PARECER  nº:

MPTC/17359/2013

PROCESSO nº:

REP 12/00382266    

ORIGEM     :

Secretaria de Estado da Fazenda

INTERESSADO:

Eduardo Passold Reis

ASSUNTO    :

Peças de Ação Penal - desvio e apropriação de recursos repassados.

 

 

 

 

1 – RELATÓRIO

Trata-se de Representação formulada pelo Dr. Eduardo Passold Reis, Juiz Substituto da Vara Criminal de Campos Novos, que encaminha cópia de sentença e de acórdão proferidos em processo judicial (fls. 2/82).

Auditores da Diretoria de Controle da Administração Estadual sugeriram o conhecimento da Representação e a adoção das providências necessárias à apuração dos fatos apontados como irregulares (fls. 86/87).

Manifestei-me no mesmo sentido (fl. 88).

As providências foram determinadas (fl. 89).

Auditores da DCE sugeriram a expedição de ofícios à Secretaria de Estado da Fazenda e à Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina visando o encaminhamento de informações complementares (fls. 91/92 e 93/94, respectivamente).

Foram encaminhados os documentos de fls. 97/281 e 283/303.

Após, auditores da DCE sugeriram nova diligência à Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina, para apresentação de documentos originais, não em fotocópias (fls. 305/306).

Foram apresentados os documentos de fls. 308/408.

Por fim, auditores da DCE sugeriram o arquivamento dos autos, tendo em vista que o valor repassado pelo Estado à Associação Comunitária de Ciclismo Flor do Campo, e desviado pelos representantes da entidade e demais envolvidos, foi restituído por meio de uma conta vinculada ao processo judicial (fls. 411/414-v).

 

2 – MÉRITO

Conforme a sentença da Ação Penal nº 014.06.000038-8 (fls. 7/8), os integrantes da Associação não empregaram o verba na finalidade a que se destinava.

Eis excertos da decisão (fls. 8/15):

 

(...), tem-se como devidamente comprovado que os valores liberados pela Secretaria de Estado da Fazenda e pela Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina não foram aplicados na forma como devida, ocorrendo, assim, o desvio de recursos públicos no montante de R$ 27.743,00 (vinte e sete mil, setecentos e quarenta e três reais).

(…)

De acordo com o conjunto probatório, os acusados Lindomar, João Valdenir e Florindo (…) tiveram a ideia de constituir uma associação para, por meio dela, lograrem a apropriação de dinheiro público oriundo de subvenções sociais.

Definida a estratégia, os três denunciados procuraram os co-denunciados Paulo e Santo (…) e obtiveram deles a aquiescência em participarem do plano, nascendo assim, em data de 5 de fevereiro de 2005, a Associação Comunitária de Ciclismo Flor do Campo, entidade privada sem fins lucrativos.

Consta dos autos, ainda, que cada um dos denunciados tinha uma atribuição específica na organização.

João Valdenir, Florindo e Lindomar, o primeiro por ser assessor do deputado estadual Antônio Ceron e os dois outros em função de manterem contatos com parlamentares estaduais, tinham a incumbência de conseguirem a liberação de recursos públicos em favor da associação. A participação de Florindo também servia para dar transparência à ação do grupo, haja vista sua condição de vereador do município.

Além disso, esses denunciados, embora sem participação formal na entidade, eram os responsáveis pela obtenção da documentação necessária para a prestação de contas da utilização da verba.

Os acusados Paulo e Santo, ao seu turno, figuravam como os administradores legais da associação, o primeiro na qualidade de presidente e o segundo como tesoureiro. Cabia a eles, assim, as tarefas de emitirem cheques e sacarem o dinheiro enviado pelos órgãos públicos e que posteriormente era partilhado entre todos os integrantes do grupo.

Essa conclusão dimana da análise concatenada das provas amealhadas, em especial das declarações prestadas pelos acusados em Juízo. (Grifos meus)

 

Com base nesses fundamentos, os acusados foram condenados por estelionato, formação de quadrilha e falsidade material (fls. 48/49).

Por ter havido desvio de subvenções sociais, o magistrado determinou o encaminhamento de cópia da sentença ao Exmo. Presidente do Tribunal de Contas (fl. 49), fato que originou esta Representação.

Em sede de apelação criminal, foi dado provimento ao recurso do acusado Honório para absolvê-lo, bem como foi dado provimento parcial aos recursos dos demais acusados, para adequar a sanção penal, tendo em vista a absorção do crime de falsidade ideológica pelo de estelionato (fls. 81/82).

Quanto à existência de irregularidades, a conclusão dos auditores da DCE não foi diferente da encontrada no Poder Judiciário (fl. 413-v):

 

(...)

