Parecer no:

 

MPTC/16.854/2013

                       

 

 

Processo nº:

 

REP 12/00292780

 

 

 

Interessado:

 

Fabiano Luiz Marafon

 

 

 

Assunto:

 

Representação acerca de supostas irregularidades em processo de inexibilidade de licitação de 2011.

 

Trata-se de Representação movida pelo Sr. Fabiano Luiz Marafon, representante da empresa Editora Folha de Videira, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º 06.017.462/0001-06, com sede na Rua Severino José Pascoal, n.º 1082, Bairro Universitário, Videira/SC, protocolada em 15 de junho de 2012 (fls. 02/03), aduzindo supostas irregularidades concernentes à processos de inexigibilidade de licitação e contratos decorrentes, para prestação de serviços de publicação institucional no âmbito da Prefeitura Municipal de Fraiburgo/SC.

A Diretoria de Controle de Licitações e Contratações apresentou o Relatório n.º 472/2012 (fls. 35-39) e manifestou-se pelo conhecimento da representação, entendendo presentes os requisitos de admissibilidade, e ainda, sugeriu ao relator promover audiência ao Sr. Nelmar Pinz, Prefeito Municipal de Fraiburgo, em observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa, para que, querendo, aquele gestor prestasse justificativas a respeito da ausência de procedimento licitatório para contratar os serviços da empresa Editora  Gráfica A Coluna Ltda., sob pena de aplicação de multas previstas na Lei Orgânica do Tribunal e seu Regimento Interno, no prazo de 15 (quinze) dias.

O Ministério Público de Contas, instado a se manifestar, emitiu Parecer às fls. 40/41, opinando no sentido de que fosse procedida à audiência do Gestor responsável, acerca da irregularidade constatada, com amparo no art. 108, da Lei Complementar no 202/2000.

Por sua vez, o Auditor Relator manifestou sua concordância com o reconhecimento da representação às fls. 42/43, acompanhando a sugestão do Corpo Instrutivo e do Ministério Público de Contas e determinou a realização de audiência do gestor responsável para apresentação de suas justificativas, no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de aplicação de multa com fundamento no art. 70, 11, da Lei n° 202/2000.

A Diretoria de Controle de Licitações e Contratações encaminhou o ofício nº 17.939 de 12/09/2012 (fl. 44) ao Prefeito Municipal de Fraiburgo, Sr. Nelmar Pinz, a fim de proceder à audiência, bem como prestar justificativas acerca das restrições apontadas.

Em atenção à audiência, foram apresentados documentos às fls. 46/54.

Após a análise da justificativa e da documentação, a Diretoria de Controle de Atos de Licitações e Contratações emitiu Relatório às fls. 363/369, onde concluiu:

Diante do exposto, a Diretoria de Controle de Licitações e Contratações sugere ao Exmo. Sr. Relator:

 

3.1. Considerar procedentes as razões apresentadas pela empresa Editora  Folha de Videira Ltda.-ME, na presente Representação.

3.2. Aplicar multa ao Sr. Nelmar Pinz, ex-Prefeito Municipal de Fraiburgo,  CPF 298619779-53, com endereço na Rua Arnoldo Frey, 348, Apto. 02 – Centro, CEP.: 89580-000 - Fraiburgo - SC, com fundamento no art. 70,  II, da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, c/c o art. 109,  II,  do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro de 2001), fixando-lhe o prazo de  30  dias, a contar da publicação do Acórdão no Diário Oficial Eletrônico - DOTC-e, para comprovar ao Tribunal de Contas o recolhimento ao Tesouro do Estado, da multa cominada, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da citada Lei Complementar, em face de:

3.2.1. Ausência de procedimento licitatório para contratar os serviços da empresa Editora Gráfica A Coluna Ltda., em descumprimento ao preceito contido no art. 37, inciso XXI da Constituição Federal e no art. 2º da Lei 8.666/93 (item 2.1 deste Relatório).

