PARECER nº:

MPTC/17298/2013

PROCESSO nº:

TCE 04/05578989    

ORIGEM:

Prefeitura Municipal de Laguna

INTERESSADO:

Ministério Público de Santa Catarina - Procuradoria - Geral de Justiça

ASSUNTO:

Referente ao Processo RPJ- 0405578989- Tomada de Contas Especial

 

 

 

Trata-se de Tomada de Contas Especial instaurada na Prefeitura Municipal de Laguna, em atendimento à Decisão n. 2073/2009 (fls. 552-553), proferida na Sessão do Tribunal Pleno de 17.6.2009, nos termos do art. 32, da Lei Complementar n. 202/2000, que determinou, ainda, a citação do Sr. Adílson Cadorin – Prefeito de Laguna, para que apresentasse alegações de defesa acerca das seguintes irregularidades:

 

6.2.1.1. Despesas com viagem, diárias, fotos, vinculação de matéria e serviços de áudio visual que não obedecem aos princípios da legalidade, moralidade e da eficiência previstos no art. 37, caput da Constituição Federal, no valor de R$ 41.975,66 (quarenta e um mil novecentos e setenta e cinco reais e sessenta e seis centavos) - item 1.1 do Relatório DMU;

 

6.2.1.2. Recursos municipais repassados à empresa NEW MILLENIUM, contrato n. 71/2002, sem a contraprestação de serviços, cujas despesas, no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), que confrontam com os princípios da legalidade, da moralidade e da eficiência previstos no art. 37, caput da Constituição Federal e com o art. 63 da Lei (federal) 4.320/64, (item 1.2 do Relatório DMU).

 

O responsável apresentou alegações de defesa às fls. 555-582.

A Diretoria de Controle dos Municípios emitiu relatório técnico (fls. 585-613), opinando pela irregularidade relativa ao repasse de recursos à empresa NEW MILLENNIUM, por meio do Contrato n. 71/2002, no valor de R$ 20.000,00, sem a devida contraprestação de serviços, e pela imputação de débito ao responsável em face das referida irregularidade.

Esta Procuradoria emitiu Parecer n° 104/2011 manifestando-se pela irregularidade ao repasse de recursos à empresa NEW MILLENNIUM, tanto quanto à imputação de débito ao gestor responsável.

O Relator, antes de manifestar-se sobre o mérito das contas, por meio de despacho (fls. 627-629), determinou a citação da Empresa New Millennium Promoções e Eventos Ltda. e do Sr. Evaldo Santos Gonçalves Marcos, representante legal à época da referida empresa, em face de os fatos evidenciarem conluio da empresa com o agente público já citado.

Houve a tentativa de citar a Empresa New Millennium Promoções e Eventos Ltda., representada na pessoa do Sr. José de Assis Sebastião, sócio-administrador, através de ofício. Contudo, não foi possível localizar o endereço de sua sede, realizando-se, enfim, citação por edital.

Realizou-se a citação do Sr. Evaldo Santos Gonçalves Marcos, o qual apresentou, supostamente, alegações de defesa (fls. 636-642).

O Sr. Adilcio Cadorin, gestor responsável, remeteu documentos sob os protocolos n° 20.982/2012, em 22/11/2012 (fls. 654-660) e n° 2.222/2013 (fls. 663-672), em 06/02/2013.

 A Diretoria de Controle dos Municípios emitiu Relatório de Reinstrução n° 706/2013 (fls. 675-715), opinando por julgar irregulares, com imputação de débito, as contas pertinentes à Tomada de Contas Especial, devido, também, ao repasse de recursos à empresa New Millennium Promoções e Eventos Ltda., por meio do Contrato n. 71/2002, no valor de R$ 20.000,00, sem a devida contraprestação de serviços, incluindo como responsável solidário o Sr. Evaldo Santos Gonçalves Marcos.

É o relatório.

Esta Representante Ministerial já se manifestou quanto ao mérito das irregularidades aqui tratadas no Parecer n° 104/2011 (fls. 614-626), ao opinar pela irregularidade das contas em análise, pela imputação de débito e pela comunicação à EMBRATUR acerca das irregularidades, pois envolviam o repasse de verbas desta entidade, cuja fiscalização não está sob o crivo desse Tribunal de Contas.

A nova análise prendem-se aos argumentos apresentados  pelo Sr. Evaldo Santos Gonçalves Marcos e nos novos documentos juntados aos autos a pedido do Sr. Adilcio Cadorin, gestor responsável.

