de setembro de 2010.

Se era esperada ou não a publicação dos decretos em análise, pouco importa. Deveria o responsável ter aguardado o início do período de vigência destes para somente após tomar as providências necessárias para admissão de profissionais aptos a atuar no Programa Microbacias 3. 

A segunda tese arguida pelo responsável – de que não havia qualquer vedação legal para as referidas contratações – igualmente não prospera.

Conforme já exposto, os contratos foram firmados em data anterior à publicação dos decretos em análise. Contudo, mesmo que fossem tais contratações realizadas posteriormente às normas citadas, não estariam amparadas por estas.

O primeiro dos decretos, de n.º 2.678/2009, estabeleceu:

Art. 1º Fica instituído, sob a supervisão da Secretaria de Estado da Agricultura e Desenvolvimento Rural – SAR, a Unidade de Coordenação da Estrutura Executiva do Programa Santa Catarina Rural/Microbacias 3.

§ 1º A Unidade de Coordenação da Estrutura Executiva do Programa Santa Catarina Rural/Microbacias 3 será composta por uma Secretaria Executiva Estadual – SEE e 27 (vinte e sete) Secretarias Executivas Regionais – SER, uma para cada região administrativa da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina – EPAGRI.

§ 2º A Unidade de Coordenação da Estrutura Executiva do Programa Santa Catarina Rural/Microbacias 3 terá sua existência limitada ao período de preparação, execução e avaliação final do Programa.

Art. 2º A Secretaria Executiva Estadual - SEE do Programa Santa Catarina Rural/ Microbacias 3 terá por finalidade:

[...]

§ 1º A Secretaria Executiva Estadual – SEE será dirigida por um Secretário Executivo Estadual e contará com o apoio de um Gerente Técnico, um Gerente de Investimentos Sustentáveis e um Gerente Administrativo-Financeiro, todos designados pelo Governador do Estado e assistidos por uma equipe multidisciplinar de profissionais que serão responsáveis pelos diversos componentes, subcomponentes e demais atividades do Programa.

§ 2º A Secretaria Executiva Estadual – SEE terá como membros, funcionários cedidos pelos órgãos executores:

I - Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina – EPAGRI;

II - Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina – CIDASC;

III - Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico Sustentável – SDS; e

IV - Fundação do Meio Ambiente – FATMA.

[...]

Art. 6º A organização operacional e funcional da Unidade de Coordenação da Estrutura Executiva do Programa Santa Catarina Rural/Microbacias 3 constará do Manual Operativo do Programa, a ser homologado pelo Chefe do Poder Executivo via Decreto.

Após, sobreveio o Decreto n.º 2.704/2009, conforme segue: 

Art. 1º Fica acrescido o § 3º ao art. 2º do Decreto nº 2.678, de 8 de outubro de 2008, que institui a Unidade de Coordenação da Estrutura Executiva do Programa Santa Catarina Rural/Microbacias 3, passando a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 2º.............................................................................................

[...]

§ 3º A Secretaria Executiva Estadual - SEE terá, se necessário, consultores nas áreas técnica, administrativa e financeira a serem contratados pela Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina - EPAGRI e pela Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina - CIDASC.”

Tal como previsto no art. 2º, §2º do Decreto 2.678/2009, a Secretaria Executiva Estadual deveria ser composta, em regra, por membros já pertencentes ao quadro de funcionários das entidades parceiras do Programa Microbacias 3 (EPAGRI – empresa auditada –, CIDASC, SDS e FATMA).

O §3º acrescido ao decreto mencionado apenas previu a possibilidade de contratação de profissionais não integrantes ao quadro das empresas executoras, caso fosse necessário, sendo exceção à regra geral exposta no parágrafo antecedente.

Por óbvio, esta espécie de contratação somente pode se dar em casos excepcionais que justifiquem o afastamento do instituto do concurso público, fato que não restou caracterizado nos presentes autos.

Conforme informação obtida pelo Corpo Técnico durante a realização da auditoria, 18 dos 27 profissionais lotados na Secretaria Executiva Estadual (SEE) foram contratados de forma direta pela EPAGRI na função de consultores, representando 2/3 do total dos seus membros componentes (tabela anexada às fls. 1.277 e 1.278).

