PARECER nº:

MPTC/18775/2013

PROCESSO nº:

REC 12/00426573    

ORIGEM:

Secretaria de Estado da Educação

INTERESSADO:

Paulo Roberto Bauer

ASSUNTO:

Recurso de Reconsideração da decisão exarada no processo -TCE-09/00594330 Assunto: Tomada de Contas Especial - Conversão do Processo n. RLA - 09/00594330 - Auditoria sobre Licitações e Contratos - Edital do Pregão Presencial n. 45/2009.

 

1.     RELATÓRIO

Cuidam-se os autos de Recurso de Reconsideração interposto pelo Senhor Paulo Roberto Bauer – ex-Secretário de Estado da Educação, ante a Decisão nº 811/2012, prolatada nos autos do Processo TCE 09/00594330.

No Decisum, o Tribunal Pleno julgou irregular, sem imputação de débito, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, que tratou de irregularidade no Edital do Pregão Presencial n. 45/2009 da Secretaria de Estado da Educação.

Aplicou, por conseguinte, multas ao Senhor PAULO ROBERTO BAUER - ex-secretário de Estado da Educação; Senhor ZITO CARLOS BALTAZAR - ex-Gerente de Suprimentos e Materiais e Serviços, e; Senhora JOVITA CATARINA BERNARDI SEIBT - Presidente da Comissão Permanente de Licitação e Pregoeira do Pregão Presencial n. 045/2009, em face da realização de licitação por menor preço global, em dissonância com o art. 15, IV, da Lei n. 8666/93 e o princípio da economicidade, previsto no art. 70, caput, da Constituição Federal.

Inconformado com a deliberação dessa E. Corte de Contas, o ex-Secretário de Educação interpôs a presente peça recursal.

Salienta que a decisão pela realização da licitação do tipo menor preço global partiu de decisão técnica pedagógica e administrativa da Diretoria de Apoio ao Estudante para aquisição de instrumentos musicais, tendo por objetivo atender a estudantes com deficiências visuais e auditivas.

Registra que “a Secretaria de Estado da Educação, através da Diretoria de Apoio ao Estudante (DIAE) e Gerência de Valorização do Educando (GEDUC), optou por ofertar os testes de acuidade auditiva por meio da composição dos kits, por se tratarem de instrumentos pertencentes a um mesmo grupo e classe, para o fim de cumprir no menor espaço de tempo o que determina a legislação garantindo o encaminhamento da criança que tivesse apresentado alteração aos serviços de saúde especializados e por uma questão de logística”.

Que a licitação fracionada poderia gerar atrasos na entrega de instrumentos, custos de armazenamento e distribuição, o que prejudicaria a aplicação dos testes, uma vez que necessários todos os instrumentos.

Informa, ainda, que em outra licitação procedida por aquela Pasta para a aquisição de instrumentos musicais, utilizando-se o mesmo tipo de licitação, a Corte de Contas considerou regular tal procedimento. (RLA 09/00596201)

De posse dos autos, a Instrução procedeu à nova análise. Aduz que os argumentos apostos aos autos são idênticos aos lançados nos fundamentos recursais e já devidamente analisados no parecer COG nº 1402/2012.

Conquanto a decisão exarada pela Corte de Contas no Processo RLA 09/00596201, considerando regular o processo licitatório para aquisição de instrumentos musicais, o Corpo Técnico asseverou que não foi possível estabelecer uma quantia exata que reflita a real perda da economicidade, uma vez que o valor do débito apurado não foi preciso e inconteste.

Nesse sentido, reitera os argumentos expedidos no parecer COG nº 1402/2012, sugerindo o não provimento do presente recurso e ratificando na íntegra a deliberação recorrida.


2.   MINISTÉRIO PÚBLICO

A manifestação ofertada pelo Recorrente merece análise e considerações deste Órgão Ministerial.

No Processo TCE 09/00550120, a Corte de Contas realizou Auditoria na Secretaria de Estado da Educação, em específico no Pregão Presencial n. 100/2007, cujo objeto era a aquisição de kits de material escolar para atender alunos do ensino fundamental.

Na ocasião, no Relatório preliminar, a Instrução manifestou-se contrária à utilização de tipo de licitação por lote ao invés de item, por se tratar de objeto fracionável que apresenta possibilidade de maior economicidade - Infração ao art. 3º, §1º, I e art. 15, IV da Lei nº 8.666/93 – Dano ao erário na ordem de R$ 199.500,00.