1. Documentos juntados aos autos a pedido do Sr. Adilcio Cadorin, ex-Prefeito de Laguna.

O Sr. Adilcio Cadorin, com o intuito de reforçar o argumento da eficácia do projeto em questão, como elemento de prova que atesta o seu pleno cumprimento, juntou às fls. 663 a 672 transcrições de trechos de depoimentos extraídos da ação penal n° 5000.149.56.2011.404.7216, além de disco compacto contendo outros depoimentos colhidos nos autos do referido processo.

Contudo, os argumentos quanto à eficácia, efetividade ou resultados do projeto não são pertinentes com as irregularidades tratadas. O mérito da questão constrói-se pelo descumprimento dos princípios da legalidade, da moralidade, e, principalmente, da isonomia, como já demonstrado por esta Representante Ministerial no Parecer n. 104/2011.

A Prefeitura Municipal de Laguna concluiu a divulgação do potencial turístico da região em outubro de 2001. Entretanto, posteriormente, dezembro de 2001 e, abril de 2002, realizou convênio com a EMBRATUR e contratou a empresa autuada, respectivamente, justificando-os para esse mesmo fim. Isto é, recolheu quantias tanto municipais quanto federais para a realização do projeto “Caminhos das Águas”, assim, contratando, mediante cláusula restritiva na tomada de preços, em abril de 2002, a empresa New Millennium Promoções e Eventos Ltda., para realizar os serviços concluídos no ano anterior. Configurando, assim, as irregularidades.

Portanto, por não apresentar novos argumentos relevantes ao mérito da questão, resta mantida a irregularidade referente ao pagamento efetivado pelo município para um objeto já concretizado e, manifesto-me pela manutenção da restrição e do débito ao responsável.

2. Alegações de defesa do Sr. Evaldo dos Santos Gonçalves Marcos.

Inicialmente, como apontado pela instrução, destaca-se a impossibilidade de conhecimento da defesa em face da ausência do instrumento de procuração. Na peça, a advogada subscritora informou que o juntaria aos autos no prazo de 10 (dez) dias. Contudo, isso não ocorreu. Logo, para evitar possíveis prejuízos ao interessado, ante a impossibilidade de comprovação da defesa, o não conhecimento é medida adequada.

Entretanto, ainda que a defesa não possa ser acolhida, a instrução analisou o seu conteúdo.

Considerando a hipótese de o Relator conhecer os argumentos apresentados e por razões de celeridade processual, também entendo pertinente, ainda que a defesa não esteja formalmente constituída, a sua análise neste momento.

Em consonância com o relatório de instrução, a premissa de ilegitimidade passiva ad causam não prospera, uma vez que tanto a pessoa jurídica quanto física são abrangidas pela jurisdição dessa Corte de Contas, como prescrito no art. 6°, incisos I e V, da Lei Complementar n. 202/2000:

Art. 6º A jurisdição do Tribunal abrange:

I - qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie, ou administre dinheiro, bens e valores públicos, ou pelos quais o Estado ou o Município respondam, ou que em nome destes, assuma obrigações de natureza pecuniária;

[...]

V - os responsáveis pela aplicação de quaisquer recursos repassados pelo Estado ou Município a pessoas jurídicas de direito público ou privado, mediante convênio, acordo, ajuste ou qualquer outro instrumento congênere, e pela aplicação das subvenções por eles concedidas a qualquer entidade de direito privado;

 

Ademais, cabe na presente hipótese, como relatado pela instrução, a desconsideração da personalidade jurídica, conforme art. 50 do Código Civil, que assim dispõe:

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

 

E para justificar a aplicação do referido dispositivo legal, trago, por pertinente, o conteúdo do Despacho n. 135/2011, no qual o Relator aponta as irregularidades relacionadas com a Empresa New Millennium Promoções e Eventos Ltda. e com o Sr. Evaldo Santos Gonçalves Marcos, então administrador da referida empresa, e relatadas pelo Ministério Público nos autos do Processo n. 013.079/2005-9, que tramitou no TCU, in verbis:

No caso vertente, foi claramente demonstrado nos autos cujo trâmite se deu no TCU que a Empresa New Milleniium Promoções e Eventos Ltda. não ostenta atividade econômica, no qual consta, também, manifestações do Ministério Público Federal no seguinte sentido:

6. Quanto à punibilidade do Sr. Evaldo Santos Gonçalves Marcos, esta é admitida pelo fato de haver evidências de que não ostenta atividade econômica a empresa Empresa New Millennium Promoções e Eventos Ltda., de que é representante legal (fls. 543, v. 2, TC 019.702/2005-9). Conforme mencionou o Ministério Público Federal, em documento de fls. 2009/210, v. 1:

6.1 o talonário de notas fiscais de onde foi destacada aquela referente ao serviço contratado pela Prefeitura do Município de Laguna foi confeccionado na época da inauguração da empresa, em setembro de 2000 (fl. 45, v. Principal);

6.2 esta nota fiscal é ainda a de número 55, passados cerca de dois anos da inauguração da empresa (fl. 45, v. Principal e 528, v. 2, TC 019.702/2005-9);

6.3 o capital social da empresa é de apenas R$ 10.000,00 (fls. 522, v. 2, TC 019.702/2005-9);

6.4 os sócios formais da empresa são a ex-esposa do Responsável, Sra. Maria José Leandro Marcos e o filho do casal, menor de idade, Murilo Leandro Marcos (fls. 522, v. 2, TC 019.702/2005-9).

 

Além disso, cabe evidenciar que as tentativas de localizar o endereço da empresa New Millennium Promoções e Eventos Ltda., para que fosse citada, foram todas frustradas. Vale, também, mencionar que seu endereço cadastrado na Receita Federal consta como sendo de Imbituba, contudo o setor tributário dessa cidade discordou, informando que para eles o endereço constava na cidade de Tubarão. Enfim, tentou-se localizar a empresa nessa cidade, mas na rua específica não se encontrou estabelecimentos empresariais, tratando-se de rua essencialmente residencial.

Todos esses fatos, dessa forma, justificam a desconsideração da personalidade jurídica da empresa New Millennium Promoções e Eventos Ltda.

Por fim, a defesa sustentou que houve benefícios do projeto ao Município de Laguna. Contudo, como já dito, o mérito da irregularidade não trata da eficácia do projeto, mas sim de recursos destinados a serviços já prestados anteriormente.

3. Recursos federais repassados pela EMBRATUR.

O Tribunal de Contas da União já apreciou a questão dos recursos transferidos pela EMBRATUR conforme Convênio n° 100/2001, como nota-se pelo seguinte acórdão extraído do TCU:

Acórdão 2732/2010 ATA 38 – Processo 013.079/2005-9 – Sessão: 13.10.210

Relatório:

Cuidam os autos de recurso de reconsideração interposto pelo Sr. Adilcio Cadorin, ex-Prefeito de Laguna/SC, contra o Acórdão n° 2.858/2008 – TCU – Plenário, adotado em processo de tomada de contas especial instaurada em desfavor do recorrente, da empresa New Millennium Promoções e Eventos Ltda. e de seu representante legal, Sr. Evaldo Santos Gonçalves Marcos, em razão de irregularidades constatadas na aplicação dos recursos recebidos do Instituto Brasileiro de Turismo (Embratur), por força do Convênio Embratur n.° 100/2001.

2. O referido convênio, celebrado em 18/03/2002 no valor de R$ 200.000,00, tinha por objetivo a cooperação técnica-financeira para promover a divulgação do projeto Roteiro Turístico Integrado “Caminho das Águas” a agentes de viagem italianos, por meio da implantação de site na internet, da implantação de programa de gestão e manutenção do site e da apresentação do roteiro turístico às 500 principais agências de viagem italianas (fl. 11, v. Principal).

[…]

Assim, é desnecessária a remessa de comunicação ao TCU, conforme proposto no parecer anterior.

Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar n. 202/2000, manifesta-se:

1.     Pela IRREGULARIDADE das contas em análise nestes autos, na forma do art. 18, III, “c”, da Lei Complementar n. 202/2000;

2.     Pela IMPUTAÇÃO DE DÉBITO aos Srs. Adílson Cadorin, ex-Prefeito Municipal de Laguna e Evaldo dos Santos Gonçalves Marcos – ex-representante da empresa New Millennium Promoções e Eventos Ltda., na importância, atualizada monetariamente e acrescida de juros legais, de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), com fundamento no art. 21, caput, da Lei Complementar n. 202/2000,  referente aos recursos municipais repassados à empresa New Millennium Promoções e Eventos Ltda., sem contraprestação de serviços. Contrariando os princípios da legalidade e da moralidade, previstos no art. 37, caput da Constituição Federal, e com o art. 63 da Lei Federal n° 4.320/64.

Florianópolis, 23 de maio de 2013. 

 

 

Cibelly Farias

Procuradora