As vagas, que deveriam ser ocupadas por profissionais cedidos pelos órgãos e empresas parceiros do Programa, foram preenchidas em sua maioria por pessoal externo, contratado pela EPAGRI mediante dispensa de licitação.

Ademais, dos dezoito contratos firmados pela EPAGRI, três foram celebrados com o escopo de viabilizar a admissão do Secretário Executivo, do Gerente Técnico e do Gerente Administrativo Financeiro do Programa Microbacias 3, em descumprimento ao estatuído pelo §1º, art. 2º do Decreto n.º 2.678/2009, acima transcrito.

De acordo com o dispositivo, os ocupantes destes cargos deveriam ser designados pelo Governador do Estado e nomeados nos moldes previstos pelo art. 37, II da CRFB/88, por se tratarem de cargos de confiança. O exercício de suas atividades, portanto, não deveria estar condicionado ao termo final previsto no contrato celebrado com a EPAGRI, nem ser por esta remunerado.

Alegou ainda o Diretor Presidente da EPAGRI que a celebração dos contratos fora aprovada pelo escritório Regional do BIRD na América Latina – Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento, responsável pelo financiamento de parcela do Programa Microbacias 3 – e que teriam sido firmadas com os mesmos profissionais que atuaram no Programa Microbacias 2.

A situação apresentada durante a execução do Programa Microbacias 2 difere da atual. Na época do antigo Programa, a responsabilidade pela contratação dos consultores ficava a cargo do Instituto CEPA/SC (entidade privada), não existindo vedação legal ou constitucional para sua efetivação da forma como vinha sendo feita.

Com a reforma administrativa sedimentada pela Lei Complementar Estadual nº 284/2005, o referido Instituto fora incorporado na estrutura organizacional da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S/A – EPAGRI, a qual passou a exercer as atribuições próprias do ICEPA.

Sendo a EPAGRI uma empresa pública e, portanto, entidade integrante da Administração Indireta do Estado, deve proceder à contratação dos seus empregados mediante concurso público, conforme previsto no art. 37, II, da Constituição Federal.

Em vista do exposto, não poderia realizar as admissões de forma direta, como levada a efeito pelo ICEPA/SC. Tal forma de contratação possui aplicabilidade restringida aos casos previstos como excepcionais, em que pode o ente público contratar sem a realização de procedimentos licitatórios.

O aval fornecido pelo Banco Mundial, que outrora bastava, não é argumento suficiente para autorizar dezoito contratações fora dos moldes constitucionais. Ademais, o próprio BIRD estatui em suas “Diretrizes para a Seleção e Contratação de Consultores pelos Mutuários do Banco Mundial” (anexo às fls. 52 a 53) a restrição à contratação direta apenas aos casos excepcionais, devendo, em regra, ser procedida a contratação mediante processo seletivo.

Nesse sentido manifestou-se a Corte de Contas catarinense em consulta realizada pelo Secretário de Estado da Agricultura e Política Rural. Na época da realização da Consulta, estava em execução do Projeto Microbacias II, quando houve incorporação do instituto CEPA/SC pela estatal EPAGRI. O Secretário protocolou junto ao Tribunal de Contas Ofício de n.º 20.357/2005, buscando dirimir a questão relativa à contratação de consultores externos para dar continuidade ao Projeto em andamento:

CON n.º 05/04277090

Projeto Microbacias II. Redirecionamento executivo das atribuições afetas ao ICEPA. Contratação de Consultores.

[...]

6.2.1. As contratações visando a realização de obras, prestação de serviços ou aquisição de bens a serem custeadas com recursos originários de contrato de empréstimo do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento, em consonância com os termos pactuados, observarão, quando da licitação, as condições decorrentes de acordos, protocolos, convenções ou tratados internacionais, aprovados pelo Congresso Nacional, bem como as normas e procedimentos daquelas entidades, inclusive quanto ao critério de seleção de proposta mais vantajosa para a Administração, o qual poderá contemplar, além do preço, outros fatores de avaliação, desde que por elas exigidos para a obtenção do financiamento ou da doação, e que também não conflitem com o princípio do julgamento objetivo e sejam objeto de despacho motivado do órgão executor do contrato, despacho esse ratificado pela autoridade imediatamente superior, conforme os termos do art. 42, § 5º, da Lei Federal n. 8.666/93;

6.2.2. A contração direta tem sua aplicabilidade restringida aos casos previstos como excepcionais e somente quando da ocorrência dessas situações é que se poderá afastar os procedimentos licitatórios regulados nas Diretrizes para Seleção e Contratação de Consultores pelos Mutuários do Banco Mundial;

[...]