Após apresentação de justificativas por parte do Responsável, e registre-se, idênticas às apostas aos presentes autos, o Corpo Técnico considerou que a opção pela contratação por item implicaria em despesa para administração com a linha de montagem; e diante dos demais argumentos consignados, pressupôs que a licitação por lote, aparentemente, mostrou-se tecnicamente mais vantajosa para Administração, tornando admissível o afastamento da suposta existência de débito e consequente dano ao erário.

Colaciona-se, para tanto, a manifestação da Instrução:

“Reitera-se como no Relatório anterior, que no que tange ao primeiro aspecto, que se refere ao tipo de licitação utilizado, esta Diretoria de Controle através de seu Relatório Inaugural consignou que “caso a licitação tivesse se desenvolvida pelo tipo menor preço por item, e não por lote, haveria possibilidade de maior competitividade entre os participantes e na aquisição mediante o menor desembolso financeiro por parte do erário, conforme será demonstrado a seguir”.

No entanto, diante das justificativas apresentadas e revendo as informações contidas nos autos bem como outros precedentes deste Tribunal de Contas, entende-se que esta afirmação deve ser analisada com cautela, levando em consideração, principalmente, a característica do objeto.

Lembre-se que a legislação vigente, como o artigo 15, inciso VI, e em especial o artigo 23, parágrafo 1º, da Lei nº 8.666/93, consigna que as “compras efetuadas pela administração serão divididas em tantas parcelas quantas se comprovarem técnica e economicamente viáveis [...]”.

  Ou seja, a utilização da licitação por itens para compras de bens de natureza divisível, não deve ser adotada de forma absoluta, mas sim após análise que demonstre a viabilidade técnica e econômica.

Lembre-se que no sentido de abonar a utilização da licitação por lote, os responsáveis assim sustentaram:

 

[...] na aquisição por item o custo se apresentaria mais elevado em razão da logística e do custo com embalagem a serem repassados para o produto[...]

[...]

 A justificativa técnica da não fragmentação do pregão em lotes distintos demonstra que a subdivisão não se revela economicamente viável até porque o objeto fracionado não garante o fato de ser mais econômico para aquisição, por se tratar de um lote contendo vários itens escolares que compõem uma entrega. Além disto, não existe maneira de prever qual das duas possibilidades garantiria a melhor condição para aquisição por melhor preço.

[...]

Não podemos considerar que o licitante praticaria o mesmo preço cotado no lote na hipótese da licitação ser por item, até porque não seria razoável e lógico considerando as particularidades do caso concreto.

 

Pertinentes as colocações dos responsáveis, que geram certa controvérsia sobre a viabilidade e economicidade da licitação por item, caso tivesse sido aplicada ao processo licitatório em análise.

Não há de fato, nenhuma demonstração técnica ou econômica que demonstre com precisão que o tipo licitatório adotado pela Unidade é de fato o mais conveniente, por outro lado, também não se pode afirmar com precisão que a licitação por itens seria a mais recomendada.

É que o objeto licitado envolve bens de natureza divisível, materiais escolares, mas que, por outro lado, deverão ser entregues na forma de kits, ou seja, um conjunto pré-determinado de materiais escolares.

Nos termos do Edital, na especificação do objeto, estes kits deverão estar embalados individualmente, já que tem como destinatário final os alunos da rede pública de ensino.

É neste sentido que surge o principal questionamento.

Seria de fato, tecnicamente mais vantajoso e mais econômico, realizar a licitação por item, cabendo à Administração proceder à montagem dos Kits, disponibilizando pessoal para tanto e fugindo de suas atribuições inerentes; ou, realizar a licitação por lote de Kits, devidamente montados?

Aparentemente a licitação por item mostra-se economicamente viável, inclusive assim tentou-se demonstrar no Relatório Inaugural. Entretanto, os responsáveis em suas justificativas afirmam de forma contundente que a forma como foi licitada, por preço global, mostra-se economicamente mais viável, levando em consideração os custos com logística, recebimento dos itens de forma separada, disposição de espaço físico e pessoal para montagem dos kits, espaço para armazenamento, perdas, entre outros.