3.3. Dar ciência da Decisão, do Relatório e Voto do Relator, do Relatório Técnico e do Parecer do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina ao Sr. Fabiano Luiz Marafon, e à Prefeitura Municipal de Fraiburgo/SC., bem como ao Controle Interno e à assessoria jurídica do órgão.  

É o relatório.

A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da entidade em questão está inserida entre as atribuições dessa Corte de Contas, consoante os dispositivos constitucionais, legais e normativos vigentes (art. 31 da Constituição Federal, art. 113 da Constituição Estadual, art. 1º, inciso III, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, arts. 22, 25 e 26 da Resolução TC nº. 16/1994 e art. 8° c/c art. 6° da Resolução TC nº. 6/2001.

 

1.              Da ausência de licitação para contratação dos serviços da empresa Editora Gráfica A Coluna Ltda., em discordância ao art. 37, inc. XXI, da Constituição Federal c/c art; 2º, da Lei n.º 8.666/93

 

Conforme se depreende dos autos, verifico que razão assiste ao corpo técnico no que tange às irregularidades das contratações sem o devido certame licitatório.

A inexibilidade de licitação está prevista no art. 25 da Lei 8.666/93, vejamos:

Art. 25.  É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:

I - para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes;

II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação;

III - para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública.

§ 1o  Considera-se de notória especialização o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato.

§ 2o  Na hipótese deste artigo e em qualquer dos casos de dispensa, se comprovado superfaturamento, respondem solidariamente pelo dano causado à Fazenda Pública o fornecedor ou o prestador de serviços e o agente público responsável, sem prejuízo de outras sanções legais cabíveis.

 

Conforme denota-se da regra do artigo supra, torna-se inexigível a licitação diante da impossibilidade de se realizar um procedimento licitatório válido, ou seja, diante da inviabilidade de competição.

Assim, cabe ressaltar que somente se estará diante de uma situação de inexibilidade de licitação quando o caráter competitivo do certame resta inviável, tanto pela falta de competidores que possam atender o interesse público, quanto pela impossibilidade de avaliar a proposta mais vantajosa com fulcro em critérios objetivos.

Necessitando a Administração Pública adquirir um bem ou contratar determinado serviço cujas características são únicas, onde apenas o fabricante ou fornecedor o possua, impossível se torna a realização de licitação, pois o universo de competidores limita-se a um único participante.

O inciso I do art. 25, no que se refere à exclusividade, devemos nos ater que um produto deve ser havido como singular quando nele existir um estilo, componente, capacidade ou qualidade de quem o produz, o que normalmente acontece quando os conhecimentos científicos, tecnologia, organização e experiência do produtor influenciam diretamente no resultado final do produto.

Já, a segunda hipótese prevista no inciso II do art. 25, concerne à contratação de serviços técnicos de natureza singularizada, com empresas ou profissionais de notória especialização.

Para ser singular o serviço técnico deve estar revestido de essencialidade, ou seja, deve ser relevante e necessário para satisfazer o interesse do órgão contratante, uma vez que a singularidade aqui exposta não pode ser confundida com exclusividade, sob pena de inviabilizar o dispositivo em comento e de configurar redundância ao inciso I do referido artigo.

A natureza singular do serviço deve ser entendida como característica peculiar do portador que lhe confere tal complexidade individualizando-o, tornando-o diferente dos demais da mesma categoria, o que exige, para a sua execução, profissional ou empresa de especial qualificação. Razão pela qual, mesmo que haja mais de uma empresa com experiência na prestação de um serviço singular, diante das circunstâncias, somente uma dela mostra-se adequada às pretensões do administrador em decorrência da proclamada especialização.