O entendimento, proferido na época do Programa Microbacias II, já deixava clara a possibilidade de contratação direta apenas em casos comprovadamente excepcionais. Pelo que se interpreta da decisão, a transição pela qual passava o Programa – delegação de atribuições antes desempenhadas por entidade privada a uma empresa pública – não era por si só justificativa apta a embasar contratações pelo poder público mediante dispensa de licitação. 

Sendo em princípio vedada tal forma de contratação em pleno andamento do Programa Microbacias II, deveria o responsável conceber que tal proibição permaneceria quando da implementação do Programa Microbacias III. Nesta última hipótese, a vedação é ainda mais clara diante do tempo disponível para a solução do problema posto, ao contrário do ocorrido durante a execução do projeto antecedente.

A alegação de que as admissões seriam uma forma de garantir a continuidade do programa não procedem, pelo simples fato de que a falta de planejamento não justifica contratações irregulares. De antemão, já era sabido o termo final do Programa anterior, tendo o responsável prazo suficiente para adotar as providências cabíveis para a execução do novo Programa.

A atuação desses mesmos profissionais no Programa Microbacias 2 também não justifica a celebração de novos contratos, agora no âmbito do Programa Microbacias 3. A experiência dos consultores não basta para afastar a regra prevista no art. 2º, §2º do Decreto n.º 2.678/2009, muito menos para substituir a realização de certame público com vistas ao preenchimento de cargos na Administração Pública, segundo disposto no art. 37, II da CRFB/88.

Ademais, pela descrição das atribuições confiadas aos consultores e pela análise dos requisitos necessários ao preenchimento da vaga junto à Secretaria Executiva – termos de referência às fls. 233/308 e tabela síntese anexa às fls. 1280/1288 – não se constata nenhuma circunstância excepcional que justifique a contratação destes profissionais.

A qualificação exigida para a ocupação de alguns cargos, inclusive, limitava-se à conclusão de ensino médio técnico. Em outros, bastava a graduação na respectiva área de competência e, quando muito, experiência relacionada ao exercício do objeto da contratação. Para a vaga de Secretário Executivo Estadual (caso em que deveria ter-se procedido à nomeação e não à contratação direta pela EPAGRI) era apenas desejável uma Pós-graduação na área correspondente à atividade desempenhada.

Consoante exposto, a “larga experiência” utilizada como fundamento pelo responsável para a contratação de 18 consultores externos não se constituía em requisito indispensável para a ocupação de muitos dos cargos preenchidos mediante dispensa de licitação.

As atividades desempenhadas pelos consultores também não eram especializadas a ponto de justificar a contratação direta, tanto que para a ocupação das vagas bastava o cumprimento a qualificações comuns, limitando-se ao grau de escolaridade (médio ou superior) e experiência na área. As tarefas, em sua maioria, são rotineiras, podendo sua execução ser atribuída a funcionários já lotados na EPAGRI.

Declarou o responsável, por fim, que não haveria no quadro de empregados dos órgãos executores funcionários disponíveis para atuar junto à Secretaria Executiva Estadual, motivo pelo qual teria a EPAGRI efetuado a contratação de consultores externos.

A alegada falta de profissionais não se sustenta diante do quadro de empregados que a EPAGRI possui a sua disposição. A entidade ainda realizou concurso público em 2006 – conforme Anexo I do edital n.º 01/2006[1] – mediante o qual foram integrados a sua estrutura um total de 569 servidores, conforme tabela anexa às fls. 126 a 150 pelo Corpo Técnico.

O preenchimento de parte das vagas se destinou a profissionais com ensino médio-técnico e superior em áreas correspondentes à escolaridade exigida para os consultores contratados de forma direta. Pela análise do Anexo III do edital n.º 01/2006 (Atribuições das Funções), verifica-se a compatibilização entre atividades desenvolvidas pelos aprovados no certame e as atribuições delegadas aos consultores contratados pela EPAGRI. Resta, portanto, clara a possibilidade de tais atividades serem delegadas aos funcionários pertencentes ao quadro da estatal.