Em outras palavras, a suposta economicidade, não estaria levando em consideração que ao adquirir os materiais de forma individualizada, a Unidade estaria sujeita a proceder o agrupamento dos itens para formação dos kits escolares, despendendo para tanto recursos públicos decorrente da eventual contratação de terceiros, ou utilizando-se de pessoal pertencente ao quadro da Unidade, onerando-se assim do exercício de atividade não essencial ao serviço público.

Portanto, em que pese possa haver economicidade na licitação dos materiais escolares quando licitados por item, ainda que questionável diante dos argumentos já expostos, no caso vertente, pode-se concluir que tecnicamente mostrou-se inviável que assim fosse procedido, pois implicaria à Administração o ônus da linha de montagem dos kits escolares, lembrando que o próprio Edital (especificação do objeto) alertava que “o arranjo dos componentes do kit, deve ser feito de uma forma a não permitir que qualquer de seus produtos se quebre, amasse ou perfure a embalagem no transporte, armazenamento e manuseio”.

Quanto ao eventual prejuízo ao erário, entende-se que apesar da licitação por item para os bens de natureza divisível mostrar-se, aparentemente, economicamente mais vantajosa, trata-se de argumento que não pode ser interpretado de forma absoluta, e, especialmente, no caso vertente, levando em consideração que o objeto consiste num agrupamento de bens de natureza divisível, que deveria ser entregue em forma de Kit.

Sendo assim, eventual recebimento dos materiais por itens oneraria a Administração com a linha de montagem dos Kits, seja através da contratação de serviços terceirizados, como através da utilização de pessoal próprio, neste caso, fugindo de suas atribuições precípuas.

Desta forma entende-se que o montante verificado do suposto dano decorrente da contratação por lote, R$ 199.500,00 (cento e noventa e nove mil reais) não pode ser reconhecido como preciso e inconteste, tendo em vista que o cálculo baseou-se nos preços das propostas encaminhadas pelos licitantes considerando a formação do Kit e a logística pela entrega de uma quantidade maior de materiais.(grifo nosso)

No mesmo sentido, ainda contrário ao débito então identificado, merece atenção o que restou consignado pelos responsáveis em suas justificativas, ao afirmarem, justamente, que não se pode usar o preço unitário como parâmetro quando extraído de uma proposta de preço global, já que ali estão inseridos outros custos, calculados, entretanto, levando em consideração a totalidade do objeto, como a logística de transporte, por exemplo, entre outros.

Ressalta-se ainda que dentre os argumentos sustentados pelos responsáveis, está a alegação de que existem indícios de que houve jogo de planilhas em algumas propostas, retirando a credibilidade dos preços cotados com baixo valor, e tomados como referência para o cálculo do suposto débito.

Por fim, considerando que a opção pela contratação por item implicaria em despesa para administração com a linha de montagem; e diante dos demais argumentos consignados neste Relatório pressupõe-se que a licitação por lote, no caso vertente, aparentemente, já que não se pode afirmar de forma absoluta, mostra-se tecnicamente mais vantajosa para Administração, tornando admissível o afastamento da suposta existência de débito e consequente dano ao erário.

Neste sentido posicionou-se o Exmo. Conselheiro Relator do Processo no voto que balizou o Acórdão nº 1544/2011, recentemente lavrado pelo Tribunal Pleno referente ao processo nº TCE 09/00582162, assim consignando em suas razões:

 

[...]

 

Cumpre destacar, porém, inicialmente, que no dimensionamento do suposto dano ao erário, apontado pela área técnica desta Corte de Contas, não foram levados em consideração os custos relativos à logística, envolvendo especialmente o recebimento dos itens de forma separada, a disposição de pessoal e de espaço físico para montagem dos kits, o espaço necessário para armazenamento, as perdas no processo de manuseio, montagem e transporte, entre outros.

 

Em verdade, compulsando atentamente os autos, não se encontra a demonstração de como o suposto prejuízo ao erário foi efetivamente calculado. Seria de indagar-se, por exemplo, se houve uma projeção de quanto se economizaria, caso a opção fosse pela licitação por itens e não por lote. Tem-se apenas a suposição de um dano ao erário, tomado globalmente e imputado, a título de débito, ao Responsável, como se nada do que foi adquirido através do referido processo licitatório tivesse entregue e utilizado pelo ente público.

 

Parece evidente, portanto, a inconsistência e insustentabilidade de tais cálculos, mormente se for considerado que, para tal efeito, foram utilizados os preços unitários constantes das propostas apresentadas pelas empresas Benedito Alves de Assis e Satélite Comercial Ltda – EPP, as quais foram desclassificadas do certame.