Sobre a matéria em comento, nota-se que os valores repassados tanto pela SEF quanto pela Assembleia, somam o montante de R$ 27.743,00 (vinte e sete mil, setecentos e quarenta e três reais), (...); como já dito, montante não empregado no objeto proposto pelos representantes da entidade no momento de solicitação dos recursos financeiros, segundo apurado na sentença criminal anteriormente citada. Assim, por consequência, houve lesão aos cofres públicos, tendo a entidade (pessoa jurídica) em conjunto com os seus representantes e demais envolvidos, obrigados a despender de valores para custear o prejuízo que deram causa.  (Grifo meu)

 

Como se vê, resta claro ter havido lesão aos cofres públicos em razão de condutas perpetradas pelos acusados, uma vez que as subvenções sociais não foram empregadas em sua finalidade.

Todavia, o montante repassado à Associação (R$ 27.743,00) foi devolvido pelo Sr. Lindomar José Pereira, mediante depósito em conta vinculada ao Juízo da Ação Penal (fls. 6 e 69).

Sob esse fundamento, auditores da DCE sugerem o arquivamento do processo, sob o argumento que “não há como esse Tribunal de Contas dá [dar] continuidade a esse processo, sob o risco de incorrer em enriquecimento ilícito ao erário, uma vez que, além de já terem sido condenados na esfera penal, houve ressarcimento aos cofres públicos” (fl. 414).

Peço vênia para dissentir quanto a esse entendimento, por dois motivos.

Primeiro porque o fato de ter havido ressarcimento ao erário não impede que o Tribunal de Contas perquira acerca do descumprimento de preceitos legais, para os quais existe previsão de aplicação de multa aos responsáveis.

Segundo porque as instâncias (Judicial e Administrativa, leia-se esta última como Tribunal de Contas) são autônomas e não se confundem.

Nessa direção, importante destacar que se trata de Representação intentada por magistrado, em decorrência de processo por ele dirigido, por meio do qual foram aplicadas sanções penais aos responsáveis, bem como foi obtida a devolução dos valores discutidos.

Por certo, o magistrado não oficiou ao Tribunal de Contas para que os valores fossem ressarcidos.

Portanto, não se trata de tomada de contas especial, e não se discutirá a necessidade de devolução de valores ao Erário, por já ter se efetivado tal medida.

De outro norte, não obstante os resultados penais obtidos, existe a necessidade de discussão acerca de eventuais sanções na esfera da Corte de Contas.

A Representação já foi conhecida mediante despacho de fls. 89/90.

Nesse passo, tenho como constituído o seguinte apontamento, para o qual existe previsão legal de aplicação de multa do art. 70, I e II, da Lei Complementar nº 202/2000:

- Aplicação de recursos públicos oriundos de subvenções sociais, no valor de R$ 27.743,00, em objeto diverso da finalidade para a qual foram solicitados e liberados (conforme detalhado na sentença penal de fls. 3/50), em contrariedade ao disposto no art. 9º da Lei (estadual) nº 5.867/81[1] e no art. 1º, § 1º, da Instrução Normativa nº TC-14/2012.[2]

Quanto à responsabilização, devem ser ouvidos o Sr. Santo Samborski e o Sr. Paulo Roberto Borges, respetivamente, Presidente e Tesoureiro da Associação.

Além deles, devem ser ouvidos os Srs. Lindomar José Pereira, Florindo Rogério Cordeiro dos Santos e João Valdenir da Silva, em decorrência na participação nos fatos tidos como irregulares.[3]

Dessarte, difiro dos termos do Relatório nº 137/2013 da Diretoria de Controle da Administração Estadual, opinando pela audiência dos responsáveis, tendo em vista descumprimento de preceitos legais cuja fiscalização compete ao Tribunal de Contas.

 

3 – CONCLUSÃO

Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108 da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se pela AUDIÊNCIA dos Srs. Santo Samborski, Paulo Roberto Borges, Lindomar José Pereira, Florindo Rogério Cordeiro dos Santos e João Valdenir da Silva, quanto ao seguinte apontamento, para o qual existe previsão legal de aplicação de multa do art. 70, I e II, da Lei Complementar nº 202/2000:

- Aplicação de recursos públicos oriundos de subvenções sociais, no valor de R$ 27.743,00, em objeto diverso da finalidade para a qual foram solicitados e liberados (conforme detalhado na sentença penal de fls. 3/50), em contrariedade ao disposto no art. 9º da Lei (estadual) nº 5.867/81 e no art. 1º, § 1º, da Instrução Normativa nº TC-14/2012.

Florianópolis, 28 de maio de 2013.

 

Aderson Flores

Procurador

 mb



[1] Art. 9º As subvenções sociais serão aplicadas exclusivamente nos fins para os quais houverem sido concedidas.

[2] § 1º A concessão de recursos públicos para entidades privadas fica submetida exclusivamente ao atendimento de necessidade coletiva ou interesse público devidamente demonstrado e justificado, e deve observar os princípios da legalidade, da publicidade, da impessoalidade, da eficiência, da moralidade e da economicidade.

[3] Vide sentença de fls. 3/50 e acórdão de fls. 51/82. A propósito, o Sr. Honório Proner teve seu recurso provido para ser excluído da condenação (fls. 68 e 81) e o Sr. Aymoré José Borille faleceu, motivo pelo qual foi extinta a punibilidade quanto a ele (fl. 6).