Mesmo que a EPAGRI não tivesse a sua disposição número suficiente de profissionais para atuar junto à Secretaria Executiva, poderia a lotação das vagas existentes nesta dar-se mediante a cessão de funcionários pelos demais órgãos executores do Programa.

Conforme disposto no art. 2º, §2º do decreto n.º 2.678/2009, a Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina – CIDASC, a Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico Sustentável – SDS, e a Fundação do Meio Ambiente – FATMA, ficaram igualmente responsáveis por ceder funcionários dos seus respectivos quadros à Secretaria Executiva do Estado.

A EPAGRI, portanto, não poderia realizar a contratação direta de dezoito consultores sob o argumento de que estas se faziam necessárias para a execução do Programa Microbacias III. Somente em não havendo disponibilidade de servidores em todas as quatro agências executoras (situação difícil de ser imaginada diante do número total de funcionários integrantes dos referidos órgãos) poderia a EPAGRI ter procedido à contratação de consultores externos e, ainda assim, mediante procedimento licitatório, em conformidade com o disposto no art. 42, §5º da Lei 8.666/93:

Art. 42.  Nas concorrências de âmbito internacional, o edital deverá ajustar-se às diretrizes da política monetária e do comércio exterior e atender às exigências dos órgãos competentes.

[...]

§ 5o  Para a realização de obras, prestação de serviços ou aquisição de bens com recursos provenientes de financiamento ou doação oriundos de agência oficial de cooperação estrangeira ou organismo financeiro multilateral de que o Brasil seja parte, poderão ser admitidas, na respectiva licitação, as condições decorrentes de acordos, protocolos, convenções ou tratados internacionais aprovados pelo Congresso Nacional, bem como as normas e procedimentos daquelas entidades, inclusive quanto ao critério de seleção da proposta mais vantajosa para a administração, o qual poderá contemplar, além do preço, outros fatores de avaliação, desde que por elas exigidos para a obtenção do financiamento ou da doação, e que também não conflitem com o princípio do julgamento objetivo e sejam objeto de despacho motivado do órgão executor do contrato, despacho esse ratificado pela autoridade imediatamente superior.

Conforme esclarecido anteriormente, o Banco Mundial, em suas “Diretrizes para a Seleção e Contratação de Consultores pelos Mutuários do Banco Mundial”, somente autoriza contratações diretas em casos excepcionais, sendo a regra a admissão precedida de processo seletivo. Portanto, nem mesmo a carência de funcionários aptos a atuar no Programa seria argumento suficiente para justificar essa forma de contratação.

Cabe ressaltar que as contratações foram efetuadas antes da realização de Empréstimo para o financiamento do Programa Microbacias III junto ao Banco Mundial, celebrado em 30 de setembro de 2010[2]. Conforme consta em Ofícios de n.º 11/2009 (fl. 17) e n.º 04/2010 (fl. 32), remetidos pelo então Secretário de Estado ao Governador, as negociações para a celebração do empréstimo estavam ainda em andamento na época da contratação dos consultores externos, ocorrida em 30 de setembro de 2009.

Segundo o responsável, as referidas contratações só se deram diante do aval fornecido pelo Banco Mundial, o qual assegurou o financiamento retroativo dos valores aplicados entre período de 01 de outubro de 2009 (término do Programa Microbacias II) e 31 de março de 2010 (início do Programa Microbacias III), prorrogados posteriormente até a celebração do empréstimo citado, ocorrido em 30 de setembro de 2010.

Em síntese, os custos com as admissões realizadas nesse período de transição (01 de outubro de 2009 ao prazo prorrogado de 30 de setembro de 2010) seriam financiadas pelo BIRD como sendo despesas decorrentes da execução do Programa Microbacias III.

Ocorre que, por mais avançadas que estivessem as tratativas no momento da contratação, não se constituem estas em garantia para a celebração do contrato de empréstimo, o qual poderia não ter restado exitoso. 