 

[...]

 

Infere-se daí que a alegação, por parte do Corpo Técnico desta Corte de Contas, de que a aquisição isolada dos itens que compõem o Kit traria vantagem financeira à Administração Pública, não seria de todo procedente, posto que deixaram de ser considerados, nos critérios de cálculo utilizados, os custos inerentes à logística que seria necessária para o recebimento, montagem, armazenamento e entrega dos materiais, caso tivesse havido opção de aquisição por item e não por lote.

 

[...]

 

Pelo visto, pode-se pode extrair do ensinamento do citado autor que a licitação por itens, em determinadas circunstâncias, como, por exemplo, quando o objeto envolver um “conjunto integrado de bens”, apresenta-se “impossível”. Mas, mesmo quando não se trate de objeto com essas características, a licitação por itens deve ser vista como mero instrumento para viabilizar a ampliação das “vantagens econômicas para a Administração”, motivo pelo qual, além de não traduzir-se em regra absoluta, deve ser analisada no contexto dos custos globais da aquisição objeto do processo licitatório, e não apenas em função do preço que seria possível obter na aquisição isolada de cada item.

 

Outro aspecto que merece relevo é o fato de não restar demonstrado nos autos uma projeção de quanto se economizaria, caso a licitação tivesse sido conduzida por itens e não por lote.

 

De outra parte, não se vislumbram indícios de má-fé ou locupletamento. Tampouco de que o Responsável tenha atuado com o propósito de beneficiar a si ou a terceiros, impingindo prejuízo ao erário.

 

Merece ser realçado, é verdade, como apontou a equipe técnica desta Corte, que a Secretaria de Estado da Educação insiste em centralizar todas as licitações e contratos na capital do Estado, ignorando as necessidades Regionais da Educação. E, daí, necessário se faz expedir recomendação à Unidade Gestora, para que envide esforços no sentido de viabilizar os meios que permitam a realização das licitações e contratações diretamente pelas Secretarias Regionais de Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina.

 

 

Como forma de elucidar ainda mais o referido posicionamento, ressalta-se que em processo similar, também de recente julgamento neste Tribunal de Contas, Processo RLA – 09/00582162, cujo objeto era a compra de materiais escolares, o Tribunal Pleno através da Decisão nº 2132/2010, seguindo o Parecer da área técnica, decidiu pela conversão do processo em tomada de contas especial, levando em consideração a verificação de dano ao erário decorrente, justamente, da opção pelo procedimento da licitação por preço global, ao invés da licitação por item:

 

Decisão n. 2132/2010

1. Processo n. RLA - 09/00582162 (apensos os Processos ns. ELC-08/00629892 e REP-08/00673360)

2. Assunto: Grupo 2 – Auditoria sobre Licitações, Contratos, Convênios e Atos Jurídicos Análogos - Pregão Presencial n. 40/2008

3. Responsáveis: Paulo Roberto Bauer - ex-Secretário de Estado

Arnóbio José Marques - Diretor de Administração Financeira em 2008

4. Órgão: Secretaria de Estado da Educação

5. Unidade Técnica: DLC

6. Decisão:

O TRIBUNAL PLENO, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar n. 202/2000, decide:

6.1. Converter o presente processo em "Tomada de Contas Especial", nos termos do art. 32 da Lei Complementar n. 202/2000, tendo em vista as irregularidades apontadas pelo Órgão Instrutivo, constantes do Relatório de Instrução DLC/Insp.2/Div.5 n. 190/09.

6.2. Definir a responsabilidade individual, nos termos do art. 15, I, da Lei Complementar n. 202/00, do Sr. PAULO ROBERTO BAUER - ex-Secretário de Estado da Educação, por irregularidades verificadas nas presentes contas.

6.2.1. Determinar a citação do Responsável nominado no item anterior, nos termos do art. 15, II, da Lei Complementar n. 202/2000, para, no prazo de 30 (trinta) dias, a contar do recebimento desta deliberação, com fulcro no art. 46, I, b , do mesmo diploma legal c/c o art. 124 do Regimento Interno, apresentar alegações de defesa:

6.2.1.1. acerca das irregularidades abaixo relacionadas, ensejadoras de imputação de débito e/ou aplicação de multa prevista nos arts. 68 a 70 da Lei Complementar n. 202/2000:

6.2.1.1.1. Utilização de tipo de licitação por lote em vez de por item, por se tratar de objeto fracionável, gerando um dano ao erário no montante de R$ 5.567.695,50 (cinco milhões, quinhentos e sessenta e sete mil, seiscentos e noventa e cinco reais e cinquenta centavos), em violação ao previsto no arts. 3°, §1°, I, 15, IV, e 23, §§ 1° e 7°, da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 4.7 do Relatório DLC);

[...]