Importante trazer à baila o seguinte prejulgado:

 

Prejulgado n.º 1571

A contratação por inexigibilidade de licitação com fundamento no art. 25, inciso II, da Lei Federal nº 8.666/93 é viável quando, de forma concomitante, estejam demonstrados os requisitos da inviabilidade de competição, da singularidade do objeto e da notória especialização do futuro contratado nos serviços técnicos objeto da contratação. Salvo inequívoca demonstração daqueles requisitos, em princípio, a contratação de serviços de fiscalização, acompanhamento e gerenciamento de obra civil de reforma e ampliação de edifício público depende de prévia licitação, pois a simples circunstância da autoria dos projetos básico e/ou executivo não ampara a Administração para a contratação do autor do projeto por inexigibilidade de licitação, sendo permitida a sua participação na correspondente licitação (art. 9º, § 1º, da Lei Federal nº 8.666/93).[1]

 

Consequentemente, conclui-se que, para configurar a inexibilildade de licitação, deve haver simultaneamente a presença de três elementos: serviço profissional especializado, a notória especialização da empresa ou do profissional e a natureza singular do serviço a ser contratado.

No caso, as aquisições foram, de “Cadernos de Educação”, com informações de interesse do Município, isto é: com conteúdo didático para auxílio na leitura, relacionados com temas do cotidiano tais quais: saúde, orientação sexual, cultura, meio ambiente, trabalho, entre outros, tornando obrigatória a licitação, haja vista a possibilidade de competição.

Percebe-se cristalinamente irregularidades nas contratações, posto que dentro do mercado editorial  brasileiro, tendo em vista os temas objeto das licitações, são raras as editoras que não estariam aptas para participar de certame licitatório a fim de se buscar melhores preços a serem arcados pela administração municipal de Fraiburgo. Razão pela qual fica descaracterizada a exclusividade como fundamento para as inexigibilidades da licitação.

Pelo exposto, verifico que as inexigibilidades de Licitação representadas, cujo objeto foi a aquisição de Cadernos de Educação, foram irregulares por não se enquadrarem nas hipóteses previstas no art. 25, da Lei, n.º 8.666/93. Há uma vasta gama de Editoras no mercado nacional, aptas a ofertarem seus produtos e serviços através de devido processo. Portanto vislumbra-se clara burla  ao preceito enunciado no art. 37, inciso XXI da Constituição Federal e o artigo 2º da Lei n.º 8666/93.

 

2.             Da possível caracterização de crime

 

 Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei caracteriza crime ao arrepio da regra do art. 89, da Lei n.º 8.666/93:

Art. 89.  Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:

Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.

Parágrafo único.  Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público.

 

Há a possibilidade também de que se caracterize ato de improbidade administrativa nos termos do que prevê o art. 10, inciso VIII da Lei 8.429/92:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:

(...)

VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente;

(...)

 

Por esta razão, com fulcro no art. 102 da Lei n.º 8.666/93, deve a Corte comunicar o fato ao Ministério Público Estadual para que aquele órgão, titular de prerrogativas específicas previstas da Constituição Federal, atue como melhor entender.

Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II da Lei Complementar 202/2000, manifesta-se:

 

1)              Pela aplicação de multa ao Sr. Nelmar Pinz, ex-Prefeito Municipal de Fraiburgo, Prefeito Municipal de Gaspar. Julio Cesar Ribeiro, nos termos do art. 70, II da Lei Complementar 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, em virtude da ausência de procedimento licitatório para contratar os serviços da empresa Editora Gráfica A Coluna Ltda., em descumprimento ao preceito contido no art. 37, inciso XXI da Constituição Federal e no art. 2º da Lei 8.666/93.

2)            Com fundamento no art. 71, XI da Constituição Federal; art. 59, XI da Constituição Estadual; art. 7º da Lei Federal nº 7.347/85; nos arts. 14 c/c 22 da Lei Federal nº 8.429/92; art. 35, I c/c 49, II da Lei Complementar nº 35/79 (LOMAN); art. 24, § 2º c/c art. 40 do Decreto-Lei n° 3.689/41 e art. 102 da Lei n.º 8.666/93, pela comunicação ao Ministério Público Estadual, para fins de subsidiar eventuais medidas em razão da possível tipificação de crime e de ato de improbidade.

3)            Pela comunicação do acórdão, relatório e voto ao Responsável.

Florianópolis, 29 de abril de 2013.

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas

 

 



[1] Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, processo n.º CON-04/03485207, Rel. Auditor Altair Debona Castelan, sessão realizada em 09/08/2004, publicação no Diário Oficial 06/10/2004.