Ademais, a citada operação de crédito somente fora autorizada em 03 de dezembro de 2009, por meio da Lei n.º 14.962/2009 (Diário Oficial – SC n.º 18.744, anexo à fl. 31), posteriormente modificada pela Lei n.º 15.139/2010 (Diário Oficial – SC n.º 18.818, anexo à fl. 34). A contratação baseou-se, portanto, em uma operação de empréstimo que nem ao menos havia sido autorizada pelo poder público.

Resta inconteste a irregularidade das admissões de consultores externos, as quais constituíram-se em afronta aos ditames  estatuídos no art. 37, incisos II e IX, da CRFB/88.

Sendo a EPAGRI empresa pertencente à estrutura da Administração Pública, a seleção de seus empregados submete-se às regras de ordem constitucional. Para tanto, deveria a empresa proceder à realização prévia de certame público ou, em sendo necessário, à contratação temporária nos moldes legais.

A admissão de 18 consultores (de um total de 27) para comporem a Secretaria Executiva do Estado demonstra o descaso do responsável para com os preceitos constitucionais e legais que regem a matéria, em total inobservância ao princípio da moralidade – art. 37, caput, da CRFB/88 –, que deve nortear as ações dos gestores no âmbito da administração pública. 

As admissões na forma direta desvirtuaram, igualmente, as regras impostas nos §§2º e 3º do Decreto n.º 2.678/2009 – modificado pelo Decreto n.º 2.704/2009 – os quais normatizaram a matéria após a assinatura dos contratos de consultoria.

As contratações, realizadas sem amparo legal – em violação ao princípio da legalidade, insculpido no art. 37, caput, da CRFB/88 – caracterizaram ainda a prática de ato de liberalidade, vedado pelo art. 154, § 2º, alínea "a", da Lei n. 6404/76: 

Art. 154. O administrador deve exercer as atribuições que a lei e o estatuto lhe conferem para lograr os fins e no interesse da companhia, satisfeitas as exigências do bem público e da função social da empresa.

[...]

§ 2° É vedado ao administrador:

a) praticar ato de liberalidade à custa da companhia;

Destarte, acompanho o entendimento da Instrução Técnica em manter este apontamento restritivo.

 

2.              Da ausência de documentação de suporte à liquidação de despesas realizadas durante a execução dos Contratos de Consultoria

O segundo apontamento restritivo levantado pelo Corpo Técnico refere-se à legalidade da execução dos contratos firmados entre a EPAGRI e os consultores atuantes no Programa Microbacias 3, no que concerne à comprovação dos serviços prestados e à realização das despesas indenizadas.

O Corpo Técnico, em seu Relatório de Auditoria n.º 1.063/2010 e Relatório de Reinstrução n.º 591/2012, apurou a carência de documentação capaz de certificar a prática das atividades contratadas em todos os relatórios apresentados pelos consultores. 

Quanto a este ponto, não se manifestou o responsável.

A prestação de contas elaborada pelos consultores compôs-se, basicamente, dos seguintes documentos (anexos às fls. 309 a 1.257): Solicitação de Pagamento, Nota Fiscal de Serviços Prestados, Comprovante de Pagamento de Recolhimento do Imposto sobre Serviços, Certidão Negativa de Débitos Relativos a Tributos Municipais e Dívida Ativa do Município, Certidão Negativa de Débitos Estaduais, Certidão Conjunta Negativa de Débitos Relativos aos Tributos Federais e Dívida Ativa da União, Liquidação de Despesa e, por fim, Nota de Empenho.

De fato, os documentos integrantes das respectivas prestações não comprovam a realização dos serviços contratados (relação de pagamentos efetuados aos fornecedores, elaboração de planilhas ou relatórios gerenciais, materiais encaminhados ao Banco Mundial, dentre outros).

Nos relatórios elaborados pelos Consultores consta apenas uma descrição das atividades supostamente desempenhadas, sem quaisquer elementos aptos a corroborar a efetiva execução de suas atribuições.

Quanto ao teor destes, manifestou-se ainda o Corpo Técnico, em seu Relatório de Auditoria n.º 1.063/2010:

Em verificação aos meses analisados por este corpo técnico (outubro/2009, novembro/2009, fevereiro/2010, abril/2010, maio/2010 e junho/2010), com exceção dos relatórios dos Consultores Valdemar Heraldo de Freitas e Glauco Olinger, os demais apresentaram relatórios em igual teor e forma (até os mesmos erros de digitação) ou alteraram (acrescentaram ou suprimiram) algumas atividades nos meses observados.