7. Ata n. 30/10

8. Data da Sessão: 24/05/2010 - Ordinária

9. Especificação do quorum:

9.1. Conselheiros presentes: César Filomeno Fontes (Presidente em exercício), Luiz Roberto Herbst, Salomão Ribas Junior (Relator), Julio Garcia, Adircélio de Moraes Ferreira Junior, Gerson dos Santos Sicca (art. 86, caput, da LC n. 202/2000) e Sabrina Nunes Iocken (art. 86, § 2º, da LC n. 202/2000).

10. Representante do Ministério Público junto ao TC: Mauro André Flores Pedrozo.

11. Auditor presente: Cleber Muniz Gavi.

CÉSAR FILOMENO FONTES

Presidente em exercício

SALOMÃO RIBAS JUNIOR

Relator

Fui presente: MAURO ANDRÉ FLORES PEDROZO

Procurador-Geral do Ministério Público junto ao TCE/SC

 

 

Ocorre que, apesar da aparente analogia entre o presente processo e o acima mencionado, destaca-se que o objeto licitado guarda diferença sutil, mas que implica na interpretação diferenciada acerca da adoção do tipo licitatório.

É que conforme já abordado no presente Relatório o objeto do Pregão nº 177/2008, ora analisado, consiste na compra de material escolar em forma de Kit, ou seja, trata-se de uma composição de materiais escolares, formando um conjunto, devidamente acondicionado, para serem entregues aos alunos da rede pública.

Esta situação não se verifica no Pregão nº 40/2008, objeto de análise no Processo RLA – 09/00582162, já que, naquele caso, os materiais escolares restaram adquiridos de forma individualizada.

Deve-se levar em consideração também, que cada processo guarda sua singularidade, motivo pelo qual o mérito deva ser apreciado considerando as particularidades de cada caso, como no caso vertente, detalhadamente analisada no presente Relatório.

Ademais esta Corte de Contas já se pronunciou de forma diversa em casos similares, mas não idênticos, acerca do tipo licitatório a ser adotado, como por exemplo, no caso de aquisição de Uniformes Escolares, já que se considera como regra geral para compras é a adoção do tipo licitatório por itens, mas devido às singularidades da licitação, no caso o Pregão nº 65/2008, o Exmo. Conselheiro Relator entendeu por admitir a licitação por lote, nos autos do processo ELC nº 08/00714652, e assim arrazoou em sua sugestão de voto, que restou posteriormente acatada pelo Tribunal Pleno através da Decisão nº 3354/2009:

 

1. Adoção do critério de julgamento de “menor preço global” quando possível a decomposição dos itens licitados, em desacordo com os arts. 3°, § 1°, I; 23, § 1°, e 45, § 1°, I, da Lei n° 8.666/93, reforçado ainda pelo disposto no artigo 15, inciso IV, da Lei n° 8.666/93, ferindo o princípio da economicidade, restringindo o caráter competitivo da licitação e inviabilizando a busca da proposta mais vantajosa (item 2.1 do Relatório DLC/INSP.2/DIV.4 n° 112/2009);

 

É louvável a preocupação da instrução quanto ao respeito aos princípios básicos, mandamentos nucleares de todo o sistema de compras ou aquisições, para selecionar a proposta mais vantajosa para a administração e garantir a isonomia de tratamento aos participantes.

 

No caso em exame trata-se de examinar se a aquisição em separado de itens de um conjunto que se pretende é melhor (mais vantajosa) para a Administração. E ainda se a aquisição do conjunto prejudica os fornecedores em benefício de um ou de uns poucos.

 

Alega a Administração que a aquisição por itens para uniformizar adequadamente os escolares separadamente onera os custos pela logística que deverá ser organizada para a montagem dos kits e insiste que são – ou podem ser – vários os fornecedores do conjunto, decidindo-se, ao final, pelo menor preço global.

 

De outra parte, questionamento judicial sobre esse ponto restou refutado pelo Judiciário, conforme documentos juntados às fls. 109/114 do processo (cópia do Acórdão do Agravo de Instrumento n° 2008.080127-9, da Capital, Relator Desembargador Cesar Abreu).

 

Eis a ementa do referido Acórdão:

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. LICITAÇÃO NA MODALIDADE DE PREGÃO PRESENCIAL. IMPUGNAÇÃO AO EDITAL E À DECISÃO DO PREGOEIRO. AQUISIÇÃO DE UNIFORMES ESCOLARES, TIPO MENOR PREÇO GLOBAL. TESE DA LEGITIMIDADE DO SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃO AFASTADA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU MANTIDA. LIMINAR CONCEDIDA EM MANDADO DE SEGURANÇA CASSADA PARCIALMENTE. SUSPENSÃO DO PREGÃO POR DUPLO FUNDAMENTO: MALFERIMENTO AO PRINCÍPIO DA COMPETITIVIDADE, NÃO PERMITIDA A DIVISÃO DOS BENS LICITADOS EM LOTES; EXIGUIDADE DO PRAZO DEFINIDO PARA APRESENTAÇÃO DAS AMOSTRAS DOS PRODUTOS. CONCORDÂNCIA DO PODER PÚBLICO QUANTO AO SEGUNDO ARGUMENTO. HIPÓTESE QUE NÃO IMPLICA EM PREJUDICIALIDADE DO PRESENTE AGRAVO, QUE REMANESCE PELO PRIMEIRO ARGUMENTO. OPÇÃO POR LOTE ÚNICO PARA FORNECIMENTO DE CONJUNTOS DE HELANCA (JAQUETA E CALÇA), BERMUDAS, CAMISETAS MANGA CURTA E LONGA, PARES DE SANDÁLIA, MEIA E TÊNIS, QUE GARANTE ECONOMICIDADE E EFICIÊNCIA. PROSSEGUIMENTO DO CERTAME AUTORIZADO, COM DILATAÇÃO DO PRAZO DE APRESENTAÇÃO DAS AMOSTRAS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

 

A regra é a preferência pelo fracionamento da contratação; a exceção a adoção de lote único. O que define a prevalência do modo de aquisição é o interesse público. Este, manda seja dado preponderância aos princípios da economicidade e da eficiência sobre o da competitividade. (grifou-se).

 

Por seu turno, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas opina pela regularidade do edital em exame, frisando que:

 

(...) verifica-se que não necessariamente o tipo menor preço será a proposta mais vantajosa para a Administração. Tal medida não é obrigatória e de forma alguma restringe o caráter competitivo da licitação, por ser uma opção escolhida pelo interesse público. Cabe à Administração optar pelo que lhe é mais vantajoso, priorizando os princípios da economicidade e da eficiência. Conforme demonstrado pela Unidade em Agravo de Instrumento n° 2008.080127-9 (cópia às fls. 109 a 114), no ano anterior foi realizado divisão por lote e restou prejudicado o processo com relação ao tempo que levou para estar concluso, bem como um maior custo. (grifou-se).

 

Comanda o art. 23, § 1°, I, da Lei de Licitações que as obras e serviços licitados devem ser divididos em "tantas parcelas quantas se comprovarem técnica e economicamente viáveis, procedendo-se à licitação com vistas ao melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no mercado e à ampliação da competitividade, sem perda da economia de escala."

Logo, concordo que a divisão do objeto é a regra, mas o presente processo é um exemplo perfeito da exceção a esta regra, sendo tecnicamente inviável o seu fracionamento.

 

Sobre o tema, em comentários ao art. 23, § 1°, da Lei n° 8.666/93, assim se manifestou Marçal Justen Filho[i][i][4]:


3) Fracionamento da Contratação (§1°)


O disposto no § 1° do art. 23 apresenta alguma relação com o art. 8º e de seu parágrafo único, que vedam a execução parcial de objetos de que a Administração Pública necessita. As contratações devem ser programadas na sua integralidade, sendo indesejável execução parcelada. Aliás, se o objeto do contrato for um conjunto integrado de bens e (ou) serviços - configurando-se um sistema - o fracionamento da contratação não será meramente indesejável, mas sim impossível.


(...)