Outra situação que merece destaque é o fato de determinados relatórios não conterem a assinatura do superior hierárquico, como é o caso dos relatórios apresentados pelo Sr. Valdemar Heraldo de Freitas (fls. 416/420, 712/717, 803/811, 947/893 e 1240/1246) e a Sra. Yriam Favero (fls. 376, 484, 680, 932, 1051 e 1255).

[...]

Há ainda o caso de relatórios idênticos para diferentes Consultores, como aconteceram com os relatórios dos senhores Jhonatam Alberto Costa (fls. 426, 905, 996, 1144) e Marcelo Bublitz (fls. 435, 688, 892, 1067 e 1126), que apresentaram o mesmo relatório nos meses analisados. No mesmo sentido, há relatórios MUITO semelhantes, como os dos senhores Cezar Niehues Bet (fls. 385, 646, 857, 1059 e 1117) e Matheus Dobner Pértille (fls. 394, 833, 1043 e 1153), contratados para exercerem as funções de “Consultor para função de Analista Operacional” e de “Consultor para a função de assistir a S.E.E. nos processos Técnicos e Administrativos do componente investimentos”, respectivamente, e cujos relatórios possuem a mesma configuração de página e se diferem apenas em algumas atividades desenvolvidas.

A análise aos documentos acostados comprova a gritante similitude (ou mesmo identidade) entre os Relatórios Descritivos elaborados pelos diferentes consultores. A semelhança pode ser verificada até mesmo em relatórios elaborados por consultores contratados para exercer distintas atribuições, com diferenciação, inclusive, na qualificação profissional exigida para a ocupação do cargo, tal como sucedeu com os relatórios elaborados pelos Consultores Cezar Niehues Bet e Matheus Dobner Pértille, acima citados.

Ademais, a descrição das atividades contidas nos relatórios apresentados é em grande parte uma reprodução das atribuições previstas nos Termos de Referências anexados às fls. 233 a 308, correspondentes aos contratos firmados entre a EPAGRI e os consultores externos (fls. 156 a 231).

Adotemos como exemplo o caso da Consultora Jamille Borges de Oliveira, contratada para exercer a função de Coordenadora Administrativa. As descrições das atividades contidas em todos os quatro relatórios elaborados pela consultora, anexos à fl. 559 (novembro/2009), fl. 654 (fevereiro/2010), fl. 897 (abril/2010) e fl. 1.217 (junho/2010), retratam fielmente as atribuições previstas no Termo de Referência TOR n.º 27/2009 (fls. 271 a 273), correspondente ao Contrato n.º 1.012/09 (fls. 184 a 187). 

Situação idêntica é constatada ao se analisar os relatórios elaborados pelo Consultor Jean Carlos Baldissarelli (fls. 357, 517, 734, 791 e 1.209), contratado como Gerente Administrativo Financeiro, e pelo Consultor Valmir José Luciano (fls. 462, 505 e 752), contratado para exercer a função de Supervisor Administrativo Financeiro. Os relatórios, referentes a meses distintos de execução,  apresentam igual teor, bem como retratam (na mesma ordem e com as mesmas expressões) as atribuições contidas no Termo de Referência TOR n.º 25/2009 (fls. 267 a 269) – correspondente ao Contrato n.º 1.018/09 (fls. 200 a 203) – e no Termo de Referência TOR n.º 33/2009 (fls. 298 a 300) – correspondente ao contrato n.º 1.023/09, (fls. 220 a 223).

O responsável alegou que as atividades desenvolvidas pelos profissionais eram constantemente supervisionadas pelo Secretário Executivo do Projeto e pelo Gerente Administrativo, não restando dúvidas quanto à efetiva execução de suas atribuições. Tal argumento não se sustenta diante da falha na fiscalização verificada quando da feitura dos relatórios do Sr. Valdemar Heraldo de Freitas (fls. 416/420, 712/717, 803/811, 947/893 e 1240/1246) e da Sra. Yriam Favero (fls. 376, 484, 680, 932, 1051 e 1255), que ao menos continham a assinatura dos citados superiores hierárquicos.