Como se extrai, o fundamento jurídico do fracionamento consiste na ampliação das vantagens econômicas para a Administração. Adota-se o fracionamento como instrumento de redução de despesas administrativas. A possibilidade de participação de maior número de interessados não é o objetivo imediato e primordial, mas via instrumental para obter as melhores ofertas (em virtude do aumento da competitividade). Logo, a Administração não pode justificar um fracionamento que acarretar elevação de custos através do argumento de benefício a um número maior de particulares.

 

Dessa forma, considerando que o fracionamento somente é exigível quando tecnicamente viável, e que dependendo do caso, como é o dos autos, nem sempre importa em economia para a administração pública ou mesmo na preservação do interesse público, objetivo maior da licitação, entendo por sanar a presente irregularidade.

 

 

Por fim, diante do panorama verificado no caso em tela, entende-se que admitida a licitação por lote, poderia a Unidade, fundada em uma análise de viabilidade econômica financeira, estudar sobre forma mais salutar para licitar os referidos materiais escolares, levando em consideração a possibilidade de subdivisão objeto licitado, bem como a possibilidade de divisão em lotes por macro ou microrregiões, visando a ampliação da competitividade, e possibilitando também a participação dos licitantes que não disponham de capacidade para entrega da totalidade do objeto, sem restringir, portanto, a competição em função da amplitude do objeto e da logística de entrega dos materiais, seguindo em consonância com o que resta consignado na Súmula nº 247 do Tribunal de Contas da União:

 

SÚMULA Nº 247

É obrigatória a admissão da adjudicação por item e não por preço global, nos editais das licitações para a contratação de obras, serviços, compras e alienações, cujo objeto seja divisível, desde que não haja prejuízo para o conjunto ou complexo ou perda de economia de escala, tendo em vista o objetivo de propiciar a ampla participação de licitantes que, embora não dispondo de capacidade para a execução, fornecimento ou aquisição da totalidade do objeto, possam fazê-lo com relação a itens ou unidades autônomas, devendo as exigências de habilitação adequar-se a essa divisibilidade.

 

Ressalta-se ainda a manifestação exarada pelo o Exmo. Conselheiro Relator do Processo no voto que balizou o Acórdão nº 1544/2011, recentemente lavrado pelo Tribunal Pleno referente ao processo nº TCE 09/00582162, no que tange, justamente, à centralização das licitações:

[...]

Merece ser realçado, é verdade, como apontou a equipe técnica desta Corte, que a Secretaria de Estado da Educação insiste em centralizar todas as licitações e contratos na capital do Estado, ignorando as necessidades Regionais da Educação. E, daí, necessário se faz expedir recomendação à Unidade Gestora, para que envide esforços no sentido de viabilizar os meios que permitam a realização das licitações e contratações diretamente pelas Secretarias Regionais de Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina.

[...]

 

Motivo pelo qual se entende encaminhar sugestão à Unidade.

Constata-se a ocorrência de dois comandos no Relatório de Instrução. O primeiro é a afastar a punibilidade do Gestor pela adoção do tipo de licitação, salientando que a utilização da licitação por itens para compras de bens de natureza divisível não deve ser adotada de forma absoluta, somente após análise que demonstre a viabilidade técnica e econômica.

O segundo ponto anotado pela Instrução, recomenda à Unidade Gestora, fundamentada numa análise de viabilidade econômica financeira, realize estudos técnicos objetivando avaliar outras formas de aquisição, levando-se em consideração “a possibilidade de subdivisão objeto licitado, bem como a possibilidade de divisão em lotes por macro ou microrregiões, visando a ampliação da competitividade, e possibilitando também a participação dos licitantes que não disponham de capacidade para entrega da totalidade do objeto, sem restringir, portanto, a competição em função da amplitude do objeto e da logística de entrega dos materiais, seguindo em consonância com o que resta consignado na Súmula nº 247 do Tribunal de Contas da União”.

É nesse sentido que este Órgão Ministerial conclui o presente parecer, opinando pelo julgamento regular das contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial - que trata de irregularidade no Edital do Pregão Presencial n. 45/2009, e recomendar à Secretaria de Estado da Educação que adote providências no sentido de realizar estudos técnicos visando aprimorar  e melhorar as contratações de “kits”, sejam referente a instrumentos musicais, de uniformes escolares, ou quaisquer outros que porventura necessitem, evitando, assim, sanções mais severas por parte dessa Corte de Contas.

 

Florianópolis, em 19 de julho de 2013.

 

 

 

 

 

 

MÁRCIO DE SOUSA ROSA

Procurador-Geral