Em sua defesa, arguiu ainda que a semelhança nas atribuições – e, consequentemente, nos relatórios de prestação de serviços – deveu-se ao trabalho em equipe desenvolvido pelos consultores, fato este que não impediria o reconhecimento de sua realização.

O fato de os consultores laborarem em equipe não é argumento capaz de justificar a similaridade entre as atividades desenvolvidas por cada profissional. Estes foram contratados para exercer um conjunto de atribuições próprias – cujo desempenho, inclusive demandava qualificações profissionais distintas – sendo-lhes vedada a imisção em outras funções que não as originariamente confiadas. 

Ainda, a semelhança nas atribuições, utilizada pelo responsável como embasamento para a similitude dos Relatórios Descritivos, contradiz o argumento anteriormente exposto para justificar as contratações diretas, qual seja: a especificidade dos serviços desenvolvidos pelos consultores, bem como a “larga experiência” adquirida em suas respectivas áreas de atuação. 

A falha na comprovação documental das despesas efetuadas caracteriza infração aos artigos 62 e 63 da Lei Federal n.º 4.320/64, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal:

Art. 62. O pagamento da despesa só será efetuado quando ordenado após sua regular liquidação.

Art. 63. A liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito.

§ 1° Essa verificação tem por fim apurar:

I - a origem e o objeto do que se deve pagar;

II - a importância exata a pagar;

III - a quem se deve pagar a importância, para extinguir a obrigação.

§ 2º A liquidação da despesa por fornecimentos feitos ou serviços prestados terá por base:

I - o contrato, ajuste ou acordo respectivo;

II - a nota de empenho;

III - os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço. (grifei)

Por não constarem nos relatórios quaisquer documentos que comprovem a execução dos serviços contratados, não é possível garantir a efetiva realização das despesas a estes concernentes. A prestação de contas falha impede o reconhecimento da regularidade das respectivas liquidações, das quais decorreria a obrigação de pagamento pela poder público.

Ante a descrição de atividades análogas em quase sua integralidade às atribuições previstas em contrato, somada à falta de documentação comprobatória do exercício dos serviços prestados, bem como aos insuficientes argumentos apresentados pelo responsável, acompanho o entendimento da DLC no sentido de manter-se o apontamento restritivo.

Ademais, o feito reclama a sua conversão em tomada de contas especial para que sejam apurados tais indícios de dano ao erário, consoante disposto no art. 64, § 4º da Lei Complementar n.º 202/2002.

 

3.              Inobservância das cláusulas contratuais dos contratos firmados com a Sra. Yriam Fávero e o Sr. Valmir José Luciano

Apurou o Corpo Técnico que os consultores acima citados não se encontram atuando junto à Secretaria Executiva Estadual – Unidade componente da Estrutura Executiva do Programa Santa Catarina Rural/Microbacias 3 – mas na sede administrativa da EPAGRI.

Consoante se depreende da Lista de Ramais anexa à fl. 125, os consultores desempenham suas atividades no Setor de Compras e Projetos (CIRAM) e no Gabinete da Presidência (GEX), respectivamente.

Em suas justificativas, o responsável arguiu que a EPAGRI, por ser um dos órgãos executores do Programa, concentrava parte da rotina administrativa e contábil em sua sede. Sustentou ainda que os profissionais atuavam em prol do Projeto e não da rotina administrativa própria da empresa.

Em que pese a estranheza de tal situação, o fato de os consultores estarem desempenhando suas funções fora do órgão para o qual foram contratados não se constitui, por si só, em ato de inobediência às cláusulas contratuais pactuadas entre os profissionais e a EPAGRI.

Para verificar se houve descumprimento é necessário examinar quais as atividades que estão sendo de fato exercidas pelos profissionais e se estas condizem com as atribuições que lhe foram conferidas quando da contratação para atuarem no âmbito do Programa Microbacias III, mediante análise do contrato firmado e do Termo de Referência correspondente a este.

A Consultora Yriam Fávero fora contratada para prestar serviço de consultoria na função de Analista Operacional junto a Secretaria Executiva, conforme consta no Contrato n.º 1.008/2009 (fls. 172 a 175), correspondente ao TOR n.º 21/2009 (fls. 249 a 251).

Dentre as atribuições delegadas à profissional, encontram-se previstas a de “atualizar diariamente os relatórios financeiros dos Sub-Componentes” e “catalogar e arquivar as documentações financeiras encaminhadas ao Setor de Análise e Controle”, atividades que não demandam, necessariamente, a presença da consultora na sede da Secretaria Executiva Estadual.

Ademais, conforme consta no Termo de Referência correspondente ao cargo ocupado, a consultora fora contratada para exercer sua função na sede da entidade executora EPAGRI. No item 6 do TOR n.º 21/2009 (Disposições Gerais), encontra-se expressamente prevista a sua vinculação direta à Gerência de Administração Financeira da EPAGRI, junto à qual deveria executar suas atividades em tempo integral e com dedicação exclusiva.

Quanto ao Consultor Valmir José Luciano, este fora contratado para prestar serviço de consultoria na função de Supervisor Administrativo Financeiro do Programa Microbacias III, conforme consta no Contrato n.º 1.023/2009 (fls. 220 a 223), correspondente ao TOR n.º 33/2009 (fls. 297 a 300). O Termo de Referência estipulava, igualmente, o exercício das atribuições – em período integral e com dedicação exclusiva – junto à Gerência Administrativa da empresa executora.

Os TOR’s referentes aos demais consultores, por sua vez, estabeleciam a sede da Secretaria Executiva Estadual como localidade de atuação dos contratados, vinculando a esta o exercício de suas atribuições. 

Em vista desta diferenciação, o desempenho das atividades dos consultores Sra. Yriam Fávero e Sr. Valmir José Luciano fora da Secretaria Executiva Estadual não consiste em inobediência ao contrato firmado.

Quanto ao cumprimento de suas obrigações contratuais, faz-se menção à observação exposta no item precedente: diante da ausência de documentação comprobatória do seu efetivo desempenho – sem a qual não se pode afirmar se houve ou não obediência ao pactuado entre as partes – resta caracterizada apenas a infração aos artigos 62 e 63 da Lei Federal n.º 4.320/64, referente irregularidade na liquidação de despesas e, consequentemente, no pagamento de serviços não comprovadamente prestados.

 

Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II da Lei Complementar 202/2000, manifesta-se:

1)              pelo conhecimento do Relatório de Auditoria realizada na Empresa de Pesquisa Agropecuária e  Extensão Rural de Santa Catarina S.A. –  EPAGRI, referentes à legalidade dos contratos de consultoria realizados durante o período de 01/10/2009 a 30/09/2010, no âmbito do Programa Microbacias 3, para nos termos do art. 36, § 2º, “a” da Lei Complementar nº 202/2000, considera-los irregulares;

2)              pela aplicação de multas ao Sr. Luiz Ademir Hessmann, Diretor Presidente da Epagri (período de 05/02/2009 a 05/02/2010 e 06/02/2010 até esta data), nos termos do art. 70, II da Lei Complementar 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, em virtude das irregularidades abaixo descritas:

2.1)         Contratação direta de consultores externos para comporem a Secretaria Executiva Estadual do Programa Microbacias 3, sem a realização de certame seletivo e sem a evidência de excepcional interesse público, em desconformidade com o disposto no artigo 37, II e IX, da Constituição Federal, caracterizando ainda ato de liberalidade, vedado pelo art. 154, §2º, a, da Lei Federal n.º 6.404/76, bem como descumprimento ao disposto no art. 2º, §§2º e 3º, do Decreto n.º 2.678/2009;

2.2)         Ausência de documentação de suporte à liquidação das despesas referentes aos Contratos dos Consultores, em desconformidade ao disposto nos artigos 62 e 63 da Lei Federal n.º 4.320;

3)              pela conversão do processo em tomada de contas especial, com fundamento no art. 32 da Lei Complementar nº 202/2000, para fins de apurar a existência e responsabilidade de danos ao erário, em face da não-prestação de contas referentes aos Contratos dos Consultores;

4)              pela determinação ao Presidente da EPAGRI para que proceda à rescisão de contratos eventualmente ainda vigentes, firmados nos mesmos moldes dos analisados nestes autos;

5)              pela ciência do acórdão, relatório e voto ao Responsável.

Florianópolis, 5 de abril de 2013.

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas

 

 



[1] Disponível em: http://epagri.fepese.ufsc.br/pages/arquivos/edital_001_atualizado.pdf